Entrevista com o Secretário Samuel Guimarães
Olá leitor!
Segue abaixo uma entrevista publicada na nova edição da Revista Espaço Brasileiro (Abr. Mai. Jun. de 2010), com o Secretario de Assuntos Estratégicos, Samuel Guimarães, onde o mesmo fala sobre o Programa Espacial Brasileiro.
Duda Falcão
Entrevista
Samuel Guimarães
O embaixador Samuel Pinheiro Guimarães assumiu, em outubro de 2009, a Secretária de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República. Secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, segundo cargo na hierarquia do Itamaraty, desde janeiro de 2003, o ministro Samuel Pinheiro, em sua posse, destacou a meta de trabalhar em conjunto com todos os ministérios, em temas estratégicos.
Samuel Pinheiro é mestre em Economia pela Universidade de Boston (EUA), bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), membro do Centro de Estudos Estratégicos da Escola Superior de Guerra (ESG) e do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Comércio Exterior da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (FUNCEX).
Espaço Brasileiro: Como o senhor avalia a contribuição do Programa Espacial Brasileiro para a Estratégia Nacional de Defesa?
Samuel Guimarães: O Programa Espacial Brasileiro é de grande importância para a Estratégia Nacional de Defesa. Integra as três áreas militares na estratégia: Nuclear, Cibernética e Espacial. Trata-se de uma área central. Somos um país de dimensões continentais onde as questões de comunicação em todos os níveis são de grande relevância. O Centro de Lançamento de Alcântara, localizado no estado do Maranhão, dispõe de um das melhores localizações geográficas para lançamentos. Há também um mercado cada vez mais importante. Temos condições excepcionais para os lançamentos e conhecimento tecnológico para a fabricação de satélites.
EB: De que forma o senhor acha que a sociedade poderia conhecer melhor o Programa Espacial Brasileiro e sua importância para o dia-a-dia?
SG: Acho que há um desconhecimento sobre as pesquisas que decorrem da atividade espacial e como a sociedade pode se beneficiar dos resultados oriundos dessa atividade. Muitos dos bens que possuímos decorrem de pesquisas feitas em programas espaciais, não apenas do Brasil, mas também de outros países. Seria necessário um esforço maior de divulgação e de difusão da importância das atividades espaciais.
EB: Qual é o papel da Secretaria no desenvolvimento das atividades espaciais no Brasil? Pretende ampliar a sua colaboração?
SG: Pretendemos. Inclusive, por sugestão de outros ministros foi proposta ao Presidente da República a criação de um Comitê Gestor das Atividades Espaciais no Brasil. O Presidente, eventualmente, talvez venha a designar a SAE como órgão articulador desse Comitê. A idéia é que esse Comitê possa identificar áreas importantes para o desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro e propor ao Presidente medidas que venham a permitir a superação desses desafios no Programa.
EB: Quais alianças internacionais têm sido consideradas como estratégicas para o Brasil? Nesse sentido, como o Programa Espacial poderá se fortalecer e se beneficiar?
SG: Há muitos anos o Brasil vem desenvolvendo programas de cooperação com muitos países, como a Alemanha, China, Argentina, Índia e a Ucrânia, entre outros. Um Programa que consideramos relevante é a cooperação com a China por meio do Programa Satélites Sino-Brasileiros de Recursos Terrestres (CBERS). Já foram lançados três satélites e existem dois a serem lançados. Apesar da importância dos programas de cooperação internacional, acho que o fortalecimento do Brasil nessa área vai depender, da alocação de recursos suficientes no orçamento para a execução do Programa Espacial, da permanência dos dirigentes desse Programa, naturalmente com a sua alteração rotineira, de um Programa que tenha maior sustentabilidade, inclusive para que as empresas privadas que produzem tenham a segurança de encomendas regulares, e da formação de pessoal.
EB: A SAE planeja realizar um seminário sobre os desafios do setor espacial, com órgãos do governo, sociedade, iniciativa privada e da academia. O que se pretende com essa iniciativa?
SG: Pretendemos reunir especialistas e os principais responsáveis no governo por atividades espaciais para fazermos um balanço da situação atual do Programa Espacial Brasileiro e propor iniciativas que venham a permitir a sua execução mais eficaz. Nosso propósito é de colaboração. Solicitamos ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a organização de um grupo de economistas para estudar a economia das atividades espaciais, não só no Brasil, mas no mundo, tema que já vem sendo estudado por esse grupo.
