CBERS-3: Lançamento Pode Atrasar Até Dois Anos, Será?

Olá leitor!

Segue abaixo um artigo publicado no “Jornal do SindCT” de Outubro de 2012, editado pelo “Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de C&T (SindCT)” destacando que a falha nos conversores do Satélite CBERS-3 colocam o MCTI e o INPE em um dilema que pode atrasar o lançamento do mesmo em dois anos.

Duda Falcão

Falhas em Conversores do CBERS
Colocam MCTI e INPE em Dilema

CBERS-3: Lançamento pode atrasar até dois anos

Por Shirley Marciano
Jornal do SindCT

Durante testes finais realizados no Brasil e na China para lançamento do CBERS-3 foram constatados problemas em parte do sistema de energia do satélite, nos pequenos conversores DC/DC. Por este motivo, poderá haver atrasos significativos no cronograma de lançamento do satélite, inicialmente previsto para novembro de 2012.

Esses componentes foram comprados entre 2007 e 2008 da fabricante americana Modular Devices Incorporated – MDI para serem utilizados nos satélites CBERS 3 e 4. Curiosamente, esta empresa não teve que passar pelas restrições da International Traffic in Arms Regulations - ITAR, que é uma reguladora de venda de produtos classificados como críticos, e, de acordo com informações obtidas com pessoas envolvidas no processo de compra à época, este teria sido o fator determinante para a escolha desta empresa, já que havia muita dificuldade para se encontrar outros fornecedores que vendessem ao Brasil em razão dessas restrições.

Quando já estava tudo praticamente pronto para o lançamento, observou-se a falha de oito conversores DC/DC, dos 44 utilizados no CBERS-3. Ou seja, quase 20% dos conversores adquiridos para serem utilizados nos satélites simplesmente não funcionaram. Teoricamente seria uma simples questão de substituição; entretanto, a estatística mostrava que havia um risco alto de acontecer o mesmo com os demais componentes que ainda não haviam sido utilizados.

“Todos ficaram muito apreensivos com a gravidade da situação, pois embora existam componentes sobressalentes destes conversores no satélite para casos de falhas, a queima dessa quantidade de dispositivos era a constatação de que o problema poderia ocorrer novamente”, explica um especialista da área que não quis se identificar. Ele explica ainda que “componentes espaciais, durante os testes finais, devem ter sempre desempenho de altíssima confiabilidade, afinal, não é possível fazer a ‘manutenção’ do satélite uma vez que o mesmo esteja em órbita”. Assim, a lógica é simples: “estragou no espaço, perde-se todo o investimento, tempo e finalidade”, conclui.

Diante do problema, entre os dias 18 e 24 de agosto, cinco engenheiros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, incluindo o coordenador do Segmento Espacial do Programa CBERS, engenheiro Janio Kono, estiveram nos EUA para tentar identificar, junto à empresa fornecedora dos componentes, os motivos que levaram às falhas, conforme divulgado no Diário Oficial da União de 17 de agosto de 2012.

A empresa analisou os dispositivos que apresentaram falhas e emitiu um relatório técnico no dia 20 de outubro, no qual teria reconhecido que parte dos problemas surgidos pode ter sido causada por erros na fabricação dos componentes. Como todos os componentes adquiridos pelo INPE faziam parte de um mesmo lote, levantou-se a suspeita de que outros componentes que não apresentaram falhas durante os testes também pudessem vir a falhar.

O relatório aponta ainda outros motivos --estes de responsabilidade do INPE e da empresa Mectron, contratada para projetar e fabricar os equipamentos para o satélite-- que podem ter contribuído para a falha dos componentes. O principal deles diz respeito a um erro de projeto dos circuitos que trabalham em conjunto com os conversores DC/DC que falharam. De acordo com o relatório, estes circuitos estariam induzindo sinais anormais nos conversores, propiciando sua falha.

Ao que tudo indica, entretanto, a empresa fornecedora MDI teve responsabilidade pela falha nos componentes. A reportagem encontrou em um site indiano um artigo de 22 de outubro de 2010 que avalia o projeto do satélite Chandrayaan-1. Neste artigo faz-se menção à falha destes mesmos conversores DC/DC fabricados pela MDI.

