Qual o Melhor Caminho Para o Programa Espacial Brasileiro?
Olá leitor!
Trago agora para
você um artigo escrito por um dos jovens empreendedores das atividades
espaciais de nosso país que muito tem contribuído (evidentemente na medida do
possível neste universo de descaso e nada favorável ao empreendedorismo espacial
no Brasil) com a sua startup, especialmente na área educacional com a
realização anual do seu SPACE CAMP, evento este direcionado a alunos do ensino
médio.
Trata-se do jovem Oswaldo
Barbosa Loureda, CEO da startup “Acrux Aerospace Technologies”, um
jovem empreendedor, de visão, conhecido por ser um leão no trabalho e que felizmente (aqui aproveito
para lhe parabenizar publicamente) tomou a iniciativa de escrever um artigo
expondo a sua visão e apresentando as suas ideias para um debate saudável com a
nossa comunidade espacial sobre a situação atual de nosso “Patinho Feio”.
Quero deixar claro que o Blog BRAZILIAN SPACE estará
sempre aberto para qualquer pesquisador ou amante do tema que queira se
posicionar sobre tudo que está acontecendo com o nosso PEB, e mesmo apontar
soluções, desde que o artigo seja assinado como este do jovem Oswaldo Loureda, e
desde que o artigo não seja sem pé nem cabeça. Portanto, contamos com a sua
participação, como bem finalizou o jovem Oswaldo em seu artigo: “Discussões
entre representantes de todos os players do setor poderá trazer muito mais
luz sobre o melhor caminho a ser seguido”. Portanto colaborem.
Duda Falcão
Qual o Melhor Caminho Para o Programa Espacial Brasileiro?
Pela visão de um
pesquisador/empreendedor
Por Oswaldo Barbosa
Loureda,
CEO da startup Acrux Aerospace Technologies
A crítica mais
antiga que notamos sobre o Programa Espacial Brasileiro – PEB sempre foi a
mesma, “não temos verbas”, creio que desde o início do programa essa frase era
bastante repetida. Inicialmente, quando comecei a me apaixonar pela área
aeroespacial, e alguns anos depois descobri que o Brasil tinha de fato um PEB,
acreditava que seria apenas questão de tempo até termos nosso próprio lançador
operando e quem sabe até plataformas orbitais. Me formei como tecnólogo em
mecânica de precisão pela FATEC-SP, e no mês seguinte, mudei-me para São José
dos Campos, o berço aeroespacial brasileiro para iniciar o mestrado no ITA.
Cheguei na cidade
com diversos sonhos e expectativas, naturalmente algumas se frustraram e outras
não, mas passei um tempo muito precioso dentro do DCTA, entre 2007 e 2015, e
com certeza foi o período de minha vida em que mais aprendi, em todos os
sentidos. Nesse período conclui um mestrado em engenharia aeroespacial e um
doutorado em engenharia aeronáutica-mecânica, e em 2008 comecei minha startup,
a Acrux Aerospace Technologies, sob as orientações da incubadora tecnológica da
Fundação Casimiro Montenegro Filho, INCUBAERO.
Após esses anos
como pesquisador e empreendedor, ainda me surpreendo com diversas situações e
fatos do PEB, e como nossas atividades aeroespaciais são executadas. Temos
alcançado grandes resultados durante esses anos, e vi de perto como esses
resultados foram alcançados, tipicamente pelo esforço homérico de alguns
profissionais chaves em nosso PEB. No entanto, pela soma de recursos públicos
que é injetado no PEB, que ainda é pouco perto de nações pertencentes aos BRICS
por exemplo, sinceramente creio que poderíamos alcançar maiores resultados.
O primeiro desafio
que precisamos resolver é a famigerada lei de licitações no 8.666 de
1993, que emperra consideravelmente a contratação de serviços e a aquisição de
produtos por parte de órgãos públicos. A solução seria dispensar esse
instrumento para a P&D? Talvez em alguns países funcionaria, mas não no
Brasil de hoje, pelo simples fato de a classe empresária não ser ética o
suficiente ainda. Precisamos sim de novos marcos legais, mas de forma nenhuma
podemos dispensar a abertura a concorrência e tomada de preços.
Precisamos sim de
um marco legal que diferencie a pesquisa aeroespacial e que valorize a
indústria nacional, valorize a especialização dos funcionários, valorize a
cooperação com universidades mas não a torne exclusiva e faça tomada de preços
internacionais para evitar abusos de preços, prática quase constante na
indústria aeroespacial no Brasil.
O segundo desafio
esta na gestão de nosso PEB, por mais que a Agência Espacial Brasileira – AEB
seja atualmente a gestora do PEB, com o pessoal efetivo que a mesma possui é
praticamente impossível gerir eficientemente e com agilidade tudo o que esta
sendo executado em termos de PEB dentro do INPE, DCTA, CLBI, CLA e todas as
universidades envolvidas com o PEB (que ainda não são suficientes para as
pretensões do PEB). Como poderíamos esperar a criação de novos programas, a
gestão e a fiscalização efetiva de todas as ações do PEB? Vamos fazer uma
comparação não muito justa, mas por que não um dia? A NASA emprega mais de 18 mil
funcionários diretos e 40 mil sob contratos temporários, o JPL apenas, mais 5 mil
diretamente.
