Projeto ITASAT-1 - Plataforma Experimental Para Missões de Comunicações e Imageamento com Nanosatélites.

Olá leitor!

Trago agora para você um artigo escrito pelo Major Eloi Fonseca, professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Coordenador do projeto do nanosatélite ITASAT-1, escrito para esclarecer melhor para sociedade as ações deste projeto em resposta ao artigo “AEB Enterra “ITASAT” Após Gastar R$ 15 milhões no Projeto” escrito pela diretória do SindCT e postado na edição de agosto do Jornal do SindCT.

Duda Falcão

Projeto ITASAT-1 - Plataforma Experimental Para Missões de Comunicações e
Imageamento com Nanosatélites.

Por Major Eloi Fonseca - ITA
08/09/2014

Dentro de uma proposta inicial de apresentar o projeto ITASAT-1, o contexto geral do projeto será exposto neste artigo, sendo periodicamente enviados detalhes dos experimentos e fases em andamento da integração e testes dos sistemas.

O projeto ITASAT até meados de 2013 visava o desenvolvimento de um microsatélite com dimensões aproximadas de 50 cm de aresta e peso até 80 kg. Nesta configuração todos os subsistemas seriam projetados, desenvolvidos, integrados e testados por alunos. Os requisitos de projeto eram rígidos, muito próximos a requisitos operacionais, que incluíam técnicas de redundância em hardware e em software, além de utilização de componentes qualificados para aplicações espaciais, com tolerância a radiação.

Neste contexto o projeto se mostrou pouco viável em termos de cronograma uma vez que o projeto conta com mão-de-obra rotativa (estudantes de graduação em sua maioria) e com pouca experiência em projetos, e custo, pois, a aquisição de componentes qualificados espacialmente tem custo elevado (da ordem de até 100x o custo de um componente equivalente comercial), e em muitos casos a aquisição destes componentes não é possível para o mercado brasileiro devido a embargos internacionais.

Tendo em vista estas dificuldades e procurando adequar o projeto as tendências internacionais de projetos de pequenos satélites e considerando também demandas para aplicação de pequenos satélites em missões estratégicas de defesa para o Brasil, foi proposta a mudança da arquitetura do satélite, para seguir o padrão de cubesats (acrônimo de cube e satellites).

Nesta nova configuração o satélite ITASAT-1 é um satélite padrão 6U, com massa estimada em até 8 kg. Os subsistemas do satélite são em sua grande maioria componentes comerciais disponíveis para aplicação espacial e o foco do projeto passa a ser a engenharia de sistemas, integração e operação do satélite.

O desenvolvimento de projetos de satélites em universidade nos últimos anos tem dado destaque ao desenvolvimento de pequenos satélites, em especial cubesats A utilização de cubesats tem recebido inclusive destaque em operações comerciais para prova de conceito ou tem sido objeto de estudo de grandes agências internacionais, como a Nasa e ESA. Os cubesats são definidos segundo um padrão 1U, que é um cubo de 10 cm de aresta e a partir destas medidas pode ser derivado em 1U, 2U, 3U, 6U e outros. Sua aplicação tem sido bastante explorada e atualmente existe uma padronização para os cubesats até 3U. Juntamente com filosofia de cubesats surgiu também a filosofia de padronização de placas de circuito impresso, equipamentos, protocolos de comunicação para serem utilizados em conjunto, e neste contexto várias empresas oferecem produtos comerciais para aplicação espacial, tais como ESL, GOMSpace, ClydeSpace, Tyvak, ISIS entre outros.

A proposta deste artigo é apresentar o projeto ITASAT em sua configuração atual.

