Medidas Espaciais
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo publicado na edição de Janeiro de
2015 da “Revista Pesquisa FAPESP” destacando que o Monitoramento por Satélite
auxilia as operações em lavras a céu aberto tornando mais segura a exploração
de minérios.
Duda Falcão
TECNOLOGIA
Medidas Espaciais
Monitoramento por satélite auxilia as operações em lavras
a céu aberto tornando mais segura a exploração de
minérios
YURI VASCONCELOS
ED. 227 - JANEIRO 2015
A mineração
é uma atividade complexa que envolve riscos variados. Um dos mais preocupantes
está associado à ruptura dos taludes, que são as encostas que formam o limite
lateral das minas a céu aberto, aquelas em que há escavação abaixo da
superfície do terreno. Quando esses íngremes paredões, de até 15 metros de
altura, cedem, a mina pode sofrer um desmoronamento, colocando em risco a vida
de trabalhadores, causando prejuízos materiais e interrompendo as operações no
local. Para evitar que tais acidentes ocorram, taludes que apresentam trincas,
rachaduras ou algum tipo de movimentação de terra são monitorados de perto por
radares e outros equipamentos em terra. Em breve, uma nova tecnologia, baseada
na aquisição de imagens de satélites, poderá ajudar a fazer um monitoramento
preditivo dos taludes, tornando a exploração mineral no país mais segura.
A inovação é
resultado de um projeto de pesquisa desenvolvido no âmbito de um convênio
firmado pela empresa Vale, a FAPESP, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de Minas Gerais (FAPEMIG) e a Fundação Amazônia Paraense (FAPESPA). Iniciado em
2012, o projeto tem o objetivo de fazer a detecção e o monitoramento de
estabilidade de taludes e de deformações superficiais nas minas de ferro a céu
aberto da Vale no Complexo Minerador de Carajás, no Pará, com auxílio de um
método avançado e inédito no Brasil, a interferometria diferencial de imagens
de radar. Por essa técnica, conhecida simplesmente pela sigla DInSAR (do inglês
Differential Interferometric Synthetic Aperture Radar), imagens de alta
definição coletadas por satélites fornecem informações que permitem a detecção
milimétrica de deslocamentos de terreno dos taludes e das demais estruturas que
compõem o complexo minerador, como rampas de acesso, pilhas de disposição de
estéril (material não aproveitado), correias transportadoras, barragens,
estradas e ferrovias, entre outras.
“A maior
novidade do projeto, finalizado no mês de dezembro passado, foi mostrar que a
tecnologia espacial DInSAR pode ser utilizada no monitoramento de condições de
estabilidade em minas ativas a céu aberto, fornecendo medidas precisas de
deslocamento na superfície de estruturas mineiras e associadas”, afirma o
geólogo Waldir Renato Paradella, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE) e coordenador do projeto FAPESP-Vale. “Essa técnica tem sido
usada em outros países para monitoramento de condições de deformações em
reservatórios de óleo e gás em terra e de obras de engenharia urbana,
como abertura de túneis e construção de metrôs. Por exemplo, na Itália, radares
orbitais fornecem informações que ajudam no monitoramento de terremotos. A
pesquisa em Carajás foi o primeiro teste em mina ativa a céu aberto em
condições tropicais úmidas.”
© AIRBUS
Imagem do satélite TerraSAR-X de Carajás, em março de
2012,
mostra as minas em traços finos e paralelos e uma barragem
no ponto
escuro de maior tamanho.
|
Ao longo do
projeto, a técnica mostrou-se eficiente ao confirmar a ocorrência de
deformações detectadas pelo corpo geotécnico da Vale na mina N5W, uma das três
a céu aberto que fazem parte do Complexo de Minas de Ferro de Carajás. Por meio
da tecnologia DInSAR foi possível avaliar quantitativamente as trincas na rampa
de acesso à mina e as fraturas em faces de talude, além da abrangência espacial.
