BR-SAR, Uma Interessante Proposta Militar Para o Uso da Tecnologia SAR no Brasil

Olá leitor!

Desde que o Programa Espacial Brasileiro (PEB) foi criado no inicio dos anos 60 do século passado, o mesmo sofre de um fenômeno muito parecido a de programas espaciais de outros países, ou seja, o fenômeno do surgimento de propostas para projetos que são feitas e mortas sem sequer chegarem ao conhecimento público ou de projetos que deixam de ser sequenciados. No Brasil exemplos como esses são inúmeros, tanto no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) como também no Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), e mais recentemente entre outras organizações que compõem o esforço das atividades espaciais no país.

Como exemplo deste fenômeno, no INPE podemos citar propostas fantásticas como a do “ECO-8 System” que era uma constelação formada por oito microssatélites tendo como objetivo assegurar serviços de telecomunicações de celular, telefone fixo, móvel, de voz e dados e de pagers, a proposta do “Monitor de Clima Espacial – MCE”, que seria a primeira sonda de espaço profundo brasileira, a proposta da “Sonda Santos Dumont”, que foi proposta para substituir a do MCE que não vingara, a proposta da “Sonda Ishtar”, que seria a primeira sonda lunar brasileira, entre outras, como também a proposta do “Satélite MAPSAR (Multi-Application Purpose SAR)” chamado tecnicamente de SSR-2 (denominação da antiga Missão Espacial Completa Brasileira - MECB) que era uma proposta de parceria com a Agência Aeroespacial da Alemanha (DLR) para o desenvolvimento conjunto de um satélite utilizando-se como base a Plataforma Multi-Missão (PMM) brasileira, e tendo como carga útil um radar imageador de abertura sintética ou SAR (Synthetic Aperture Radar), projeto este que será mais abordado abaixo. Fora leitor os projetos que simplesmente foram abandonados, como por exemplo, o “Projeto MASCO”, que tinha como objetivo desenvolver um telescópio a ser lançado por balões capaz de obter espectros e imagens em Raio-X e Gama de fontes cósmicas empregando uma técnica de imageamento denominada de “MÁScara Codificada”, e  o “Projeto PSO (Plataforma Sub-Orbital)” que tinha como objetivo o desenvolvimento de uma plataforma suborbital para ser usada por experimentos científicos e tecnológicos em ambiente de microgravidade, inicialmente no topo de um foguete Sonda III, para assim atender as necessidades de um projeto denominado de SATREC.

Concepção artística do antigo satélite MAPSAR (INPE/DLR)

Já no IAE, no que diz respeito à parte espacial do instituto, podemos citar propostas que nunca saíram do papel, como a dos “Foguetes Suborbitais  VS-15 e VS-43”, a do “Motor-Foguete Sólido P40”, a dos “Motores-Foguetes Líquidos L300 e L1500” (estes ainda dependentes do desenvolvimento do motor-foguete liquido L75 que no momento se encontra em desenvolvimento no instituto), a da proposta dos veículos lançadores do “Programa Cruzeiro do Sul”, entre outros, fora os projetos que foram simplesmente abandonados, como os projetos dos “Motores-Foguetes Líquidos L5 e L15”, o projeto do “Sistema de Alimentação de Motor Foguete (SAMF)”, e o mais famoso de todos eles, o projeto do “Veículo Lançador de Satélites -1 (VLS-1)”.

Pois então, pensando em ajudar e aproveitando a grande expectativa que temos com relação ao novo “Governo Bolsonaro” e ao novo Ministro Marcos Pontes, gostaria aqui de apresentar a você leitor e em especial a “Comissão de Transição” do novo governo, uma interessantíssima proposta que, talvez ainda e muito provavelmente, vocês não tenham tido conhecimento.

