Novos Olhos no Universo
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo publicado na a edição de Maio de
2015 da “Revista Pesquisa FAPESP” destacando Telescópios
vão estudar a matéria e a energia escuras, os raios gama e mapear o Cosmo em 3D
com a participação de Astrofísicos Paulistas.
Duda Falcão
CAPA
Novos Olhos no Universo
Telescópios vão estudar a
matéria e a energia escuras,
os raios gama e mapear o
Cosmo em 3D
MARCOS PIVETTA
Revista Pesquisa FAPESP
ED. 231 - MAIO 2015
© ESO / B. TAFRESHI
Com instalação prevista para 2016 na Argentina, a antena
de 12 m
do Llama será parecida com a do Apex (foto), já em operação no Chile.
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A 4.800 metros acima do
nível do mar, situado na região argentina de Puna de Atacama, uma espécie de
prolongamento da paisagem árida da porção leste chilena do deserto do Atacama,
o sítio de Alto Chorrillo deverá abrigar, a partir de abril do próximo ano, um
radiotelescópio de 12 m de diâmetro, o Llama, sigla em inglês para o projeto
Grande Arranjo Milimétrico Latino-americano. Concebida e implementada por meio
de uma parceria entre astrofísicos do estado de São Paulo e da Argentina, a
moderna antena está prevista para entrar em operação, e produzir ciência, no
início de 2017. Em linhas gerais, o acordo estabeleceu que os pesquisadores
paulistas comprariam o radiotelescópio (com US$ 9,2 milhões financiados pela
FAPESP) e os argentinos montariam a estrutura física para receber o equipamento
e cuidariam de seu funcionamento. “Em princípio, cada país terá metade do tempo
de observação do telescópio”, diz o astrofísico Jacques Lépine, do Instituto de
Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo
(IAG-USP), mentor e coordenador do Llama em solo nacional. “Mas estamos
estabelecendo projetos-chaves a ser tocados por equipes binacionais.” Metade do
valor da antena já foi paga e o restante será quitado quando o equipamento estiver
100% funcional. A parte argentina do projeto conta com financiamento da
Secretaría de Articulación Científico Tecnológica do Ministerio de Ciencia,
Tecnología e Innovación Productiva (MINCyT).
A localização da antena nesse ponto do noroeste argentino
segue critérios duplamente estratégicos. Em primeiro lugar, a Puna de Atacama
tem um clima extremamente seco, com pluviosidade anual ligeiramente superior à
do contíguo deserto do Atacama, o lugar mais seco do planeta. O vapor de água
atmosférico é o principal empecilho para a realização de boas observações
astronômicas em comprimentos de ondas milimétricos e submilimétricos, como a
banda de frequências entre 90 gigahertz (GHz) e 900 GHz em que operará o Llama.
Em segundo, o Llama dista, em linha reta, 150 quilômetros do Atacama Large
Milimeter/Submilimeter Array (Alma), o maior projeto de radioastronomia do
planeta, montado num ponto extremamente elevado do município chileno de San
Pedro de Atacama. Formado por um conjunto de 66 antenas de 7 m e de 12 m instaladas
no planalto de Chajnantor, a cerca de 5 mil m de altitude, o Alma entrou em
funcionamento em março de 2013 (ver Pesquisa FAPESP nº 206). Vizinho ao
radioexperimento gigante, localizado igualmente no altiplano de Chajnantor, há
ainda o Atacama Pathfinder Experiment Telescope (Apex), radiotelescópio de 12 m
do qual o Llama é quase um clone.
Inicialmente, o Llama funcionará de forma isolada, sem se
conectar ao Alma. Mas há a perspectiva de a antena brasileiro-argentina
trabalhar de maneira integrada ao Alma e também ao Apex, como se todos
formassem um único radiotelescópio descomunal. Para que isso ocorra, o projeto
precisará receber um equipamento para fazer interferometria, técnica que
combina os sinais de diferentes antenas e possibilita a obtenção de imagens com
maior resolução.
