Acelerações Quânticas
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo publicado na a edição de Julho de
2015 da “Revista Pesquisa FAPESP” destacando que
Nuvens de Átomos Frios podem ser usadas para medir tênues variações da Força da
Gravidade.
Duda Falcão
CIÊNCIA
Acelerações Quânticas
Nuvens de átomos frios podem ser usadas para medir
tênues
variações da força da gravidade
IGOR ZOLNERKEVIC
Revista Pesquisa DAPESP
ED. 233 - Julho 2015
© LÉO RAMOS
O físico
Philippe Courteille e seus colaboradores no Instituto de Física de São Carlos
(IFSC) da Universidade de São Paulo (USP) estão construindo um instrumento para
medir com alta precisão o efeito da força de gravidade da Terra sobre o chamado
condensado de Bose-Einstein, nuvens microscópicas compostas por cerca de 100
mil átomos de estrôncio mantidos a temperaturas próximas ao zero absoluto
(-273, 15º C). Esse equipamento – um gravímetro atômico – deverá permitir obter
em tempo real a intensidade da força gravitacional em escala microscópica, algo
ainda não muito bem mensurado. Existem outros instrumentos semelhantes no
mundo, com sensibilidade igualmente suficiente para medir forças gravitacionais
nessa escala. Mas os dispositivos existentes apenas reconstituem o movimento
dos átomos depois que ele já aconteceu e não conseguem acompanhá-lo ao vivo,
como prometem os pesquisadores de São Carlos. De acordo com eles, o novo
gravímetro terá aplicações práticas e em física fundamental.
Outros
experimentos com gravímetros atômicos – alguns já realizados, outros em
andamento – mediram a força gravitacional em escalas microscópicas. Mesmo
assim, ainda não se alcançou o mesmo grau de precisão obtido para as demais
forças fundamentais da física. “Há teorias que preveem que a lei da gravitação
de Newton pode não valer para distâncias menores que alguns micrômetros”, conta
Courteille. A lei da gravitação estabelece que a força de atração entre dois
corpos é inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles e
explica muito bem o que se observa no mundo macroscópico. “Talvez seja
necessário fazer modificações nessa lei de atração para explicar o que ocorre
no nível microscópico”, diz o físico.
As
aplicações práticas do novo gravímetro dependerão de sua sensibilidade. Se for
bastante elevada, o aparelho poderá ser usado para mapear reservas de petróleo
e minérios. Courteille ainda não tem condições de estabelecer o grau exato de
sensibilidade que seu instrumento poderá alcançar, mas estima que deve ser
capaz de superar os melhores gravímetros comerciais de alta precisão, que usam
feixes de laserpara medir a aceleração da gravidade que atua sobre
um pequeno espelho em queda livre no vácuo. Geofísicos usam esse tipo de
equipamento para mapear reservas no subsolo que tenham valor econômico.
Variações mínimas na aceleração da gravidade terrestre permitem detectar
diferenças nas densidades das rochas subterrâneas, indicando a presença de
minérios.
Courteille já tem pronta a peça fundamental do
gravímetro: a cavidade óptica anular. Trata-se de um trio de pequenos espelhos
especiais que ficam dispostos nos vértices de um triângulo, distantes cerca de
2 centímetros um do outro. São esses espelhos, cuidadosamente projetados e
arranjados, que devem garantir o sucesso do futuro aparelho, de acordo com
artigos publicados nas revistasOptic Express e Laser Physics Letters. Simulações
computacionais realizadas por Courteille e Romain Bachelard, do IFSC, em
parceria com Marina Samoylova e Nicola Piovella, da Universidade de Milão, na
Itália, e Gordon Robb, da Universidade de Strathclyde, no Reino Unido, indicam
que a cavidade óptica deve aprimorar o funcionamento do gravímetro por duas
razões. A primeira é que a cavidade deve evitar a destruição do condensado pelo
feixe de laser que interage com ele para medir seu
deslocamento. A segunda é que ela deve estabilizar as oscilações do condensado,
tornando-as mais regulares e previsíveis. Os pesquisadores submeteram neste ano
um pedido de patente do aparelho ao Instituto Nacional de Propriedade
Intelectual (INPI).
