Dove-OSCAR 17: O Primeiro Satélite Verdadeiramente 100% Brasileiro
Olá leitor!
Segue abaixo um interessantíssimo artigo postada ontem (08/03)
no site do “Olhar Digital” tendo como destaque a história do Satélite
Dove-OSCAR-17, o primeiro satélite verdadeiramente 100% brasileiro, e do
seu idealizador, o engenheiro e radioamador Júnior Torres de Castro.
Duda Falcão
CIÊNCIA E ESPAÇO / COLUNISTAS
Dove-OSCAR 17: O Primeiro Satélite Verdadeiramente 100% Brasileiro
Satélite inteiramente projetado e construído por um
paulista de Botucatu foi colocado em órbita em 1990 e transmitia mensagens de
paz para a humanidade
Por Por Marcelo Zurita*
Olhar Digital
8 de março de 2021
No dia 28 de fevereiro foi lançado a partir do Centro Espacial de Satish Dhawan, na
Índia, o satélite brasileiro Amazônia-1, que tem como principal função
monitorar nossas florestas a partir do espaço. O
Amazônia-1 é o mais moderno satélite do Brasil e certamente um grande feito da
engenharia aeroespacial nacional. Mas você sabia que, ao contrário do que foi
informado em grande parte da imprensa, ele não é o primeiro satélite 100%
brasileiro?
Créditos: ISRO
Segundo o INPE, que desenvolveu o satélite, o Amazônia-1 é o primeiro
satélite de observação da Terra completamente projetado, integrado,
testado e operado pelo Brasil. Mas quando consideramos todas as outras
categorias de satélites, o primeiro 100% nacional foi projetado e construído
por um radioamador de Botucatu, no interior de São Paulo. Ele foi a única
pessoa no mundo a ter um satélite só seu, mas que levou sua mensagem de paz ao
redor do mundo.
Júnior Torres de Castro
Júnior Torres de Castro sempre foi uma pessoa acima da
média. Graduou-se em Engenharia Civil, Física e Engenharia Elétrica. Fez uma
série de outros cursos de pós-graduação no exterior, até atingir o nível de
PhD. Viajava pelo mundo inteiro e falava várias línguas com fluência. Era
também um empreendedor de sucesso, possuindo empresas na área de construção
civil e mineração. Mas sua paixão era mesmo o radioamadorismo.
Imagem: Reprodução YouTube
Seu interesse pelo rádio veio do berço. Seu pai era
diretor dos Correios e Telégrafos numa época em que grande parte da comunicação
de longa distância era feita através de rádios. Ainda criança ele ganhou de sua
mãe o livro “Conheça seu Rádio” e, seguindo as instruções do livro, ele
construiu seu primeiro rádio com 12 anos de idade.
O Sonho de Uma Vida
Júnior tinha 24 anos e já era engenheiro formado quando,
em 1957, captou os sinais transmitidos pelo Sputnik, o primeiro satélite
artificial em órbita da Terra. Apesar do seu deslumbramento com o Sputnik,
aqueles bips transmitidos pelo satélite intrigaram o jovem radioamador. O que
seriam eles? Teriam algum significado?
Foto: Korolev/Wikimedia
Quando descobriu que os bips transmitiam informações de
telemetria do satélite, Júnior Torres começou a planejar aquilo que se tornaria
o sonho da sua vida: construir um satélite que se comunicasse com as pessoas
aqui na Terra, utilizando transmissão de voz.
Empenho, Dedicação e Superação
Ele sabia que para realizar esse sonho precisaria de
muito dinheiro e de muito conhecimento. Na época, era operador de telégrafo dos
Correios de Botucatu, mas era do que ganhava perfurando poços artesianos que
vinham grande parte dos recursos que ajudaram a realizar seu sonho. E graças a
seu empenho e determinação, em pouco tempo ele estaria entre os mais
importantes engenheiros de satélites da época.
Ele passou a frequentar os principais congressos
internacionais da área. De início todos estranharam a presença do brasileiro.
Afinal, era apenas um radioamador de um país sem tradição na pesquisa espacial.
Mas como Júnior estava sempre lá, eles tiveram que se acostumar com a ideia, e
com o tempo, ele passou a ser respeitado e admirado pelos cientistas.
O Little Brick (Tijolinho)
Até que em 1989, Junior Torres de Castro resolveu que era
hora certa para realizar seu sonho. Ele já tinha uma boa reserva financeira e
conhecimento mais que suficiente, além de ser amigo de todos os principais
cientistas e construtores de satélites do planeta. Foi então que ele
apresentou, em um congresso em Logan, nos Estados Unidos, um protótipo do seu
satélite para um auditório lotado de cientistas do mundo inteiro.
Ele havia trabalhado no projeto e na construção desse
protótipo nos últimos 5 anos. Tudo feito em sua casa, em São Paulo, utilizando
peças compradas na Santa Ifigênia, uma importante rua de comércio de
componentes eletrônicos da capital paulista. Naquele momento, em Logan, ele
submetia o resultado desse trabalho aos maiores nomes da ciência aeroespacial
da época.