Em tradução livre o artigo afirma que “o comitê também revelou, pela primeira vez, que um minúsculo componente de 110 gramas de apenas US$ 5 mil derrubou uma missão que custou US$ 100 milhões”. ‘Foi a formiga que matou o elefante’, observou um engenheiro da agência espacial indiana. Ainda segundo o artigo, “um componente chamado conversor DC/DC, muito parecido com um transformador pequeno, que havia sido importado de uma empresa americana, Modular Devices Inc., foi o que causou a falha.

Não um, mas cinco destes componentes falharam sequencialmente a bordo do Chandrayaan-1, causando a interrupção prematura da missão. Entretanto, o comitê de investigação apontou em seu relatório falhas por parte dos técnicos da própria agência espacial indiana evolvidos nas atividades de teste e garantia do produto, por não terem sido capazes de detectar a má qualidade do componente importado, vital para o funcionamento do satélite.” http://www.thehindu.com/opinion/lead/article841036.ece

Fazendo uma analogia com o caso ocorrido no programa espacial indiano, alguns questionamentos são imediatos, a saber:

1) a equipe técnica responsável pela condução dos testes de qualificação dos componentes importados, bem como o pessoal responsável pela garantia do produto, tanto do INPE quanto da Mectron, têm alguma responsabilidade por não haver detectado antes algum sintoma de falha dos conversores que veio a ocorrer mais tarde?

2) levando em conta que um número significativo de componentes apresentou falhas, a simples substituição destes por outros sobressalentes do mesmo lote não contribuiria para uma diminuição indesejável do nível de confiança do satélite, colocando em risco a própria missão, como ocorreu com o satélite indiano?

3) assumindo-se que houve erros tanto por parte da empresa fornecedora dos componentes (MDI), quanto do INPE e da Mectron (contratada para fabricar partes do satélite CBERS), quem deverá arcar com os gastos financeiros extras decorrentes da substituição das peças e retrabalho dos equipamentos? A União?

Engenheiros do INPE consultados pela reportagem comentaram possibilidades de solução para o dilema do lançamento do CBERS 3. As alternativas apontadas foram:

1) Levar os componentes à MDI, acompanhar a inspeção de cada um e ir corrigindo suas falhas: Pode ser uma solução mais rápida, mas como se trata de uma empresa que mostrou ter antecedentes de problemas que não foram sanados --vide o caso da Índia-- talvez possa ser um risco considerável.

2) Trocar de fornecedor, utilizando o serviço de um fabricante mais conceituado no mercado para este tipo de dispositivo: um alternativa mais segura, no entanto, demandaria mais tempo, pois ao adquirir componentes novos, seria necessário reanalisar e reprojetar as placas de circuito de todo o sistema, o que poderia levar a um atraso de até dois anos no lançamento do satélite.

A reportagem apurou ainda que está havendo muita pressão do MCTI, para que o CBERS-3 seja lançado o mais rapidamente possível (fala-se em fevereiro de 2013), como forma de se evitar desgastes políticos ainda maiores com os parceiros chineses. Entretanto, técnicos e engenheiros do INPE estão receosos de que se tome uma decisão pela pressa e cause o maior de todos os desastres para uma missão não tripulada: o não funcionamento do satélite em órbita.

O impasse é proporcional à gravidade do problema, e há rumores diversos no INPE sobre o desdobramento do fato. Inclusive, no dia 23 de outubro, os chineses foram ao Instituto para discutir um acordo sobre o que fazer com relação às falhas dos dispositivos DC/DC.

Mas, como esta parte do satélite é de responsabilidade do Brasil, teriam se eximido de opinar sobre o assunto para aguardar um posicionamento brasileiro sobre as próximas ações. Dias antes da visita chinesa, o ministro Marco Antonio Raupp (MCTI), esteve, sem aviso prévio, nas instalações do INPE reunido a portas fechadas com os responsáveis pelo programa CBERS, muito provavelmente para tratar dos desdobramentos das falhas dos conversores DC/DC ocorridas na China, bem como avaliar os impactos das mesmas sobre o cronograma de lançamento do satélite.

A direção do INPE foi procurada para comentar o assunto mas informou que preferia não emitir opinião neste momento.


