As Questões do Atraso do CBERS 3 Estão Longe de Terminar

Olá leitor!

Segue abaixo um artigo publicado no “Jornal do SindCT” de dezembro de 2012, editado pelo “Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de C&T (SindCT)” destacando que as questões relativas ao atraso do Satélite CBERS-3 estão longe de terminar.

Duda Falcão

Nosso Trabalho

As Questões que Envolvem o Atraso
do CBERS 3 Estão Longe de Terminar

Falhas em componentes foram alertadas desde 2009

Por Shirley Marciano
Jornal do SindCT


Durante a última visita à MDI, nos EUA, realizada por três tecnologistas do INPE, entre os dias 10 e 14 de novembro, a própria empresa desaconselhou o uso espacial dos conversores adquiridos pelo INPE.

Assim, de posse de mais informações, no dia 19/11, houve reunião entre a direção do INPE, a gerência do CBERS e a AEB, quando ficou decidido que o lançamento do CBERS-3 poderia ser adiado para que se tenha tempo hábil para descobrir as causas que deram origem a todas as falhas verificadas no satélite.

Há conversores contratados de outra empresa, que foram comprados pelos chineses, mas os que falharam foram tão somente os fabricados pela empresa Modular Device Corporation - MDI, contratada pelo INPE. Eles apresentaram não conformidades em 19 módulos em um universo de 44 usados no satélite CBERS 3.

Alguns apresentaram defeitos em testes elétricos na bancada, logo ao sair do almoxarifado, antes mesmo de serem submetidos a qualquer teste em condições de ambiente espacial.

Ainda é difícil mensurar o prejuízo, pois foram comprados pelo INPE em setembro de 2007 cerca de 300 conversores DC/DC por US$ 2,7 milhões, conforme Diário Oficial de 21 de dezembro de 2007. Depois, foram adquiridos mais 60 por U$ 650 mil pela FUNCATE, o que é outro dado curioso, já que nesse caso deveria ser feita outra licitação para ser comprado diretamente pelo INPE.

Nesse caso, nem mesmo um aditivo contratual baseado na primeira compra poderia ser feito, uma vez que o valor do segundo lote superou a margem de 20% do valor do primeiro contrato.

Especialistas consultados pela reportagem avaliam que os gastos extras com o CBERS-3 podem chegar a US$ 10 milhões, sem levar em conta as centenas de horas de trabalho perdidas por técnicos e engenheiros com as atividades de retrabalho.

A MDI tem casos de processos contra ela por empresas renomadas no mundo, como por exemplo, a americana Space Systems/Loral - SS/L, líder mundial na fabricação de satélites comerciais, e uma das mais renomadas empresas da área espacial, que contratou a empresa espanhola Alcatel, que por sua vez, subcontratou a MDI para executar parte de seu escopo.

Mas, assim que a SS/L tomou conhecimento dessa subcontratação, informou a Alcatel de que seu contrato com a MDI faria aumentar os custos da Alcatel e, dessa forma, reduziria os seus lucros. Imediatamente, a Alcatel interrompeu o contrato com a MDI, que ao se sentir lesada, processou a Alcatel e também a SS/L na justiça americana, mas perdeu.

Houve o caso também da empresa Brookhaven Science Associates, LLC (BSA). Neste episódio, a MDI, contratada para fornecer módulos de suprimento de energia (LVBS), entregou um primeiro lote de componentes que não apresentou falhas, entretanto, quando lhe foi solicitada uma quantidade maior, a empresa forneceu componentes que não cumpriram as especificações técnicas exigidas em contrato.

Por conta disso, a contratante teve que fazer engenharia reversa, reprojetando o componente a partir do estudo do projeto original da MDI. Com isto, os problemas detectados nos módulos fornecidos pela MDI foram finalmente sanados. Além disso, a BSA ainda processou a MDI, que foi condenada pela justiça. A MDI, por sua vez, processou a BSA por ter “plagiado” seu componente, mas o Tribunal rejeitou a acusação.

A MDI é também responsabilizada pelo problema ocorrido no projeto lunar Chandrayaan, desenvolvido pela Organização Indiana de Pesquisa Espacial) - ISRO. Neste caso, são apontadas cinco falhas sucessivas de conversores DC/DC, fabricados pela MDI, conforme publicado na edição nº 19 do Jornal SindCT.

