Estudo do Problema da Geração de Detritos Orbitais Com a Destruição do Satélite MICROSAT-R pelo Míssil Antissatélite Indiano PDV MK II
Caro leitor!
Trago agora para você um interessante estudo/artigo
escrito pelo Mestre em Mecatrônica pela Universidade
Federal da Bahia (UFBA), Rui Botelho, tendo como tema o problema
da geração de detritos orbitais após a destruição do Satélite MICROSAT-R pelo Míssil Antissatélite Indiano PDV MK II. Vale a pena conferir.
Duda Falcão
Estudo do Problema
da Geração de Detritos Orbitais Com a Destruição do Satélite MICROSAT-R pelo
Míssil Antissatélite Indiano PDV MK II
Rui Botelho*
02/05/2019
No dia 27 de março último, o Governo da Índia anunciou
publicamente que havia realizado, com sucesso, um teste com um míssil
antissatélite (Anti-SATellite missile
– ASAT) disparado do solo, no qual destruiu um de seus satélites orbitando a
cerca de 300 km de altitude. Com essa ação, a Índia se tornou a quarta nação
mundial (depois de Rússia, China e Estados Unidos) a realizar um feito dessa natureza.
Ao mesmo tempo em que a notícia impactou a comunidade
internacional com a demonstração de força e poderio tecnológico da Índia, em um
momento em que tensões regionais e eleições gerais se aproximavam, também
espantou a comunidade espacial graças aos efeitos nocivos de um possível
acirramento de uma corrida armamentista espacial (em longo prazo) e, de forma
imediata, pela geração de detritos oriundos da destruição do satélite alvo.
Como é de conhecimento público, o problema dos detritos
espaciais é uma temática que vem preocupando sobremaneira a comunidade espacial
internacional nas últimas três décadas, dado o crescente aumento dos mais
diversos tipos de objetos orbitando descontroladamente o planeta. Esse aumento
da geração de detritos vem gerando discussões e tem consumido tempo e recursos
financeiros de muitos países e empresas, para que seja possível continuar
utilizando e explorando comercialmente dispositivos espaciais em órbita,
através da mitigação de riscos de perdas materiais e operacionais dos mesmos ou
com o efeito de destruição de satélites e geração em cadeia de detritos
espaciais, denominado Síndrome de Kessler.
Essa preocupação provocou a criação de diversos grupos de
pesquisa sobre o tema, além de um Comitê de Coordenação Interagências sobre
Detritos Espaciais (Inter-Agency Space
Debris Coordination Committee - IADC), bem como grupos de trabalho ligados
os Escritório das Nações Unidas para Uso Pacífico do Espaço Exterior (United Nations Office of Outer Space Pacific
Affairs – UNOOSA), com o objetivo de realizar pesquisas e difundir
conhecimentos, evitar e mitigar a geração de detritos espaciais.
Mesmo assim, por mais que todos os países e empresas que
fizeram uso de sistemas orbitais tenham sido responsáveis pela geração de
detritos ou sejam potenciais geradores de detritos espaciais, somente os
Estados Unidos, a Rússia, a China e agora a Índia, incorreram em ações
conscientes e intencionais que geraram mais detritos espaciais e comprometeram
um pouco mais o espaço orbital terrestre, em especial nas orbitas baixas (Low-Earth Orbit – LEO), região mais
prejudicada nesse tema.
Assim como a índia, os Estados Unidos também
desenvolveram e testaram no passado sistema antissatélite. O mais recente foi
em 14 de Fevereiro de 2008, quando o satélite espião USA-193 (com 2.300 kg de
massa, em uma órbita de 257 km de altitude, com inclinação de 58,46º) foi
destruído por um míssil RIM-161 SM-3, com a justificativa de que o satélite
estava decaído na atmosfera e continha uma carga tóxica e perigosa de Hidrazina.
O outro teste americano ocorreu em 13 de Setembro de 1985, quando um míssil
ASM-135 foi disparado a partir de um caça F-15 em voo destruindo o satélite
P78-1 Solwind (de 850 kg de massa) em órbita de 545 km de altitude, com 97.6º
de inclinação.