Trata-se de uma interessantíssima proposta denominada “BR-SAR:A Small Spaceborne SAR With an Offset Reflector Antenna and Compact Polarimetry Architectures / BR-SAR: Um Pequeno Satélite SAR com uma Antena Refletora Offset e Polarimetria Compacta em sua Arquitetura” apresentada que foi pela primeira vez no ano de 2016 em nível internacional (creio eu) por três pesquisadores brasileiros, ou seja, o Major Márcio Martins da Silva Costa (na época locado no ITA), o jovem Dr. Rafael Lemos Paes (na época locado no INPE) e o Dr. Ângelo Passaro (na época e atualmente locado no IEAv) durante a realização do “AIAA Space 2016”, evento este realizado de 13 a 16 de setembro de 2016 em Long Beach, Califórnia (EUA), e em nível nacional apresentado durante a realização do “7º Simpósio de Sensoriamento Remoto de Aplicações em Defesa (SERFA)”, evento este realizado de 24 a 27 de outubro de 2016 nas instalações do IEAv em São de José dos Campos (SP).

Proposta militar do satélite BR-SAR

Fruto de um profundo estudo realizado por esses três pesquisadores com o incentivo e suporte financeiro da “Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação da Marinha (SecCTM)” e do “Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)”, bem como do apoio logístico do “Instituto de Estudos Avançado (IEAv)”, do “Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)”, do “Instituto de Pesquisas da Marinha (IPpM)”, do “Centro de Guerra Eletrônica da Marinha (CGEM)” e da “Comissão de Coordenação e Implantação de Sistemas Espaciais (CCISE)”, esta proposta tem como objetivo o desenvolvimento de um pequeno satélite com tecnologia de Abertura Sintética SAR, tendo como ponto de partida o antigo projeto do MAPSAR (INPE/DLR) e a utilização da Plataforma Multi-Missão – PMM como módulo de serviço (plataforma que já está pronta para realizar o seu primeiro voo com o Minissatélite Amazonia-1 do INPE em 2020).

Assim sendo, sugiro a “Comissão de Transição” do novo Governo Bolsonaro que olhe para esta proposta do Satélite BR-SAR com muita atenção e carinho não deixando-a morrer, pois a mesma é uma interessantíssima resposta dos militares as suas necessidades de uso desta inovadora Tecnologia SAR, até porque a opção civil que o INPE tenta emplacar em parceria com os chineses, esta denominado de CBERS-SAR (também se utilizando da PMM), apresentada que foi pela primeira vez pelo Dr. Adenilson Roberto da Silva durante a realização “8º Simpósio de Sensoriamento Remoto de Aplicações em Defesa (SERFA)” deste ano (2018), além de estar ainda em discussão com os chineses, existe muitas incertezas quanto à qualidade da Tecnologia SAR a ser empregada neste satélite, além do que as Forças Armadas Brasileiras precisam ter o seu sistema de sensoriamento remoto próprio, opção está muita mais segura de que um sistema compartilhado com o setor civil, como já ocorre com o trambolho espacial francês SGDC-1, este um grande, inseguro e caro souvenir dos desmandos no setor espacial ocorridos nos dois Governos Petralhas.

