USP Debate Perspectivas Científicas Após Bóson de Higgs
Olá leitor!
Segue abaixo uma nota postada ontem (16/08) no site da
“Universidade de São Paulo (USP)” destacando que o Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP debate Perspectivas
Científicas
após confirmação do Bóson de Higgs.
Duda Falcão
Ciências
IEA Debate Perspectivas Científicas
Após Confirmação do Bóson de Higgs
Por Luiza Caires
USP Online Destaque
16/08/2012
Foto: CERN
LHC, na Suíça - onde tudo termina ou apenas começa?
No mês passado, o anúncio da detecção experimental de uma
partícula que tem tudo para ser o bóson de Higgs deixou a comunidade
científica em polvorosa. Principalmente quem fez parte dos experimentos com os
grandes aceleradores, que levaram décadas, muito suor – e recursos – para
chegar a este resultado.
Mas abusando de metáforas explosivas, podemos dizer que
os físicos ainda colidem ao avaliar se o modelo padrão, que em tese a
descoberta confirma, é a fronteira final da física de partículas.
O pesquisador Sérgio Ferraz Novaes, do Instituto de
Física Teórica da Unesp, é um dos que trabalhou nos experimentos iniciais na
Suíça para detectar o bóson de Higgs. Foi ele também um dos primeiros
pesquisadores brasileiros a publicar um artigo sobre os mecanismos de produção
do bóson de Higgs, ainda nos anos 80. Passado o período de comemorações mais
efusivas, Novaes se juntou na tarde desta quarta-feira (15) aos professores Mahir
Saleh Hussein, Gustavo Burdman e Dionísio Baseia, do Instituto de Física (IF)
da USP, e ao vice-diretor do IAG, Laerte Sodré Jr., para debater as
perspectivas da física após este fato.
O Nano do Nano
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
No encontro realizado no Instituto de Estudos Avançados
(IEA) da USP, Sérgio Novaes destacou o estado da arte privilegiado da física de
partículas, já que desde o início do século XX, quando surgiu a proposta de
utilizar as colisões para investigar a estrutura da matéria, muito se avançou
na compreensão do que a matéria é composta e das forças que agem na natureza.
“Antes conhecíamos
basicamente do que é composta a tabela periódica, com uma escala média de -10
metro, que é a escala do átomo. Progredimos de tal forma que conhecemos o que
está dentro dos prótons, numa escala aproximada de 10-18 metro.
Estamos explorando hoje o nano do nano, considerando que a escala nanométrica é
de 10-9“, ressaltou.
“Estamos explorando
hoje o nano do nano,
considerando
que a escala nanométrica é de 10-9.”
Referindo-se
ao modelo padrão, ele apontou que os cientistas foram capazes de criar um
quadro bastante consistente dos building blocks (partículas
fundamentais, que compõem as demais partículas), quarks, léptons,
e bósons que intermediam as interações. Essas interações incluem a força
eletromagnética; a interação fraca – força que afeta quarks e
léptons, responsável pelo decaimento beta (quando o neutron se transforma num
próton emitindo um eletrón e um anti-neutrino, em um processo bastante
utilizado pela medicina para diagnóstico e radioterapia), e que é mediada por
bósons W e Z; e a interação forte – força que mantém os quarks unidos em
hádrons, esta mediada pelos gluóns.
Segundo o
físico, o bóson de Higgs era justamente a peça faltante predita pelo modelo
padrão – e que parece ter sido encontrada.
Dando o
panorama histórico dos estudos e experimentos que culminaram na caça à
partícula de Higgs e no reinado do modelo padrão, Novaes apontou o papel de uma
teoria em particular, a QED (sigla em inglês para eletrodinâmica quântica).
Combinando a
mecânica quântica com a relatividade especial de modo a descrever os fenômenos
eletromagnéticos, ela é simplesmente “a melhor teoria que se tem disponível na
atualidade”. Não porque seja “a mais bonita”, mas por estar de acordo de
maneira mais precisa com as medições que foram averiguadas experimentalmente,
tornando-a um protótipo para a construção de outros modelos.
Foto: CERN
Analogamente,
o modelo padrão seria o que descreve com maior precisão experimental as forças
fundamentais e também as partículas que constituem toda a matéria. Ele se
assenta sobre a QED, complementada pela teoria eletrofraca (ambas descritas
pela teoria quântica de campos), e teria sido confirmado de maneira notável
pelos testes no LHC.
“O acordo
que se conseguiu entre a teoria e a prática nestes últimos dez anos é algo
impressionante. O modelo ganhou o respeito da comunidade porque faz predições
contundentes, e todas elas se mostraram verdadeiras – até mesmo o bóson de
Higgs, que resistia a ‘dar as caras’ de maneira aberta nos experimentos”,
finalizou.
O Problema da Massa
Imagem: IF-USP
Partículas elementares |
Gustavo Burdman, docente do IF, conduziu sua
apresentação por uma pergunta principal: a descoberta do bóson de Higgs seria o
capítulo final da física ou simplesmente, por enquanto, do modelo padrão, com
sua última peça revelada?