Entre os objetivos científicos do Llama figuram possíveis
estudos sobre a estrutura do Sol, das primeiras estrelas e galáxias, emissões
de jatos e masers (um tipo de radiação similar ao laser) e também de
planetas extrassolares. A procura por moléculas orgânicas no Cosmo deve ser uma
das primeiras áreas de pesquisa a produzir trabalhos com a antena. Coordenador
do Laboratório de Astroquímica e Astrobiologia da Universidade do Vale do
Paraíba (Univap), de São José dos Campos, o astrofísico Sergio Pilling pretende
usar o radiostelescópio para esse fim. “Com um pouco de sorte, podemos
descobrir moléculas ainda não localizadas no espaço se observarmos em
determinadas radiofrequências”, diz Pilling.
© ALBERTO MOLINO
Novo
telescópio brasileiro de 0,80 m montado em Cerro Tololo, Chile
(à esq. na imagem): parceria com
espanhóis no projeto J-PAS.
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Universo
em Raios Gama
Outro
projeto ambicioso de âmbito internacional com participação de pesquisadores de
São Paulo e de outros estados brasileiros é o Cherenkov Telescope Array (CTA).
Trata-se de um consórcio formado por 29 países que planeja construir até 2020 o
maior observatório astronômico de raios gama do mundo, dedicado a entender os
fenômenos mais energéticos do Universo. Entre esses eventos, figuram a colisão
de partículas de matéria escura, a natureza dos aceleradores astrofísicos de
raios cósmicos, que incluem desde nuvens e estrelas em colisão até buracos
negros supermassivos nos núcleos das galáxias, e a violação da constância da
velocidade da luz, que também só pode ser medida em raios gama. O observatório,
orçado em € 200 milhões, será composto por cerca de 100 telescópios de três
tamanhos distintos (24 m, 12 m, 4 m de diâmetro), do tipo Cherenkov, ideais
para realizar esse tipo de medição, espalhados em dois arrays, ou
arranjos. Um será montado no hemisfério Norte, num ponto do México, Estados
Unidos ou Espanha, e o outro no Sul, provavelmente perto do Alma, no Chile. A
maioria dos telescópios será de tamanho pequeno. A primeira etapa do projeto,
denominada CTA Mini-Array, prevê a instalação de nove telescópios de 4 m no
sítio austral do empreendimento até 2017.
Por
meio de financiamento da FAPESP, a astrofísica Elisabete de Gouveia Dal Pino,
do IAG-USP, coordena a contribuição nacional no Mini-Array. Ao custo de cerca
de € 3 milhões, a Fundação banca a construção na Itália de três telescópios
pequenos, baseados em um protótipo desenvolvido pelo Instituto Nacional de
Astrofísica da Itália com a participação de engenheiros brasileiros. A África
do Sul financia mais uma unidade e a Itália outras cinco. “Os telescópios do
Mini-Array vão captar as mais altas energias entre 0,1 e 100 TeV [100 TeV
correspondem a 100 trilhões de elétrons-volt de energia]”, diz Elisabete. “Eles
elevarão de cinco a dez vezes a atual sensibilidade para captar raios gama.”
A parte
brasileira na iniciativa não se restringe ao Mini-Array. A equipe de Luiz Vitor
de Souza Filho, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP), desenvolveu o
braço que posiciona a câmara de imagem usada nos telescópios de médio porte do
CTA. Ele criou e testou um protótipo com uma empresa de São Paulo,
Orbital Engenharia, e agora foi escolhido para fornecer a estrutura, que mede
16 m e pesa 5 toneladas, para os demais telescópios. Pesquisadores do Centro
Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) participam do projeto de desenvolvimento dos telescópios de 24
m.
Protótipo
italiano de telescópio de 4 m do projeto
CTA: FAPESP financia a construção de
três unidades,
com participação de engenheiros brasileiros.