No evento mais famoso e com maior geração de detritos, em
2007, a China realizou um teste de ASAT muito controverso no qual destruiu o
satélite inoperante FY-1C em uma órbita a 865 km de altitude, o que gerou uma
considerável nuvem de detritos de mais de 3.000 pedaços grandes, num total de
125.000. Com a repercussão negativa de 2007, os chineses realizaram com sucesso
outros testes em 2010, 2013 e 2014, nos quais, em vez de utilizar satélites em
órbita como alvo, interceptaram nessas ocasiões simulacros de ogivas nucleares,
lançadas de mísseis balísticos. Por esses alvos estarem voando em baixíssimas
altitudes (no limiar da linha de Kárman), houve pouca geração de detritos.
Sem muitos dados complementares, sabe-se que a Rússia
também realizou com sucesso um teste do sistema antissatélite (ASAT) Nudol, em
25 de Maio de 2016, tendo sido o segundo teste bem sucedido em quatro
tentativas. Considerando que não se identificou claramente a geração de
detritos espaciais, acredita-se que estes testes foram similares aos últimos
testes chineses.
O presente artigo tem por objetivo apresentar mais
detalhes sobre o teste do míssil antissatélite indiano e os testes de mísseis
antissatélites que mais contribuíram para a geração de detritos orbitais. Além
disso, os resultados do teste indiano foram comparados com os demais testes de
ASATs, de modo a permitir projetar uma perspectiva de geração de detritos para
os próximos anos. Como resultado estima-se que, diferentemente do que foi
divulgado pelo Governo da Índia, a quantidade de detritos gerada será maior (na
casa das centenas) e demorará mais tempo (em torno de uma década) para decair
(queimar na reentrada em órbita), do que o divulgado inicialmente.
O Teste de ASAT
indiano ("Mission Shakti")
A Missão Shakti (poder em Hindi) se deu pelo lançamento
do míssil ASAT (PDV Mk II) do Complexo de Lançamento Dr. A P J, na ilha de
Abdul Kalam (Figura 1), nordeste da Índia (~18º N, ~ 78º L), com o objetivo de
destruir um satélite próprio em órbita baixa. Segundo informações, o ASAT atingiu
o satélite alvo em uma colisão frontal com uma velocidade de 8 km/min (~480
km/h).
Fonte: Google Maps
Figura 1. Complexo de Lançamento Dr. A
P J na ilha de Abdul Kalam.
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O PDV (Prithvi
Defence Vehicle) Mk II é uma variante adaptada para missão antissatélite do
estágio superior do míssil antibalístico (Anti-Balistic Missile - ABM), um
veículo cinético de destruição (Kinectic
Kill Vehicle – KKV) do tipo colida para matar (Hit-to-Kill – HTK), sobre os dois estágios do míssil balístico
lançado de submarinos (Submarine-Launched
Balistic Missile – SLBM) K-4 SLBM, ambos projetados pela Organização de
Pesquisa e Desenvolvimento de Defesa (Defence
Research and Development Organization - DRDO) e construídos pela Bharat
Dynamics Limited (BDL), uma das principais indústrias de munições e mísseis da
Índia. O quadro 1 apresenta um comparativo entre o K-4 SLBM e o PDV Mk II ASAT.
Apesar do Governo Indiano não ter revelando inicialmente
o nome do satélite destruído, especulou-se que os alvos prováveis poderiam
ser os satélites Microsat-TD ou o Microsat-R, sendo esse último confirmado como
alvo do teste. O Microsat-R é um minissatélite militar, desenvolvido nos
laboratórios da DRDO, com massa de 740 kg e órbita polar heliossíncrona (sun-synchronous orbit – SSO) de 96,6º de
inclinação, a uma altitude entre 268 e 289 km.
Figura 2. Satélite Microsat-R indiano.
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Quadro 1. Comparativo das características do K-4 SLBM
e do PDV Mk II ASAT
Por ter sido desenvolvido pela DRDO e lançado em órbita
em janeiro desse ano, mesmo tendo uma massa considerável, acredita-se que ele
tinha a missão exclusiva de ser alvo para o teste do ASAT, possuindo uma carga
útil (payload) reduzida a sensores
específicos para a telemetria e registro do experimento, sobre um módulo de
serviço (bus) capaz de manter e
corrigir sua órbita e trajetórias para a realização do teste. Por mais
imprecisa que pareça, dado o cenário atual de crescente tensão com o Paquistão,
da massa do satélite e da sua órbita baixa, existem especulações que o
Microsat-R seria um satélite militar espião da Índia, para teste de alguma
tecnologia que não funcionou corretamente, que foi aproveitado como alvo para o
teste.
