Tragédia Faz 10 Anos e o Brasil Ainda Sonha em Lançar Foguete
Olá leitor!
Segue abaixo uma extensa matéria postada hoje (22/08) no
site “G1” do globo.com, dando destaque a tragédia ocorrida em Alcântara há dez
anos e o sonho do Brasil de lançar o seu próprio Veículo Lançador de Satélites
(VLS-1).
Duda Falcão
CIÊNCIA
E SAÚDE
Tragédia em Alcântara Faz Dez Anos e
Brasil Ainda Sonha em Lançar Foguete
Em 22 de agosto de 2003, VLS deu partida antecipada e
matou 21 homens.
Novo foguete completo, em sua quarta versão, deve ser lançado em 2017.
Luna
D'Alama*
Do G1, em São Paulo
22/08/2013 - 06h00
Atualizado em 22/08/2013 - 08h40
(Foto: Ed
Ferreira/Estadão Conteúdo)
Imagem de arquivo do dia 25 de agosto de 2003 mostra os escombros da torre de lançamento do VLS em Alcântara, no Maranhão. |
Uma tragédia que matou 21 profissionais civis no Centro
de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, e adiou os projetos do programa
espacial brasileiro completa dez anos nesta quinta-feira (22). No dia 22 de
agosto de 2003, às 13h26, o foguete Veículo Lançador de Satélites (VLS) foi
acionado antes do tempo e ficou pronto para a partida (veja abaixo o vídeo com imagens das câmeras de
segurança que gravaram o momento do acidente).
Ainda faltavam, porém, três dias para o lançamento do
protótipo, o terceiro desse foguete (V03), e toda a estrutura em volta dele
continuava montada. Com a ignição prematura do VLS – que tinha 21 metros de
altura e colocaria em órbita dois satélites de observação terrestre –, a torre
acabou explodindo e matando os homens que trabalhavam ali.
Segundo o relatório final de investigação, concluído pela
Aeronáutica em fevereiro de 2004, houve um "acionamento intempestivo"
(súbito) de um dos quatro motores do VLS, provocado por uma pequena peça que
ligava o motor. Mas até hoje não se sabe por que esse detonador disparou,
embora duas hipóteses tenham sido levantadas: corrente elétrica ou descarga
eletrostática (transferência de energia por contato entre dois corpos).
A comissão de investigação descartou a possibilidade de
sabotagem, de grosseira falha humana ou de interferência meteorológica, mas
apontou "falhas latentes" e "degradação das condições de
trabalho e segurança". Esses pontos de fragilidade estavam ligados à
segurança em terra (as saídas de emergência, por exemplo, levavam para dentro
da própria torre de lançamento) e de voo, à perda de pessoal tecnicamente
qualificado e à falta de contratações, à defasagem salarial e de recursos
financeiros, à sobrecarga de trabalho e ao estresse por desgaste físico e
mental dos operadores.
De acordo com o texto, "identificou-se uma
expressiva defasagem entre os recursos humanos e materiais previstos como
necessários ao projeto e os efetivamente disponíveis". Testemunhas ouvidas
na época informaram que não sabiam que os motores de arranque do foguete haviam
sido instalados antes do previsto. Elas ignoravam, portanto, o perigo que
corriam, e algumas chegaram a reclamar de levar choque ao tocar no corpo do
VLS.
Na opinião do presidente da Associação Aeroespacial
Brasileira (AAB), Aydano Carleial, o desastre não foi uma indicação de falta de
capacidade técnica brasileira, mas de ausência de organização e método, pois o
processo foi feito com pressa e de forma improvisada, o que aumentou ainda mais
os riscos.
"O grande problema foi a perda humana. A paralisação
do programa espacial ocorreu mais pela comoção, pela falta de reação, pelo fato
de as promessas não terem sido cumpridas", avalia Carleial, que é
engenheiro eletrônico formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e
trabalhou durante anos no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE),
responsável por fabricar os satélites brasileiros.
Na visão do major-brigadeiro Hugo Piva, um pioneiro do
nosso programa espacial, a falta de verba prejudicou seu avanço. Até 1987,
quando houve uma redução do investimento, os foguetes aprovados para voar não
falharam, aponta. "Depois disso, lançaram três: todos falharam, um
deles causando a maior tragédia da história", destaca Piva, que já não
trabalhava no projeto do VLS em 2003.
Indenização às famílias
As 21 vítimas do acidente foram enterradas com honras
militares, na presença do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e as
famílias receberam uma indenização de R$ 100 mil do Ministério da Defesa, além
de pensões mensais proporcionais ao salário de cada um dos homens mortos.