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Uma Grande Angular no Céu
Com orçamento total de € 30
milhões, o Javalambre Physics of the Accelerating Universe Astrophysical Survey
(J-PAS) é um projeto originalmente concebido pela Espanha que, há cerca de
cinco anos, passou a ter o Brasil como segundo sócio. A ambição da iniciativa,
para a qual foi construído um novo observatório em Teruel, na região espanhola
de Aragão, é produzir um levantamento em três dimensões de todo o céu nos
próximos cinco ou seis anos. Dois telescópios, um de 2,5 m e outro de 0,80 m,
foram projetados para se dedicar exclusivamente ao trabalho de mapear desde
asteroides, planetas e estrelas até as centenas de milhões de galáxias do
Universo. O diferencial em relação a mapeamentos anteriores, como o
Sloan, é que o telescópio grande do J-PAS contará com a segunda maior câmera
astronômica do mundo, a JPCam, com resolução de 1,2 bilhão de pixels e composta por um mosaico de 14 CCD,
sensor usado para obter imagens digitais. Uma espécie de grande angular do
Cosmo.
A câmera será capaz de gerar
uma quantidade recorde de cores (espectros) dos objetos visualizados. Terá 59
filtros distintos – o Sloan contava com apenas cinco – e todos juntos gerarão
um espectro (conjunto de cores) que realça determinadas características dos
milhões de corpos celestes que serão observados. “A construção dessa câmera é
financiada e coordenada pelos brasileiros”, diz Renato Dupke, astrofísico do
Observatório Nacional (ON), que iniciou a parceria com os espanhóis. A
Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), a Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio de Janeiro (Faperj), o Ministério da Ciência e Tecnologia e
Inovação (MCTI), além da FAPESP, investiram por volta de US$ 7 milhões no
desenvolvimento da JPCam, que deverá ser instalada no telescópio em 2016. “O
sistema de filtros da câmera deverá ser muito útil para estudarmos as
oscilações acústicas de bárions”, diz Laerte Sodré, do IAG-USP, outro
astrofísico que atua na parceria. Esse fenômeno, ainda pouco conhecido, é
caracterizado por ondas que teriam sido criadas logo após o Big Bang devido a
interações da matéria visível (bariônica) com a radiação. Estudar tais
oscilações pode contribuir para a compreensão da matéria escura e sobretudo da
energia escura, os dois constituintes majoritários, porém de natureza
desconhecida, do Universo.
A parceria com os espanhóis
estimulou a astrofísica Cláudia Mendes de Oliveira, do IAG-USP, a obter US$ 2
milhões da FAPESP para montar um telescópio de 0,80 m igual ao equipamento
menor do J-PAS. O ON pagou R$ 520 mil para fazer o prédio da cúpula e bancar a
manutenção dos seis primeiros meses do telescópio, batizado de T-80 Sul. O
equipamento foi instalado no sítio de Cerro Tololo, no Chile, e deverá entrar
em funcionamento nos próximos meses. “Vamos fazer um levantamento de grande
parte do Universo local, em conjunto com o telescópio menor da Espanha, usando
12 filtros”, explica Cláudia. “Mesmo com menos filtros, devemos produzir
resultados de alto impacto.”
Projetos
1. Llama: um radiotelescópio para ondas mm/sub-mm nos Andes,
em colaboração com a Argentina (nº 2011/51676-9); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Jacques Lépine (USP); Investimento R$ 7.890.473,28 e US$ 9.221.992,00 (FAPESP)
2. Investigação de fenômenos de altas energias e plasmas
astrofísicos: teoria, simulações numéricas, observações e desenvolvimento de
instrumentação para o Cherenkov Telescope Array (CTA) (nº 2013/10559-5); Modalidade Projeto Temático;Pesquisadora responsável Elisabete de Gouveia Dal Pino (USP); InvestimentoUS$ 2.269.594,10 e R$ 1.981.476,55 (FAPESP).
3. EMU: aquisição de um telescópio robótico para a comunidade
astronômica brasileira (nº 2009/54202-8); Modalidade Programa Equipamentos Multiusuários;Pesquisador responsável Cláudia de Oliveira (USP); Investimento US$ 1.746.697,84 e R$ 1.325.134,14 (FAPESP).
4. Pau-Brasil: aquisição de detectores de CCD para a câmera
CCD panorâmica da pesquisa Javalambre – Física do Universo em aceleração (nº 2009/54162-6) Modalidade Programa Equipamentos Multiusuários; Pesquisador responsávelLaerte Sodré (USP); Investimento US$ 1.600.000,00 e R$ 912.000,00 (FAPESP).
Fonte: Revista Pesquisa FAPESP - Edição 231 – Maio de 2015
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