Astrônomos da USP Tiram Dinheiro do Próprio Bolso Para Pagar Pesquisa
Segue abaixo uma interessante matéria postada hoje (24/07)
no site do jornal “Folha de São Paulo”, destacando que Astrônomos da USP tiram
dinheiro do próprio bolso para pagar pesquisa.
Duda Falcão
CIÊNCIA
Astrônomos da USP Tiram Dinheiro do
Próprio Bolso Para Pagar Pesquisa
Por GIULIANA MIRANDA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
24/07/2016 - 02h00
Foto: Marcos Leoni/ Folhapress
O professor de astronomia da USP Jorge Meléndez. |
Após corte de cerca de 80% de recursos, entre bolsas e
outras verbas de financiamento, pesquisadores de um dos principais grupos de
astronomia do Brasil estão recorrendo a vaquinhas virtuais, “favores” de
universidades estrangeiras e até ao próprio dinheiro para continuar as atividades
e se manter em nível competitivo internacional.
O ramo da astronomia e da astrofísica demanda altos
investimentos em instrumentos de observação, capacitação e deslocamentos, seja
para observações astronômicas ou para a participação em congressos e
treinamentos.
Responsável no ano passado pelo primeiro exoplaneta (planeta
fora do Sistema Solar) descoberto por um grupo brasileiro, o professor de
astronomia da USP Jorge Meléndez diz que o bom desempenho científico de seu
grupo não foi suficiente para garantir os recursos necessários para tocar os
trabalhos.
“Tentamos contornar do jeito que dá, mas está bem
difícil. Para ajudar meus alunos, eu tenho tirado dinheiro de minha reserva
técnica do meu próprio projeto. Também tentamos obter dinheiro de todos os
lados, como parcerias com universidades do exterior e a própria organização dos
congressos”, diz.
Aluno de doutorado em astronomia na USP, Henrique
Reggiani também precisou complementar do próprio bolso para conseguir se manter
na Alemanha durante um período de estágio de capacitação em espectrometria
avançada para sua pesquisa.
“Era uma oportunidade muito boa, Avaliei que valia ir
mesmo assim”, explica.
Colega de Henrique no doutorado, a astrônoma Marília
Corrêa Carlos, tenta um financiamento coletivo virtual para tentar garantir sua
participação em um congresso em Porto Alegre.
Líder do projeto Sampa (Stellar Atmospheres, Planets and
Abundances), Meléndez avalia que a situação da pesquisa no Brasil se deteriorou
nos últimos dois anos, Ele critica algumas políticas de financiamento, como Ciências
sem Fronteiras (programa federal de intercâmbio), que em sua opinião tiveram
recursos “mal empregados”.
“ O problema é que os cortes de hoje muitas vezes só vão
ser percebidos lá na frente, quando os nossos equipamentos já não conseguirem
dar conta do trabalho”, diz.
As verbas para pesquisa no Brasil como um todo têm
sofrido sucessivos cortes.
O investimento do CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico)em auxílio a pesquisa caiu 50% em 2015
em comparação com 2014. Os números preliminares já liberados sobre 2016 não
mostram qualquer tendência de recuperação.
Coordenadora da pós-graduação em astronomia do IAG
(Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP, Silvia
Rossi diz que os cortes atingiram tanto as verbas para compra de equipamentos
quanto as bolsas de pesquisa.
“Eu tento contemplar todo mundo e ajudar como dá, mas houve
um corte muito expressivo dos recursos, especialmente da CAPES [Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal , ligada ao Ministério da Educação] “, diz. “Eles cortaram bolsas
que supostamente estavam ociosas, mas era um período em que os alunos da
graduação estavam se formando e iam realizar procedimentos para avançar para a
pós”, diz Rossi.
A coordenadora também afirma que houve redução de bolsas
da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) – eram 44 em
2013 contra 27 em 2015 – e uma dificuldade adicional imposta pela agência.
“A FAPESP leva em consideração o histórico do aluno na
graduação na hora de conceder uma bolsa de pós-doutorado. Há situações muito
complicadas. Tive um aluno cujo o pai morreu no primeiro ano da faculdade e
isso obviamente se refletiu no desempenho acadêmico dele. Mesmo com um bom
desempenho na pesquisa hoje, ele não consegue bolsa de lá”
OUTRO LADO
O diretor-científico da FAPESP (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo), Carlos Henrique Brito Cruz, afirmou que os
cortes nas bolsas e verbas aconteceram de uma maneira ampla devido à queda da
arrecadação de impostos do Estado de São Paulo, que é a fonte de financiamento
da agência.
Brito Cruz diz concordar com os critérios de desempenho
rígidos para a concessão das bolsas.
“Tendo em vista que essas bolsas serão pagas com dinheiro
do contribuinte, elas tem mesmo de ser dirigidas a estudantes que tenham
excelente históricos acadêmicos”.
“A astronomia é uma área prioritária para a FAPESP, temos
grandes projetos que estão indo muito bem. O GMT (Giant Magellan Telescope) já
recebeu R$ 48 milhões.”
Procurada, a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior) não comentou os cortes de recursos até a conclusão desta reportagem.
Fonte: Jornal “Folha de São Paulo” - 24/07/2016
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