O Dia Que os Russos Espionaram a Barreira do Inferno
Olá leitor!
Segue abaixo um interessantíssimo artigo histórico postado
dia (10/03) no blog “Tok de História” do escritor natalense Rostand Medeiros, dando
destaque ao dia que os Russos espionaram a Barreira do Inferno.
Duda Falcão
O Dia Que os Russos Espionaram
a Barreira do Inferno
Um
desconhecido episódio da guerra fria em águas potiguares
Publicado em 10/03/2013
Ouve um tempo em que Natal
olhava para o céu e via interessantes rastros espiralados de fumaça branca, que
às vezes marcava grandes extensões do firmamento. Era a época em que Natal
ficou conhecida como “Capital Espacial do Brasil”, termo irradiado
entusiasticamente pelas rádios locais para mostrar a importância do Centro de
Lançamento de Foguetes da Barreira do Inferno, na época um local único no país.
Foto atual do complexo da Barreira do Inferno |
Era a década de setenta do século passado, período em que nosso país
vivia um período difícil, fechado e o mundo estava em plena Guerra Fria, se
mantendo em permanente estado de tensão, sempre com o medo presente de uma
hecatombe nuclear entre os americanos e os russos soviéticos. Este conflito
ideológico era distante de nossa realidade e não dávamos a mínima atenção.
Mas houve um
dia os soviéticos decidiram espionar a nossa Barreira do Inferno.
Natal
Soltando Foguetão
A história
da implantação do Centro de Lançamento de Foguetes da Barreira do Inferno
confunde-se com a história do inicio das atividades espaciais no Brasil.
A ideia de o
Brasil galgar o espaço exterior tem início com o próprio desenvolvimento dos
processos tecnológicos de lançamento de foguetes pelos países vencedores da
Segunda Guerra Mundial. A ideia de ficar para trás neste novo desenvolvimento
tecnológico não passava na cabeça de algumas pessoas inteligentes que havia em
nosso país naquela época. Logo com a criação de instituições como o Instituto
Tecnológico de Aeronáutica (ITA) em 1950 e o surgimento do Centro Técnico de
Aeronáutica, hoje o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), como órgão científico e
técnico do Ministério da Aeronáutica apontava para a necessidade do
desenvolvimento de um projeto de programa espacial brasileiro.
Mas como bem
sabemos, no governo brasileiro aqueles que têm ideias interessantes, têm
proporcionalmente grandes dificuldades no desenvolvimento de seus projetos por
conviverem com medíocres e carreiristas de plantão, que não sabem perceber no
presente as necessidades do futuro.
Mas como
também sempre ocorre no nosso país, só após termos visto que estrangeiros dão
importância a uma determinada coisa, é que iniciamos as mesmas atividades.
Muitos artefatos disparados em cabo Canaveral, eram monitorados pela estação de Fernando de Noronha – Fonte – NASA |
Em
1956 os Estados Unidos chamaram o governo brasileiro para participar como
parceiro na criação de uma estação de rastreio de veículos espaciais no
Arquipélago de Fernando de Noronha. Ali deveriam acompanhar a trajetória dos
artefatos lançados em Cabo Canaveral, na Flórida.
Vendo
que não poderia deixar de participar do desenvolvimento aeroespacial que
acontecia no mundo, o governo brasileiro decidiu construir uma base de
lançamento de foguetes. A princípio foram escolhidos três locais no Nordeste para
a sua instalação: Fernando de Noronha, Aracati (Ceará) e a região próxima a
praia de Ponta Negra. Após uma análise, decidiu-se que Ponta Negra era o local
ideal.
Em
05 de outubro de 1964 teve início a construção das primeiras edificações do
centro de lançamento. Recordo de uma antiga reportagem de um jornal local, que
até mesmo grupos de presidiários de bom comportamento foram utilizados na
construção da estrada de acesso a base. Oficialmente a base foi primeiramente
denominada Campo de Lançamento de Foguetes de Ponta Negra, mas depois receberia
a denominação de Centro de Lançamento de Foguetes da Barreira do Inferno.
Esta
era uma área pouco frequentada por pescadores, pela existência de uma grande
falésia de arenito, muitas pedras e forte correnteza que não ajudava em nada a
navegação das pequenas jangadas dos pescadores da vila de Ponta Negra.