“Essa nova tecnologia é uma ferramenta preditiva com elevado grau de
confiabilidade. Nosso interesse é incorporá-la no futuro às nossas operações e
usá-la no monitoramento contínuo de áreas de interesse”, destaca o geólogo
Luciano Mozer Assis, da Diretoria de Planejamento e Desenvolvimento de Ferrosos
da Vale. Segundo ele, o uso de imagens de radar de abertura sintética (em
inglês Synthetic Aperture Radar ou SAR) a bordo de satélite traz vantagens em
relação às técnicas comuns porque elas abrangem grandes áreas, são adquiridas
sob condição de cobertura de nuvens e durante o período noturno.
Durante a
aquisição de uma imagem, a antena de um radar SAR, instalado em um satélite
orbital, emite milhões de pulsos de ondas eletromagnéticas em direção ao solo.
Quando o campo elétrico irradiado interage com o alvo no terreno, parte do
sinal é refletida e captada pela antena. Por meio de técnicas de processamento,
duas propriedades fundamentais desse sinal retroespelhado são analisadas: a
amplitude e a fase. A amplitude indica quanto o alvo reflete da iluminação,
enquanto a fase mostra quão distante o alvo se encontra da antena. A fase,
portanto, revela a distância do sensor radar para determinado ponto imageado do
terreno. A interferometria SAR utiliza as medidas de mudança de fase do sinal
entre duas imagens adquiridas sobre a mesma área em tempos diferentes. A
diferença de fase entre um par de imagem recebe o nome de interferograma.
“Quando um alvo no terreno apresenta movimentação entre
dois imageamentos, a distância entre o sensor radar e o alvo se altera, o que é
expresso por uma diferença de fase. Quando essa diferença é relacionada a um
ponto localizado em um talude de mina, provavelmente indica que um deslocamento
ocorreu no local”, explica Paradella. A presença de nuvens, umidade e poluição
não causa interferências significativas na captação dos sinais, mas a precisão
das medições pode ser afetada por atrasos do sinal até atingir o solo. Esses
atrasos estão normalmente associados ao comportamento da troposfera, a camada
mais baixa da atmosfera terrestre. “Esses ‘ruídos’ são corrigidos pela técnica
PSI [sigla de Persistent Scatterer Interferometry], desenvolvida por cientistas
da Universidade Politécnica de Milão e patenteada pela empresa italiana TRE
como modelagem PSInSAR”, diz Paradella. Para execução do trabalho, os
cientistas trabalharam com 33 imagens das minas de Carajás geradas pelo
satélite alemão TerraSAR-X, que orbita a Terra numa altitude de 514 quilômetros
e passa sobre o território brasileiro a cada onze dias. Caso o intervalo entre
as aquisições fosse em um tempo menor, maiores seriam as chances de detectar
deformações no terreno. Em função dos bons resultados alcançados com o estudo,
a Vale já planeja colocar em campo um novo projeto, agora direcionado às minas
do Quadrilátero Ferrífero, situadas em Minas Gerais. Desta vez, serão
utilizados dados combinados de dois satélites, o TerraSAR-X e o italiano
Cosmo-Skymed. “Do ponto de vista metodológico, a pesquisa no Quadrilátero
Ferrífero, com duração prevista de dois anos, vai complementar a de Carajás.
Hoje, com o sistema Cosmo-Skymed, o tempo de revisita da mina cairia para oito
dias”, diz Paradella. Com o uso de outros futuros satélites, a tendência é que
o período de aquisição de dados seja cada vez menor, melhorando a capacidade de
detectar deformações em um tempo mais curto.
