Brasil e Espanha Tentam Desvendar a Matéria Escura
Olá leitor!
Segue abaixo uma
matéria publicada ontem (16/09) no site do jornal “O Estado de São Paulo” destacando
que o Brasil e a Espanha vão investigar a misteriosa Matéria Escura através de
novo observatório astronômico bi-nacional em construção pelos dois países.
Duda Falcão
Notícias
Brasil e Espanha Tentam
Desvendar a Matéria Escura
Novo observatório de astronomia binacional
vai investigar
um dos maiores mistérios do universo: aquilo
que ninguém enxerga
HERTON ESCOBAR
O Estado de São Paulo
16 de setembro
de 2012 - 3h 05
No topo de uma
montanha próxima a Teruel, no leste da Espanha, o sonho de um Prêmio Nobel para
o Brasil começa a tomar forma. É lá, no Pico do Abutre, a quase 2 mil metros de
altitude, que um novo observatório astronômico está sendo construído pelos dois
países com o objetivo de investigar um dos maiores enigmas científicos de todos
os tempos: a natureza da matéria escura. Uma coisa que ninguém vê e ninguém
sabe o que é, mas que constitui mais de 80% de toda a matéria do universo. Um
problema que incomoda e fascina cientistas há quase oito décadas.
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O Observatório
Astronômico de Javalambre, batizado com o nome da cadeia de montanhas que o
abriga, está em fase avançada de construção. O complexo todo, orçado em 30
milhões, está quase completo, com sala de controle, túneis, dormitórios e
telescópios de apoio. Faltam as duas peças fundamentais: o telescópio T250, que
está sendo montado na Bélgica, e a câmera J-PCAM, que foi projetada e está
sendo construída parcialmente no Brasil - principal contribuição do País para o
projeto, no valor de 5 milhões.
Segundo Renato
Dupke, do Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, será a segunda maior câmera
do mundo, com uma resolução de 1,2 bilhão de pixels e pesando mais de 1
tonelada. A previsão é de que ela fique pronta só em 2014, mas que o
observatório comece a operar já em 2013, com outros instrumentos.
A partir de
2015, com o telescópio e a câmera acoplados, o observatório dará início ao seu
maior projeto de pesquisa: o Levantamento Astronômico de Javalambre sobre a
Física da Aceleração do Universo (J-PAS, em inglês), que vai produzir um mapa
tridimensional do céu, com a localização precisa de bilhões de estrelas,
galáxias, aglomerados de galáxias e outros objetos espaciais, cuja posição e
comportamento são influenciados pela matéria escura.
"Só te digo
uma coisa: queremos o Prêmio Nobel", diz o pesquisador Laerte Sodré, do
Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da
Universidade de São Paulo, um dos líderes do projeto.
Um objetivo
extremamente ambicioso, mas não tão pretensioso assim. "Se pode sair um
Prêmio Nobel desse projeto? Certamente que sim", afirma Dupke, que divide
a coordenação científica do J-PAS com o colega espanhol Narciso Benítez, do
Instituto de Astrofísica de Andaluzia. O projeto foi tema de uma reunião de
quatro dias na semana passada, no IAG.
Não há dúvida de
que aqueles que desvendarem o enigma da matéria escura serão candidatos
fortíssimos ao Nobel. O J-PAS não terá como dizer do que é feita a matéria
escura exatamente - algo que só a física de partículas poderá eventualmente
responder -, mas poderá dar pistas importantes sobre seu comportamento, sua
distribuição e sua influência sobre a evolução das galáxias e do universo.
Informações essenciais para entender também sua estrutura. "Para saber do
que é feita a matéria escura precisamos saber suas propriedades com muita precisão",
explica Benítez.
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Enigma Espacial
- Na astrofísica e na cosmologia, ciências que estudam a evolução e o
funcionamento do universo, características como velocidade, massa, temperatura,
luminosidade, tempo e distância estão diretamente relacionadas. A descoberta da
matéria escura - originalmente chamada de "matéria faltante" - deu-se
em 1933 pelo astrônomo suíço Fritz Zwicky, que percebeu que a velocidade com
que as galáxias se moviam no espaço era incompatível com a quantidade de
matéria (massa) presente nelas e ao redor delas.
