Estudo de Pesquisadores Brasileiros da UNESP Explica 'Taxa de Expansão do Universo'

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Imagem: Mariano de Souza/UNESP
Representação das eras do Universo – (a) radiação, (b) matéria, (c) energia escura – com os respectivos valores do parâmetro da equação de estado ω = Γeff, onde Γeff é o parâmetro de Grüneisen efetivo. À medida que a energia escura passa a dominar, ocorre uma mudança de sinal em Γeff, que emula uma transição de fase da física da matéria condensada.

No dia 03/04, o site oficial da Agência FAPESP divulgou uma nota destacando que um 'Estudo' realizado por pesquisadores da UNESP, publicado na revista Results in Physics, utiliza conceitos da termodinâmica para explicar a expansão do Universo.
 
De acordo com a nota da FAPESP, a transição da expansão do Universo de um regime desacelerado (na era dominada pela radiação e pela matéria) para um regime acelerado (na era dominada pela energia escura) é comparável a uma transição de fase termodinâmica.
 
A teoria da expansão do Universo tem quase um século. A ideia de que as galáxias distantes estão se afastando da Terra e que essa velocidade de afastamento aumenta com a distância foi proposta por Georges Lemaître (1894-1966) em 1927 e confirmada por observações realizadas por Edwin Hubble (1889-1953) em 1929. Essa confirmação foi possível devido ao redshift (desvio para o vermelho) no espectro da radiação eletromagnética recebida desses objetos distantes.
 
Em 1998, uma descoberta surpreendente alterou o modelo existente. Observações de estrelas supernovas extremamente distantes mostraram que a expansão do Universo estava acelerando, ao invés de ser retardada pela gravidade, como se pensava. Isso levou à introdução do conceito de energia escura, que se estima contribuir com mais de 68% da energia total do Universo observável, enquanto a matéria escura e a matéria comum contribuem com aproximadamente 26% e 5%, respectivamente.
 
"Mensurações do redshift indicam uma expansão acelerada adiabática [sem transferência de calor] e anisotrópica [não uniforme em todas as direções]", afirma Mariano de Souza, professor do Departamento de Física do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da UNESP, campus de Rio Claro. Ele continua: "Princípios básicos da termodinâmica permitem deduzir que toda expansão adiabática é acompanhada de um resfriamento, devido ao efeito barocalórico [gerador de calor quando submetido à pressão], que é quantificado pela razão de Grüneisen."
 
Em 1908, o físico alemão Eduard August Grüneisen (1877-1949) propôs uma expressão matemática para o parâmetro de Grüneisen efetivo, que relaciona três propriedades físicas de um material: coeficiente de expansão térmica, calor específico e compressibilidade isotérmica. Quase um século depois, em 2003, Lijun Zhu e colaboradores demonstraram que a parte singular do parâmetro de Grüneisen, chamada "razão de Grüneisen", aumenta significativamente perto de um ponto crítico quântico devido ao acúmulo de entropia. Em 2010, Mariano de Souza e colaboradores demonstraram que o mesmo ocorre para um ponto crítico a temperatura finita.
 
Em um artigo recente publicado na revista Results in Physics, os pesquisadores da UNESP liderados por Souza utilizaram o parâmetro de Grüneisen para descrever aspectos complexos relacionados à expansão do Universo. O estudo é um dos resultados da pesquisa de doutorado de Lucas Squillante, o primeiro autor, atualmente pós-doutorando sob supervisão de Souza.
 
"A dinâmica associada à expansão do Universo é comumente descrita pelo modelo de um fluido perfeito, cuja equação de estado é dada por ω = p/ρ, onde ω é o parâmetro de equação de estado, p é a pressão e ρ é a densidade de energia. Embora amplamente utilizado, o significado físico de ω ainda não foi discutido de forma adequada. Ou seja, ω foi tratado apenas como uma constante para cada era do Universo. Um dos resultados importantes de nosso trabalho é a identificação de ω com o parâmetro de Grüneisen efetivo, por meio da equação de estado de Mie-Grüneisen", explica Souza.
 
Os pesquisadores demonstraram, usando o parâmetro de Grüneisen, que o contínuo resfriamento do Universo está relacionado a um efeito barocalórico, que associa pressão e temperatura. Esse efeito ocorre devido à expansão adiabática do Universo. Sob essa perspectiva, eles propuseram que, na era dominada pela energia escura, na qual estamos atualmente, o parâmetro de Grüneisen depende do tempo.
 
Um dos aspectos interessantes desse trabalho é a utilização de conceitos da termodinâmica e da física do estado sólido, como stress e strain, para descrever a expansão anisotrópica do Universo. "Demonstramos que o parâmetro de Grüneisen está naturalmente incluído no tensor de energia-momento presente nas celebradas equações de campo de Einstein - o que oferece uma nova maneira de investigar os efeitos anisotrópicos associados à expansão do Universo. Isso não descarta a possibilidade de um possível Big Rip", afirma Souza.
 
A hipótese do Big Rip foi apresentada pela primeira vez em 2003, em um artigo publicado em Physical Review Letters. Ele sugere que, se a quantidade de energia escura for suficiente para acelerar a expansão do Universo além de uma velocidade crítica, isso poderá causar uma ruptura no tecido do espaço-tempo.
 
"Sob a perspectiva do parâmetro de Grüneisen, conjecturamos que a mudança de um regime de expansão desacelerada [na era dominada pela radiação e pela matéria] para um regime de expansão acelerada [na era dominada pela energia escura] é semelhante a uma transição de fase termodinâmica. Isso ocorre porque demonstramos que Γeff muda de sinal quando a expansão do universo passa de desacelerada para acelerada. Essa mudança de sinal é semelhante à assinatura típica de transições de fase na física da matéria condensada", acrescenta Souza.
 
Como se sabe, a energia escura foi associada à constante cosmológica Λ. Primeiramente postulada e depois rejeitada por Einstein, a constante cosmológica foi reconsiderada quando se descobriu que a expansão do Universo estava acelerando em vez de desacelerar. O modelo predominante, chamado de Λ-CMD (Lambda-Cold Dark Matter), atribui à constante cosmológica um valor fixo, supondo que a densidade de energia escura permanece constante conforme o Universo se expande. No entanto, existem outros modelos que consideram a densidade de energia escura e, consequentemente, Λ, variando com o tempo.
 
"Atribuir um valor fixo para lambda é equivalente a atribuir também um valor fixo para ômega. Mas reconhecer ω como o parâmetro de Grüneisen efetivo permite inferir uma dependência temporal de ω à medida que o Universo se expande na era dominada pela energia escura. Isso implica diretamente em uma dependência temporal de Λ ou da constante universal da gravitação", destaca Souza. Este estudo abre uma nova perspectiva na interpretação da expansão do Universo sob a luz da termodinâmica e conceitos da física da matéria condensada, e pode ter implicações significativas.
 
Além de Souza e Squillante, participaram do estudo os pesquisadores Antonio Seridonio (UNESP de Ilha Solteira), Roberto Lagos-Monaco (UNESP de Rio Claro), Gabriel Gomes (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, IAG-USP), Guilherme Nogueira (UNESP de Rio Claro) e a doutoranda Isys Mello, orientada por Souza.
 
O trabalho recebeu apoio da FAPESP por meio de dois projetos (11/22050-4 e 18/09413-0).
 
O artigo Exploring the expansion of the universe using the Grüneisen parameter pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2211379724000263?via%3Dihub.
 
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