Considerando que a colisão entre o PDV Mk II e o
Microsat-R foi frontal, segundo análises e simulações posteriores, acredita-se
que a colisão ocorreu a uma velocidade relativa de 9,8 km/s (35.280 km/h). Em
um primeiro momento, foram detectados entre 70 e 200 detritos com diâmetros maiores
que 1 cm, estimando-se que, por ter ocorrido em uma órbita a 280 km de
altitude, a maioria desses detritos deverá decair em dias ou semanas, podendo
esse número ainda crescer mais a depender de vários fatores, inclusive da
fragmentação ou interação entre estes e outros detritos. Por outro lado, foi
identificado que, com o impacto, alguns detritos foram ejetados para órbitas
mais altas (acima de 2.000 km), podendo permanecer por lá por muito tempo. A
figura 3 apresenta a lista de alguns detritos catalogados do Site Celestrak,
rastreados e catalogados pelo Comando de Defesa Aeroespacial Norte-Americano (North American Aerospace Defense Command
- NORAD).
Fonte: Site
Celestrak.com / NORAD
Figura 3. Lista de alguns detritos
rastreados.
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Nessa lista é possível identificar o detrito formado pelo
principal parte do que era o satélite Microsat-R, identificado pelo número de
catálogo do NORAD (NORAD Catalog Number),
nº 43947, bem como de outros detritos como o de nº 44154, que estão transitando
em órbitas a 2.180 km, mais altas que a originalmente frequentada pelo
Microsat-R (280 km), e outros que estão em órbitas mais baixas (115 a 166 km),
como o detrito de nº 44138.
O Teste do ASAT Chinês
de 2007 e a Situação dos Detritos Antes do Teste Indiano
O teste do ASAT chinês de 2007
Por causar a maior repercussão na comunidade espacial
pela quantidade de detritos gerada, o teste de míssil antissatélite chinês de
2007 foi um evento conduzido em 11 de Janeiro de 2007, onde um satélite
meteorológico, o FY-1C (Figura 1) em órbita polar heliossíncrona (SSO), a uma altitude
de 865 km e com 750 kg de massa, foi destruído por um veículo/projétil cinético
SC-19, lançado do Centro Espacial de Xichang, no centro sul da China (28,27242
N, 102,00353E), trafegando a uma velocidade de 8 km/min, na direção contrária
ao satélite.
Fonte: Google Maps
Figura 4. Centro de Lançamento de
Satélites de Xichang.
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O SC-19 (denominação americana) é uma versão modificada
do míssil balístico de médio alcance (Medium
Range Balistic Missile – MRBM) chinês de dois estágios, lançado de
plataformas móveis autorrebocadas ou autopropulsadas, Dong-Feng (“direção
leste”, em tradução livre) 21 (DF-21). Apesar ser um míssil operacional desde
1991, as informações técnicas mais detalhadas sobre o DF-21 não são abundantes
e, por esse motivo, os dados sobre o SC-19 também carecem de um confrontamento
maior com outras fontes. No entanto o que se sabe dizer é que os mísseis
chineses possuem características muito similares aos seus equivalentes indianos
em termos de dimensões, sendo que o DF-21 possui alcance e carga útil menor que
o K-4. No entanto, como mísseis antissatélites, as versões ASAT se assemelham
mais nesses critérios com alcance de 1.000+ km e estágio superior com massa
próxima a 1.000 kg. O quadro 2 mostra a comparação entre o DF-21 e o SC-19.
