A farra dos cursos na AEB! (Parte II)

Olá, leitor!

Depois da matéria "A farra dos cursos na AEB! (Parte I)", a AEB veiculou notícias em suas redes sociais alardeando que "preza pela geração de conhecimento de alto nível a ser utilizado no segmento espacial e pela capacitação dos seus servidores”. Essa clara campanha de desinformação foi contestada pelo BS na matéria em "AEB: "Aqui tem espaço..." para a cara de pau, a mentira e a dissimulação! [A farra dos cursos na AEB! (Parte I.I)]".
Imagem: https://www.bancariosparanagua.org.br/noticia/dez-casos-absurdos-de-desperdicio-de-dinheiro-publico

Resolvemos verificar como anda esse alegado apreço. Iniciamos com uma busca das ações de capacitação no sítio da AEB que revelou a opacidade que caracteriza a atual gestão quando o assunto é prestar contas à sociedade. Contrariando o que prescreve a portaria que regulamenta a Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas (PNDP) no âmbito da Agência Espacial Brasileira (Portaria Nº 274, de 24/10/2019), que determina que "as ações de desenvolvimento de pessoas serão divulgadas na internet, de forma transparente e objetiva"; no sítio da AEB na internet não se encontra informação nenhuma sobre esse assunto.

Mas o Brazilian Space vai ajudar a AEB a cumprir o seu dever de dar publicidade aos seus atos. Numa pesquisa na internet, descobrimos a seleção de dois comissionados da AEB, indicados pelo Presidente da autarquia, para participar de uma pós-graduação na Escola Superior de Guerra (ESG), no Curso Superior de Inteligência Estratégica (https://www.esg.br/cursos-regulares/csie).

Importante destacar que, os dois comissionados estão listados no referido curso como se fosse vinculados ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), ao invés da AEB.

É de se estranhar a falta de divulgação porque a seleção para uma pós-graduação de 712 horas/aulas na ESG, com direito a viagem de estudo nacional, deveria ser vista como uma conquista importante e ser digna de publicidade, não é verdade? Mas, por alguma razão, a AEB não quis dar notícia da seleção dessas pessoas. Para isso, sabendo como a AEB trata das questões de acesso à informação, solicitamos a ESG, via Lei de Acesso à Informação, a confirmação dos nomes, o que foi respondido positivamente, confirmando os dados do site (www.esg.br/Avisos/csie.pdf), veja:

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Imagem: Print de tela da consulta e da resposta (Fonte: https://falabr.cgu.gov.br/).
No resultado desta seleção, identificamos novos indícios de desrespeito às normas, descompromisso com resultados, ausência de justificativa válida, planejamento precário, improviso e desvio de finalidade; além de indícios de favorecimento desses dois comissionados em detrimento dos servidores efetivos de carreira. É bom lembrar que por não ser mais servidor do quadro da carreira de C&T, posso falar com isenção, mas, também, com propriedade sobre esse tema. Reconhecemos a importância da capacitação dos quadros da AEB (concursados ou não), mas, é a capacitação dos servidores efetivos da carreira de ciência e tecnologia que trará resultados a médio e longo prazo para a AEB. Esses comissionados que estão sendo beneficiados com cursos de elevado valor podem sair a qualquer momento da AEB, devido ao seu vínculo de caráter transitório com a Administração Pública; e os recursos aplicados em sua capacitação serão perdidos. Apenas estes comissionados irão se beneficiar, enriquecendo seus currículos, pois não haverá exigência de contrapartida do que foi gasto em sua capacitação. Ao contrário dos servidores efetivos que tem o compromisso de permanecer na agência por período igual ao da capacitação, como contrapartida. Agraciados com cargos comissionados, portanto, dispensados do esforço de obter aprovação em concurso público, seguem beneficiados com o melhor que a AEB pode oferecer em termos de capacitação. Uma pós-graduação na Escola Superior de Guerra, além do mestrado na UnB que estão cursando. O que, mais uma vez, contraria a portaria nº 274 da própria AEB (link) que impõe o dever de "garantir que a oferta das ações de desenvolvimento aconteça de maneira equânime a todos os servidores, privilegiando a alternância". Esses dois comissionados já estavam selecionados para o mestrado da UnB quando foram beneficiados com a indicação para participar da pós-graduação na ESG. Parece que, quando o assunto é participar de cursos de pós-graduação e mestrado às custas do erário, não tem ninguém mais apto na AEB do que esses dois comissionados. A pós-graduação de 712 horas/aula na Escola Superior de Guerra, com direito a viagem de estudo nacional O objetivo da pós-graduação de Inteligência Estratégica da ESG é "preparar civis e militares para o exercício de funções de Inteligência Estratégica na administração pública e, em especial, nos órgãos componentes do Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN).". O curso, que será realizado na modalidade mista (parte a distância e parte presencial), tinha previsão para ocorrer nos períodos de 8 a 12 de fevereiro (fase a distância) e de 22 de fevereiro a 16 de julho de 2021 (fase presencial, em tempo integral), porém foi adiado para o segundo semestre deste ano, em razão da pandemia. Apesar de existirem várias coisas estranhas na seleção dos dois comissionados, a primeira e mais evidente é que a AEB tem uma Diretoria de Inteligência Estratégica e Novos Negócios (DIEN) e nenhum servidor dessa diretoria foi selecionado para participar do referido curso. Ou seja, nenhum servidor da diretoria responsável pela inteligência estratégica da AEB foi selecionado para o curso de inteligência estratégica da ESG. Como seria possível justificar a seleção da chefe de gabinete e do diretor de planejamento, orçamento e administração neste curso, uma vez que ocupam cargos cujas atribuições não incluem inteligência estratégica? Como explicar que nenhum servidor da diretoria encarregada da inteligência estratégica da AEB foi selecionado para esse curso? Posso garantir que não é por falta de servidores qualificados, pois na DIEN atuam vários analistas e tecnologistas da carreira de ciência e tecnologia que tiveram sua qualificação comprovada em concurso público, inclusive com prova de títulos e que trabalham na área há muitos anos. Também posso garantir que não é por falta de necessidade, pois, sendo essa a diretoria com as atribuições mais aderentes ao referido curso, a capacitação de seus servidores nesse tema iria agregar muito mais valor para a unidade e para a AEB. Esse é o retrato da barafunda em que se converteu a gestão da AEB. A confusão instalada nos cursos é reflexo de uma desordem muito maior. Parece haver na AEB uma organização subterrânea, que existe de fato, mas difere daquela representada no organograma. Ou melhor, uma desorganização subterrânea onde as iniciativas obedecem ao arbítrio de alguns poucos comissionados, que direcionam ou produzem as melhores oportunidades para eles mesmos, não para a organização. A farra dos cursos e essa nomeação desses gestores, além de outras evidências encontradas, também parecem indicar que os mesmos estão construindo para si papéis que vão muito além as competências de seus cargos. Este diretor, por exemplo, avoca para si as mais diversas atribuições como a de responsável por acordo de cooperação internacional.

