50 anos do COPUOS e do Primeiro Vôo Espacial Tripulado
Olá leitor!
Segue abaixo uma nota postada hoje (27/06) no site da Agência Espacial Brasileira (AEB) destacando a festa dos 50 anos do “Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço (COPUOS)” e do "Primeiro Vôo Espacial Tripulado", realizada na sede da ONU em Viena, Áustria, em 01/06.
Duda Falcão
Declaração Sobre os 50 Anos do
Comitê da ONU para o Espaço
e do Vôo inaugural de Gagarin
José Monserrat Filho
27-06-2011
A festa dos 50 anos do Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço (COPUOS) e do primeiro vôo espacial tripulado, realizada na sede da ONU em Viena, Áustria, em 1º de junho de 2011, reuniu dezenas de embaixadores, representantes de organismos internacionais e agências espaciais, empresários, professores, pesquisadores e estudiosos das questões políticas, jurídicas, científicas, tecnológicas e industriais das atividades espaciais.
Entre os eventos comemorativos, destacou-se uma exposição dos avanços espaciais de inúmeros países (infelizmente, sem a presença do Brasil).
A sessão solene, em que desfilaram oradores de várias nações e instituições envolvidas com programas espaciais, culminou com a aprovação por aclamação da “Declaração sobre o 50º Aniversário do Primeiro Vôo Espacial Tripulado e o 50º Aniversário do Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior”, que apresentamos na íntegra a seguir.
Ela dá especial atenção às conquistas na regulamentação jurídica das atividades espaciais.
No parágrafo 5, cita “o desenvolvimento do regime jurídico internacional que rege as atividades espaciais” junto com os significativos avanços atingidos pela ciência e tecnologia espaciais e suas aplicações.
No parágrafo 6, salienta a entrada em vigor do Tratado do Espaço, de 1967, “que estabeleceu os princípios fundamentais do direito espacial internacional”.
No parágrafo 9, registra o “fortalecimento da cooperação internacional no uso do espaço exterior com fins pacíficos, mediante (…) o fortalecimento do marco regulatório e seus mecanismos para este fim”.
No parágrafo 10, reafirma “a importância da cooperação internacional para promover o Estado de Direito, inclusive as normas pertinentes do direito espacial, e a adesão mais ampla possível dos tratados internacionais que promovem o uso do espaço exterior com fins pacíficos”.
Nos dois últimos destaques, cabe notar uma relação dialética (ainda que o tema não tenha sido referido diretamente): o fortalecimento do marco regulatório fortalece a cooperação internacional, que, por sua vez, promove o Estado de Direito, inclusive o direito espacial, e maior adesão aos tratados espaciais já vigentes (Tratado do Espaço, de 1967; Acordo de Salvamento de Astronautas e Restituição de Astronautas e Objetos Espaciais, de 1968; Convenção de Responsabilidade por Danos causados por Objetos Espaciais, de 1972; Convenção de Registro de Objetos Espaciais, de 1975; e Acordo da Lua, de 1979).
Ou seja, a cooperação e o avanço do marco regulatório possuem uma relação mútua. Quanto mais cooperação, mais direito, e quanto mais direito, mais cooperação.
Será isso constatação ou mero desejo? Como tal relação se dá na prática das atividades espaciais? A cooperação espacial, de fato, tem crescido muito. Mas o mesmo não se pode dizer do direito espacial. Ele não tem avançado, nem se atualizado, tanto quanto seria preciso, sobretudo para ordenar o impacto do intenso desenvolvimento das novas tecnologias espaciais e atender às demandas, necessidades e legítimos interesses, cada vez maiores, dos países menos desenvolvidos.
Muito curioso é que os países mais avançados nas atividades espaciais são justamente os que mais se opõem à atualização e modernização do ordenamento jurídico internacional no setor, preferindo não regulamentar os assuntos pendentes, ou regulamentá-los por legislação nacional, que podem resguardar melhor os interesses de suas instituições e empresas, e, ainda por cima, servir de referência para a decisão de casos internacionais não tratados por instrumentos internacionais.