Sobre a mesa, Júnior colocou seu pequeno satélite.
Pequeno como uma cafeteira, mas que cabia o sonho de uma vida. Do fundo do
auditório, ele acionou e comandou o equipamento através de um hand talk, e via
rádio, recebia, diante de uma plateia admirada, a voz sintetizada trazendo as
informações de telemetria do satélite.
Foto: Acervo Júnior Torres de Castro
Little-brick (Tijolinho), o protótipo do satélite
projetado e construído por Júnior Torres de Castro.
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Numa época em que os satélites chegavam a ter o tamanho
de um caminhão, algo tão pequeno e funcional era revolucionário. Júnior
introduziu então, o conceito de “microssatélites” e seu protótipo recebeu o
apelido carinhoso de “Little-Brick”, que significa “Tijolinho”.
Só que o Little-Brick infelizmente não poderia ser
colocado em órbita. Ele foi construído com peças que não aguentariam as
condições extremas do espaço. Para ser enviado ao espaço, seu satélite
precisaria ser construído com peças desenvolvidas especificamente para o
ambiente espacial, que operassem no vácuo e que suportassem as enormes
variações de temperatura e o bombardeio de raios cósmicos. E essas peças
especiais, além de extremamente caras, eram de uso restrito, tendo o comércio
controlado pelo governo e vetada a exportação para outros países.
A Materialização de Um Sonho
Mas graças ao sucesso daquela apresentação no congresso e
aos inúmeros amigos que Júnior fez naquele meio, ele conseguiu convencer as
autoridades americanas a autorizar a venda das peças que precisaria. Convenceu,
mas nem tanto. Para montar seu satélite, ele precisou se mudar para os Estados
Unidos. As peças só seriam entregues lá e ele só poderia trabalhar com elas sob
a supervisão do governo americano. Parece chato, mas Júnior não exitou.
Mudou-se para lá e iniciou a montagem.
Foto: Acervo Júnior Torres de Castro
Júnior Torres amava tudo o que fazia e por isso, sempre
fazia com excelência. Era uma pessoa cativante. Sempre muito atencioso e
prestativo. Durante suas viagens pelo mundo, em meio à Guerra Fria, ele
entrevistou e gravou cerca de 3 mil crianças, mandando mensagens de paz para a
humanidade. Júnior queria que essas mensagens fossem transmitidas para todo o
planeta a partir do seu satélite. Convencidos da importância daquele projeto,
os fabricantes de componentes resolveram contribuir com sua realização. Alguns
doaram os componentes, outros venderam a preço de custo.
Com todo o apoio que recebeu, Júnior conseguiu montar seu
satélite em apenas 11 meses, e gastando “apenas” US$ 225 mil, o que era uma
pequena fortuna na época, mas bem menos que os US$ 4 milhões que ele esperava
gastar. Júnior tinha em mãos o satélite que ele havia idealizado 33 anos antes,
quando ouviu os bips do Sputnik através do seu rádio. Faltava apenas lançá-lo
ao espaço.
This is DOVE in Space
Mas Júnior era tão bem relacionado e tão respeitado no
meio que não foi difícil conseguir um foguete. Oficialmente chamado de
DOVE-OSCAR 17, o satélite pegou carona no foguete Ariane 40 H10, lançado do
Centro Espacial de Kourou, na Guiana Francesa, e foi colocado em órbita em 20
de janeiro de 1990. Tudo isso acompanhado de perto pelo irradiante Júnior
Torres, que pulava e gritava, comemorando a realização de seu sonho.
Foto: Acervo Júnior Torres de Castro
O DOVE era um cubo com 23 cm de lado e 12,92 Kg. Possuía
16 painéis solares que alimentavam suas baterias, o que lhe dava a capacidade
de operar por até 6 anos. Quem sintonizasse o DOVE, na frequência 145.825 MHz,
invés de bips, receberia a voz sintetizada do satélite. Ele se apresentava
dizendo “this is DOVE in space” (esse é DOVE no espaço) e informava 59
parâmetros de telemetria em voz e também codificados. Além disso, transmitia as
mensagens de paz nas vozes de 3 mil crianças de todo mundo, e as coordenadas
geográficas de sua posição no espaço. Isso tinha uma finalidade educacional.
Júnior distribuiu em escolas do Brasil e do mundo, milhares de rádios capazes
de sintonizar o satélite e também mapas onde as crianças poderiam localizar
onde estava o DOVE a partir das coordenadas enviadas.
Foto: Acervo Júnior Torres de Castro
O nome do satélite, DOVE, era um acrônimo para “Digital
Orbiting Voice Encoder”, mas também era uma referência à palavra em inglês
“dove” que significa pomba, o pássaro símbolo da paz. Outro apelido que o
satélite ganhou na época foi de “Peace Talker” que significa “aquele que fala
da paz”. “OSCAR” é a designação dada para os satélites de radioamadores, e o
DOVE era o 17° dessa categoria.