Alguns parentes também entraram na Justiça para receber
um valor compatível com o que as vítimas ganhariam ao longo de toda a vida
profissional, mas o processo ainda se arrasta nos tribunais. Além disso, o
Ministério do Planejamento está questionando as gratificações pagas nas
pensões, e há a possibilidade de as famílias terem o valor reduzido ou até
terem de devolver parte do que receberam.
O engenheiro de computação Artur Varejão, de 28 anos,
filho do engenheiro mecânico Cesar Augusto Costalonga Varejão, que morreu em
Alcântara, lembra que havia falado com o pai um dia antes da tragédia e que
soube do acidente por uma funcionária da base, pela internet. O anúncio oficial
da tragédia à família só veio às 22h – quase 9h após a explosão.
"Meu pai nem ia lá nesse dia, porque já estava tudo
pronto. Comecei a telefonar, mas celular raramente funcionava lá, então não
estranhei. Aí começou a passar na TV, eram 14h quando fiquei sabendo, deu
plantão na Globo, só estávamos minha mãe e eu em casa", recorda Artur, que
era muito próximo do pai e chegou a trabalhar um ano com ele no INPE.
"Meu pai estava no projeto há 25 anos, era um
entusiasta, mas sempre foi muito realista, sabia dos perigos, da falta de
recursos, da precariedade. Só que parecia que não tinha medo, estava empolgado,
era um projeto de vida também. Aliás, todos eram técnicos ótimos e trabalhavam
meio que por ideologia", diz Artur.
O jovem chegou a acompanhar um teste de ignição de um
propulsor de primeiro estágio do VLS, quando perguntou: "E se isso
explode?" O pai respondeu que não sobraria nem um fio de cabelo, mas que
até então nunca havia acontecido nada.
"Minha desilusão maior é com o governo, que nunca
nos ligou ou enviou um psicólogo. Dez anos é muito tempo para os familiares e a
sociedade terem uma resposta, uma satisfação", afirma Artur.
Mudanças Exigidas
(Foto:
Agência Força Aérea)
Nova sala de controle de lançamento em Alcântara, com sistemas digitais |
Entre as várias recomendações feitas pelo relatório de
investigação após o acidente em Alcântara, foi pedida a modernização da
plataforma de lançamento de foguetes. A atual conta com uma torre de apoio,
para fuga de funcionários em caso de emergência.
Os profissionais agora têm três opções de saída: uma
escada, um poste como o dos bombeiros e um tubo de tecido em que a pessoa se
joga e escorrega até embaixo.
Segundo o presidente da Agência Espacial Brasileira
(AEB), José Raimundo Braga Coelho, a nova torre permite uma fuga rápida, sem
riscos, e tudo o que havia sido perdido foi recuperado e modernizado.
De acordo com ele, o acidente de 2003 permitiu que o
programa espacial brasileiro revisasse todas as atividades operacionais
desenvolvidas na base de Alcântara, a infraestrutura de solo para dar suporte
aos lançamentos, o próprio VLS e seus sistemas.
(Foto:
Agência Força Aérea)
Visão em grande angular da nova torre, com segurança reforçada. |
A previsão da AEB é que um voo-teste do VLS seja feito em
2014, com um segundo lançamento estipulado para 2016, que deve levar uma carga
útil contendo um experimento tecnológico. O foguete completo, em sua quarta
versão (V04), deve ser lançado em 2017, já com um pequeno satélite a bordo.
O primeiro protótipo do VLS (V01) foi lançado em dezembro
de 1997 e o segundo (V02), em dezembro de 1999 – mas ambos falharam e foram
destruídos na partida.
Objetivos do Programa Espacial
Coelho explica que os principais objetivos do programa
espacial brasileiro são fazer com que o país tenha um centro de lançamentos em
operação, foguetes capazes de colocar satélites nacionais em órbita e a
possibilidade de vender esses serviços a outros países.
Para isso, a AEB lançou no ano passado a quarta edição do
Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), que substitui a de 2005 e
vale até 2021. Segundo o texto, essa versão é mais realista que as anteriores,
pois "busca o caminho da realização concreta e produtiva", e não
apenas sonha.
(Foto: Agência Força Aérea)
Imagem externa da nova Torre Móvel de integração (TMI) em Alcântara. |
"Esse é um planejamento de longo prazo, ainda carece
de ajustes, que serão feitos anualmente. Vejo a nossa situação atual com certa
tristeza, gostaria de ver um satélite lançado por mês ou pelo menos seis por
ano", afirma o presidente da AEB.
Ele espera que o orçamento da agência chegue a quase R$
500 milhões em 2014.