Duda Falcão

Comentários

  1. Caro Duda e prezados leitores do Brasilian Space,

    Gostei muito da matéria e de como você compilou exemplos de missões propostas e que não tiveram prosseguimento. No entanto, antes de entrar no mérito da proposta do BR-SAR e do CBERS-SAR ou avaliar tais projetos interrompidos como insucessos, devem ser questionados os aspectos de como o nosso país (em especial a AEB) nunca fez prevalecer um programa espacial para o segmento satelital, sustentado em informações sólidas sobre as demandas nacionais governamentais (civis e/ou militares) ou gerais (exceto no segmento de telecomunicações).
    É com base nessas necessidades que deveria ser planejado o programa espacial, a partir de um processo de adoção de missões satelitais com cronogramas de lançamento, reposição e descomissionamento bem definidos, onde se garantiria a permanente prestação do serviço e atendimento às aplicações deles dependentes, de modo a desacoplar tais missões do desenvolvimento tecnológico necessário para a sua execução, como se fez até hoje, fato este que culmina em repetidos adiamentos e atrasos nos projetos e na dependência nacional de satélites de privados e de outros países, como se vê especialmente no setor de sensoriamento remoto.
    Em resumo, é preciso que seja vislumbrado, a cada etapa do projeto, que se um determinado sistema, subsistema, montagem ou componente que esteja sendo desenvolvido nos institutos de pesquisa ou na indústria, não esteja ou não venha a estar qualificado para voo (TRL 8) o mesmo será substituído por componentes de mercado equivalente de modo a não comprometer a missão, sendo isso planejado desde a proposta de cada projeto submetido ao processo de adoção, ou seja: Não está pronto? Voa na próxima missão!
    Por outro lado, um sistema de adoção (seleção) de missões para os diversos setores (Sensoriamento Remoto Óptico, Sensoriamento Remoto por Radar, Científico, Coleta de Dados, etc.) evitaria cairmos no erro de nos envencilharmos com projetos de grupos e sinecuras que comprometem sofregamente os recursos nacionais (financeiros, materiais e humanos), durante décadas, sem que se avalie (externa e independentemente) os resultados e rumos dos mesmos, em detrimento de todo um programa espacial, sejam projetos de satélites, sejam projetos de acesso ao espaço, entre outros.
    Voltando mais especificamente para os dois projetos citados na matéria, não há o que discutir quanto à importância de um satélite SAR para o nosso país, motivo pelo qual, ambas as propostas são relevantes. Entretanto, tais projetos ainda estão em níveis de maturidade tecnológica ainda muito baixos (TRL 2 ou 3, níveis de concepção / prototipação), ainda que alguns subsistemas como a PMM, por exemplo, estejam em TRL 8. Assim, se um subsistema ou uma montagem ou um componente está em TRL 3 (como no caso do payload ou da antena), todo o sistema estará em TRL 3, ainda que existam partes com TRL mais elevado.
    Para exemplificar, sem questionar se as especificações do BR-SAT atendem qualitativamente e quantitativamente à demanda nacional, este depende de todo o desenvolvimento tecnológico do payload SAR e de seus subsistemas (que devem estar em TRL 2 ou 3) que deverão ainda atravessar o famoso “vale da morte” dos níveis 4 a 7, o que pode durar uma década ou mais, mesmo que venha a ser montado sobre a PMM padrão, a ser validada em voo na missão Amazonia 1, quando essa plataforma adquirirá o TRL 9.
    Do mesmo modo, a proposta apresentada para o CBERS-SAR, também carece de muito desenvolvimento tecnológico, pois depende não só do desenvolvimento do SAR, mas de um grande processo de reengenharia da PMM, com a sua conversão para um padrão ITAR Free, como descrito na apresentação “linkada” na matéria, de modo a permitir que o satélite seja desenvolvido em parceria com a China e seja lançado por lá, assim com as versões CBERS lançadas até então.

    (continua...)

