Presente de Aniversário Para a Agência Espacial Brasileira
Olá leitor!
Segue abaixo mais um artigo do Sr. José Monserrat Filho
postada dia (05/02) pelo companheiro André Mileski em seu "Blog Panorama
Espacial".
Duda Falcão
Presente de Aniversário Para a
Agência Espacial
Brasileira
“Tenham coragem. Não tenham medo de sonhar coisas grandes.”
Papa Francisco
José Monserrat Filho *
A AEB completa 22 anos de
existência agora no dia 10 de fevereiro.
Qual seria o melhor presente para festejar a data? É o que tento sugerir aqui.
A certidão de nascimento da
AEB é a Lei nº 8.854, de 10 de fevereiro de 1994, sancionada pelo então Presidente Itamar Franco depois de
aprovada pelo Congresso Nacional. Essa lei continua em plena vigência, ainda
que com algumas atualizações.
Seu art. 1º anuncia algo
histórico: “Fica criada, com natureza civil,
a Agência Espacial Brasileira (AEB), autarquia federal vinculada à Presidência
da República, com a finalidade de promover o desenvolvimento das atividades
espaciais de interesse nacional.” E mais: o art. 2º dota a AEB de “autonomia
administrativa e financeira, com patrimônio e quadro de pessoal próprios”.
Vale enfatizar: a AEB é
órgão civil, não militar. Era o que pleiteavam
entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a
opinião pública em geral, após a democratização do país, em 1985. A AEB veio
substituir – com nove anos de atraso, diga-se – a Comissão Brasileira de
Atividades Espaciais (COBAE), criada em 1971 pelo regime militar para
assessorar o Presidente da República. O Estado-Maior das Forças Armadas
desempenhava papel central na COBAE.
A AEB tem ampla competência, que começa pelo dever de executar e fazer executar a
Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE) e propor
sua atualização, bem como de elaborar e atualizar os Programas Nacionais de
Atividades Espaciais (PNAE). O PNAE atual refere-se ao período 2012-2021. Ao
todo, conforme o art. 3º da Lei nº 8.854, são 14 mandatos da AEB. Apenas para
dar uma ideia deles, eis aqui os oito mais importantes:
“I – executar e fazer executar
a Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE), bem
como propor as diretrizes e a implementação das ações dela decorrentes;
II – propor a atualização da
Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais e as diretrizes
para a sua consecução;
III – elaborar e atualizar os Programas Nacionais de Atividades Espaciais
(PNAE) e as respectivas propostas orçamentárias;
IV – promover o relacionamento
com instituições congêneres no País e no exterior;
V – analisar propostas e firmar
acordos e convênios internacionais, em articulação com o Ministério das
Relações Exteriores e o Ministério da Ciência e Tecnologia, objetivando a
cooperação no campo das atividades espaciais, e acompanhar a sua execução;
VI – emitir pareceres relativos
a questões ligadas às atividades espaciais que sejam objeto de análise e
discussão nos foros internacionais e neles fazer-se representar, em articulação
com o Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Ciência e
Tecnologia;
VII – incentivar a participação
de universidades e outras instituições de ensino, pesquisa e desenvolvimento
nas atividades de interesse da área espacial;
VIII – estimular a participação
da iniciativa privada nas atividades espaciais;...”
Não é pouca coisa. São mandatos
de alta relevância para o desenvolvimento espacial do país. Ainda mais que os
benefícios do espaço são hoje essenciais à vida normal de todos os países.
Não se pode confundir a
Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE) com o
Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE). A PNDAE foi instituída pelo Decreto n.º 1.332, também
firmado pelo Presidente Itamar Franco em 8 de dezembro de 1994, nove meses após
a fundação da AEB. Elaborada pela própria AEB, a PNDAE estabelece objetivos e
diretrizes para os programas e projetos da área espacial e tem no PNAE seu
principal instrumento de planejamento e programação para períodos de dez anos.