Assinale-se ainda, por oportuno, que, no parágrafo 12, a Declaração manifesta “profunda preocupação com a fragilidade do ambiente espacial e com os problemas da sustentabilidade a longo prazo das atividades espaciais, especialmente o impacto dos dejetos espaciais”.
Vale recordar, aqui, que, em abril passado, um pequeno grupo de potências espaciais impediu a discussão dos aspectos legais do “impacto dos dejetos espaciais” pelo Subcomitê Jurídico do COPUOS. O tema não obteve o consenso indispensável para figurar como item especial na agenda de trabalho desse órgão em 2012. O direito espacial ainda é passível de vetos como esse.
O lixo espacial é, realmente, uma ameaça que só faz crescer. Faltaria, porém, acrescentar o enorme perigo também apresentado às atividades espaciais pela militarização radical do espaço, perseguida por alguns países mediante a instalação de armas em órbitas da Terra e a conseqüente transformação do espaço em teatro de guerra. Se efetivada, essa nova realidade pode causar danos incalculáveis aos serviços de primeira necessidade, hoje, prestados somente a partir do espaço – telecomunicações, observação e monitoramento dos recursos naturais da Terra, meteorologia, sistemas de posicionamento, alerta, socorro e redução dos desastres naturais, e tantos outros.
Vale enfatizar ainda o parágrafo 14 do documento, que define a cooperação espacial regional e inter-regional como essencial para o cumprimento das metas da Declaração do Milênio, adotada pela Cúpula do Milênio das Nações Unidas, realizada em Nova York, de 6 a 8 de setembro de 2000, com a participação de 100 Chefes de Estado, 47 Chefes de Governo, três Príncipes, cinco Vice-Presidentes, três Primeiros Ministros, oito mil delegados e 5.500 jornalistas.
Para dar uma noção das chamadas metas do Milênio, é bom lembrar alguns de seus pontos:
– Acreditamos que o desafio central a enfrentar hoje é o de assegurar que a globalização se torne uma força positiva para todos os povos do mundo. Conquanto a globalização ofereça grandes oportunidades, no presente seus benefícios são desigualmente compartilhados, enquanto seus custos são desigualmente distribuídos. (…) Portanto, só através de esforços grandes e sustentados na criação de um futuro compartilhado, baseado em nossa comunidade humanitária em toda sua diversidade, pode a globalização se tornar inteiramente inclusiva e justa. Tais esforços devem incluir políticas e medidas globais, que correspondam aos esforços dos países em desenvolvimento e economias em transição, sendo formulados e implementados com sua participação efetiva.
– Assegurar a implantação, por todos os Estados Membros envolvidos, de acordos em áreas como controle de armas e desarmamento, de legislação humanitária internacional e de leis de direitos humanos, bem como convocar todos os Estados que considerem a assinatura e ratificação do Estatuto de Roma que criou Corte Criminal Internacional.
– Resolvemos (...) criar um ambiente – a nível nacional e global comuns – que conduza ao desenvolvimento e à eliminação da pobreza.
– Reduzir à metade, até 2015, a proporção dos povos do mundo cuja renda é inferior a um dólar ao dia e a proporção dos povos que passam fome, e também, até a mesma data, reduzir à metade a proporção dos povos que não dispõem de água potável.
– Assegurar que, até a mesma data, crianças de toda parte, tanto meninos como meninas sejam capazes de completar um curso de ensino primário; e que meninos e meninas tenham igual acesso a todos os níveis de educação.
– Até a mesma data, ter reduzido a mortalidade materna a três quartos; e mortalidade abaixo dos cinco anos, a dois terços das suas taxas atuais. Ter, até lá, cessado, e começado a reverter, a proliferação da HIV/AIDS, a praga da malária e as doenças maiores que afligem a humanidade.
Estão as atividades espaciais de nossos dias preparadas para contribuir na consecução desses objetivos? Essa questão fica no ar, acompanhando a leitura, atenta e criticamente construtiva, da Declaração de um momento histórico da Era Espacial, que estamos vivendo, queiramos ou não.
