O Brasil no Subcomitê Jurídico do COPUOS
Olá leitor!
Segue abaixo outro artigo do José Monserrat Filho postado
hoje (25/04) no site da “Agência Espacial Brasileira (AEB)”, dando destaque a
participação brasileira na 52ª Reunião do Subcomitê de Assuntos Jurídicos do
COPUOS, realizada em Viena, Áustria, de 8 a 12 de abril deste ano.
Artigo
Brasil no Subcomitê Jurídico do COPUOS
José Monserrat Filho*
25/04/2013
O Brasil teve ativa participação na 52ª Reunião do
Subcomitê de Assuntos Jurídicos do COPUOS, realizada em Viena, Áustria, de 8 a
12 de abril deste ano. A delegação brasileira, presidida pela ministra
conselheira Vivian Loss Sanmartin, da Missão Permanente do Brasil junto às
Nações Unidas em Viena, foi composta por Tatiana Esnarriga Arantes Barbosa,
também da Missão Permanente do Brasil em Viena, André João Rypl, da Divisão do
Mar, da Antártida e do Espaço (DMAE) do Itamaraty, Ana Cristina Galhego Rosa,
doutoranda brasileira da Universidade de Leiden, Países Baixos, Daniel Konrad
Link, representante da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial
(SBDA), e o autor deste texto.
A decisão mais importante
adotada nesta reunião parece ter sido a aprovação das
“Recomendações sobre a legislação nacional relativa à exploração e ao uso do
espaço exterior com fins pacíficos”, que agora serão apresentadas como projeto
de resolução à Assembleia Geral das Nações Unidas em sua sessão deste ano.
O Brasil manifestou-se em várias ocasiões sobre os temas
mais relevantes da agenda do encontro. A primeira intervenção brasileira
ocorreu na fase do “Intercâmbio de Opiniões”. E enfatizou, entre outras, as
seguintes ideias:
1) O Subcomitê Jurídico do COPUOS “pode desempenhar papel
mais vigoroso como fórum multilateral e discutir novas demandas legais para
regular as atividades espaciais e assegurar a segurança jurídica. Mais que
nunca a comunidade internacional exige um sistema transparente, efetivo e
previsível, que contribua para a construção da confiança entre os países.”;
2) A reunião do Subcomitê Jurídico deve manter sua
duração atual, pois “há muitos temas que precisam ser tratadas com profundidade”,
conforme a declaração do Grupo de Países Latino-Americanos (GRULAC), lida pelo
representante da Guatemala;
3) “A questão da definição e delimitação do espaço
exterior é elemento importante do Direito Espacial. Como o progresso
tecnológico traz para a arena espacial novos atores, tanto públicos quanto
privados, é essencial estabelecer as diferenças entre o Direito Aeronáutico e o
Direito Espacial, para definir onde se aplica o princípio da soberania dos
Estados e onde o Direito Espacial Internacional é a regra apropriada. A
incerteza nessa questão impede o progresso tecnológico e o desenvolvimento das
atividades comerciais no espaço exterior. A definição e a delimitação do espaço
exterior ajudarão a eliminar a incerteza (…), tornando possível atribuir responsabilidades
em controvérsias envolvendo objetos espaciais…”;
4) “O Tratado da Lua deve ser discutido e esclarecido
para que possa ser melhor entendido. Acima de tudo, a exploração da Lua deve
ser conduzida somente para fins pacíficos e em benefício de toda a
humanidade.”; As recomendações sobre legislação espacial nacional relativas à
exploração e uso do espaço exterior paa fins pacíficos, elaboradas sob a
liderança de Irmgard Marboe (Áustria), são fonte de diretrizes para subsidiar
os países no desenvolvimento de suas próprias legislações espaciais nacionais;
5) O Brasil apóia a revisão e atualização dos princípios
sobre o uso de fontes de energia nuclear no espaço exterior, em sintonia com a
Estrutura de Segurança na Aplicação das Fontes de Energia Nuclear no Espaço
Exterior, adotada pelo Comitê Científico e Técnico do COPUOS e endoçada peloa
Comissão de Padrões de Segurança da Agência Internacional de Energia Atômica;
6) A redução dos detritos espaciais (debris) continua
sendo, em sua essencia, um problema multilateral e deve ser examinada com muito
cuidado pelo Subcomitê Jurídico para prover soluções jurídicas capazes de
tratar da questão de modo justo, estabelecendo equilíbrio entre a necessidade
da sustentabilidade a longo prazo das atividades espaciais, a prevenção de
colisões entre satélites e as responsabilidades históricas das nações com
grandes programas espaciais pelos detritos existentes.
Nesta sua primeira e mais
ampla intervenção, o Brasil anunciou o lançamento em 2012 do
novo Programa Nacional de Atividades Espaiais (PNAE 2012-2021), que prioriza o
desenvolvimento da indústria espacial nacional, integra a política espacial às
outras políticas pública do país e se compromete a elaborar uma lei geral das
atividades espaciais.
O Brasil anunciou também
o próximo lançamento do CBERS-3 e o início das conversações entre Basil e China
para a elaboração de um Plano Decenal de Cooperação Espacial, iniciativa
inédita nestes primeiros 56 anos da Era Espacial.