Projetos VLS e Cyclone
O programa espacial brasileiro se divide atualmente em
dois grandes projetos para lançar foguetes: o VLS, coordenado pelo Instituto de
Aeronáutica e Espaço (IAE), subordinado ao Departamento de Ciência e Tecnologia
Aeroespacial (DCTA), do Ministério da Defesa; e o Alcântara Cyclone Space
(ACS), uma empresa pública binacional (brasileira e ucraniana) criada em 2006
para lançar satélites por meio do foguete ucraniano Cyclone-4, a partir da base
de Alcântara.
Para Aydano Carleial, da AAB, a parceria com a Ucrânia
tem se justificado economicamente, mas no papel o acordo não prevê
transferência de tecnologia.
“O grande
problema foi a perda humana.
A
paralisação do programa espacial ocorreu
mais pela
comoção, pela falta de reação, pelo
fato de as
promessas não terem sido cumpridas"
Aydano
Carleial,
presidente
da Associação Aeroespacial Brasileira
No caso do VLS, segundo o tenente-coronel Alberto Walter
da Silva Mello Junior, gerente do projeto desde setembro de 2011, o foguete
sofreu uma revisão completa após o acidente de 2003, teve um aprimoramento nos
sistemas de segurança e passou a ser certificado pelo Instituto de Fomento e
Coordenação Industrial (IFI).
"As redes elétricas e pirotécnicas do veículo foram
todas modernizadas. Há vários dispositivos de segurança novos, e o sistema da
plataforma de lançamento também interrompe eventuais descargas elétricas ou
ignição inadvertida", enumera.
Mello Junior destaca que foram listados todos os fatores
que poderiam ter contribuído para o acidente em Alcântara, e cada uma dessas
possíveis causas foi eliminada.
Para o gerente, o VLS é o carro-chefe do programa
espacial brasileiro e gera conhecimento para capacitar o país na conquista do espaço.
Além desse projeto, há parcerias com a Alemanha para produção de foguetes e com
a China para fabricação de satélites.
As Vítimas do Acidente de Alcântara
Amintas
Rocha Brito
Antonio
Sergio Cezarini
Carlos
Alberto Pedrini
Cesar
Augusto Varejão
Daniel Faria
Gonçalves
Eliseu
Reinaldo Vieira
Gil Cesar
Baptista Marques
Gines
Ananias Garcia
Jonas
Barbosa Filho
José
Aparecido Pinheiro
José Eduardo
de Almeida
José Eduardo
Pereira II
José Pedro
Claro da Silva
Luis Primon
de Araújo
Mario Cesar
de Freitas
Levy
Massanobu Shimabukuro
Mauricio
Biella Valle
Roberto
Tadashi Seguchi
Rodolfo
Donizetti de Oliveira
Sidney
Aparecido de Moraes
Walter
Pereira Junior
"Hoje o Brasil é o 11º no índice de competitividade
espacial, segundo o Relatório Futron, uma agência independente que mede o nível
dos países nessa área. E o VLS é de extrema importância para nos qualificar na
concorrência internacional. Se você não desenvolver, ninguém te ensina",
analisa Mello Junior.
Na visão do tenente-coronel, o programa espacial não se
trata simplesmente de lançar um VLS com satélites científicos, meteorológicos,
de defesa ou observação da Terra, mas desenvolver tecnologia para a indústria.
"Mais de 50 empresas trabalham hoje no projeto do
VLS. Desenvolvemos aço de alta resistência que tem sido usado em trens de pouso
de aviões, criamos pás para turbinas de energia eólica, fizemos um sistema de
navegação de aeronaves que informa a posição delas e para onde devem ir,
processamos combustível sólido, entre outras coisas. Nosso objetivo é
desenvolver o país", diz Mello Junior.
"Só vamos ter autonomia completa de comunicação
quando tivermos satélites e condições de lançá-los, senão vamos continuar à
mercê da disponibilidade e da conveniência de outros países. A partir do
momento em que o VLS for lançado, vamos mudar de patamar na comunidade
internacional e melhorar nosso índice de competitividade", avalia o
gerente do projeto, que tem um orçamento anual de R$ 15 milhões. Quando
funcionar efetivamente, será capaz de pôr em órbita um satélite com até 250 kg,
a 750 km de altitude.