Eis o texto da Declaração, em tradução de minha responsabilidade:
Declaração Sobre o 50º Aniversário do Primeiro Vôo Espacial Humano
e do Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior (COPUOS)
Nós, os Estados participantes dos eventos comemorativos da 54ª sessão do Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior, realizada em Viena, no dia 1º de junho de 2011, celebrando o cinqüentenário do primeiro vôo espacial tripulado e o 50º aniversário do Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior,
1. Recordamos o lançamento do primeiro satélite da Terra construído pelo ser humano, o Sputnik I, que teve lugar em 4 de outubro de 1957, abrindo o caminho para a exploração do espaço;
2. Lembramos, também, que, em 12 de abril de 1961, Yuri Gagarin tornou-se o primeiro ser humano a orbitar a Terra, inaugurando novo capítulo na aventura humana no espaço exterior;
3. Recordamos, ainda, a incrível história da presença humana no espaço exterior e as extraordinárias realizações alcançadas desde o primeiro vôo espacial tripulado, em especial as façanhas de Valentina Tereshkova, a primeira mulher a orbitar a Terra, em 16 de junho de 1963; de Neil Armstrong, o primeiro homem a pisar na Lua, em 20 de julho de 1969; e das naves Apollo e Soyuz que acoplaram-se, em 17 de julho de 1975, na primeira missão espacial internacional tripulada; lembramos, igualmente, que na última década a humanidade manteve presença humana multinacional permanente no espaço exterior, a bordo da Estação Espacial Internacional;
4. Lembramos, com respeito, que a exploração do espaço pelos seres humanos não se fez sem sacrifícios e prestamos reverência aos homens e às mulheres que perderam suas vidas na tarefa de expandir as fronteiras da humanidade;
5. Salientamos o significativo progresso no desenvolvimento de ciência e tecnologia espaciais e suas aplicações, que permitiram aos seres humanos explorar o universo, bem como os notáveis avanços nas atividades de exploração do espaço logrado nos últimos 50 anos, incluindo o conhecimento cada vez mais profundo do sistema planetário, do Sol e da própria terra; o uso da ciência e tecnologia espaciais em benefício de toda a humanidade; e o desenvolvimento do regime jurídico internacional que rege as atividades espaciais;
6. Recordamos a entrada em vigor do Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Exterior, inclusive a Lua e demais Corpos Celestes (Tratado Espaço), em 10 de outubro de 1967, que estabeleceu os princípios fundamentais do direito espacial internacional;
7. Recordamos, também, a primeira reunião do Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior, convocada para 27 de Novembro de 1961, que facilitou a aprovação das resoluções 1721 de A à E (XVI) da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 20 de dezembro de 1961, entre os quais cabe citar a resolução 1721 A, que recomendou aos estados os primeiros princípios jurídicos destinados a orientar suas atividades no espaço exterior, e a resolução de 1721 B, em que a Assembléia estimava sua crença de que a ONU deveria ser o ponto central da cooperação internacional na exploração e uso do espaço exterior com fins pacíficos;
8. Reconhecemos que o Comitê sobre o Uso Pacífico do Espaço Exterior, assistido pelo Escritório para Assuntos do Espaço Exterior do Secretariado, tem atuado ao longo dos últimos 50 anos como plataforma única de nível mundial na área da cooperação internacional em atividades espaciais, e que a Comitê e seus órgãos subsidiários são a vanguarda na busca de fazer com que o mundo una esforços no uso da ciência e tecnologia espaciais para preservar a Terra e o ambiente espacial e assegurar o futuro da civilização humana;
9. Reconhecemos ter havido mudanças significativas na estrutura e no conteúdo do empreendimento espacial, como revelam o surgimento de novas tecnologias e o número crescente de atores em todos os níveis e, como efeito, observamos com satisfação os progressos logrados no fortalecimento da cooperação internacional no uso do espaço exterior com fins pacíficos, mediante o aumento da capacidade dos Estados de promoverem o desenvolvimento econômico, social e cultural, e o fortalecimento do marco regulatório e seus mecanismos para este fim;