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  2. (...continuação)
    Em ambos os casos, percebe-se que seriam projetos com duração de décadas que deveriam ser de alguma forma, selecionados e suportados, principalmente quanto ao desenvolvimento de um SAR nacional, mas que não devem condicionar o nosso país a só dispor de um satélite do tipo SAR quando o desenvolvimento tecnológico esteja maduro, considerando a premente demanda nacional desse tipo de imageamento, conforme apresentado nos estudos sobre demandas nacionais da AEB (http://brazilianspace.blogspot.com/2018/11/resultados-de-pesquisa-da-aeb-serao.html), a Nota Técnica nº 42/2017/DSAD/AEB e o artigo “Revisão da Realidade Brasileira em Termos da Aplicabilidade de Pequenos Satélites para Missões de Sensoriamento Remoto” apresentado no 1º CAB.
    Portanto, creio que seria mais viável e pragmático que, utilizando o acordo do CBERS, o Brasil utilize o módulo de serviço atual do CBERS4 (assumindo a sua engenharia por completo) e a China desenvolva ou adapte um dos seus payloads SAR (tecnologia já dominada por eles) ao módulo em questão, garantido que este se adapte a capacidade do bus (não só em termos de potência) de modo a diminuir o tempo de desenvolvimento. Essa solução poderia permitir um NewCBERS-SAR voando em um prazo de 4 a 6 anos.
    Outra abordagem seria a aquisição de uma solução de mercado, em paralelo com uma das soluções vistas acima, preferencialmente com transferência de tecnologia, de modo a suprir o mais rapidamente as nossas carências em termos de imageamento por radar, o que poderia acontecer em 2 a 3 anos. Nesse cenário, na linha do que propõe o PESE (Programa Estratégico de Sistemas Espaciais), à medida que o desenvolvimento tecnológico de sistemas e componentes nacionais para atender a missões de sensoriamento atinjam níveis de maturidade alto (TRL 7 / 8), os mesmos poderiam ser validados em voo a cada nova missão como redundância dos dispositivos originais do projeto. Ao serem validados em voo, os mesmo poderiam ser integrados como componente principal de uma nova missão e assim, sucessivamente.
    Dessa forma, seria possível desenvolver um mecanismo de adoção de missões que permita o atendimento ininterrupto, sustentável e sem sobressaltos de missões de sensoriamento remoto por SAR, com calendários de lançamento, reposição e descomissionamento bem definidos, sem o acoplamento da missão ao desenvolvimento de tecnológico de sistemas / componentes.

    Enfim, sem me estender mais, aproveito o ensejo para saudar respeitosamente a todos e desejar um feliz 2019!

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  3. Está mais que na hora da nação ter um projeto consistente de produção de inteligência à partir do espaço. Seja por meios óticos e radar, este último especialmente importante em função da quantidade de território nacional e adjacente coberto por vegetação densa, nuvens e umidade constante.
    Acredito que este momento, onde um novo presidente com uma retorica mais focada em segurança e defesa toma posse, abre-se uma janela de oportunidade ímpar em 25 anos para finalmente perdermos qualquer preconceito (tolo e infundado) sobre o uso militar do espaço.
    Nos anos FHC, em função sobretudo dos esforços Brasil – Argentina de desnuclearizar a região criou-se um muro irracional em torno do conceito de tecnologia espacial de uso potencialmente militar. Nos anos PT, talvez por questões ideológicas isto não foi modificado. A hora é agora. Precisamos cristalizar a imagem de que civis e militares vestem a mesma camisa, são cidadãos da mesma nação. Sem divisões, sem retoricas oportunistas que nos separem.
    O custo desta bobagem retorica é a perda de liderança regional. Na América do Sul, nesta década, Chile, Venezuela e Peru possuem capacidades de reconhecimento ótico com resolução entre 2,5 e 0,8 m.
    Os mais críticos podem argumentar que estas nações compraram tecnologia de prateleira de França e China, o que é verdade. Mas também é verdadeiro que nenhum deles se propôs a possuir tecnologia espacial própria (como Brasil e Argentina), logo foram coerentes comprando de prateleira.
    Sejamos coerentes também escolhendo um modelo que nos sirva. Qual vai ser o modelo de aquisição, se uma plataforma de prateleira com transferência de tecnologia, se um modelo misto baseado na PMM com carga útil licenciada ou se um modelo totalmente nacional de plataforma e carga útil, só os estudos econômicos e de risco irão dizer.
    O que não se pode é abrir mão de uma visão estratégica de estado, coisa que há mais de 30 anos perdemos com os sucessivos ocupantes do planalto e suas pirotecnias de política externa.
    Igualmente tão importante quanto cobrarmos do presidente (seja quem for ele) coerência, ela deve existir também entre os atores do programa espacial que precisam somar capacidades em pró deste objetivo. Que um grande conhecedor programas espaciais e de temas militares, que hoje temos a honra de ter como ministro, unifique esta visão. Sem uma visão única entre estado, governo e comunidade espacial, estaremos patinando no brejo de sempre.

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