Com uma massa original de 954 kg, 4,5m de comprimento e
2.1 m de altura, o FY (FengYung) -1C foi lançado da base de Taiyuan - China por
um veículo Longa Marcha 4B (CZ-4B) em 10 de março de 1999, tendo sido
considerado inoperante em janeiro de 2004, após quase 05 anos de operações (3
anos a mais que a vida útil projetada). Por não possuir condições para ser
descomissionado, seguindo as políticas mais modernas de mitigação de detritos
espaciais (através de manobras para o decaimento ou para o posicionamento em
uma órbita cemitério), permaneceu vagando na sua trajetória orbital, como um
grande detrito espacial, até ser destruído no evento de 2007.
O FengYun (vento e nuvem) é da primeira série de
satélites meteorológicos de órbita baixa (Low
Earth Orbit – LEO) da China, organizada pela Administração Meteorológica da
China (China Meteorological
Administration - CMA), a qual consiste em um total de quatro espaçonaves
(FY-1A, -1B, -1C e -1D).
Quadro 2. Comparativo das características do DF-21
MRBM e do SC-19 ASAT
Fonte: EOPortal[1]
Figura 5. Satélite FengYun série 1.
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Segundo estudos do Escritório do Programa de Detritos da
NASA (NASA's Orbital Debris Program
Office), do Centro Espacial Johnson (Johnson
Space Center – JSC), à época, a destruição do FY-1C gerou inicialmente uma
nuvem de detritos de mais de 950 objetos com diâmetros maiores que 10 cm
(facilmente detectáveis) e estimando-se que foram gerados mais de 35.000
refugos com diâmetros maiores que 1 cm. Em 2012, uma nova medição da NASA
identificou que a fragmentação havia gerado mais de 3.300 detritos com
diâmetros com mais de 10 cm e mais de 150.000 objetos com diâmetros com mais de
1 cm. Segundo a NASA, a nuvem gerada espalhou detritos entre as altitudes de
200 a 4.000 km, o que chegou a gerar mais de 3.000 alertas de colisão (raio de
5 km) para satélites operando nessa faixa, inclusive para a Estação Espacial
Internacional (International Space
Station – ISS). A figura 4 apresenta o gráfico do histórico de crescimento
dos detritos espaciais, com destaque para o aumento provocado pela destruição
do satélite FY-1C.
Como consequência da repercussão negativa causada pela
destruição do FY-1C em 2007, a China realizou outros testes em 2010, 2013 e
2014, mas sem utilizar satélites em órbita como alvo dos seus ASAT. Em vez de
usar satélites como alvos, os chineses utilizaram de simulacros de ogivas de
mísseis balísticos (ogivas sem carga explosiva), voando no limiar da linha de
Kárman para serem interceptados pelos seus mísseis ASAT. Desse modo,
conseguiram realizar os testes de interceptação com pouca geração de detritos,
sendo que, aqueles que foram criados, decaíram rapidamente e queimaram na
reentrada na atmosfera, dada a baixa altitude da colisão.
Fonte: EOPortal[2].
Cabe destacar que, como pode ser visto na figura 6,
apesar de não se originar de um teste de míssil ASAT, a colisão entre os
satélites Cosmos 2251 e Iridium 33, em 10 de fevereiro de 2009, é um evento que
claramente teve um grande impacto na geração de detritos nos últimos anos,
motivo pelo qual foi destacado na figura 5 para fins de comparação com outros
eventos, além do fato de ser um claro marco negativo e preocupante do problema
dos detritos.
Apesar da probabilidade de colisões ainda ser
relativamente baixa, em janeiro de 2013, cientistas russos reportaram que um
pequeno satélite de calibração óptica (7,5 kg) do seu país, que voava cerca de
830 km de altitude, foi atingido por um detrito oriundo da nuvem de detritos do
FY-1C. Esse fato foi corroborado posteriormente por simulações Que indicaram
que o satélite foi atingido por um detrito muito pequeno que o dividiu em, pelo
menos, duas partes, tornando-o inoperante, e transformando-o, em verdade, em 02
novos detritos.