A Vale planeja empregar a técnica DInSAR juntamente com
radares de campo e de estações totais com prismas refletores, os dois métodos
convencionais de levantamento e monitoramento geotécnico hoje em uso em suas
minas. “Nossa ideia é que o método que utiliza informações de satélites venha a
se somar às técnicas convencionais de campo. Ele será complementar ao que já
fazemos, com a vantagem de ser preditivo. Com ele, otimizaremos nossas
operações”, afirma o geólogo Luciano Assis, da Diretoria de Planejamento e
Desenvolvimento de Ferrosos da Vale. Além do inovador DInSAR, existem outras
duas técnicas de monitoramento. Os radares de campo, instalados na própria
mina, enviam pulsos de sinais de micro-ondas para determinado alvo – uma
bancada, por exemplo – e capturam esses sinais de volta, comparando-os com
sinais enviados anteriormente. Caso seja detectada alguma mudança de fase entre
os sinais emitidos em diferentes momentos, podem estar ocorrendo deformações
superficiais no alvo. Esse tipo de radar é usado em diferentes pontos de
observação. Em Carajás, a Vale usa três radares SSR (sigla de Slope Stability
Radar), da empresa australiana GroundProbe, para fazer o monitoramento de setores
da mina.
Já as estações totais são um equipamento que faz medições
de ângulos verticais e horizontais e de distâncias lineares. Para isso, é
preciso posicionar o equipamento num local livre de obstáculos e mirar em
prismas refletores, que são fixados em uma haste e colocados sobre o ponto onde
se quer medir – no caso específico da Vale, as faces de bancadas dos taludes.
Um feixe de laser emitido pela estação total é
refletido pelo prisma e retorna à estação. Pelo tempo de resposta e grandezas
angulares na visada, um computador interno calcula as distâncias. Os sinais
refletidos são armazenados e comparados a sinais medidos anteriormente,
revelando se houve mudança no comportamento dos pontos – afastamento ou
aproximação – onde os prismas estão instalados. A limitação desse sistema e dos
radares de campo é que eles fornecem informações apenas dos locais onde estão
instalados, ao contrário da técnica DInSAR, cuja cobertura é muito mais ampla,
abrangendo todo o complexo minerador. “A pesquisa mostrou que o uso
complementar e sinérgico do DInSAR com os dois sistemas tradicionais é a
configuração ótima”, diz o engenheiro elétrico e pesquisador do Inpe José
Claudio Mura, vice-coordenador do projeto.
Além da geração de conhecimento que levará à adoção de
uma nova tecnologia na mineração brasileira, a pesquisa contribuiu para a
formação de pessoal na pós-graduação em sensoriamento remoto no INPE – um
doutorado já foi concluído e dois mestrados estão em andamento. O projeto
aprovado na FAPESP foi conduzido por uma equipe multidisciplinar composta por
geólogos, cartógrafos, engenheiros elétricos e ambientais, do INPE, da
Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP),
em Presidente Prudente, e do Instituto de Geociências da Universidade Federal
do Pará (UFPA). n
Projeto
Detecção e monitoramento de estabilidade de taludes e
deformações superficiais em mina a céu aberto através de técnicas avançadas de
interferometria diferencial de radar: uma avaliação na mina de ferro N4
(Carajás) utilizando dados do satélite TerraSAR-x (nº 2010/51267-9); Modalidade Auxílio Pesquisa –
Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (Pite); Pesquisador responsável Waldir Renato
Paradella (INPE); Investimento
R$ 626.273,35 e US$ 433.463,20 (FAPESP).
Artigos científicos
Mura, J. C. et al. Monitoring of surface deformation in open pit mine using DInSAR
Time-Series: A case study in the N5W iron mine (Carajás, Brazil) using
TerraSAR-X data.
Set. 2014. Proceedings SPIE RS 2014. v.
9243. out. 2014.
Hartwig, M. E. et al. Detection and monitoring of
surface motions in active open pit iron mine in the Amazon region, using
persistent scatterer interferometry with TerraSAR-X satellite data. Remote
Sensing. v. 5, n. 9, p. 4719-34. set. 2013.
Paradella, W. R. et al. Radar interferometry in surface deformation detection
with orbital data. Revista Brasileira de
Cartografia. v. 64, n. 6, p. 797-811. dez. 2012.
Fonte: Revista Pesquisa FAPESP - Edição 227 – Janeiro de
2015
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