Um recente lançamento na Barreira do Inferno |
Em
15 de dezembro de 1965 ocorreu o primeiro lançamento de um foguete na Barreira
do Inferno. Foi um foguete americano de dois estágios NIKE-APACHE, fruto de uma
nova cooperação entre o Brasil e os Estados Unidos, com a participação de
técnicos da NASA.
Logo
um foguetório de fazer inveja em festa de São João era visto nos céus
potiguares. Chegou um momento que de tão comuns, os rastros dos foguetes já nem
chamavam mais a atenção das pessoas na cidade. De toda maneira o espetáculo
enchia de orgulho o povo de nossa terra, sendo referência no Brasil. Até o
grande sanfoneiro Luiz Gonzaga colocou na sua música “Nordeste prá frente“ o
seguinte refão;
“Caruaru tem sua universidade
Campina
Grande tem até televisão
Jaboatão
fabrica jipe à vontade
lá
de Natal já tá subindo foguetão…”
Participação Estrangeira
Por
sua localização no Nordeste do Brasil, próximo a linha do Equador e suas
instalações, a Barreira do Inferno começou a chamar a atenção dos centros de
desenvolvimento espacial espalhados pelo mundo afora. Vários projetos
internacionais foram firmados entre o nosso país, estados e centro de pesquisa
estrangeira. A NASA e o Max Plank Institute, da então República Federal da
Alemanha, se tornaram utilizadores habituais das instalações da Barreira do
Inferno e seus cientistas eram clientes comuns do novo hotel dos Reis Magos, na
praia do Meio.
Foguetes
tipo Nike-Ajax, Nike-Cajun, Nike-Iroquois, Javelin, Aerobee e outros eram aqui
lançados. De dezembro de 1965 a março de 1972 a Barreira do Inferno já havia
disparado um total de 381 foguetes. O lançamento de número 382 estava previsto
para ocorrer no dia 7 de março de 1972, onde um modelo Black Brant 5C,
fabricado pela empresa canadense Bristol Aerospace e vendido para os alemães
desenvolverem seus projetos de pesquisa espacial, subiria a partir da Barreira
do Inferno.
Esta operação era parte do Projeto Aeros, onde o custo de 1
milhão de dólares do disparo era totalmente financiado pelo estado germânico e
trazia algumas novidades em relação aos lançamentos anteriores. A sua
carga útil de componentes eletrônicos de medição, pesando 98 quilos, seria
recuperada a cerca de 145 milhas náuticas (268 km) de distância da base, o
Black Brant 5C atingiria a altitude máxima de 230 km e após o fim de
combustível cairia livremente até 4.500 metros de altitude, quando seria acionado
seus paraquedas e a carga cairia tranquilamente no oceano. Essa carga seria
recuperada com o trabalho conjunto de uma corveta do Grupamento Naval do
Nordeste da Marinha do Brasil e dois helicópteros SAR da FAB – Força Aérea
Brasileira. Até então eram normalmente eram disparados foguetes cuja área
de recuperação de sua carga útil atingia em média de 40 milhas náuticas (74 km)
e metade da altitude. Diante da situação a FAB e a Marinha criaram uma área de
exclusão ao redor da Barreira do Inferno de 60 milhas náuticas (111 km), onde
todo o tráfego aéreo e marítimo foi expressamente proibido por razões de
segurança.
Durante
a operação a corveta da Marinha ficaria permanentemente em alto mar e caberia
também a sua tripulação a missão de informar a Barreira do Inferno, cinco horas
antes do lançamento, as condições do tempo, velocidade do vento,
visibilidade e cobertura de nuvens. Ainda em relação a meteorologia o
monitoramento também era realizado pelo então Centro Meteorológico do Instituto
de Atividades Espaciais, com sede em São José dos Campos, São Paulo, que
utilizava informações vindas do satélite ESSA-8. Todo este cuidado era
importante, pois naquele início de março de 1972 estava ocorrendo algumas
chuvas na costa potiguar.
O
evento era coberto de extrema segurança e contava com a presença até do então
Ministro da Aeronáutica, o brigadeiro Araripe Macedo, toda a cúpula da FAB, do
setor técnico aeroespacial brasileiro e do pessoal diplomático e técnico
alemão.
P-15 da FAB |
Para
manter a cobertura área segura a FAB disponibilizou duas aeronaves de patrulha
Lockheed P-15 Neptune, pertencentes ao Primeiro Esquadrão do Sétimo Grupo
de Aviação (1º/7º GAv), o conhecido Esquadrão Orungan, sediado em Salvador, na
Bahia.
