Senado Debateu em Novembro o Programa Espacial Brasileiro
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo opinião sobre o Debate do PEB ocorrido em novembro na CCT do Senado Federal,
publicado na Edição de Nº 33 (Dezembro) do Jornal do SincdCT.
Duda Falcão
CIÊNCIA E TECNOLOGIA 2
Senado Debate Programa Espacial
Audiência
pública de 18/11 na CCT
Gino Genaro*
Jornal do SindCT
Edição nº 33
Dezembro de 2014
As exposições dos
dirigentes da AEB, INPE e da Visiona foram burocráticas e apenas descreveram seus projetos e atividades,
deixando de expor as dificuldades do Programa Espacial Brasileiro. O DCTA não
compareceu (teria muito a falar sobre o VLS).
Coube ao SindCT
denunciar falhas e riscos do modelo adotado Foi realizada em 18 de novembro uma
audiência pública no Senado Federal para se debater o Programa Espacial
Brasileiro (PEB), com enfoque na contratação do chamado Satélite
Geoestacionário de Defesa e Comunicações (SGDC), que comporá a infraestrutura
para prover comunicações militares e a ampliação dos serviços de Internet de
banda larga no país.
O evento foi
organizado pela Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) e coordenado pelo
senador Aníbal Diniz (PT-AC), que compõe uma comissão de trabalho responsável
por apresentar uma avaliação da implantação do Plano Nacional de Banda Larga
(PNBL) (vide Jornal do SindCT 32, p. 5).
O audiência
reuniu a maior parte das instituições e setores que atuam no PEB ou incidem
sobre ele. Participaram como expositores Leonel Perondi, diretor do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE); coronel Anderson Alvarenga, integrante
da assessoria do projeto SGDC, representando o Ministério da Defesa; Eduardo
Bonini, presidente da empresa mista Visiona; Francisco Ziober, presidente da
Telebrás; Ivanil Elisiário, presidente do SindCT; Flávia Schmidt, diretora do
Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA); e José Raimundo Coelho,
presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB). Registre-se a ausência do
comandante ou de algum representante do Departamento de Ciência e Tecnologia
Aeroespacial (DCTA), que, pelo papel que ocupa no desenvolvimento das
atividades espaciais no país, bem como pelas dificuldades que enfrenta no seu
programa de desenvolvimento de veículos lançadores (VLS), teria muito a
contribuir com a discussão.
No geral, os
pronunciamentos dos dirigentes da AEB, INPE e Visiona foram “institucionais”,
explicando as atividades desempenhadas por cada um, os projetos que vêm
desenvolvendo e de que maneira têm contribuído com o projeto do satélite SGDC
propriamente dito.
Tal abordagem
prejudicou um dos principais objetivos da audiência pública, que seria expor e
debater problemas e dificuldades (políticas, técnicas e institucionais)
encontrados por cada instituição na execução do Plano Nacional de Atividades
Espaciais (PNAE): afinal, tratava-se de um espaço privilegiado para o debate,
com transmissão ao vivo pela TV Senado e a presença dos principais responsáveis
pelas atividades espaciais no país. Neste sentido, o apelo do senador Diniz,
que abriu a sessão afirmando que “de antemão, nos seria de grande valia que
cada uma das entidades pudesse nos apresentar os seus principais obstáculos”,
não foi levado em consideração pelos principais participantes governamentais.
Agência Espacial
O presidente da
AEB, José Raimundo Braga Coelho, abordou o início das atividades espaciais no
Brasil, nas décadas de 1950 e 1960, com a criação do então CTA (hoje DCTA) e do
INPE, respectivamente. Lembrou que o PEB teve início efetivamente na década de
1970, com a criação da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB), “que tinha
como meta colocar satélites brasileiros em órbita, com foguetes nacionais, a
partir de um centro de lançamento próprio”.
Destacou que uma
das principais atribuições da AEB consistiu na condução dos projetos concebidos
no âmbito da agência, “atualizando e acrescentando ações que contam hoje com a
sua agenda decenal estratégica, denominada Plano Nacional de Atividades
Espaciais (PNAE)”.
Faz parte dessa
estratégia, continuou ele, “o fomento à formação de capacitação de recursos
humanos e o reconhecimento da necessidade do domínio de certas tecnologias
críticas, de acesso restrito, com a participação efetiva da indústria nacional
e em parceria com a competência e o talento existentes nas universidades e nos nossos
institutos de pesquisas”.