Em Queda Livre
Desde o final dos anos 1990, físicos realizam
experimentos usando átomos frios como gravímetros. Quando resfriados a
temperaturas próximas ao zero absoluto, alguns tipos de átomos podem se
aglutinar e formar o chamado condensado de Bose-Einstein. No condensado, os
átomos param de agir como partículas individuais e começam a se mover todos
juntos, formando uma nuvem de átomos idênticos – os físicos dizem que se
comportam como uma única onda de matéria. Vários gravímetros atômicos feitos
até agora medem como as propriedades dessa nuvem de átomos mudam à medida que
ela se desloca exclusivamente sob a influência da gravidade. Para analisar a
ação apenas da força gravitacional, os físicos geram essa nuvem de átomos no
interior de uma câmara de vácuo e a deixam se deslocar na vertical em direção
ao solo. Nesse movimento, semelhante ao de um elevador em queda livre, que cai
sem nada que o freie, a única força atuando é a gravidade.
Já o gravímetro de Courteille funciona de modo diferente,
semelhante ao desenvolvido em 2005 pela equipe do físico Massimo Inguscio, da
Universidade de Florença, Itália. No experimento feito pelo italiano, o
condensado de Bose-Einstein cai livremente até certo ponto. Quando a aceleração
gravitacional faz o condensado atingir determinada velocidade, ele interage com
uma onda de luz criada pelo cruzamento de dois feixes delaser. Nesse
instante, o condensado recebe um impulso da onda de luz e passa a se mover para
cima, num processo que se repete indefinidamente. “É como se a onda de matéria
desse saltos em um trampolim”, explica Courteille. “A frequência dos saltos
depende da aceleração gravitacional da Terra.”
Ao usar os três espelhos para criar uma cavidade óptica,
espaço em que os feixes delaser permanecem aprisionados, circulando
quase indefinidamente, Courteille conseguiu eliminar alguns inconvenientes do
experimento italiano. O gravímetro de Inguscio usava um terceiro laser para medir o deslocamento do
condensado que acabava por destruí-lo. No esquema de Courteille, o ambiente é
controlado e a luz do terceiro laser, mesmo que
interaja com o condensado, não o desorganiza. Sob supervisão de Courteille, o
físico Raul Teixeira, que realiza um estágio de pós-doutorado no IFSC, está
construindo a câmara de vácuo do gravímetro e preparando a montagem dos lasers e da cavidade óptica. “É um grande
desafio técnico”, diz Courteille. “Vai demorar pelo menos uns dois anos até
obtermos resultados científicos.”
Projetos
1. Desenvolvimento de sensores quânticos
com átomos ultrafrios (nº 2013/04162-5);Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Philippe Wilhelm Courteille
(IFSC-USP); Investimento R$ 1.988.250,00 (FAPESP – para todo o
projeto).
2. Monitoramento contínuo de oscilações
de Bloch de átomos ultrafrios para aplicação em gravimetria (nº 2014/12952-9); Modalidade Bolsa no Brasil – Pós-doutorado;
Beneficiário Raul Celestrino Teixeira; Pesquisador responsável Philippe Wilhelm Courteille
(IFSC-USP); Investimento R$ 177.860,00 (FAPESP).
Artigos científicos
SAMOYLOVA, M. et al. Synchronization of
Bloch oscillations by a ring cavity. Optics Express.
v. 23, n. 11. 28 mai. 2015.
SAMOYLOVA,
M. et al. Mode-locked Bloch
oscillations in a ring cavity. Laser Physics Letters. v. 11,
n. 12. 12 nov. 2014.
Fonte: Revista Pesquisa FAPESP - Edição 233 – Julho de
2015
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