A China Diante do Direito Espacial
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo
escrito pelo Sr. José Monserrat Filho e postado ontem (22/11) no Blog Panorama
Espacial do companheiro André Mileski, tendo como destaque a posição da China
diante do Direito Espacial.
Duda Falcão
A China Diante do
Direito Espacial
José Monserrat Filho*
22/11/2014
“Os Estados-Partes do Tratado têm a
responsabilidade internacional das atividades nacionais realizadas no espaço
cósmico, inclusive na Lua e demais corpos celestes, quer sejam elas exercidas
por organismos governamentais ou por entidades não-governamentais, e de velar
para que as atividades nacionais sejam efetuadas de acordo com as disposições
anunciadas no presente Tratado. As atividades das entidades não-governamentais
no espaço cósmico, inclusive na Lua e demais corpos celestes, devem ser objeto
de autorização e vigilância contínua pelo respectivo Estado-Parte do Tratado.”
Artigo 6º do Tratado do Espaço de 1967
A China sempre respeitará o Direito Espacial
Internacional e planeja adotar sua própria legislação nacional sobre as
atividades espaciais até 2020, declarou o Diretor da Administração Nacional
Espacial da China (CSNA), Xu Dahze¹, que também é Vice-Ministro da Indústria e
figura de peso em áreas estratégicas da economia chinesa.
A Declaração foi feita na sessão de abertura do
Workshop sobre Direito Espacial, organizado em conjunto pelo Escritório das
Nações Unidas para Assuntos do Espaço Exterior (United Nations Office for Outer
Space Affairs – UNOOSA), pela CSNA e pela Organização Ásia-Pacífico de
Cooperação Espacial (Asia-Pacific Space Cooperation Organization – APSCO)². O
evento de cinco dias (17-21 de novembro) teve como tema central “O Papel da
Legislação Espacial Nacional no Fortalecimento do Estado de Direito”.
Xu Dahze acrescentou que a China já adotou diretrizes
políticas e regulamentos nacionais nas áreas de lançamentos espaciais civis,
registro de objetos espaciais, bem como de redução e prevenção de detritos
espaciais. O Secretário Geral da CNSA, Tian Yulong, por sua vez, informou que o
Direito Espacial Nacional está incluída no plano nacional de leis a serem criadas.
O workshop abordou os mais recentes desenvolvimentos
em política e Direito Espacial Internacional, as questões jurídicas sobre as
atividades comerciais envolvendo o espaço, a formação de especialistas e a
divulgação de informações no setor. Participaram do evento mais de 30 países e
organizações internacionais, em especial da região Ásia-Pacífico. A Diretora do
UNOOSA, Simonetta Di Pippo, salientou que o seminário vem ajudar os países a
cumprirem as normas do Direito Espacial Internacional, a utilizarem melhor o
espaço e a manterem a segurança espacial.
Os seminários da UNOOSA sobre Direito Espacial vem
sendo promovidos há mais de uma década. Já foram realizados na Holanda, em
2002, na Coreia do Sul, em 2003, no Brasil, em 2004 (por iniciativa da
Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial – SBDA), na Nigéria, em
2005, na Ucrânia, em 2006, no Irã, em 2009, na Tailândia em 2010, e na
Argentina, em 2012.
A China e os Tratados Internacionais
A China ratificou quatro dos cinco grandes tratados
elaborados e aprovados pelas Nações Unidas sobre o espaço e as atividades
espaciais:
1) Tratado sobre Princípios Reguladores das
Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e
Demais Corpos Celestes ("Tratado do Espaço"), de 1967;
2) Acordo sobre o Salvamento de Astronautas e
Restituição de Astronautas e de Objetos Lançados ao Espaço Cósmico
("Acordo de Salvamento e Restituição"), de 1968;
3) Convenção sobre Responsabilidade Internacional por
Danos Causados por Objetos Espaciais ("Convenção de Responsabilidade"),
de 1972; e
4) Convenção Relativa ao Registro de Objetos Lançados
ao Espaço Cósmico ("Convenção de Registro"), de 1976.
A China não ratificou, nem assinou, o Acordo que
Regula as Atividades dos Estados na Lua e Outros Corpos Celestes ("Acordo
da Lua"), de 1079. Não se conhecem os motivos dessa decisão.
O Livro Branco das Atividades Espaciais
A China já produziu três edições do “Livro Branco”
sobre suas atividades espaciais, em 2000, 2006 e 2011. Na edição mais recente,
o governo chinês afirma que “cada um e todos os países do mundo têm direitos
iguais para explorar livremente, desenvolver e utilizar o espaço exterior e
seus corpos celestes, e que as atividades espaciais de todos os países devem
ser benéficas ao desenvolvimento econômico, o progresso social das nações, à
segurança, à sobrevivência e ao desenvolvimento da humanidade”.3
E mais: “A cooperação espacial internacional deve
respeitar os princípios fundamentais estabelecidos na 'Declaração sobre a
Cooperação Internacional na Exploração e Uso do Espaço Exterior em Benefício e
no Interesse de todos os Estados, Levando em Especial Consideração as
Necessidades dos Países em Desenvolvimento'".4
No documento, a China sustenta também que “o
intercâmbio e a cooperação internacionais devem ser fortalecidos para promover
o desenvolvimento espacial inclusivo, com base na igualdade e benefício mútuo,
uso pacífica e desenvolvimento comum”.
