Controladora de empresa selecionada para operar no Centro Espacial de Alcântara sofre intervenção judicial para pagar credores nos Estados Unidos

Olá, Leitora! Olá, Leitor!


Apesar dessa notícia já ser de domínio público nos Estados Unidos, desde outubro de 2021, após apurações realizadas pelo Brazilian Space, informamos aos nossos leitores que o Grupo Theia (Theia Group Inc.), controlador da empresa Hyperion que foi selecionada em maio de 2021 para operar a partir do Centro Espacial de Alcântara - CEA (veja a matéria do BS "O anuncio das empresas selecionadas para operar em Alcântara e o provável primeiro lançamento a partir do CLA"), sofreu uma intervenção judicial para pagar dívidas de mais de US$ 290 milhões de dólares a credores nos Estados Unidos. 

Imagem destaque do slide da apresentação do vídeo da FAB (Adaptado)

De acordo com as matérias "Theia Group ordered to relinquish control of its assets, raising questions about the Orion Center and plans for Albuquerque" e "Funding for Orion Center satellites up in the air as Theia Group Inc. battles lender lawsuit", publicadas pelo The Business Journals em novembro e setembro de 2021, respectivamente, o juiz do Tribunal Distrital dos EUA, P. Kevin Castel , do Distrito Sul de Nova York, determinou a nomeação de um Interventor / Administrador dos bens da empresa, além de autorizar que os ativos da empresa e suas subsidiárias (entre elas a Hyperion), dentre eles as licenças de operação de uma constelação de satélites obtida junto à Federal Communications Commission - FCC (o equivalente americano à nossa Agência Nacional de Telecomunicaões - Anatel),  possam ser entregues ou vendidos a terceiros para sanar as dívidas em questão.

Segundo as notícias, a Theia está sendo acionada judicialmente por credores da Brevet Capital, que está tentando recuperar quase US$ 290 milhões de dólares investidos na empresa, alegando inclusive que a Theia teria adulterado o seu balanço com valores de recursos capitados em rodadas de investimentos anteriores, na ordem de US$ 4,5 milhões de dólares, além de declarar indevidamente outros ativos como garantia para o aporte do fundo de investimento.

Representantes da empresa alegam em sua defesa que dos US$ 290 milhões de dólares levantados junto ao fundo de investimentos, somente US$ 177 milhões de dólares foram efetivamente aportados na empresa.

Segundo declaração do advogado da Theia nos autos do processo: 

"Não há empresa hoje. Não há dinheiro sendo gasto de maneira significativa... tudo o que realmente existe é uma licença e um plano de negócios 
...  
Acreditamos que o único caminho para qualquer pessoa obter seu dinheiro de volta é vender esta licença [da constelação de satélites], e a venda desta licença inevitavelmente exigirá algum tipo de processo de falência" (grifos)

No entanto, independentemente do valor, a situação da Theia e, por consequência, da subsidiária Hyperion é muito delicada e preocupante, pois conforme confessa o representante legal a. empresa era só "um plano de negócio", ou seja, uma "empresa de papel" ou "empresa powerpoint", como se diz na gíria das startups.

A Hyperion e a seleção para operação em Alcântara

Conforme apresentado pelo BS na matéria "O anuncio das empresas selecionadas para operar em Alcântara e o provável primeiro lançamento a partir do CLA", a Hyperion foi uma das 4 empresa selecionadas (HyperionOrion AST , Virgin Orbit e C6 Launch), via o famigerado Edital nr 002/2020 e seus puxadinho (veja aqui e aqui)

Imagem do slide com os nomes das empresas selecionadas e as respectivas instalações / sítios associados.

Importante lembrar que, das 4 empresas selecionada, a mais conhecida e a única que possui um veículo operacional (com 1 lançamento bem sucedido de 2) é a Virgin Orbit. 

A Hyperion, que até o dia da apresentação do resultado da seleção não tinha nem mesmo um site, não era a desenvolvedora do seu veículo lançador (denominado Sprite), que, salvo engano, teria sido encomendado e estaria sendo desenvolvido pelas empresas "irmãs" Scorpius e Microcosm.

Imagem da concepção esquemática do veículo lançador Sprite
Fonte: Microcosm Inc.

Salvo o caso de informações mais recentes terem sido omitidas, pelo material publicado pela Microcosm Inc. em 2014 (veja aqui). com a proposta de uma família de lançadores da família Scorpius, os voos dos protótipos de testes foram todos sub-orbitais.