A Situação dos Detritos Espaciais Antes do Teste Indiano
A colisão acidental entre os satélites Cosmos 2251 e o
Irídium 33 foi o último grande evento isolado em que se registrou um
crescimento considerável do número de detritos orbitais, antes do teste
indiano. Esse evento gerou uma nuvem de mais de 2.000 novos detritos com
dimensões maiores que 1 cm de diâmetro. O Cosmos 2251 foi um
satélite de comunicação militar russo (tipo Strela)
de 950 kg,lançado por um foguete Kosmos-3M em 16 de Junho de 1993, que estava
desativado bem antes da colisão e permaneceu em órbita como "lixo
espacial", voando em uma órbita com 74º de inclinação entre 778 e 803 km de altitude. O Iridium 33 foi um
satélite de 560 kg (de um conjunto de 66 satélites de telefonia celular da Iridium constellation), lançado em 14 de
Setembro de 1997 por um foguete Próton, que voava em uma órbita com inclinação
de 86,4º entre 779,6 e 793,9 km de altitude.
Esse incidente demonstra que, apesar de ser um satélite
completo até o momento da colisão, por estar inativo e sem controle, o Cosmos
2251 se tornou um (grande) detrito espacial que destruiu um satélite
operacional. Evidentemente, pela sua massa e a velocidade que se deslocava,
somados as do Irídium 33, isso fez com que a colisão de ambos tivesse um efeito
devastador para a proliferação de detritos, como visto na figura 6. No entanto,
sempre cabe lembrar que, mesmo objetos muito pequenos e com pouca massa podem,
potencialmente, provocar incidentes e danos muito graves a satélites ou
espaçonaves em órbita. Por exemplo, um objeto como uma porca-sextavada de 1/8
de polegada, com massa de ~0,0004 kg e orbitando a uma velocidade de 20.000 km /h,
possui uma energia cinética (Ec) de 6.172,85 J (629,46 Kgf), o que é
mais do que suficiente para danificar um painel solar, tornar inoperante um
satélite pequeno, perfurar a fuselagem de uma espaçonave e ainda gerar novos
detritos com essas colisões.
Até 2017, a estimativa era que existiam um total de
18.000 a 21.000 detritos com mais de 10 cm de diâmetro, cerca de 400.000 a
10.000.000 de objetos com diâmetro menor que 10 cem e maior ou iguais a 1 cm e
algo da ordem de 108 a 1012 objetos com diâmetros menores
que 1 cm de diâmetro, o que condiz com o gráfico da figura 6. O quadro 2
apresenta um resumo das estimativas até 2017.
Quadro 3. Estimativa de detritos orbitais, seus tipos
e distribuição de massas por tamanho e sua classificação quanto à dificuldade
de serem detectados, até janeiro de 2017.
Fonte: O Autor.
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Apesar de um crescimento anual médio de detritos de 1957
a 2017 (60 anos de atividade espaciais) ser de 300 a 350 detritos grandes/ano
(18.000 ou 21.000 detritos grandes / 60 anos), observa-se que, até 2007 (antes
do teste do ASAT chinês e da colisão do Cosmos 2251 e Iridium 33) o crescimento
anual médio era de 220 detritos grandes/ano (11.000 detritos grandes / 50 anos
(1957 a 2007)), um crescimento de 36%.
Por outro lado, observando os períodos de 1997 a 2007 e
de 2009 a 2017 as taxas de crescimento anuais de detritos se mantiveram bem
mais baixas ou estáveis que as apresentadas anteriormente (respectivamente, 50
e 0 detritos grandes/ano). Isso permite inferir que se os eventos de 2007 e
2009 não tivessem ocorrido, o total de detritos grandes poderia ser inferior a
12.000, menos de 2/3 do total até 2017. Essas diminuições das taxas de
crescimento detritos se devem muito as políticas de mitigação de geração de
detritos incentivadas pela UNOOSA e pela IADC, e promovida pelos principais
grupos de pesquisa, indústrias e agências espaciais do mundo, em prol da
exploração sustentável do espaço orbital terrestre. Esse esforço para a redução
de geração de detritos fica muito evidente ao se observar as curvas 4 (laranja
tracejada) e 5 (verde pontilhada) do gráfico da figura 6, nas quais percebe-se
um tendência de crescimento até o final dos anos de 1990 e uma estabilização a
partir daí, mesmo com o crescimento constante do número de espaçonaves a cada
ano, conforme a curva 3 (azul) do referido gráfico.
De posse desse entendimento, acredita-se que a quantidade
de detritos grandes observados até 2017 se mantiveram estáveis até antes do
teste do ASAT indiano.