Princípios Políticos Fundamentais
O “Livro Branco” diz ainda que “o governo chinês
adotou as seguintes políticas fundamentais sobre o desenvolvimento de
intercâmbios espaciais internacionais e de cooperação:
1) Apoiar as atividades espaciais de uso pacífico no
âmbito das Nações Unidas, bem como todas as ações das organizações
intergovernamentais e não-governamentais, que promovem o desenvolvimento da
indústria espacial;
2) Enfatizar a cooperação espacial regional na área
Ásia-Pacífico, e apoiar outras organizações regionais de cooperação espacial ao
redor do mundo;
3) Fortalecer a cooperação espacial com os países em
desenvolvimento e valorizar a cooperação espacial com países desenvolvidos;
4) Incentivar e endossar os esforços dos centros
nacionais de pesquisa científica, as empresas industriais, as instituições de
ensino superior e organizações sociais para o desenvolvimento espacial
internacional, o intercâmbio e a cooperação em diversas formas e em vários
níveis, sob a orientação dos respectivos estados, políticas, leis e
regulamentos;
5) Usar de forma apropriada tanto o mercado interno
quanto o externo – os dois tipos de recursos – e participar ativamente da
prática da cooperação espacial internacional.
Instituto de Direito Espacial da China
Cabe frisar ainda que a China tem seu Instituto de
Direito Espacial (CISL), fundado em 1992 por cinco ministérios e hoje
patrocinado pela CNSA e pela Corporação Chinesa de Ciência e Tecnologia
Aeroespacial (China Aerospace Science and Technology Corporation – CASC), além
de contar com a contribuição de seus sócios fundadores e sócios regulares.
O Instituto de Direito Espacial chinês, que busca
ligar a área acadêmica com o Governo e a indústria, forma especialistas,
promove eventos e estudos em escala nacional e internacional. Suas atividades
científicas incluem consultas ao serviço diplomático do país, contribuem no
preparo de leis e regulamentos, em particular sobre o desenvolvimento
industrial, defendendo a filosofia do Estado de Direito na indústria espacial.
A entidade também se empenha em atrair jovens juristas para programas de
formação profissional em outros países.
Destaque-se, igualmente, que o CISL organiza, desde
2003, a participação de crescente número de universitários chineses no Juri
Simulado Manfred Lachs, criado em 1993 pelo Instituto Internacional de Direito
Espacial (IISL). Foi ele que coordenou a organização local do 64º Congresso
Interacional de Astronáutica (IAC), realizado em Pequim, no mês de setembro de
2013.
O Precursor
Pioneiro do Direito Espacial na China, na etapa de
sua especialização (1982-1992), foi o Prof. He Qizhi, membro da Consultoria
Jurídica do Ministério das Relações Exteriores de seu país e autor dos livros
“Direito do Espaço Exterior” (“Outer Space Law”) e “O Progresso Jurídico do
Espaço na China” (“Legal Progress of Space na China”), lançados,
respectivamente, em 1992 e 1993., além de dezenas de artigos publicados em
várias revistas e anais de circulação internacional. Prof. He
Qizhi foi Diretor e Diretor Honorário do Instituto Internacional de Direito
Espacial. E recebeu importantes Prêmios da Federação Internacional de
Astronáutica (FIA) e da Academia Internacional de Astronáutica (AIA) por sua
obra.
Estas informações básicas revelam que a China já está
muito bem alicerçada e aparelhada para se lançar à relevante tarefa de erigir
sua legislação geral sobre as atividades espaciais.5
Notas & Referências
1) Xu Dahze esteve em Brasília em meados de julho
deste ano. Na mesma época o Presidente da China, Xi Jinping, participou da
Conferência de Cúpula do Fórum dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África
do Sul), realizada em Fortaleza, Ceará, e encontrou-se com a Presidenta Dilma
Rousseff no Palácio do Planalto. Ambos prestigiaram a assinatura de 32 atos de
parceria entre os dois países, inclusive um memorando de entendimento sobre
cooperação em dados de sensoriamento remoto por satélite. Outros 13 documentos
foram também firmados durante a visita presidencial.
2) A APSCO, fundada em Pequim, no ano de 2005, tem
como países membros Bangladesh, Indonésia, Irã, Mongólia, Paquistão, Peru,
Tailândia e Turquia, além da própria China.
3) Ver .
4) Resolução 51/122 da Assembleia Geral das Nações
Unidas; ver texto em .
5) Coincidentemente, o Brasil tem pela frente o mesmo
plano, já previsto no Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE
2012-2021), editado pela Agência Espacial Brasileira (AEB). A Associação
Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), graças ao trabalho de seu
Núcleo de Estudos de Direito Espacial (NEDE), já compôs um projeto de Lei Geral
das Atividades Espaciais no Brasil. Com esse projeto, a SBDA presta sua
contribuição ao estudo e ao debate que o país deve promover sobre a lei
necessária. O projeto já foi apresentado na sessão de 2014 do Subcomitê
Jurídico do Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Exterior
(UNCOPUOS), em Viena, Áustria, e na Reunião Anual da Sociedade Brasileira para
o Progresso da Ciência (SBPC), na Universidade Federal do Acre, em Rio Branco,
em julho de 2014.
* Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional
da AEB, Vice-Presidente da SBDA, Diretor Honorário do Instituto Internacional
de Direito Espacial e membro efetivo da Academia Internacional de Astronáutica
Fonte; Blog Panorama Espacial - http://panoramaespacial.blogspot.com.br/
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