Vasculhando na internet, a última referencia confiável que encontramos sobre o andamento desse projeto foi de agosto de 2018 nos slides da apresentação "Small Launch Vehicles: A 2018 State of the Industry Survey", (veja aqui) de Carlos Niederstrasser (todos os direitos reservados). Nessa apresentação o autor informa que o status do projeto do Demi Sprite (uma versão menor do Sprite), que deveria ter voado em 2017, era desconhecido. 


Imagem do slide da apresentação "Small Launch Vehicles: A 2018 State of the Industry Survey", com destaque em amarelo para o nome do veículo Demi Sprite.
Fonte: Niederstrasser (2018).

Se nos causou espécie e nos fez pesquisar muito por informações sobre a Hyperion, dada a ausência de um background de sucesso e comprovada experiência no lançamento de veículos orbitais, a falta de informações públicas do processo seletivo promovido pela Agência Espacial Brasileira (AEB) e pela Força Aérea Brasileira (FAB) nos impediu (a sociedade) de acompanhar e verificar a capacidade empresarial e financeira da referida empresa.

Importante lembrar que as diversas falhas dos Editais (02/2020 e 07/2021) deram motivos e a brecha para empresas como a Hyperion viessem aventurar aqui no Brasil, como bem enfatizamos na matéria "AEB publica novo Edital de Chamamento Público para operação no CEA: Uma confissão pública de ilegalidade e a mesma incompetência de sempre":

"Se já não fossem óbvias as deficiência e incompletudes do instrumento de 2020, dada a importância e complexidade operacional, técnica e legal de tal empreitada, esse tipo de situação só faz com que os investidores (exceto os com muito apetite a riscos, os aventureiros) não se sintam confortáveis e confiantes para se apresentarem como candidatos a operadores licenciados do CEA, e isso é muito ruim e contraproducente para o objetivo de tornar o CEA operacional e internacional, o mais rápido possível. 
... 
O que mais impressiona é como todos os alertas foram dados e a AEB e, por tabela, o COMAER (Comando da Aeronáutica), insistiram em manter o Edital de 2020 e o processo como um todo sem promover as correções necessárias, pois rever os próprios atos (autotutela) é um dos princípios mais nobres da Administração Pública e deve ser usado justamente para evitar que situações como essa se materializem." (grifos)

Agora, com a luz trazida pela justiça e a imprensa americana, vemos que a empresa que foi selecionada para operar de Alcântara, além das diversas inconsistências técnicas apresentadas pelo BS, como visto acima e na matéria publicada por nós no ano passado, em termos de gestão, era, também, uma "empresa de papel", uma "empresa powerpoint", que foi selecionada em detrimento de várias empresas nacionais sérias que concorreram para operar no CEA.

O que vai acontecer com a Hyperion e a operação no CEA?

O BS tentou contato com o Theia Group Inc. e a Hyperion, mas os seus sites oficiais e outros meio de contato na web estão inacessíveis.


Imagem respostas do servidor dos sites da Theia (tgi-hg.com) e da Hyperion (hyperionrocket.com)
Último acesso em: 07/02/2022 00:43h

Vamos encaminhar a presente matéria para a AEB e o Comando do Estado Maior da Força Aérea (COMAER) para buscar um pronunciamento oficial dos mesmos sobre o assunto e quais providências serão tomadas por esses entes diante dessa situação de insolvência da Theia / Hyperion.

Além disso, procuramos por contatos e representantes da Hyperion no Brasil sem sucesso, mas obtivemos o nome do Tenente-Brigadeiro do Ar R1 Alvani Adão da Silva, que no vídeo da solenidade de apresentação das empresas selecionadas foi convidado a tomar lugar de destaque, tendo sido anunciado como representante da Hyperion no Brasil (vide video abaixo).

Vídeo do instante do anuncio das empresas selecionadas e chamada do representante da Hyperion.

Cumpre destacar que procuramos por contatos do mencionado representante da Hyperion no Brasil na internet e nas redes sociais (em especial o LinkedIn), mas não obtivemos sucesso.

Assim, deixamos os nossos canais de contato abertos para a Theia / Hyperion e seu(s) representante(s) no Brasil, bem como para a AEB e a FAB para se pronunciarem sobre o assunto, apresentarem seus esclarecimentos e demais informações que julguem pertinentes.

Rui Botelho
Brazilian Space

Comentários

  1. O Brasil ama uma boa picaretagem
    Quando a gente não é o golpista é o que sofre o golpe

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