No caso do CBERS-3, é sabido que cada país ficou com uma parte do satélite para ser desenvolvido. Conforme foi explicado à reportagem, os equipamentos chineses, por apresentarem uma concepção mais simples, utilizam conversores fabricados pela empresa brasileira Aeroeletrônica, enquanto os equipamentos brasileiros, pelo fato de possuírem um projeto mais sofisticado, não eram compatíveis com os conversores da Aeroeletrônica.

Isto levou o Brasil a ter de importar estes componentes da MDI. Acontece que os conversores brasileiros utilizados pela China não apresentaram falhas durante os testes, ao contrário dos conversores produzidos pela MDI.

O satélite CBERS-3 utiliza um projeto-base herdado dos satélites CBERS 2 e 2B, entretanto, por uma razão ainda desconhecida, alguns equipamentos sob a responsabilidade do Brasil tiveram seus projetos alterados, o que levou, dentre outras coisas, à necessidade de se utilizar outros tipos de conversores.

Ainda segundo especialistas, esta alteração nos projetos dos equipamentos não foi submetida à análise de uma equipe responsável pela garantia do produto do INPE, o que é praxe nestes casos, sobretudo na área espacial, onde o nível de confiabilidade exigido é altíssimo. De acordo com as fontes entrevistadas, esta equipe de garantia do produto do INPE não foi consultada à época, e todas as modificações de projeto ocorreram sem o seu respaldo. Assim, procedimentos formais exigidos nos casos em que há alterações significativas de projeto, como relatórios de análise de risco, simplesmente não foram seguidos.

De acordo com informações obtidas no INPE, os últimos três ministros da Ciência e Tecnologia, assim como os respectivos presidentes da AEB, foram alertados reiteradamente sobre os riscos que havia nos conversores DC/DC, já que estes foram adquiridos em 2008 e começaram a apresentar falhas em 2009. Tudo isso pode ser considerado como evidências de possível negligência da contraparte brasileira no programa.

No primeiro relatório emitido pela MDI em 20 de outubro, ela já havia admitido erros de manufatura na grande maioria das falhas dos conversores DC/DC do CBERS 3. Este relatório, por si só, já aponta para um nível de confiabilidade dos componentes da MDI muito inferior ao exigido em missões espaciais desta natureza. Sendo assim, não há solução sensata, segura e coerente que passe pela simples substituição dos conversores que falharam por outros pertencentes ao mesmo lote de componentes.

O Que São os Conversores DC/DC?

Os agentes causadores do atraso no CBERS-3 são conversores de voltagem, chamados conversores DC/DC. São geralmente responsáveis pela adaptação da voltagem, do barramento da bateria para as diversas voltagens solicitadas pelos módulos do satélite para minimizar a dissipação de potência.


Fonte: Jornal do SindCT - Edição 20ª - Dezembro de 2012

Comentário: Pois é leitor, o que dizer? Como não se desestimular com toda essa situação? O PEB que já tem problemas de sobra gerados pelo governo e ainda tem de passar por essa. É por essas e outras que começo a perder a minha fé no Programa Espacial Brasileiro. E note que a autora do artigo nem se arriscou ou preocupou-se em dar uma nova previsão de lançamento para o CBERS-3.

Comentários

  1. Bom,

    Sobre esse projeto do CBERs do jeito que está, minha posição é a seguinte: melhor seria comprar o serviço dos chineses adaptarem um dos seus satélites para usar a tal câmera super sofisticada que ainda está no chão e colocá-la no espaço o mais rápido possível, antes que ela se torne obsoleta.

    Quanto ao artigo, me chamaram a atenção:

    1 - O envolvimento da FUNCATE, em mais um contrato sem licitação.

    2 - A quantidade enorme de fatos desabonadores do fornecedor e a insistência com ele.

    3 - Um projeto espacial completamente alterado, que não passa pelo crivo do setor de garantia.

    4 - Mais uma vez, Ministros foram alertados, diretores de instituições estavam cientes, engenheiros e cientistas se restringiram a "alertar" seus superiores, e ninguém vai ser responsabilizado.

    Att.

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  2. Isto ai é um belo enredo para um filme chamado “Os trabalhões no espaço” onde Didi e Dedé, tentam lançar em orbita um satélite, para fazer contato com os parceiros Mussum e Zacarias.

    Senão vejamos;

    1) A fornecedora MDI tem um notório histórico de problemas de qualidade e processos judiciais, tendo sido responsável por falhas em algumas missões espaciais anteriores.