Um Exemplo de Vida
A realização de seu sonho, seu sucesso profissional e a
proximidade que tinha dos principais cientistas da época não afastaram Júnior
de suas origens. Através de seu rádio e utilizando a identificação PY2BJO, ele
conversava diariamente com seus amigos radioamadores do Brasil e do mundo, mas
também com seus amigos cientistas e com astronautas em órbita da Terra. Durante
vários anos Júnior visitou, nos meses de agosto, o Centro Espacial da Guiana
Francesa, onde trabalhava voluntariamente em retribuição pelo lançamento do seu
satélite feito gratuitamente pela Arianespace.
Foto: Acervo Júnior Torres de Castro
Por oito anos (dois além do previsto), o DOVE levou sua
mensagem de paz para o mundo. Em março de 1998, devido a uma falha nas
baterias, ele deixou de enviar seu sinal. Entretanto, o satélite ainda
está em órbita e, dependendo do alinhamento de seus painéis solares, eles
podem fornecer energia suficiente para que ele transmita, até hoje, seus dados
de telemetria.
Júnior faleceu em 2018 deixando esposa, filhos, netos, e
um satélite, que ainda vai orbitar nosso planeta por muitos anos. O DOVE-OSCAR
17, mais do que o primeiro satélite 100% brasileiro é prova do imenso legado de
dedicação à ciência e à paz de Júnior Torres de Castro, o brasileiro que
realizou o que poucas pessoas no mundo ousariam sonhar.
Com contribuições de Sebastião A. Silva (PY2KEY).
* Marcelo Zurita é presidente da Associação Paraibana de
Astronomia – APA; membro da SAB – Sociedade Astronômica Brasileira; diretor
técnico da Bramon – Rede Brasileira de Observação de Meteoros – e coordenador
regional (Nordeste) do Asteroid Day Brasil.
Fonte: Site Olhar Digital - https://olhardigital.com.br
Comentário: Pois é leitor, a Cesar o Que é de César. Já havíamos
abordado essa história em algumas oportunidades aqui no Blog, porém é sempre
bom lembrar daqueles que realmente contribuíram para o desenvolvimento das
atividades espaciais brasileiras, né verdade Ministro Marcos Pontes???? Parabéns
ao astrônomo Marcelo Zurita por trazer novamente esta história a público.
Nosso "astronauta" segue fazendo turismo.
ResponderExcluirHistória emocionante e cativante! Parabéns e Obrigado ao BS por trazer isto para nós!
ResponderExcluirO que está relatado é quase o princípio dos CUBESATs!
ResponderExcluirNão pelo tamanho e padronização, mas pelo conceito de usar componentes comercias (COTS).
Não foi dado mais detalhes, de repente isto estava contemplado, mas bastava adicionar arquiteturas resistentes à "falhas" ("Fault Tolerance Architecture") que seria parte do conceito moderno dos CUBESATs.
Para um "amador", isto foi fantástico!
Dove-OSCAR 17 (Digital Orbiting Voice Encoder) ou DO 17
ResponderExcluirO Dove-OSCAR 17, foi um microssatélite da série AMSAT (também conhecido como BRAMSAT no Brasil, atual AMSAT-BR)
Descrição
Nomes alternativos DO-17
Microsat 2
Tipo Cubesat
Missão Radioamadorismo
Educacional
Operador(es) Brasil BRAMSAT
Estados Unidos AMSAT
Identificação NSSDC 1990-005E
Identificação SATCAT 20440
Duração da missão 8 anos
Propriedades
Plataforma Cubesat
Massa 12,92 quilogramas (28,48 libras)
Altura 21 centímetros (0,6890 pés)
Largura 23 centímetros (0,7546 pés)
Comprimento 23 centímetros (0,7546 pés)
Potência elétrica 4 watts
Geração de energia Painéis solares fotovoltaicos
Baterias Níquel-cádmio
Projetista Brasil Junior Torres de Castro
Missão
Contratante(s) França Arianespace
Data de lançamento 22 de janeiro de 1990, 01:44:35 UTC
Veículo de lançamento União EuropeiaFrança Ariane 40 H10
Local de lançamento Guiana Francesa Centro Espacial de Kourou
Destino Órbita terrestre baixa
Último contato Março de 1998
Especificações orbitais
Referência orbital Helio-síncrona
Regime orbital Terrestre-baixa
Semi-eixo maior Desconhecido
Excentricidade orbital Desconhecida
Periastro 791 quilômetros (491,5 milhas)
Apoastro 821 quilômetros (510,1 milhas)
Inclinação orbital 98,7º
Período orbital 100,8 minutos
Argumento de periastro Desconhecido
Anomalia média Desconhecida
Época Desconhecida
Transponders
Frequências 145.825 MHz
2401.221 MHz