Equipamento Indisponível
Olá leitor!
Pois então, dando sequência com os seus ‘causos’
postados em seu novo "Blog Memórias de Um Pesquisador" (acesse por
aqui), o Dr. Waldemar Castro Leite Filho publicou mais este abaixo muito
interesse. Confira!
Duda Falcão
Equipamento Indisponível
Por Dr. Waldemar Castro Leite Filho
10 de julho de 2020
Em 1981 eu estava desenvolvendo minha dissertação de
mestrado no sistema de controle do míssil Roland, de cuja equipe eu fazia
parte. Decidi fazer uma malha de
simulação para testar a validade do trabalho.
Era em um grande computador analógico EAI-580. Naquela época não havia ainda disponível os
recursos computacionais de hoje. Tudo
era analógico e deveria ser gravado através de registradores de papel. Os sinais eram desenhados com uma espécie de
pena de tinta mecânica. Como era de se
esperar, só conseguia registrar sinais lentos (no máximo 2 Hz). Acontece que a frequência que eu precisava
registrar era 13Hz.
Fiquei sabendo que havia um registrador especial que
marcava o papel de forma térmica e tinha a capacidade de registrar o que eu
precisava. Ficava no departamento de
mecânica enquanto o EAI-580 ficava no departamento de eletrônica.
Fui até laboratório onde se encontrava o tal equipamento
e falei com o responsável. Não lembro o
seu nome, então vou chamá-lo de João.
João me atendeu muito solícito e eu lhe expliquei a minha
necessidade. Ele ficou muito contente e
me disse que aquele equipamento havia sido comprado havia 9 anos e nunca tinha
sido usado e eu seria o primeiro. Ele
ligava o equipamento quinzenalmente para ter certeza de que estava funcionando
mas nunca havia sido, de fato, utilizado.
Fiquei igualmente contente e lhe perguntei onde estaria a
cautela para assinar para que eu pudesse levar o equipamento para a sala onde
ficava o EAI-580. A sala ficava no mesmo
andar, no mesmo corredor, a cerca de 20 metros da sala onde estava o
registrador térmico.
João, para minha surpresa, me respondeu que eu não
poderia tirar o equipamento daquela sala pois ele deveria estar à disposição
dos alunos de pós-graduação da mecânica.
Eu repliquei que ele acabara de me dizer que havia 9 anos que o
equipamento estava lá e ninguém o havia utilizado. Então ele me saiu com a seguinte pérola:
“quem garante que hoje não irá aparecer um aluno ?” Pacientemente lhe expliquei que o EAI-580
era do tamanho de um pequeno guarda-roupa e não poderia ser removido. Enquanto o registrador era portátil e poderia
facilmente ser levado e trazido a hora que fosse necessário.
João foi irredutível e o registrador continuou sem uso
pelos anos que se seguiram.
Mais uma vez, os procedimentos eram mais importantes que
o objetivo. Um equipamento caríssimo
nunca foi usado pois seu guardião, muito zeloso, seguia à risca as regras que
impediram que ele fosse usado.
Fica a questão: quantos desses equipamentos comprados com recursos públicos e espalhados pelas diversas instituições públicas Brasil afora estão na mesma situação, guardados por tantos Joãos?
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