No item sobre lixo espacial,
o Brasil apoiou a ideia lançada pelos Países Baixas, inspirada no debate havido
na véspera sobre o assunto no Instituto Europeu de Política Espacial (ESPI, na
sigla em inglês), em Viena: o exame jurídico da questão dos detritos espaciais
poderia ser encaminhado com base em princípios mais gerais do Direito
Internacional Público. Um desses princípios, citado diretamente, é o Princípio
2 da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, e
Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992. Diz o Princípio 2: “Os
Estados, de acordo com a Carta das Nações Unidas e com os princípios do Direito
Internacional, têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos
segundo suas próprias políticas de meio ambiente e de desenvolvimento, e a
responsabilidade de assegurar que atividades sob sus jurisdição ou seu controle
não causem danos ao meio ambiente de outros Estados ou de áreas além dos
limites da jurisdição nacional.”
No referente à Legislação
Espacial Nacional, o Brasil informou que a Associação
Brasileira de Direito Aeronáuico e Espacial (SBDA) está iniciando o trabalho de
elaboração de um pré-projeto da lei geral das atividades espaciais no Brasil.
Trata-se de uma contribuição da SBDA à AEB.
Sobre o tema da formação de
competências em Direito Espacial, o Brasil deu ciência da
iniciativa da AEB de promover em breve um curso de Direito Espacial dedicado a
diretores e executivos das industriais espaciais do país, interessadas em
penetrar no mercado mundial e estabelecer parcerias com empresas de outros
países.
O Grupo de Trabalho sobre
Definição e Delimitação do Espaço Exterior, mais uma vez, não
logrou chegar a uma solução de consenso sobre o tema. Presidi o GT pela nona
vez consecutiva e decidi ler e pôr em debate as respostas de vários países
sobre três ordens de questões: 1) As leis e práticas dos países relativas à
definição e delimitação do espaço exterior; 2) A posição de cada país sobre a
necessidade ou não de definir e delimitar o espaço exterior; e 3) A posição de
cada país sobre uma eventual relação entre os voos suborbitais e a questão de
definir e delimitar o espaço exterior, bem como sobre a necessidade ou não de
se definir legalmente os voos suborbitais.
As intervenções de alguns países novamente revelaram a
continuidade do impasse existente há muitas décadas entre os dois modos
dominantes de tratar o tema, o enfoque espacial e o enfoque funcional. Por
isso, optei por oferecer ao debate os efeitos jurídicos resultantes da vitória
hipotética por consenso de cada um dos enfoques referidos. Em ambos os casos,
haveria que emendar o Tratado do Espaço de 1967 e algumas das convenções
adotadas pelas Nações Unidas com base nesse tratado pioneiro e líder no
ordenamento das atividades espaciais.
Se o enfoque espacial fosse aprovado por consenso, o
Tratado do Espaço, por exemplo, deveria ser completado no próprio texto ou em
documento especial com a definição do espaço exterior e a altura escolhida para
delimitar a linha limítrofe entre o espaço aéreo e o espaço exterior.
Se o enfoque funcional fosse o preferido, haveria que
mudar o próprio título do tratado e vários de seus dispositivos, que não já
poderiam referir-se ao espaço exterior, mas sim, e tão somente, às atividades
espaciais, pois, no caso, o critério dominante seria não o espaço, mas a
funcionalidade, o tipo de atividade exercida.
Assim, o “Tratado sobre Princípios Reguladores das
Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e
demais Corpos Celestes” deveria assumir o nome de “Tratado sobre Princípios
Reguladores das Atividades Espaciais dos Estados” (não importando o lugar onde
sejam realizadas – na Terra, no espaço aéreo, no espaço exterior, na Lua ou em
qualquer corpo celeste). E o artigo 1º, §2, deveria ganhar outra redação. Em
lugar de rezar que “o espaço cósmico, inclusive a Lua e demais corpos celestes,
poderá ser explorado e utilizado livremente por todos os Estados…”, caberia
dizer “as atividades espaciais, independentemente do lugar onde sejam
realizadas, poderão ser exercidas livremente por todos os Estados…” Quanto ao
artigo 2º, seria impossível ajustá-lo legalmente à visão funcional, já que ele
se refere diretamente ao espaço, estabelecendo que “o espaço cósmico, inclusive
a Lua e demais Corpos Celestes não poderá ser objeto de apropriação…”
A verdade é que, num enfoque rigorosamente funcional,
essa norma deveria ser cancelada, pois, a seu ver, o que importa é a atividade
espacial e não o espaço cósmico ou exterior. A solução do dilema, creio, está
na adoção de um sistema misto, que tanto delimite o espaço exterior, quanto
defina as atividades espaciais. Atividades que, na realidade, começam ainda na
superfície da Terra. Essa foi a minha recomendação aos delegados presentes. Mas
nenhum deles houve por bem discutir as hipóteses formuladas, nem a solução
proposta. Fez-se um silêncio completo. Como não há consenso nem para retirar o
tema da agenda de debates, ele inevitavelmente voltará no próximo ano. Parece
que todos os países membro do Subcomitê Jurídico estão condenados a alcançar
uma solução de consenso.
* José Monserrat Filho, chefe da Assessoria de Cooperação
Internacional da AEB
Fonte: Site da Agência Espacial Brasileira (AEB)
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