Ela nasceu, certamente, como parte do esforço do governo brasileiro para
demonstrar aos países mais desenvolvidos que o programa espacial brasileiro era
civil. O Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis (Missile Technology Control
Regime – MTCR), instituído em 1987, liderado pelos Estados Unidos e outras
potências, bloqueou em 1988 a construção do VLS (Veículo Lançador de
Satélites), parte essencial da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB),
anunciada em 1980. Acusação: o VLS seria na realidade um míssil de longa
distância. Em resposta, o Brasil aderiu ao MTCR em 1995, um ano após a fundação
da AEB e a aprovação do PNDAE, deixando claro que seu programa espacial era
pacífico, e que o VLS não tinha pretensões a ser míssil.
O PNAE é elaborado pela AEB
e aprovado pelo seu Conselho Superior.
Composto por representantes de todos os ministérios ligados às atividades
espaciais, nomeados pelo Presidente da República, o Conselho Superior da AEB
tem extrema importância jurídica e operacional. Suas deliberações são
fundamentais para a execução da PNDAE e do próprio PNAE.
“As atividades espaciais
brasileiras serão organizadas sob forma sistêmica, estabelecida pelo Poder Executivo”, determina o art. 4º
da Lei que criou a AEB. Ou seja, as instituições que realizam atividades
espaciais devem funcionar de modo a constituir um sistema coerente, entrosado e
cooperativo, ainda que cada uma delas mantenha sua autonomia.
Daí surgiu o Sistema
Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (SINDAE), cerca de dois anos depois da AEB e da PNDAE, para
“organizar a execução das atividades destinadas ao desenvolvimento espacial de
interesse nacional”. O SINDAE tem base no Decreto nº 1.953, de 10 de julho de
1996, firmado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso. Embora haja
dúvidas, críticas e certo ceticismo quanto à funcionalidade do SINDAE, esse
decreto nunca foi debatido ou revisto e continua em vigor. Conformar-se
ironicamente com “uma lei que não pegou” não se coaduna com o Estado Democrático
de Direito, estabelecido no art. 1º da Constituição Brasileira.
“O SINDAE é constituído por
um órgão central, responsável por sua coordenação geral, por órgãos setoriais, responsáveis pela coordenação
setorial e execução das ações contidas no Programa Nacional de Atividades
Espaciais (PNAE) e por órgãos e entidades participantes, responsáveis pela
execução de ações específicas do PNAE”, reza o art. 2º do Decreto nº 1.953.
O órgão central do SINDAE é
a AEB e os órgãos setoriais são o
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), ligado ao Ministério da
Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI); o Departamento de Ciência e Tecnologia
Aeroespacial (DCTA) e seu Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), e os Centros
de Lançamento de Barrera do Inferno (CLBI) e de Alcântara (CLA), todos
vinculados ao Comando da Aeronáutica, do Ministério de Defesa (MD). Também são
membros do sistema as universidades e as empresas da indústria espacial. O
funcionamento do SINDAE é regulado por resolução normativa aprovada pelo
Conselho Superior da AEB.
Cerca de 20 anos depois, em
2 de outubro de 2015, os então Ministros
da Defesa, Jaques Wagner, e da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aldo Rebelo,
criaram o “Grupo de Trabalho Interministerial para o Setor Espacial (GTI -
Setor Espacial)”, pela Portaria Interministerial nº 2.151. Esse GTI tem por fim
“assessorar, em caráter temporário, o Ministro de Estado da Defesa e o Ministro
de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação nos trabalhos relativos ao
aprimoramento do Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE), do Programa
Nacional de Atividades Espaciais (PNAE) e da Política Nacional de
Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE), a fim de organizar e
dinamizar as atividades espaciais no Brasil como um Programa de Estado”.
