Um Meteorito em Serra Pelada
Olá leitor!
Segue abaixo um interessante artigo publicado na edição
de Julho de 2018 da “Revista Pesquisa FAPESP” tendo como destaque os estudos
realizados sobre a queda de um meteorito em junho de 2017 na região de Serra Pelada,
no estado do Pará.
Duda Falcão
ASTROFÍSICA
Um Meteorito em Serra
Pelada
Fragmentos de um dos
maiores asteroides do Sistema Solar
caem na Amazônia e são recuperados por
pesquisadores
Por Victória Flório
Revista Pesquisa FAPESP
Edição 269 - Jul. 2018
Às 10h35 da manhã de 29 de
junho de 2017, uma bola de fogo cruzou o céu na direção nordeste-sudoeste,
depois explodiu, com um estrondo ouvido a quilômetros de distância,
fragmentou-se e caiu na vila de Serra Pelada, no município de Curionópolis,
sudeste do Pará. Os moradores coletaram os pedaços do meteorito que caíram
perto de uma escola. Um fragmento de 5,4 quilogramas (kg) caiu em uma
mineradora e foi coletado por um eletricista. O geólogo Marcílio Rocha, que
nasceu na vila, suspeitou que aquilo poderia ser um meteorito e contatou uma
especialista em meteoritos, a astrônoma Maria Elizabeth Zucolotto, pesquisadora
do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Os estudos realizados por
pesquisadores do Rio, Pará, Bahia e São Paulo indicaram que se tratava de um
tipo raro de meteorito, que deve ter se desprendido de um dos maiores e mais
brilhantes asteroides do Sistema Solar, o Vesta. Com 500 quilômetros (km) de
diâmetro, ele faz parte do Cinturão de Asteroides, entre as órbitas de Marte e
Júpiter. “As colisões de asteroides podem fazer com que pedaços se desprendam e
entrem em órbita em torno do Sol”, diz a astrônoma Thais Mothé Diniz, que
trabalhou com meteoritos no Observatório do Valongo da UFRJ e atualmente é
professora na Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, em
Alesund. “Quando estão muito próximos da Terra, podem entrar na
atmosfera, ganhando o nome de meteoro.” Ao atingir a superfície do planeta,
passam a ser chamados de meteoritos.
O meteorito do Pará, que
ganhou o nome de Serra Pelada, é essencialmente uma rocha basáltica,
constituída principalmente por dois minerais, feldspato e silicatos, conhecidos
como piroxênios, além de quartzo e apatita, em menores proporções, como
detalhado em um artigo científico publicado em fevereiro de 2018 na
revista Anais da Academia Brasileira de Ciências.
Segundo Elizabeth, a
principal autora desse trabalho, o Serra Pelada deve ter entrado na atmosfera
terrestre com uma velocidade entre 11 e 70 km por segundo. Ao ser freado pelo
atrito com o ar, o meteorito explodiu em diversos fragmentos; apenas dois
pedaços foram recuperados e muitos outros, possivelmente menores, perderam-se
na mata. Sua composição reitera a hipótese de realmente ser um vestígio de
Vesta, uma vez que o asteroide tem uma proporção única de elementos químicos.
O meteorito do Pará foi o
primeiro registrado na Amazônia e é o terceiro fragmento de Vesta já coletado
no Brasil. O primeiro foi o Serra de Magé, com cerca de 1,8 kg, que caiu em
1923 no município de Alagoinha, Pernambuco. O segundo foi o Ibitira, com cerca
de 2,5 kg, que caiu no município de Martinho Campos, Minas Gerais, em 1957. O
maior meteorito achado até hoje no país é o de Bendegó, de 5,36 toneladas,
encontrado no sertão baiano em 1784. Até agora, 74 meteoritos foram
identificados no Brasil.
“Os meteoritos são
constituídos por restos do que formou o Sistema Solar, além de fragmentos de
corpos maiores como asteroides, Lua, Marte e possivelmente cometas. Eles são
peças importantes no quebra-cabeça da história da formação e evolução dos
planetas, pois são amostras desde o núcleo até a superfície de corpos dos quais
se originaram. Alguns deles, como os condritos, mantiveram a composição inalterada
de 4,56 bilhões de anos atrás, que data da origem do Sistema Solar”, diz
Elizabeth.
Quando recebeu a ligação
de Rocha avisando sobre o meteorito, Elizabeth estava a trabalho de campo em
Palmas de Monte Alto (BA) em busca de fragmentos de outro meteorito. Mudou os
planos de viagem e foi para a vila Serra Pelada, a 1.800 km de distância. Ela e
o colecionador André Moutinho começaram a procurar vestígios do meteorito pela
vizinhança de Serra Pelada. Passaram por um garimpo clandestino de ouro, conheceram
membros do Movimento dos Trabalhadores sem Terra em Eldorado dos Carajás e
percorreram trechos isolados da rodovia Transamazônica.
Após seis dias de procura,
não encontraram nenhum meteorito e souberam que o pedaço de 5,4 kg, que
pretendiam adquirir, já havia sido vendido para um comprador do exterior.
Terminaram a viagem com apenas alguns fragmentos, que compraram por R$ 37 mil.
“Às vezes, para essas compras, conseguimos apoio da Sociedade dos Amigos do
Museu Nacional”, conta ela.
Elizabeth tem experiência
em caçar meteoritos. Em 1997, ela participou de uma perseguição a dois
norte-americanos que haviam roubado um meteorito de um tipo bastante raro, o
Angrito, com 1,5 kg, que caiu no município de Angra dos Reis em 1869 e estava
guardado no Museu Nacional, do Rio de Janeiro – na ocasião, os ladrões o
substituíram por um similar sem valor. O Angrito é um dos tipos de rochas mais
antigas do Sistema Solar, com apenas 28 exemplares confirmados no mundo. O
furto foi descoberto rapidamente e o meteorito recuperado, com a ajuda da
Polícia Federal, no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio. “Naquela época,
o Angrito tinha alto valor comercial porque era raro, mas, recentemente, foi
encontrado um meteorito de 40 kg muito parecido, na Argentina, e o valor despencou”,
diz ela. Quando foi roubado, o meteorito poderia ser vendido para
colecionadores por um valor próximo a R$ 3,5 milhões.
Artigo Científico
ZUCOLOTTO, M. E. et al. Serra Pelada: The first Amazonian meteorite fall is a eucrite
(basalt) from asteroid 4-Vesta. Anais da Academia Brasileira de
Ciências. v. 90, p. 3-16. fev. 2018.
Fonte: Revista Pesquisa FAPESP - Edição 269 – Julho de
2018
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