Na Portaria nº 492 da AEB, de 25/01/2021, por exemplo, na condição de presidente substituto, esse diretor designou a si mesmo como "Diretor Nacional do Projeto de Cooperação Técnica Internacional - BRA/20/021 - Programa Espacial Brasileiro: fortalecimento institucional e novas perspectivas firmado no âmbito do Acordo de Cooperação Técnica Internacional entre a Agência Espacial Brasileira, a Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento".

Então se o diretor de planejamento, orçamento e administração tornou-se responsável por um acordo de cooperação internacional, podemos presumir que o assessor de cooperação internacional deve estar cuidando das licitações e contratos. Seria até o mais correto, uma vez que, liberado da sua responsabilidade de cuidar de acordo de cooperação internacional, o assessor de cooperação internacional poderia utilizar o tempo livre resultante para fiscalizar contratos e licitações como forma de retribuir a gentileza. Resta saber se com esses compromissos adicionais vai sobrar algum tempinho para esses gestores se dedicarem às responsabilidades dos seus cargos. Mas isso é outra história que vai dar pano pra manga.

Vamos continuar apurando Como fazia parte do processo de seleção para esse curso da ESG um "Parecer da instituição" (disponível em: https://www.esg.br/cursos-regulares/arquivos-cursos-reg/PARECERDAINSTITUIOCSIE2021.pdf), onde a AEB teve que apresentar as razões para os indicados realizarem o Curso Superior de Inteligência Estratégica (CSIE 2021), os motivos da indicação dos mesmos; além de destacar a importância do curso para os candidatos e para a Instituição no que diz respeito ao seu aproveitamento futuro, após a realização da pós-graduação. O BS vai se dedicar a obter, via LAI / Fala.br, tais documentos, bem como os documentos referentes a possível consulta à DIEN sobre a indicação de servidores para esse curso, conforme resumo da solicitação abaixo:
Imagem: Print de tela da solicitação de informações para a AEB (Fonte: https://falabr.cgu.gov.br/).

Outra questão é como será a classificação das ausências necessárias para cursar a pós-graduação da ESG e o mestrado na UnB. Mesmo que o mestrado da UnB seja realizado durante a jornada de trabalho e não gere o afastamento destes servidores, eles terão que dedicar parte do expediente para cumprir as tarefas necessárias para aprovação neste mestrado, inclusive com alguma aula presencial.

Porém, concomitantemente, terão que se ausentar por meio expediente ao longo de mais de cinco meses para participar da pós-graduação da ESG. Considerando que ambos ocupam cargos comissionados, resta saber como será resolvida a classificação de suas ausências que ocorrerão por meio expediente, como vimos. Mesmo havendo uma possível solução, a presidência da AEB, antes de indicar os dois para o curso na ESG, deveria ter feito uma avaliação mais criteriosa e responsável se todas essas regalias estariam de acordo com o interesse público, requisito indispensável.

Ou seja, a concessão de benefícios tão expressivos não poderia ter sido tão banalizada como vimos nestes casos. E com o agravante de que os dois estarão desfrutando de duas vantagens, cada um, simultâneas, visto que os cursos da UnB e da ESG serão concomitantes. O que implicará para a AEB, por longo período, na perda da força de trabalho dos dois servidores que ocupam cargos tão importantes e com alta remuneração.

Essas vantagens obtidas em termos de capacitação são inéditas! Por isso, vamos questionar a AEB para saber como os indicados vão participar dos dois cursos concomitantemente e ainda cumprir com suas obrigações como gestores da instituição. Em razão da inexistência de informações que a AEB tem o dever de fornecer, apresentamos o que foi possível obter até agora sobre os fatos encontrados, enquanto aguardamos pelas informações solicitadas. Rui Botelho (Brazilian Space)

Errata: O curso da ESG não contempla viagens internacionais, somente uma viagem de estudo nacional. Editado em 17/02/2021 10:44h

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