II. A Missão ITASAT-1

O projeto ITASAT faz parte das ações a Agência Espacial Brasileira (AEB) para fomentar projetos na área espacial. A missão do primeiro satélite do projeto, o ITASAT-1, é principalmente capacitar recursos humanos para projetos de aplicação espacial. Para atingir este objetivo o foco do projeto não é desenvolver os subsistemas do satélite, mas sim integrar soluções disponíveis de modo a atender os requisitos de projeto, dentre os quais pode-se destacar:

* Vida útil de 1 ano em órbita LEO;

* Estar de acordo com o código de conduta para mitigação de detritos espaciais;

* Redução de volume e massa, devido a custos de lançamento;

* Custo para finalização do projeto limitado;

* Janela de lançamento para o segundo semestre de 2015;

* O satélite deve servir de plataforma para futuras missões estratégicas;

* Uma das cargas úteis deve ser um transponder de coleta de dados desenvolvido pelo INPE CRN;

* Receber os dados de telemetria dos demais experimentos e status do satélite;

* Equipe de desenvolvimento limitada a 10 estudantes; e

* Permitir o teste de cargas úteis em voo

Características da missão
Vida útil
1 ano
Peso
< 8 kg
Dimensões
100 x 226,3 x 340,5 mm
Controle de Atitude
Estabilizado em 3 eixos
Atuadores: Magneto torqueadores e rodas de reação
Sensores: sensor solar, magnetômetros e girômetros
Controle Térmico
Passivo (a ser confirmado após análise térmica)
Comunicação
VHF, UHF and S-Band
Supervisão de bordo
Processador dedicado com interfaces de expansão
Geração de energia
Painéis solares em 5 faces
Baterias de Litium Ion
Estrutura
6U
Cargas úteis
DCS / GPS / Placa de sensores / câmera / experimento de comunicação com a comunidade de radio amador

A vida útil de 1 ano define a altitude mínima que o satélite deve ser lançado, o que em estudos preliminares mostra que a altitude mínima deve ser cerca de 400 km de altitude.

Será considerada a relação área/massa para realizar o decaimento natural do ITASAT e atender o código de conduta. Esta condição limita a altitude máxima que o satélite pode ser lançado para que o mesmo reentre na atmosfera terrestre e se queime dentro do prazo de 25 anos após a vida útil. Estudos preliminares mostram que esta altitude é de aproximadamente 600 km de altitude

Grafico 1 – Projeção de decaimento do satélite

Um fator importante a ser analisado na missão é a análise de tempo de contato para uma órbita LEO. Esta análise é importante para determinar a quantidade de dados de telemetria que poderão ser recebidos pelo segmento solo. Fator importante para o dimensionamento correto da memória de massa e para a alocação adequada de memória para cada um dos equipamentos do satélite e cargas úteis. Para uma altitude de 400 km em média o tempo de contato é de 470 s e o máximo será de 600 s. Para uma altitude de 1000 km em média o tempo de contato é de 800 s e o máximo será de 1000 s.

Outro fator importante é para a órbita em função de disponibilidade de lançamento polar, seja feita a análise de tempo de iluminação e penumbra, como mostrado a seguir. Esta análise é importante para determinar o pior caso para o subsistema de potência, onde a bateria deverá ser usada com maior frequência e influencia na autonomia do satélite para executar a missão.

Fig. 1 – Análise de tempo de iluminação, penumbra e umbra

Para uma órbita LEO (de 400 km a 1000 km de altitude).

* 400 km

* iluminação: 57 minutos
* Umbra: 37 minutos
* Período orbital: o94 minutos

* 1000 km

* Iluminação: 71 minutos
* Umbra: 35 minutos
* Período orbital: a106 minutos

Outro aspecto importante de missão são os modos de operação do satélite, que são influenciados diretamente pela capacidade de geração de energia e autonomia do satélite, características das cargas úteis e requisitos de operação.

A Fig. 2 mostra os modos de operação propostos para o ITASAT-1.

Fig. 2 – Modos de operação do ITASAT-1

III. Segmento Espacial – O Satélite

O segmento espacial é composto basicamente pelo satélite. Os equipamentos e componentes do satélite ITASAT-1 foram selecionados para atender os seguintes requisitos:

- Componentes comerciais que atendam ao padrão cubesat.
- Componentes com histórico de voo
- Componentes com compatibilidade com diversos fabricantes

A arquitetura proposta para o ITASAT-1 é apresentada na figura abaixo:

Fig. 3 – Arquitetura do Projeto ITASAT

É importante ressaltar que o satélite ITASAT busca ser uma plataforma flexível para diversas missões, e neste contexto busca-se uma arquitetura modular em que se possa trocar componentes e cargas úteis aproveitando-se o máximo possível do conhecimento já adquirido. Para manter esta flexibilidade, procurou-se criar o conceito de Plataforma, onde estão os subsistemas essenciais e comuns a todos os satélites e as cargas úteis ou experimentos.