    2) A China utilizar conversores CC/CC (ou DC/DC em inglês) Brasileiros, estes nunca apresentaram problemas. E o Brasil utiliza americanos que são problemáticos. Esta claro que os conversores fabricados no Brasil são incompatíveis com as necessidades de alimentação da eletrônica embarcada do lado nacional, mas me parece razoável que OS CONVERSORES DA AEREOELETRÔNICA PODERIAM SER RE-PROJETADOS PARA ATENDER AS NECESSIDADES DO LADO BRASILEIRO DO SATÉLITE . Esta decisão poderia ter sido tomada em 2009 quando existiu a primeira sinalização de falha dos componentes da MDI. Afinal estamos falando de uma indústria nacional cujo projeto base de conversor se mostrou confiável.

    3) Existe desde 2009 um informe de que os conversores da MDI eram problemáticos e NINGUÉM FEZ NADA ATÉ QUE NA VÉSPERA DO LANÇAMENTO O PROBLEMA SE TORNA GRAVE.

    4) O projeto do satélite é modificado sem passar pelos tramites de qualidade do INPE.

    Convenhamos que é um histórico muito mal contato de problemas.

    Ninguém neste mundo espacial é burro, tem coisa nesta história que não sabemos.

    O re-projeto de sistemas brasileiros do satélite é que me chama a atenção, normalmente este tipo de medida acontece por três motivos.

    a) Os sistemas anteriores não tiveram bom desempenho nos vôos anteriores.

    b) Houve boicote de fornecedores externos exigindo re-projeto.

    c) Fornecedores antigos descontinuaram o fornecimento.

    Também chama a atenção a equipe de garantia do produto do INPE ter sido evitada no processo de modificação do projeto. Isto nos remete a duas hipóteses.

    a) Os responsáveis pelas modificações do projeto do satélite são irresponsáveis ou negligentes e evitam terem suas modificações auditadas por alguém externo ao processo.

    b) O INPE como toda instituição publica deve ter suas “panelinhas” a turma do fulano que apóia isto a turma do beltrano que é contra aquilo. E eventualmente estas “comissões internas” podem ser apenas burocracia pro forma que se não apoiam determinado processo não o aprovam e não o vetam, apenas o “cozinham”, coisa normal na burocracia brasileira. Como exemplo: Hoje para um fabricante brasileiro que não seja a Embraer é mais fácil conseguir homologar uma aeronave com a FAA nos EUA do que com a ANAC.

    Sobre conversores CC/CC eles não são nenhum bicho de sete cabeças.

    É óbvio que tudo que se coloca a bordo de um satélite ou aeronave precisa passar por rígidos processos de homologação então mesmo itens básicos como estes conversores não são projetados da noite para o dia. Mas é o ônus de querer brincar de construir satélites.

    Se existe know-how no Brasil para fazê-los, eles deveriam ser feitos aqui, porque sem base industrial meus caros, ai que realmente não se faz nada em construção espacial.

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  3. Antes tentar fazer esses conversores do que arriscar mais atrazos em próximas missões (já gastaram milhões nisso, será que custaria investir e poupar mais alguns outros milhares?). Uma pena toda essa confusão por causa de peças que dizem ser tão simples. É a reputação do nosso PEB que está em jogo.

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  4. Olá Israel!

    Qual reputação você se refere amigo? A coisa tá feia e o PEB é motivo de chacota não só la fora, como também em rodas sociais aqui no Brasil.

    Abs

    Duda Falcão
    (Blog Brazilian Space)

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  5. Só um detalhe, a China Usa componentes brasileiros fabricados pela "Brasileira" Aeroeletrônica cujo controle acionário pertence a Israelense Elbit Systems .....

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  6. Olá André!

    Permita-me ser mais preciso. Na realidade usa componentes israelenses fabricados pela filial brasileira da empresa Elbit System.

    Abs

    Duda Falcão
    (Blog Brazilian Space)

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  7. Sei não!!!Posso está errado, mas acho que a AEL não fabrica estes conversores aqui.

    Talvez em Haifa, mesmo assim eu duvido, pois eles também não tem escala e mercado consumidor para produção local.

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  8. Infelizmente o Brasil anda muito mal na área espacial, entramos em um retrocesso que já dura décadas.Precisamos nos curvar frente a nossa incompetência e nos corrigirmos.Acreditem, a nossa formação acadêmica está mal direcionada, temos que perder o orgulho e reconhecermos que precisamos melhorar muito.O Brasil precisa de engenheiros criativos e não mais seguidores de normas e nomes famosos.

    A C Marton

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