EB: Para que o Programa Espacial se torne um verdadeiro programa de Estado é necessário que haja um reconhecimento por parte do próprio governo, do Congresso, dos partidos e da sociedade em geral. Como a SAE poderá contribuir para isso?
SG: Acredito que podemos contribuir por meio do Comitê Gestor e procurar fazer com que esse Comitê venha a propor ao Presidente medidas que garantam para uma atividade dessa natureza, uma atividade de longo prazo, sustentável, o volume de recursos adequado e de forma regular, não sujeitos a variações. São duas questões: recursos adequados e continuidade, porque isso não só é importante para todas as instituições de pesquisa envolvidas no setor espacial, como também para as empresas que trabalham na área e que naturalmente necessitam de contratos regulares, inclusive para o fortalecimento da cadeia produtiva.
EB: Países como a Índia e a China que começaram seus programas espaciais depois do Brasil já se encontram em fase adiantada de desenvolvimento e colhendo resultados concretos da pesquisa espacial. A que o senhor atribui o atraso do Programa Espacial Brasileiro?
SG: Não existe Programa Espacial Brasileiro sem um programa intenso de formação de engenheiros e técnicos na área. Isso já existe. Mas, para que o Programa se desenvolva, é preciso que se amplie esse processo e que se ofereçam as melhores condições para a seleção de engenheiros e a formação de professores. Isso é um ponto importante. É um esforço que a Agência Espacial Brasileira (AEB) e o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) tem feito nesses últimos anos e que se reforça no atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que os recursos aumentaram muito para a AEB e o DCTA. Verificamos que outros países que começaram programas espaciais depois de nós, estão muito à frente. Mas houve uma persistência, o que não ocorreu no caso brasileiro, e uma alocação de recursos suficiente para se alcançar esses resultados.
EB: O Brasil tem registrado fortes chuvas nos últimos meses em diversas regiões. Se o país tivesse seu próprio satélite meteorológico parte dessas tragédias, que as pessoas acompanharam pela mídia, poderiam ter sido evitadas. O que o senhor sugere para que esse e outros projetos da área espacial possam se tornar realidade e trazer de fato uma melhora na qualidade de vida da população?
SG: Temos um território muito extenso onde há oportunidade e necessidade do uso de satélites. Há vários tipos de satélites, destinados à meteorologia, cartografia, à questão ambiental, cada vez mais crescente, não só no mundo, mas no Brasil também, entre outros. Há fenômenos climáticos internacionais que repercutem no País, como as mudanças nos regimes das chuvas, inundações e formações de tornados ao longo do estado de Santa Catarina. Desta forma, dispor de satélites para acompanhar esses fenômenos é extremamente importante. Também as questões relativas a desmatamentos, aglomerados urbanos, oceanos, geoposicionamento, comunicações, georeferenciamento e controle das fronteiras. De uma forma geral, ter um sistema meteorológico adequado, com a cobertura nacional adequada é extremamente importante na previsão de fenômenos meteorológicos, o que pode permitir, por exemplo, a remoção de pessoas em situação de risco em determinadas regiões. Tudo passa pela certeza de que o orçamento para as atividades espaciais tenha um caráter estratégico. É necessário que seja um orçamento firme. São projetos de longo prazo, como a questão dos lançadores, da pesquisa tecnológica, de combustível e de formação de pessoal.
Fonte: Revista Espaço Brasileiro - num. 9 - Abr. Mai. Jun. de 2010 - págs. 5, 6 e 7
Comentário: Chamo atenção do leitor para a preocupante resposta do secretário Samuel Guimarães a terceira pergunta da revista. Estranhamente entre os países citados pelo mesmo, a Rússia não aparece, preferindo o secretário citar a Índia, país com o qual o Brasil tem um acordo espacial de pouco resultado prático. Diferentemente da Rússia, que dentre os países citados é o de maior importância no momento, devido ao acordo assinado e ratificado para o auxílio no desenvolvimento da tecnologia de propulsão líquida no país, formação de pessoal e auxílio do desenvolvimento dos foguetes VLS-1 e VLS ALFA. Fundamental para as pretensões do Brasil se o mesmo quiser um dia tornar-se um player importante do setor espacial. Muito estranho e preocupante. Já quanto à idéia da criação de um Comitê de Gestão ligada à Presidência da República, nos parece uma boa idéia, desde que venha ter apoio político incondicional do presidente, seja ele quem for.
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