III.1. A Plataforma

A plataforma ou módulo de serviço do projeto ITASAT e seus subsistemas são descritos a seguir:

* Subsistema de Estrutura e Térmico;

* Subsistema de Supervisão de Bordo;

* Subsistema de Controle de Atitude;

* Subsistema de Geração e distribuição de energia; e

* Subsistema de Telecomando e Telemetria.

Visando a necessidade de conversão de protocolo físico e logico, interfaces de integração foram desenvolvidas permitindo adaptar as placas microprocessadas como o computador de bordo aos requisitos de características de periféricos e expansão de Entradas e saídas analógicas e digitais conforme a necessidade do projeto. Estas placas estão sedo desenvolvidas em conjunto com a UNISINOS.

Fig. 4 – Exemplo de uma interface de expansão

III.2 As Cargas Úteis

Fig. 5 – Transponder de coleta de dados DCS

Fig. 6 – GPS ORION

Fig. 7 – Sensores

Fig. 8 – Camera 4Mpixels resolução 80m a 600km de altitude.

Serão realizados experimentos de comunicação com a comunidade de rádio amadores, sobre o envio de pacotes de dados e sua difusão operando como datarelay.

IV. Segmento Solo

O Segmento solo da missão ITASAT-1 deve ser divida em duas partes, uma que diz respeito ao segmento solo da plataforma e outro específico da carga útil DCS.

IV.1 Segmento solo da Plataforma (TMTC)

Fig. 9 – Segmento solo – Estações de rastreio

Estação solo principal instalada no ITA.  Software de Operação do Satélite

Cooperação com outras universidades, tais como Escola Politécnica da USP, Universidade Federal de Santa Maria, Instituto Federal Fluminense e toda comunidade de radio amador.

Fig. 10 – Diagrama em Blocos da Estação solo instalada no ITA.

IV.2 Segmento solo DCS

Fig. 11– Estações de Rastreio do DCS

Fig. 12 – Plataformas de coleta de dados
espalhadas pelo território brasileiro.

VI. Apresentação do Lay-Out

A estrutura do ITASAT-1 esta documentada com todas as placas, estrutra externa, painéis solares  e antenas de forma a permitir a construção de um plano de integração modular, cada módulo é integrado individualmente e após esta integração física e testes do módulo é realizada a montagem na estrutura externa.

Fig. 13– Projeção em perspectiva do ITASAT-1 com Painéis Solares

Fig. 14– Projeção em perspectiva do ITASAT-1 sem os Painéis Solares

Fig. 15– Projeção em perspectiva de um dos módulos individuais

Fig. 16– Projeção em perspectiva da distribuição dos módulos na estrutura 6U

VI. Conclusões

O projeto ITASAT tem como principal proposta treinar mão de obra e recursos humanos para projetos em setores espaciais. O foco principal do projeto é aplicar a engenharia de sistemas para integração de soluções comerciais de modo a atender as necessidades da missão. Outro foco é o desenvolvimento do software de bordo o desenvolvimento de filosofias e planos de integração e testes.

Outro fator importante do projeto é provar que é possível utilizar pequenos satélites em missões estratégicas, como por exemplo, o experimento com a comunidade de rádio amador, que irá permitir a troca de mensagens entre radio amadores utilizando o satélite, permitindo que estes se comuniquem mesmo em grandes distâncias, às vezes em outros continentes, ou por exemplo o uso de pequenos satélites para missões de imageamento de pontos específicos do globo.

A vantagem do uso de pequenos satélites em face ao projeto de satélites convencionais é o custo, menor prazo de desenvolvimento e maior facilidade para lançamento. Pequenos satélites podem ser utilizados como plataformas de teste de novas tecnologias a um menor custo, sem agregar riscos as missões já estabelecidas.