Fonte: Jornal do SindCT - Edição 19ª - Outubro de 2012

Comentário: Bom leitor, se você me perguntar se essas notícias tem fundamento, eu diria a você que algumas delas sim e foram até divulgadas aqui no blog, já outras me parecem um pouco especulativas, apesar de que não deixam de fazer sentido. Será mesmo que o MCTI e o INPE entraram nesse dilema? Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come, hummm, sei não, mas a verdade é que se realmente as coisas estão como colocadas nesse artigo, em nossa opinião o melhor mesmo é o INPE não ceder à pressão do MCTI e esperar mais dois anos reformulando no satélite o que tem de ser reformulado. Afinal, correr o risco de colocar o CBERS-3 no espaço e não funcionar, não só seria um desastre financeiro e tecnológico, mas também e muito provavelmente um desastre político, já que poderia prejudicar junto aos chineses a continuação do programa CBERS. Por mais que esse atraso seja um desastre, pois o desenvolvimento do satélite já conta com cinco anos de atraso, a possibilidade de perder o satélite por si só justifica a cautela na decisão a ser tomada, e sinceramente espero que a mesma não seja política, evitando assim que o nosso PEB venha virar uma vez mais motivo de chacota. Só lembrando, os satélites argentinos que estão no espaço estão funcionando muito bem, e os que estão em desenvolvimento, seguem normalmente seus cronogramas.

Comentários

  1. Piada.

    Duvido que em Portugal, desculpem patrícios, já não estejam "zoando" com isso.

    E notem, esse é apenas um dos problemas, num satélite que na teoria, já está "pronto" passando pelos testes de integração finais, o que como pode ser observado, está longe de ser verdade.

    Acessando o site do póprio INPE, no que diz respeito ao "planejamento" do CBERS-3, vejam na aba do 3o trimestre que os cinco itens pendentes, ou seja, TODOS, estão com problemas, sendo que este e um outro sobre o sistema de detecção de incêncio estão com status de "Preocupante" e os demais, com status de "Atenção". E a aba do 4o trimestre sequer foi atualizada. Devem ter ficado com vergonha...

    Bom, como se pode ver, piada isso já é. Quem sabe daqui a uns 5 anos esse projeto "dinossauro" de 2005 (estou supondo essa data, pois disseram que os componentes foram comprados em 2007), seja lançado. Eu particularmente, já começo a pedir pra jogarem isso tudo "pro espaço", pois mais parece um "poço sem fundo". Não duvido nada de os chineses "abrirem mão" desse projeto em breve.

    Dizer mais o que?

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  2. Devemos atentar para o fato de a câmera MUX, o artefato mais importante do satélite, totalmente desenvolvido aqui, está na China a um bom tempo...

    Não sei se eles já dominavam essa tecnologia antes, mas se não dominavam...

    #tenso

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  3. Eu creio que isso tudo pode ter sido de propósito para atrasar ainda mais o projeto podendo justificar mais gastos nesse satélite (mais dinheiro do Estado para o bolso de alguns aproveitadores). Depois daquele video que falei num comentário na matéria anterior, onde o cara explica que todas as transações de ordem militar e tecnológica têm corrupção no meio, eu não acredito que tenha sido irresponsabilidade. Já comentaram aqui que esse aparelho (DC/DC) é facil de se encontrar, e foi ao EUA que foram recorrer (que já contam com uma história, nos prejudicando nessa área). Pessoalmente espero que resolvam esse problema rápido, mas acho que não é isso que estão querendo.

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    1. Oi Israel e PessoAll,

      Esse vídeo/Audio é bem interessante, porém a versão original está com o audio muito ruim.

      Felizmente alguém ajustou o audio e republicou aqui:

      Corrupção entre Brasil e China. Áudio editado

      Abs.

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  4. Esse problema afeta apenas as câmeras brasileiras ou também interfere com a parte chinesa do satélite?

    E se os chineses resolverem lançar assim mesmo?

    Afinal se as câmeras brasileiras não funcionarem, eles ainda podem usar as deles.O CBERS-2C é exemplo de satélite que pegou apenas a parte chinesa do CBERS e foi lançado para cobrir esse atraso do CBERS-3.

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    1. Não é verdade. O CBERS-2B (e não 2C) trocou uma cãmera chinesa (IRMSS) por outra (HRC), mantendo a brasileira (WFI).

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    2. Olá Antônio!

      Valeu pela sua interferência.