E
foram os membros deste esquadrão que localizaram em alto mar, às dez horas da
manhã do dia 1 de março, um penetra no foguetório teuto-brasileiro.
O Intruso Vermelho
As
aeronaves de patrulha da FAB eram equipadas com potentes radares de busca,
podiam voar horas sobre o mar e segundo os jornais da época teriam detectado um
forte sinal que aparentava ser de um navio de grande porte, agindo de maneira
suspeita em águas territoriais brasileiras. Prontamente eles foram investigar.
Navio Cosmonauta Iuri Gagarin – Fonte – Wikipédia |
Os
tripulantes se depararam com um grande navio pintado em cor clara, equipado com
enormes antenas parabólicas, navegando lentamente a cerca de 144 milhas
náuticas (266 km) da costa de Natal. Os dados mostraram que o tal navio estava
56 milhas náuticas (103 km) dentro de águas territoriais brasileiras, em clara
violação segundo as leis brasileiras.
Vale
frisar que nesta época a União Soviética não reconhecia o mar territorial
brasileiro como tendo 200 milhas náuticas. O decreto ampliando a nossa faixa
marítima havia sido instituído apenas em 1970 e além dos soviéticos
os arquivos do Itamaraty registram notas de protesto, ou de não reconhecimento,
ou de reservas quanto ao ato unilateral de ampliação do mar territorial, vindos
da Bélgica, Estados Unidos, Finlândia, França, Grécia, Japão, Noruega, Reino
Unido, República Federal da Alemanha e Suécia.
Mas
para os aviadores do P-15 Neptune, os soviéticos e seu grande navio
estavam sim em nossas águas territoriais e, ou caiam fora, ou poderiam sofrer
alguma consequência. E aquele não era um naviozinho qualquer, era o grande
e recém-lançado navio soviético de monitoramento espacial Cosmonauta Iuri
Gagarin.
Um
verdadeiro monstro com 230 metros de comprimento, autonomia de 24.000 milhas
náuticas (44.448 km) e uma tripulação de 180 pessoas, onde entre estes haviam
os mais especializados técnicos de monitoramento e rastreamento eletrônico da
extinta União Soviética. Em operação desde dezembro de 1971, a silhueta do
navio Cosmonauta Iuri Gagarin se caracterizava pela existência de quatro
grandes antenas parabólicas e elas serviam para monitorar tudo que fosse
interessante e relativo a área espacial produzido pelos países ocidentais.
O Iuri Gagarin e sua inconfudível silhuetaFonte – Wikipédia |
Apesar
de vivermos o período de extrema censura jornalística durante a ditadura
militar brasileira, o interessante neste caso foi que os militares não negaram
aos jornais praticamente nenhuma informação sobre a presença deste “intruso
vermelho” em nossas águas. Desejavam mostrar que as nossas Forças Armadas
estavam atentas a movimentação daquele barco carregado de alta tecnologia russa
e em clara missão de espionagem tecnológica.
E
não podemos negar que o pessoal do Esquadrão Orungan estava realizando
corretamente seu trabalho. Segundo o então comandante da operação de lançamento
do foguete Black Brant 5C, o coronel aviador Paulo Henrique Correia do
Amarante, não havia dúvidas que o navio Cosmonauta Iuri Gagarin estava no mar
territorial brasileiro para monitorar e rastrear o lançamento do foguete
adquirido pelos alemães.
Ele
afirmou que após a localização visual do navio, ocorreu uma primeira passagem
para fotografias e depois os P-15 Neptune da FAB realizaram voos rasantes
“raspando as antenas e o mastro do navio soviético”. A tripulação do Iuri
Gagarin prontamente acelerou as máquinas e deslocou a nave para fora de nossas
águas territoriais, em uma direção que o conduzia a região do Arquipélago de
Fernando de Noronha. O coronel Paulo Henrique chegou mesmo a apresentar
fotografias do navio espião à imprensa.
Foi divulgado que no dia 6 de março os P-15 Neptune
retornaram a missão de buscas ao navio Cosmonauta Iuri Gagarin, em uma operação
que durou mais de cinco horas, alcançando uma área de 900 milhas náuticas de
patrulha, incluindo Fernando de Noronha. Foi utilizado constante busca por
radar, foram levados cinegrafistas para registar a presença da nave, mas o
grande navio não voltou a ser localizado.