O problema é que
a velocidade com que as galáxias giram e se movem dentro de um aglomerado é
alta demais para a massa que conseguimos observar. Nessa velocidade, pelas leis
da física, elas deveriam se desmantelar e se dispersar, como um carro de
corrida que se despedaça e "sai voando" de uma pista oval por andar
rápido demais.
A única força
capaz de segurar as coisas nos seus devidos lugares no espaço é a gravidade - e
a força da gravidade depende da massa de um objeto. O problema é que a
quantidade de matéria visível nessas galáxias e aglomerados não é nem de perto
suficiente para gerar a atração gravitacional necessária para evitar que elas
se desmantelem ou saiam voando por aí. Algum cabo invisível está segurando o
carro na pista. É a matéria escura.
O adjetivo
"escuro" se refere ao fato de que essa matéria não emite nem absorve
luz. É completamente invisível. Só sabemos da sua existência por causa dos seus
efeitos gravitacionais, confirmados por várias linhas independentes de pesquisa
nas últimas décadas.
Há alguma coisa
lá fora, só não sabemos o que é. E o mais assustador é que essa coisa não é
apenas um detalhe. Pelo contrário, as observações indicam que há cinco vezes
mais matéria escura que matéria visível. Ou seja: tudo que a gente enxerga
corresponde a menos de 20% de tudo que existe no universo.
É como se não
soubéssemos da existência do ar, com a diferença de que o ar, apesar de
invisível, é feito de matéria "comum" (átomos de hidrogênio,
oxigênio, etc). Já no caso da matéria escura, os cientistas não têm a menor
ideia do que ela é feita.
"Não
sabemos o que é, mas é algo que precisamos levar em conta em todos os nossos
cálculos, pois sem a matéria escura nada faz sentido; as teorias não batem com
as observações", diz o astrofísico Rubens Machado, do IAG. "É um
vexame astronômico", reconhece Dupke.
Na prática, há
duas possibilidades: ou a matéria escura existe e as leis da física estão
corretas ou a matéria escura não existe e as leis da física precisam ser
revistas. A mais provável é a primeira opção, mas a segunda não está
descartada. "A opinião majoritária é de que a matéria escura existe, mas
tem gente muito séria que acha que ela não é a explicação correta",
reconhece Benítez. "O problema é que não há uma boa explicação
alternativa. A matéria escura é a 'menos pior'."
Vários estudos
já foram publicados questionando a existência da matéria escura, pelo menos em
escalas menores que galáxias, mas nada conclusivo até agora. "Temos vários
indícios independentes, baseados em técnicas distintas, que apontam na mesma
direção, o que é uma indicação forte de que a matéria escura existe",
avalia Machado.
Ainda que não
venham a fornecer respostas definitivas, os mapas e parâmetros medidos pelo
J-PAS ajudarão a "fechar o cerco" sobre a matéria escura, permitindo
descartar muitas das teorias que circulam por aí.
"Quem não
procura não acha", argumenta Sodré, cobrando mais ousadia da ciência
brasileira, que costuma trabalhar com questões mais periféricas. "Se não
arriscarmos e não ousarmos a responder perguntas fundamentais, não vamos chegar
a lugar nenhum. Temos de meter as caras mesmo."
Fonte: Site do
jornal O Estado de São Paulo - 16/09/2012
Comentário: Já haviamos postado aqui notícias sobre essa
parceria brasileira com a Espanha nesse projeto J-PAS, mas não tínhamos ideia
que o observatório já se encontrava em fase avançada de construção. Essa
notícia é maravilhosa e demonstra o quanto a astronomia brasileira avançou nos últimos
dez anos graças ao IAG/USP, o LNA (Laboratório Nacional de Astrofísica) e de
outras instituições espalhadas pelo país. Esta claro que a “Comunidade Astronômica
Brasileira”, pequena em tamanho, mas grande em realizações, é hoje altamente
respeitada internacionalmente e os astrônomos, astrofísicos e Cosmólogos
brasileiros estão de parabéns pelos resultados alcançados. Já quanto ao “Patinho
Feio” do MCTI, esse continua andando para trás a passos largos. Lamentável!
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