Falta de Coordenação Geral
Para Aydano Carleial, presidente da AAB, a participação
de diferentes instituições civis e militares (DCTA, IAE, INPE e AEB) no
programa espacial e o envolvimento de dois ministérios diferentes (da Defesa e
da Ciência, Tecnologia e Inovação) não é ruim, mas a falta de uma coordenação
geral prejudica sua eficácia
(Foto: Carlos Santos/G1)
Major-brigadeiro Hugo Piva, pioneiro do programa espacial brasileiro. |
Ele acredita que precisa haver mais clareza e
consistência com os objetivos históricos do Brasil na área espacial, como a
capacidade de fabricar e lançar satélites de interesse nacional, e o acesso ao
espaço por meio de foguetes brasileiros, lançados do nosso próprio território.
"Essas metas estratégicas são as mesmas há 30 anos.
Por duas décadas, não houve projetos para dar continuidade ao programa. Vários
planos foram concebidos, mas tudo para o futuro. Não considero a falta de
recursos o maior problema, mas a gestão, a organização institucional, a forma
de cobrar resultados. Os projetos precisam ter começo, meio e fim, serem algo
mais responsável", diz.
Carleial lembra que, até hoje, o Brasil só colocou em
órbita dois satélites simples e pequenos 100% nacionais, lançados em 1993 e
1998, respectivamente. O SCD-1 e o SCD-2 recolhem e transmitem dados ambientais
(como temperatura, qualidade da água e características do solo), mas não
processam nem interpretam nada.
Em desenvolvimento, o país tem o satélite Amazônia, que
deve monitorar a região amazônica e está previsto para ser lançado em 2015. Há
ainda o satélite Lattes (que deve ser lançado em 2017 para monitorar as
condições atmosféricas da Terra e fazer uma varredura no céu em busca de fontes
de raio X), o Sabiá-Mar (parceria entre Brasil e Argentina para monitorar o
território marinho das duas costas, que deve ser lançado em 2018) e o CBERS-3
(sigla em inglês para Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, uma
parceria com a China que deve ter seu lançamento até o fim deste ano; os outros
dois anteriores já foram lançados).
*Colaborou Renato Ferezim, do
G1 Vale do Paraíba e Região
(Foto: Agência Força Aérea)
Imagem em grande angular da nova plataforma do VLS na base de Alcântara. |
Fonte: Site G1 do globo.com
Comentário: Senhores, a falta de recursos financeiros, a
falta de recursos humanos, a falta de infraestrutura adequada, a falta de uma melhor
Coordenação Geral, não é o motivo de toda essa situação, são sim os resultados
dela. O motivo dessa situação é a Falta de comprometimento do Governo (leia-se,
Presidência da Republica e Congresso) e no momento que isso mudar, todos esses
problemas serão equacionados com a maior facilidade. Senhores, o Programa
Espacial Brasileiro é um programa governamental, e assim sendo depende de decisões,
ações e cobrança do governo, que, se positivas forem, o programa deslancha, e o
que acontece é que desde COLLOR isso não tem acontecido, e o programa que tinha
(na época dos militares) um tamanho condizente com o país, hoje não tem mais
devido essa mesma falta de comprometimento. O resto caros senhores, é conversa
para boi dormir.
O Iran com todas as dificuldades possíveis e imagináveis já colocou satélites em órbita, agora caminha para lançamentos tripulados tripulados....no Brasil temos toda competência técnica necessária, de sobra.......mas é a falta de vergonha na cara do nosso executivo e legislativo que impede, dificulta tudo. A sociedade precisa dar um basta o quanto antes.
ResponderExcluirMiraglia
www.edgeofspace.com.br
Será que é tão simples assim? trocamos as pessoas no poder e tudo estará resolvido? fazemos isso de 4 em 4 anos e as coisas continuam da mesma maneira, e vai continuar enquanto lançarmos mão de respostas simplistas para problemas muito mais profundos do realmente suspeitamos. Um exemplo verbas para viabilizar os lançamentos propostos para esse ano foram insuficientes e os ditos foram suspensos, mas a licitação para as obras em Alcântara de alguns milhões estão em andamento . enquanto isso no Irã seus foguetes são lançados de plataformas militares no meio do deserto sem qualquer infra estrutura e nós ficamos comendo poeira deles.
ResponderExcluirCaro Daniel!
ExcluirVejo que não entendeu meu comentário, ou não acompanha o que venho dizendo. Aqui não é uma questão partidária, até porque não existem partidos no Brasil e sim legendas, que esses energúmenos se utilizam para chegar ao poder. A questão aqui é de COMPROMETIMENTO, se houver por parte do governo que estiver no poder, seja ele qual for, o programa deslancha, pois temos profissionais qualificados para isso e melhor, interessados em atingir esse objetivo, mas sem COMPROMETIMENTO do governo, tudo continuará como antes no Quartel de Abrantes.
Abs
Duda Falcão
(Blog Brazilian Space)