Com exceção da gravidade, que não pode ser testada em
experimentos com aceleradores, “a cromodinâmica quântica descreve as interações
entre as partículas elementares. quarks e leptons são as partículas de spin
1/2, que podemos chamar de matéria elementar. E as interações são intermediadas
pelos bósons, como fótons, gluóns, bósons W e Z”, pontua Burdman.
Acontece a
simetria do modelo padrão proíbe que as partículas elementares tenham massa.
Mas sabemos que as partículas como férmions, e bósons W e Z têm sim massa. Como
explica o pesquisador, é o mecanismo de Higgs que permite que elas adquiram
massa, respeitando-se ao mesmo tempo a simetria das interações, pela chamada
quebra espontânea de simetria. Para isso supôs a existência de uma outra
partícula – o bóson de Higgs.
Ainda assim,
Burdman indica aspectos que permanecem em aberto no modelo padrão, “perguntas
que ele não responde”. Por exemplo, os bósons W e Z têm aproximadamente 100
vezes a massa do próton. Mas quanto aos férmions, há uma grande hierarquia de
massas que não tem explicação pelo modelo padrão.
As
interações com o Higgs são responsáveis por dar massa aos férmions (nome dado a
todas partículas elementares, exceto os bósons). O chamado acoplamento
dá o elétron uma massa da ordem de 10-31 kg.
Existe uma
partícula ‘parente’ do elétron, o muón, cuja única diferença para ele é a
massa. Esta massa é mais de 200 e vezes maior do que a do elétron. O mesmo
acontece com quarks idênticos entre si quanto a todas as variáveis, menos suas
massas, bem discrepantes. É o caso dos quarks u (do inglês up,
para cima) em relação aos ‘quarks estranhos’.
Além disso,
se o bóson de Higgs, é o que dá massa às demais partículas, elétrons, quarks,
“de onde vem esta partícula?”, questiona. “É unica partícula do modelo padrão
que tem spin zero, então sua origem não pode ser a mesma das que tem spin
diferente de zero”.
O
pesquisador listou ainda outros problemas não resolvidos pelo modelo padrão,
entre eles as questões da matéria escura, da massa dos neutrinos, e a violação
da simetria matéria/antimatéria (a diferença que se verifica na produção de
antimatéria e matéria é muito pequena, desproporcional à quantidade muito maior
de matéria que existe no universo em relação à antimatéria).
Então,
defende Burdman, “existe sim física além do modelo padrão”.”
Valor
Financeiro, Valor ‘Espiritual’
Foto: Marcos
Santos/USP Imagens
Fechando o
debate, os outros especialistas participantes colocaram seus questionamentos a
Sérgio Novaes e Gustavo Burdman.
Uma das
perguntas era como justificar o alto custo de um projeto como o do CERN, a
Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear. “Vale a pena?”, indagou Dionísio
Bazeia, procurando na verdade refletir a voz da sociedade fora da comunidade
científica, que certamente se questiona sobre isso.
Para Novaes,
a sociedade tem todo direito de perguntar, não apenas isso, mas também, por
exemplo se vale a pena por mandar o Curiosity para Marte. “Houve uma
discussão muito grande no congresso norte-americano, entre Kennedy e os
senadores, se a missão à Lua realmente valeria a pena – e os Estados Unidos
tiveram a sorte de ter um presidente que defendeu uma posição arrojada de levar
à frente esse desafio.”
Na opinião
do pesquisador da Unesp, a humanidade tem que decidir onde vale a pena investir
seus recursos. “Vai se continuar jogando futebol? Vai se gastar a fortuna que
se gasta para reformar um estádio? Vamos continuar sustentando a Orquestra
Sinfônica de São Paulo? Qual a resposta para isso?”
Sérgio
Novaes resiste à ideia de ter que lançar mão dos chamados de ‘benefícios
secundários’ para justificar “a aventura que é um projeto como este”. Lembrou
que a World Wide Web (WWW) foi desenvolvida no CERN, e também das centenas de
inovações geradas lá e aplicadas em equipamentos médicos. Mas negou que estas
justificativas sejam um bom motivo para se continuar investindo em física de
altas energias.
“Perguntar
qual a utilidade de tudo isso é o mesmo que perguntar qual a
utilidade de
se fazer música ou filosofia. Acredito que tudo isso, somado,
faz a
aventura do homem na superfície da Terra mais gloriosa, divina.”
Burdman
também ressaltou o valor espiritual desta busca. Não no sentido religioso, já
que é opinião unânime entre os cientistas ser saudável que ciência e religião
permaneçam o mais separadas possível. Até porque elas estão, como dizem os
céticos, em mãos opostas: uma deve começar duvidando, enquanto a outra
pressupões que se comece acreditando.
Fonte: Site da Universidade de São Paulo (USP)
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