A Importância dos Satélites Científicos Para o Programa Espacial Brasileiro
Olá leitor!
Segue abaixo um interessante artigo escrito pelo
pesquisador João Braga (CEA/INPE) postado na Edição 85 (outubro de 2019) do Jornal do SindCT defendendo
que o Brasil invista também em satélites científicos.
Duda Falcão
PROGRAMA ESPACIAL
A Importância dos Satélites Científicos Para o
Programa Espacial Brasileiro
Brasil já desenvolveu e opera diversos satélites de
aplicações
Por João Braga*
Jornal do SindCT
Outubro de 2019 - Edição 85
Foto: /Divulgação
O Programa Espacial Brasileiro precisa reservar um nicho
estratégico para as missões espaciais de caráter científico.
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A aurora da era espacial, no final da década de 1950,
ocorreu no contexto de uma corrida estratégica pela supremacia geopolítica
entre os EUA e a então União Soviética (URSS). A disputa essencialmente
terminou uma década depois, com a Apollo 11, que permitiu ao ser humano pisar
pela primeira vez na superfície da Lua, nosso único satélite natural. Esse
feito espetacular, ocorrido há 50 anos, só foi possível graças a um salto
tecnológico sem precedentes na história, propiciado por um orçamento
astronômico (com o perdão do trocadilho) e estimulado pela curiosidade humana
acerca do universo que nos cerca. Quem não gostaria de saber como seria a
superfície da Lua, se seria possível caminhar lá, que surpresas ela nos
guardaria?
Desde então, diversos países vislumbraram a relevância
socioeconômica das atividades espaciais, entre eles o Brasil. Satélites que
observam a Terra e/ou redirecionam sinais de origem terrestre são hoje
imprescindíveis para aplicações como previsão de tempo, monitoramento
ambiental, telecomunicações, navegação global (GNSS – “Global Navigation
Satellite System”) e atividades militares.
No entanto, o que esses países também perceberam, e o
Brasil infelizmente ainda não, é que missões espaciais de cunho científico são
tão ou mais importantes para os corações e mentes das pessoas do que missões de
aplicações tecnológicas, econômicas ou de defesa. Que cidadão não vibra e não
sente orgulho quando seu país aterrissa uma sonda num cometa, descobre água num
satélite de Júpiter ou desenvolve um experimento embarcado num satélite que
confirma um importante efeito previsto pela teoria da Relatividade Geral de
Einstein? Quantos satélites que orbitam nosso planeta são mais conhecidos e venerados
do que o Telescópio Espacial Hubble? Quantos experimentos científicos são
realizados diariamente na Estação Espacial Internacional?
É essa percepção que parece não existir no Programa
Espacial Brasileiro. É importante ressaltar que muitas tecnologias inovadoras
são originadas por esses indutores científicos. A ida do Homem à Lua não
aconteceu apenas por objetivos geopolíticos; ela só foi possível porque o
cidadão norte-americano se empolgou com o caráter desbravador, e de busca por
novos conhecimentos para a humanidade, que a missão proporcionou. Os
astronautas viraram heróis nacionais muito mais por terem dado um gigantesco
salto científico (parafraseando Neil Armstrong) do que por terem ajudado a
ganhar a corrida espacial contra a URSS.
As principais agências espaciais de hoje, NASA (EUA), ESA
(Europa), CNES (França), ASI (Itália), DLR (Alemanha), JAXA (Japão), ROSCOSMOS
(Rússia), CNSA (China) e ISRO (Índia) mantêm robustos programas de missões
espaciais científicas. Com isso, não só captam a atenção e o interesse do
público, sempre fascinado pelas descobertas científicas e sedento de novos
conhecimentos a respeito do universo em que vivemos, como avançam suas
tecnologias espaciais com o desenvolvimento que ocorre na esteira do fio
condutor científico das missões. Importante lembrar que muitas dessas
tecnologias transcenderam as aplicações espaciais e hoje fazem parte do nosso
dia-a-dia. No caso das missões Apollo, o avanço técnico que foi obtido para
levar ao ser humano à Lua nos propiciou coisas hoje corriqueiras como TV via
satélite, purificadores de água, aparelhos eletrônicos sem fio, detectores de
fumaça e a técnica de tomografia computadorizada. As câmeras fotográficas que
quase todos nós usamos em nossos celulares utilizam detectores eletrônicos de
luz desenvolvidos incialmente para telescópios astronômicos, muitos deles
embarcados em satélites. Os exemplos são muitos.