O GTI - Setor Espacial
também tem ampla competência:
“I - propor revisão do modelo de governança para as atividades espaciais no
Brasil;
II - propor a revisão da
legislação, no que couber, com vistas a:
a) formalizar um Programa de
Estado para as atividades espaciais no Brasil;
b) propor um regime
diferenciado de contratação de pessoal especializado do setor espacial; e c) propor
um regime diferenciado para aquisição de bens, serviços, obras e informações
com aplicação direta nos projetos e instalações do setor espacial;
III - apresentar proposta de
revisão do PNAE para o decênio 2016-2025, harmonizando as diversas iniciativas
espaciais em curso;
IV - propor um Projeto
Mobilizador, para o período de cinco anos, visando fomentar o desenvolvimento
da indústria nacional, quanto aos seus componentes basilares: satélite,
lançador e infraestrutura de lançamento e operação;
V - identificar as necessidades
e propor um plano de recomposição, readequação e ampliação dos quadros de
pessoal especializado do setor espacial, no Comando da Aeronáutica e no
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE); e
VI - propor um plano de
valorização e divulgação das atividades espaciais no Brasil.”
O GTI é composto por membros
titulares e suplentes indicados pelo MD e MTCI, e sua coordenação está a cargo do Comando da Aeronáutica
do MD, como reza a Portaria, acrescentando que os relatórios e estudos
produzidos pelo GTI Espacial devem ser encaminhados ao MD pelo Comando da
Aeronáutica, e ao MTCI pelo INPE. E mais: o GTI pode convidar representantes de
outros órgãos ou entidades, públicas ou privadas, para participar de suas
reuniões e opinar nas suas proposições, sem, contudo, gerar a obrigação de
acatar as sugestões por eles emanadas.
Em momento algum a Portaria
menciona a AEB, que, aliás, tomou ciência
do GTI apenas pelo noticiário. Em termos legais, vale lembrar: uma lei aprovada
pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República tem muito
mais peso do que uma Portaria Interministerial. Essa não pode, de modo algum,
ignorar ou desconhecer aquela. Há uma hierarquia clara e imperativa entre os
instrumentos jurídicos. Trata-se de um princípio elementar do direito.
Todos os Ministros de Estado
têm o direito de recorrer a portarias interministeriais, se e quando julgarem
isso necessário, inclusive para criar grupos de trabalho conjuntos. O que não
tem amparo legal é criar uma portaria interministerial que se coloque acima de
uma lei federal em pleno vigor. Ainda mais quando a intenção manifesta é
alcançar um nobre e elevado objetivo nacional: a criação de uma Política
Espacial de Estado, antigo sonho da comunidade espacial brasileira.
Eis, então, a minha sugestão
de presente de aniversário para comemorar os 22 anos da AEB: reconhecer a vigência da Lei nº 8.854, acatar o papel
legal e legítimo da AEB, como ativa participante de qualquer plano de revisão
da política e do programa nacional de atividades espaciais, e, como
consequência natural, substituir a referida Portaria Interministerial MD-MCTI.
A alternativa disso seria ainda
mais dolorosa: anular a Lei nº 8.854 e as que vieram a seguir (PNDAE e SINDAE),
nela calcadas. Mas não é precisamente isso o que, na prática, parece estar
acontecendo, bem diante dos nossos olhos e do nosso senso de justiça?
* Vice-Presidente da
Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor
Honorário do Instituto Internacional de Direito Espacial, Membro Pleno da
Academia Internacional de Astronáutica (IAA) e ex-Chefe da Assessoria
Internacional do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da
Agência Espacial Brasileira (AEB). E-mail: jose.monserrat.filho@gmail.com.
Fonte: Blog Panorama Espacial - http://panoramaespacial.blogspot.com.br/
Comentário: Bom Sr. José Monserrat, sugestão existem inúmeras
por ai em diversos documentos que foram elaborados para melhorar o desempenho
do PEB e deste órgão inócuo e fantasioso, mas usar os 22 anos de existência desta
agencia de brinquedo que mais atrapalhou do que ajudou desde que foi a criada,
e justamente quando o senhor já não faz mais parte do Ministério, é muito fácil
e conveniente. Porque o senhor não fez esta sugestão de forma pública quando
estava no governo como esta fazendo agora? Ora Sr. Monserrat, faça-me uma
garapa.
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