Desenho do P-15 da FAB – Fonte – wp.scn.ru |
Para
os militares brasileiros o lançamento do foguete Black Brant 5C e a parceria
teuto-brasileira não tinha nada de secreto. Tanto que as atividades na Barreira
do Inferno eram amplamente divulgadas, até como forma de mostrar que o governo
militar era atuante e tecnologicamente moderno. Deduziu-se que a presença
do navio Cosmonauta Iuri Gagarin, violando as novas águas territoriais
brasileiros e arriscando um possível problema diplomático, era um claro aviso
aos alemães que os soviéticos estavam plenamente atentos as suas atividades
aeroespaciais, ocorressem elas onde ocorressem.
Esta
situação de bisbilhotagem eletrônica entre a extinta União Soviética e os
países ocidentais eram ações mais do que corriqueiras durante a chamada Guerra
Fria. Eles se xeretavam mutuamente na tentativa de descobrir os avanços
tecnológicos dos inimigos e muitas vezes estas ações serviam para mostrar ao
adversário que o outro lado estava atento e alerta.
Nós
brasileiros é que não estávamos acostumados com este tipo de coisa.
E a Visita das Baleias
Serguei
Mikhailov, o então embaixador soviético no Brasil na época negou qualquer
declaração por parte daquela representação diplomática e não sei se o Itamaraty
chegou a emitir alguma nota de desagravo. desconheço se o caso teve maiores
desdobramentos diplomático.
Apesar
de alguns atrasos devido à chuva, exatamente as 7h32m53s da manhã do dia 8 de
março de 1972 o foguete Black Brant 5C foi lançado da Barreira do Inferno em
direção ao sol.
O
artefato alcançou 230 km de altitude e precisamente 10 minutos e 15 segundos
após o lançamento a sua carga útil de equipamentos eletrônicos de medição tocou
o Oceano Atlântico a 15 milhas náuticas (28 km) da corveta da Marinha. Já os
P-15 Neptune da FAB localizaram visualmente a cápsula no mar e apoiaram a
chegada do navio da marinha brasileira.
Os
militares da FAB não avistaram o navio Cosmonauta Iuri Gagarin, mas informaram
que foram visualizadas duas graciosas e grandes baleias próximas ao artefato
aeroespacial. Consta que os cetáceos se mostraram completamente indiferentes
com a presença humana no seu território, com as tolas diferenças ideológicas
dos homens e com seus brinquedinhos tecnológicos.
Fontes
– Reportagens publicadas no periódico carioca Jornal do Brasil, edições de 7,8
e 9 de março de 1972, respectivamente nas páginas página 18, 7 e 4.
*
Fonte: Blog do Tok de História - http://tokdehistoria.wordpress.com/
Comentário: Veja você leitor que nem eu sabia desse
incidente, e note como é importante para o Brasil um sistema de inteligência
eficiente e efetivo. E olha que estamos falando da Rússia, mas precisamente da URSS
- União das Republicas Socialistas Soviéticas (como era conhecido na época da
Guerra fria esse país), nação que nas últimas duas décadas têm colaborado com
o Programa Espacial Brasileiro. O que dizer do acidente de Alcântara onde se
suspeita de sabotagem americana? Pois então, que ese incidente sirva de alerta, é preciso que as autoridades
militares tenham preocupação com isso, já que esse governo de energúmenos que
temos é omisso e irresponsável. Sei que o COMAER tem desde o acidente de
Alcântara investido muito em segurança e creio que também em inteligência tanto
no CLBI como no CLA, mas é preciso muito mais e talvez a solução seria uma ação
conjunta de todas as três armas criando um sistema de inteligência conjunto para
coibir essas ações hostis de nações estrangeiras em áreas estratégicas de
segurança nacional como os institutos e empresas de São José dos Campos, o Centro
Experimental de Aramar, o IME, enfim todas áreas de segurança nacional, principalmente agora com a chegada ao país desse Centro da Boeing que é nada mais, nada menos, do que uma base da CIA para atividades de espionagem implantada em território brasileiro. Não
podemos esperar uma ação efetiva dos “Companheiros” e de sua "PresidentA" nesse
sentido, e o Brasil não pode e não deve ficar a mercê da omissão e da irresponsabilidade desses energúmenos. Gostaríamos de agradecer ao leitor paulista José Ildefonso pelo
envio desse interessantíssimo artigo histórico.
Meu pai já falecido, na época era operador de radar do P15 7000, e participou destas missões, conforme sua caderneta de vôo.
ResponderExcluirMeu pai já falecido, na época era operador de radar do P15 7000, e participou destas missões, conforme sua caderneta de vôo.
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