Uma vez que o centro de missão está instalada no ITA e o software de bordo e de operação do satélite serão desenvolvidos pela equipe de projeto, capacita-se pessoal para operação de satélites, permitindo-se inclusive utilizar a estação solo como treinamento prático de operadores. Ressalta-se que a estação solo se encontra operacional e rastreando satélites como o NanosatC-BR1.

Reportagem da TV Novo Tempo sobre o Projeto

Comentários

  1. Excelente artigo, muito esclarecedor. Meus parabéns Eloi !

    Ficou no entanto uma dúvida. Eu pensava que as medidas máximas externas desses modelos múltiplos tinham que ser múltiplos de cubos com 10 cm de aresta.

    Nota-se pela descrição e pelos desenhos que existem espaçadores entre os módulos, e "meio espaçadores" nas extremidades. A medida externa que eu esperava de um 6U era de 100 x 200 x 300 mm. Será que a medida máxima padrão só se aplica ao módulo único? Alguém pode esclarecer?

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    1. Ola Marcos Ricardo, sua pergunta foi bem interessante. O padrão adotado internacionalmente dos cubesats preve que as dimensões finais dependem da estrutura dos guias laterais de adaptação ao dispositivo mecânico chamado Poly-PicoSatellite Orbital Deployer (P-POD),. A estrutura interna de cada modulo tem então 10cmx10cmx10cm, mas as colunas guia de sustentação ("rails" ou "tabs" dependendo do P-POD)fazem que as dimensões finais sejam dependentes do modelo de P-POD empregado, sendo apresentados abaixo alguns exemplos:
      http://digitalcommons.usu.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1111&context=smallsat
      http://www.cubesat.org/images/developers/cds_rev13_final.pdf
      A titulo de curiosidade temos nos documentos dos sites citados:
      1U: 10cmx10cmx11cm
      2U 10cmx10cmx22,7cm
      3U 10cmx10cmx34,5cm
      6U 10cmx22,5cmx34,5cm

      Espero ter ajudado a esclarecer.

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    2. Grato Eloi, muito esclarecedor, e os links tratam o assunto de forma bem detalhada.

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  2. Olá hoje me deparei com uma noticia muito interessante, foi aprovado pela Argentina um acordo com a China,que cede a China uma área de 200 hectares em Neuquén, para construção de uma base espacial, o acordo tem vigência de 50 anos.

    neste site no fim da matéria tem os pdf do acordo

    http://goo.gl/JG3eAf

    Este um Vídeo da Infobae onde eles discutem a situação

    http://goo.gl/7m51c1

    Abraços

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    1. Só para não criar expectativas erradas, que fique claro que o termo "estación espacial" em espanhol, nesse contexto, se refere a uma estação de rastreio e coleta de dados que deverá fazer parte de uma rede de estações que vai cobrir as futuras missões chinesas à Lua.

      Fazem eles muito bem, vão instalar equipamentos de ponta e os argentinos podem se beneficiar aprendendo a lidar com eles.

      A função primordial hoje do CLBI é exatamente essa. Uma estação de rastreio e coleta de dados, muito mais que um centro de lançamento, devido às limitações conhecidas.

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    2. Isso mesmo, o "x" da questão é a reação dentro da Argentina, por causa do tempo de vigência do acordo 50 anos, e com receio que os chineses usem a base para fins militares,e isso azede mais a já tortuosa relação Argentina X EUA.

      Abraços

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  3. Olá leitores!

    Aproveito para parabenizar ao Major Eloí Fonseca e sua equipe de alunos pelo projeto e principalmente pela sua postura como educador e servidor público, já que demonstra ter respeito pelas pessoas e uma grande preocupação com a transparência, postura esta correta e bem diferente, por exemplo, da experiência vivida pelo Blog com a Coordenadora do misterioso Projeto SERPENS da AEB. Mas enfim...

    Abs

    Duda Falcão
    (Blog Brazilian Space)

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