O Brasil, através do INPE, já desenvolveu e opera
diversos satélites de aplicações, próprios ou em colaboração com a China, nas áreas
de coleta de dados ambientais e observação da Terra (sensoriamento remoto). As
dimensões continentais do país e o fato dele abrigar a maior parte da maior
floresta tropical do mundo fazem com que satélites ambientais e de imagens
terrestres sejam de extrema importância estratégica para o desenvolvimento
socioeconômico e para a defesa do território. É importante, no entanto, que o
país perceba o mais rapidamente possível o caráter também estratégico do
desenvolvimento e lançamento de missões científicas. Um exemplo paradigmático é
a questão da Anomalia Magnética da América do Sul (SAMA, na sigla em inglês).
Grande parte dessa região, na qual o campo magnético terrestre diminui
significativamente e permite a precipitação de partículas energéticas a altitudes
relativamente baixas, está localizada sobre o nosso país. O estudo detalhado
desse fenômeno é crucial para um melhor entendimento da nossa atmosfera e para
a modelagem das influências da atividade solar sobre o planeta (o chamado Clima
Espacial).
O Brasil é o 13º país do mundo em número de publicações
científicas, e a ciência espacial aparece como uma das áreas que mais contribui
para isso. O país possui competentes grupos de pesquisa nessa área, mas isso
não se reflete no seu programa espacial. Na astronomia, por exemplo, os países
desenvolvidos estão, cada vez mais, utilizando dados obtidos por satélites, já
que a astrofísica moderna depende de multimensageiros cósmicos, e muitos deles
só podem ser observados do espaço. É de grande importância estratégica que o
Brasil passe a desenvolver instrumentos espaciais para observar o universo e os
coloque a bordo de satélites nacionais, para que nossa astronomia não fique,
cada vez mais, defasada e menos relevante.
Em resumo, o programa espacial brasileiro precisa
reservar um nicho estratégico para as missões espaciais de caráter científico,
a exemplo do que se faz nos países de programas espaciais consolidados ou em
consolidação. A importância do avanço científico não deve ser menosprezada, sob
pena das atividades espaciais brasileiras não conseguirem o apoio de importante
parcela da opinião pública e perderem a oportunidade de contribuir para o
avanço do conhecimento humano sobre nosso planeta - especialmente na nossa
região - e sobre o universo.
* João Braga é pesquisador titular da CEA/ INPE
Fonte: Site do Jornal do SindCT - http://www.sindct.org.br/jornaldosindct
Comentário: Concordo em gênero, número e grau com o Dr.
João Braga. Atualmente fora os nanossatélites SPORT em parceria com os
EUA, e o NanosatC-Br2 ambos científicos, o INPE sonha em desenvolver o EQUARS,
o MIRAX e mais recentemente o Galileu Solar Space Telescope (GSST).
Entretanto para se partir para algo assim leitor, além da necessidade de termos
de aumentar o orçamento substancialmente do nosso ‘Patinho Feio’, teríamos também
e principalmente de melhorar em muito a gestão do INPE e dos coordenadores
destes projetos, bem como o compromisso e a cobrança por resultados do próprio
governo. Pois se assim não fosse acabariam virando novelas intermináveis, extremamente
custosas, como ocorreu com o Satélite Amazonia-1 (ou SSR-1 da antiga Missão MECB para que não se
esqueça a sua origem), satélite este que parece agora está finalmente em seu
capitulo final, mais de 30 anos após ter sido estabelecido como missão. Não pode
continuar desse jeito e como exemplo temos a NASA que em média produz sondas
espaciais altamente complexas em 5 a 6 anos. Enfim...
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