Expectativa de
Aumento de Detritos Provocado Pelo ASAT Indiano
Independente da nacionalidade dos testes com ASATs que
geraram quantidades consideráveis de detritos nos últimos anos é possível
perceber que nenhum desses eventos é exatamente igual ou trouxe resultados
exatamente iguais aos outros. Analisando os dados de ocorrência dos mesmos
percebe-se que o teste chinês e o indiano têm em comum que a trajetória e
velocidade do míssil na colisão foram muito semelhantes (colisão frontal e ~8
km/min). Por sua vez, as altitudes das colisões ocorreram a ~280 km (ASAT
indiano 2019) e a ~865 km (ASAT chinês 2007).
Conforme visto previamente, além do ASAT indiano, os
principais testes mísseis antissatélites registrados que geraram detritos
orbitais são os testes dos Estados Unidos de 1985 e de 2008 e o teste chinês de
2007. A figura 7 apresenta o gráfico com a identificação dos testes realizados,
a partir de pontos de inflexão no aumento dos detritos espaciais nos anos em
que estes foram realizados.
Fonte: O autor
Figura 7. Gráfico do histórico de
crescimento dos objetos espaciais com diametro maior que 10 cm, com destaque os
eventos de testes de ASATs (Adaptado).
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Segundo o gráfico da figura 7, ao observar as tendências
de comportamento do crescimento dos detritos orbitais (setas verdes) dos
períodos anteriores aos testes de mísseis antissatélites e compará-las as
tangentes do gráfico nos pontos de inflexão da curva 1 (cor preta ó Total de objetos),
identificados para cada situação, percebe-se claramente a sua disparidade com a
taxa incremento de detritos pós-fragmentação. Essa disparidade fica mais
evidente quando observada a curva 2 do gráfico (cor rosa ó Detritos de
fragmentação), na qual a tendência de crescimento anterior aos testes estava
estagnada ou decrescendo, como estava ocorrendo anteriormente ao teste indiano.
Em todas as situações, observou-se um pico de crescimento dos detritos, os
quais podem variar conforme as diversas variáveis de cada caso, tais como:
altitude da colisão, ângulo, sentido, direção, massa dos corpos, densidade dos
corpos, velocidade dos corpos, velocidade relativa entre os corpos, etc.
As autoridades indianas afirmaram que o teste
gerou/geraria poucos e que, pelo fato de ter ocorrido em uma órbita baixa,
estes detritos iriam decair e queimar na reentrada em pouco tempo, não sendo
uma ameaça para outros satélites e espaçonaves. No entanto, as informações
obtidas e as simulações realizadas até então, mostram que o teste realizado
pela Índia não terá consequências tão severas como o promovido pela China em
2007, mas também não será tão insignificante quanto foi anunciado.
Uma das provas disso é que a quantidade de detritos
rastreados inicialmente pelo NORAD é de 70 objetos grandes, mas estes estão
trafegando por órbitas que vão a mais de 2.000 km, motivo pelo qual 50 novos
alertas de possíveis colisões com a ISS (que está em uma órbita a 420 km) foram
gerados e 200 detritos de tamanho médio foram reportados até então, fato que
pode ser alterado pela interação e subfragmentação interna desses corpos que
compõem a nuvem detritos. Simulações realizadas pela Analytical Graphics Inc. indicam que cerca de 6.500 fragmentos do
Microsat-R e do corpo do objeto cinético do míssil PDV Mk II estão orbitando o
planeta.
Outro fator não considerado pelas autoridades indianas e
ignorado pela maioria das pessoas é que, pelo fato do teste do ASAT da Índia
ter sido realizado no período do mínimo solar (solar minimum), o decaimento dos fragmentos será mais lento do que
se poderia esperar. Durante o período de mínimo solar, como o que está
ocorrendo no presente ano, a alta atmosfera esfria e se contrai, reduzindo o
arrasto aerodinâmico dos objetos em órbitas baixas. Particularmente no início
de 2019, a temperatura da atmosfera está no ponto próximo do seu recorde de
frio, o que pode duplicar ou triplicar o tempo de decaimento de fragmentos. Em
certas altitudes maiores, isso pode fazer com que detritos que permaneceriam
alguns meses em órbita, fiquem por 1 ou 2 anos. No caso de detritos em órbitas
a 1.000 km ou mais, esse tempo pode chegar a uma década. Para fins de
comparação, os gráficos da figura apresentam o percentual de decaimento de
detritos por ano, em diversas altitudes, no máximo e no mínimo solar.