Creio eu que uma
modernização da AEB, com no mínimo o dobro de postos de trabalho seria de
enorme importância para nosso PEB, e não aumentaria significamente o volume de
recursos dispendidos para o setor. A contratação de um número suficiente de
funcionários especializados em gestão de projetos, gestão da inovação,
desenvolvimento estratégico, gestão pública e engenharia de sistemas iria
ajudar muito na fluência de todos os processos.
O terceiro grande
desafio lincado com o segundo é justamente o efetivo envolvido no PEB. Esse é
um problema bastante complexo, pois nesse momento temos dezenas de
profissionais pesquisadores da mais alta capacidade aposentando-se e indo
pescar. Esses excelentes profissionais deveriam possuir um regime de trabalho
diferenciado no final de suas carreiras, dedicando parte do tempo voltado para
o treinamento e capacitação de novos engenheiros.
Até ai, a criação
de um programa de mentoring é relativamente simples de implementar, mas
precisamos de muito mais contratações sejam por CLT ou concursos públicos. Ai
entra outra grande necessidade do nosso PEB, que já gerou problemas para
diversos gestores anteriormente. É necessário urgentemente a criação de mais um
instrumento jurídico que permita de forma desburocratizada a contratação legal
de funcionários por regime CLT. Tal possibilidade de contratação iria aumentar
muito a eficiência na gerência do quadro de efetivos, e suas alocações.
O quarto grande
desafio na minha visão é estabelecer uma relação mais justa e sustentável com a
indústria. Em muitos países desenvolvidos, empresas do setor espacial podem
sobreviver somente de contratos governamentais, mas definitivamente não é o
caso do Brasil. Devemos então criar demandas para sustentar a indústria? Absolutamente
esse não é o caminho, a indústria é quem deve servir aos interesses de
pesquisa, desenvolvimento e produção da nação.
Como vamos possuir
uma indústria espacial sustentável então? Primeiramente temos de acabar com
vantagens, indicações e o tráfico de influência que ronda algumas de nossas
indústrias aeroespaciais no Brasil atualmente. Tal problema gera atrasos,
produtos com baixa qualidade e principalmente preços abusivos que tornam
qualquer projeto inviável. Por mais que tivéssemos a causa da nacionalização a
alguns anos, hoje precisamos pensar de forma diferente, mais voltada para o
mercado, rumo a sustentabilidade do programa.
As indústrias
espaciais no Brasil precisam se diversificar, e atender outros mercados além do
segmento espacial, de forma a manter sua saúde financeira e suas equipes. Essa
é uma premissa no Brasil, e não é uma estratégia nova. Dessa forma, as empresas
podem atender a contratos específicos quando necessário, e não precisam aplicar
preços abusivos para manter o caixa da empresa por anos.
Atualmente
possuímos algumas empresas nesse setor que se negam a diversificar e mantêm
suas atividades baseando-se em editais de P&D, no entanto, ao agirem dessa
forma contribuem para o monopólio e a extinção das micro e pequenas empresas no
setor. Em um pais com recursos limitados como o Brasil uma solução para o
desenvolvimento de um PEB sustentável está justamente na criação de dezenas ou
centenas de micro e pequenas empresas, intimamente integradas as universidades
e os institutos de pesquisa, tal ecossistema é encontrado em diversos polos
tecnológicos pelo mundo, como o Vale do Silício.
Devido a natureza
inovadora de sua gestão, essas startups tem enorme potencial de desenvolvimento
de avanços tecnológicos e solução de problemas com frações do custo de empresas
de maior porte, no entanto, esse tipo de empreendimento necessita de apoio governamental
em seus primeiros anos, mas a maior parte dos recursos que deveriam servir para
esse fim no Brasil tem sido injetados em pouco inovadoras e caras empresas de
médio e grande porte a vários anos.
O quinto grande
desafio a vencer esta na cooperação internacional, que é
atualmente um dos grandes pilares do desenvolvimento aeroespacial mundo a fora.
O Brasil por algumas razões históricas, algumas escolhas tecnológicas e algumas
vendas de armamentos a paises não amigáveis aos USA, tem grandes restrições na
importação de componentes, sistemas e mesmo cooperação em algumas áreas,
principalmente lançadores.
Além desse
histórico, o Brasil na última década tem se aproximado de países comunistas ou
pseudocomunistas, e isso tem dificultado o diálogo no sentido de acesso a
tecnologias correlatas a área de lançadores. No entanto, o INPE tem feito
grandes avanços em missões internacionais científicas e de observação da terra.
Creio que o modelo de cooperação que o INPE tem estabelecido com diversas
agências espaciais tem funcionado muito bem ao longo desses anos, e creio que
poderíamos tentar replicar esse modelo no campo de lançadores, e de forma mais
intensa buscando parceiros talvez dentro do bloco dos BRICS ou mesmo de países
do leste europeu.
Não creio de forma
alguma que meu ponto de vista contemple todo o problema, mas gostaria de
contribuir com alguns aspectos que creio serem importantes, e que tipicamente não
vejo muito diálogo. Nesse sentido creio que mais discussões e com mais
representantes de todos os players do setor poderia trazer mais luz
sobre o melhor caminho a seguir.
Oswaldo
ResponderExcluirParabéns pela iniciativa.
Concordo plenamente com você.
Precisamos no setor aeroespacial brasileiros honestos, esforçados e amantes desta tecnologia, gente que faz, assim como você.
Um grande abraço
Prof. Miraglia
Belo texto Oswaldo. Concordo com tudo que disse.
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