      Abs

      Duda Falcão
      (Blog Brazilian Space)

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    3. Estou falando do CBERS-2C (Ziyuan 1 No.02C) mesmo e não do 2B. Parece que os chineses pararam de chamar de CBERS depois de um tempo, provavelmente alguém do INPE deve ter reclamado.

      Veja o anúncio inicial da programação de lançamento como CBERS-2C:

      http://forum.nasaspaceflight.com/index.php?topic=5060.595;wap2

      Aqui a lista dos satélites CBERS em vôo já sem o CBERS mas listado junto:

      http://www.dragoninspace.com/earth-observation/ziyuan1-cbers.aspx

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    4. Caro Anônimo!

      Não existe e nunca existiu o satélite CBERS-2C no programa CBERS entre o Brasil e a China. Até agora foram desenvolvidos e lançados três satélites, o CBERS 1, 2 e 2B. O que existe na realidade é uma conversa para se desenvolver o CBERS-4B (uma cópia idêntica do CBERS-4, como foi o CBERS-2B foi do CBERS-2), caso o acordo seja estendido para os supostos projetos dos CBERS 5 e 6, como querem a AEB e o INPE. Portanto, essas suas fontes não estão corretas.

      Abs

      Duda Falcão
      (Blog Brazilian Space)

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    5. O que eu disse é que este satélite foi criado exclusivamente pelos chineses ("O CBERS-2C é exemplo de satélite que pegou apenas a parte chinesa do CBERS" ). Sei que não foi fruto direto da cooperação Brasil-China mas, dentro da China, ele utilizou a mesma plataforma, tecnologias e a verba do programa CBERS chinês. Tanto que o nome em chinês do satélite é igual aos dos CBERS e assim foi traduzido inicialmente pelos próprios chineses.

      Ele está voando desde 2011, então dizer que ele não existe é meio complicado. Se vc não quer chamar de CBERS-2C tudo bem, mas o Ziyuan 1 No.02C possui as mesmas câmeras chinesas que voaram nos outros CBERS.

      Mas isso é apenas para dizer que, na minha opinião, existe sim o risco de a China dar um bye-bye para o Brasil devido a esses problemas todos de atraso do CBERS-3.

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    6. Olá Anônimo!

      Se existe um satélite chamado "Ziyuan 1 No.02C" isto é uma história, mas você falou CBERS-2C. A sigla CBERS no inglês significa "China-Brazil Earth Resources Satellite" ou em português "Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres". No programa CBERS, não existe e nunca existiu satélite CBERS-2C e é improvável que os Chineses viesse a desenvolver um satélite próprio e denominá-lo de CBERS-2C. Agora, se eles desenvolveram um satélite semelhante tecnologicamente, usando a tecnologia empregada no CBERS e lançado no espaço, isso é possível sim. Quanto ao que você disse sobre o risco da China se chatear e dar um fim ao Programa CBERS, isso é possível e se você tivesse lido o meu comentário com atenção, notaria que eu disse isso.

      Abs

      Duda Falcão
      (Blog Brazilian Space)

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    7. Oi Duda,

      Pelo que os chineses me falaram, eles usaram esse nome pq já tinham verba carimbada para esse programa.

      Não sei pq vc achou que não dei atenção ao seu comentário, tanto dei que concordei com ele.

      Abs.

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    8. De facto, o leitor Anónimo tem razão. A certa altura o satélite foi mesmo designado CBERS-2C, porém o nome foi removido porque apesar de ser um satélite de detecção remota semelhante aos CBERS, não fazia parte do programa de colaboração entre a China e o Brasil. O Ziyuan-2C foi lançado a 22 de Dezembro de 2011.

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  5. Olá Anônimo!

    Não creio nisso, já que o satélite é fruto de uma cooperação internacional entre o Brasil e a China, e o Brasil não permitira. O que aconteceu com o CBERS-2B e não 2C, aconteceu quando o satélite já estava no espaço e não havia o que fazer, mas aqui a situação é diferente. Entretanto, todo esse episódio certamente deverá afetar as relações com os chineses no que diz repeito a continuidade do programa CBERS.

    Abs

    Duda Falcão
    (Blog Brazilian Space)

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  6. Uma noticia sobre o tal CBERS-2C

    http://www.nasaspaceflight.com/2011/12/china-in-surprise-launch-of-long-march-4b-with-ziyuan-1/

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