10. Reafirmamos a importância da cooperação internacional para promover o Estado de direito, inclusive as normas pertinentes do direito espacial, e a adesão mais ampla possível aos tratados internacionais que promovem o uso do espaço exterior com fins pacíficos;
11. Expressamos nossa firme convicção de que a ciência e a tecnologia espaciais e suas aplicações, tais como as comunicações por satélite, os sistemas de observação da Terra e as tecnologias de navegação por satélite, oferecem ferramentas essenciais para prover soluções viáveis de longo prazo na área do desenvolvimento sustentável e podem contribuir mais eficazmente para os esforços com vistas a promover o desenvolvimento de todos os países e regiões, melhorar a vida das pessoas, preservar os recursos naturais de um mundo com população crescente, que exerce pressão cada vez maior sobre todos os ecossistemas, e estar melhor preparados para enfrentar os desastres naturais e mitigar suas conseqüências;
12. Expressamos nossa profunda preocupação com a fragilidade da ambiente espacial e os problemas da sustentabilidade a longo prazo das atividades espaciais, especialmente o impacto dos dejetos espaciais;
13. Destacamos a necessidade de se prestar mais atenção à forma como os sistemas e tecnologias avançadas de pesquisa e exploração do espaço exterior poderiam contribuir para resolver desafios como, em particular, a mudança climática global, a segurança alimentar e o bem-estar global, e se examinar como os resultados diretos e indiretos da pesquisa científica sobre vôos espaciais tripulados poderiam ampliar benefícios, especialmente para países em desenvolvimento;
14. Enfatizamos que a cooperação regional e inter-regional em atividades espaciais é vital para fortalecer o uso do espaço exterior para fins pacíficos, ajudar os Estados a desenvolverem suas capacidades espaciais e contribuir para a realização dos objetivos expressos na Declaração do Milênio (Resolução 55/2 da Assembléia Geral das Nações Unidas);
15. Confirmamos a necessidade de coordenação mais estreita entre o Comitê para o Uso Pacífico do Espaço Exterior e outros organismos intergovernamentais envolvidos no programa de desenvolvimento mundial das Nações Unidas, inclusive em relação às principais conferências e cúpulas das Nações Unidas sobre desenvolvimento econômico, social e cultural;
16. Instamos todos os Estados a adotarem medidas nos níveis nacional, regional, inter-regional e global para trabalharem em conjunto no uso da ciência e tecnologia espaciais e suas aplicações, a fim de preservar a Terra e o ambiente espacial para as gerações futuras.
Fonte: Agência Espacial Brasileira (AEB)
Comentário: Em nossa opinião o artigo do competente José Monserrat Filho nos trás importantes informações sobre os rumos da política espacial no mundo em época de entendimento, e também (mesmo que de forma discreta) a perda de prestígio do Brasil neste setor (se é que já tivemos algum) devido infelizmente a ainda insignificante contribuição brasileira nessa importante e crucial área para o futuro da humanidade. Situação essa que é bastante preocupante para gerações futuras de nossa sociedade e que certamente trará grandes problemas para o país. Temo que sendo o Brasil o berço de grande parte dos produtos agrícolas do mundo, de grande parte do reservatório de água potável do planeta, de grande parte de recursos naturais minerais entre tantas outras coisas que o país dispõem, seja a tecnologia espacial crucial para a soberania do país e sobrevivência de nosso povo. Alerto aos “Cabecinhas de Panetone” que militam nos bastidores de Brasília, desde a presidência aos mais baixos escalações do poder, do grande risco e erro histórico que um país como o Brasil está correndo quando não investe com consistência e seriedade nessa nova fronteira da humanidade. Vocês serão os responsáveis pelo que ocorrer com os nossos filhos e netos, pois na luta pelo sobrevivência sobrevive o mais forte e mais preparado para lidar com as adversidades.
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