Fonte: Wright (2010) apud cálculos de Wang Tin (BUAA).
Figura 8. Percentual de detritos remanescentes em órbita no tempo (anos), no máximo e no mínimo solar. |
Quadro 4. Comparativo entre os testes de mísseis
antissatélites que mais geraram detritos.
Fonte: O autor (dados compilados de diversos autores e
fontes).
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Com base no que foi apresentado e da atualização de
informações sobre os outros testes de mísseis antissatélites já destacados,
estima-se que os 6.500 detritos (independente do tamanho) oriundos do recente
evento promovido pela Índia podem permanecer em órbita por mais de uma década e
que a quantidade de detritos com diâmetro maior que 10 cm de pode chegar a mais
de 100. O quadro 4 apresenta um comparativo atualizado entre os testes de
mísseis que mais geraram detritos, com destaque para a projeção para o caso
indiano.
A figura 9 apresenta o gráfico histórico de crescimento
dos objetos espaciais, atualizado com as projeções para os detritos gerados
pelo ASAT da Índia.
Fonte: O Autor.
Figura 9. Histórico de crescimento da
quantidade de objetos grandes em órbita, após a destruição do Microsat-R.
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De posse das informações, simulações e projeções
apresentadas é possível inferir que, caso não haja mais nenhum incidente que
gere detritos, somente em 2025 a quantidade de detritos de fragmentação grandes
irão voltar aos números anteriores ao teste indiano. Em termos de detritos
médios e pequenos, estima-se que estes deverão durar em órbita, no mínimo, por
uma década.
Finalmente, com o provável aumento das atividades
espaciais e do crescente número de países e empresas que deverão adquirir
capacidade de lançamento nos próximos anos, é de fundamental importância que
sejam reforçados e/ou repactuados acordos internacionais no sentido de
desencorajar ações que venham a criar mais detritos espaciais, tais como os
testes de mísseis antissatélites.
Agradecimentos
Meus sinceros agradecimentos a Gunter Krebs (Gunter´s
Space Page) e ao Dr. Ademir Xavier (AEB) pela troca de informações e revisão do
texto.
Referências
Botelho A. S., R. C., 2014. Otimização de Dinâmica
Relativa em Ambiente de Detritos Espaciais por Agente Autônomo. Projeto de Tese
de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Mecatrônica (PPGM) da Universidade
Federal da Bahia (UFBA). Salvador, Brasil.
Botelho A. S., R. C., 2017. Estratégias de mitigação de
detritos espaciais. Apresentação de estudos técnicos. Diretoria de Satélites,
Aplicações e Desenvolvimento (DSAD), Agência Espacial Brasileira (AEB). 27 de
janeiro de 2017. Brasília – DF.
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Último acesso: 04/04/2019.
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N.; Pokharel, S., 2019. India conducts successful anti-satellite missile
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* Rui Botelho - É mestre em mecatrônica pela UFBA,
especialista em GNSS pela Universidade de Beihang (BUAA) – China e bacharel em
Ciência da Computação. Foi servidor concursado da AEB, tendo atuado como
Tecnologista Pleno na área de Satélites e Aplicações. Atualmente, atua em
projetos de TIC e leciona em programas de especialização na área de tecnologia,
além de ser articulista e pesquisador independente de temas ligados às
ciências, políticas e tecnologias espaciais. http://lattes.cnpq.br/6214855666557824.
o Brasil precisa também dominar esta tecnologia de Míssil Antissatélite , é uma questão de Defesa de Estado.
ResponderExcluirDuda e leitores do BS,
ResponderExcluirO artigo apresentado aqui é fruto de um relatório técnico (technical report) que está à disposição com o DOI: 10.13140/RG.2.2.19460.78722.
Basta acessar https://www.doi.org/ e pesquisar usando o número acima.