Coelho não
chegou a explicar por que, passadas tantas décadas, o Brasil ainda não
conseguiu atingir todos os objetivos a que se propunha na MECB: não domina
tecnologias estratégicas necessárias para a construção de alguns subsistemas de
satélites, nem conseguiu colocar nenhum artefato em órbita por meios próprios.
O presidente da
AEB também esquivou-se de avaliar o porquê de a maioria das metas estabelecidas
no PNAE estarem com seus cronogramas bastante atrasados: é o caso do satélite
PMM/Amazônia-1, iniciado em 2000, com previsão de lançamento da primeira missão
em 2006, e que ainda hoje continua no papel, com contratos junto à indústria
nacional paralisados e sem perspectiva de lançamento num futuro próximo. No que
diz respeito às tecnologias críticas de acesso restrito, Coelho não explicou a
escassez de projetos e recursos disponibilizados pela agência para que este
objetivo seja atingido.
Tecnologias
críticas como o desenvolvimento do subsistema de controle de órbita de
satélites, que o país não domina, continuam sendo objeto de projetos pontuais,
com parcos recursos, conduzidos por institutos públicos de pesquisa como o INPE
e o DCTA, sem a participação da indústria privada, haja vista o alto risco de
desenvolvimento inerente aos projetos desta natureza.
Transferência?
Sobre o satélite
mais importante e complexo do PNAE, o chamado SGDC, cuja contratação está a
cargo da empresa Visiona Tecnologia Espacial S.A., Coelho lembrou que o papel
da AEB tem se resumido à “coordenação, monitoramento e avaliação dos resultados
do Plano de Absorção e Transferência de Tecnologia” previsto no contrato junto
ao fornecedor do satélite, a empresa francesa Thales Alenia Space.
A respeito dessa
questão o representante do SindCT, Ivanil Elisiário, foi enfático ao destacar
que a contratação deste satélite integralmente no exterior, sem a participação
do INPE (e mesmo da indústria nacional), em nada irá contribuir para que o país
avance no desenvolvimento de sistemas espaciais mais sofisticados.
Lembrou ainda
que o chamado Plano de Absorção e Transferência de Tecnologia é bastante
limitado, já que país nenhum do mundo transfere tecnologias críticas a outros
países. “Ninguém entrega tecnologia assim de mão aberta”, afirmou Elisiário.
Elas foram, em certos casos, desenvolvidas à custa de recursos de países como
China e Índia, com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) inferiores ao do
Brasil, observou: “Eles não vão permitir que tais tecnologias sejam repassadas
desta forma a outras nações”. Eduardo Bonini, presidente da Visiona, destacou o
papel desempenhado pela empresa na aquisição do satélite SGDC.
Sobre a
transferência de tecnologia, destacou o fato de engenheiros brasileiros estarem
trabalhando e compondo efetivamente as equipes de engenheiros da fornecedora
Thales Alenia no desenvolvimento do satélite. “Nesse ponto, nós temos até a
agradecer ao nosso fornecedor, Thales Alenia”, declarou Bonini. “Esta é a
melhor maneira de se fazer absorção de tecnologia: conseguir que as pessoas [em
treinamento] compartilhem o trabalho diretamente com os engenheiros da área de
desenvolvimento da empresa”, reforçou.
Tal informação,
entretanto, não condiz com a experiência de técnicos do INPE citados pelo
Jornal do SindCT na edição 32. Os técnicos enviados à França no âmbito deste
programa de transferência de tecnologia teriam acesso restrito às informações,
sendo vedado a eles inclusive o livre acesso à documentação técnica do próprio
SGDC.
Além disso, são
obrigados a assinar termos de compromisso de sigilo das informações a que
tiverem acesso, dificultando ou mesmo impossibilitando a disseminação aos
demais técnicos, após o retorno ao país, do conhecimento eventualmente
absorvido.
Visiona, PESE Etc.
Engana-se quem
imagina que a Visiona foi criada apenas para contratar no mercado, interno e
principalmente externo, satélites geoestacionários operacionais para os órgãos
do governo.
Seu apetite por
lucros e por projetos espaciais das mais variadas naturezas ficou patente na
exposição de seu presidente durante a audiência pública. Eduardo Bonini
declarou que a empresa nasceu para atender às demandas não apenas do PNAE-AEB,
mas também do Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE, ligado ao
Ministério da Defesa), que irá requerer, além de satélites geoestacionários,
satélites de órbita baixa, com diferentes tipos de cargas úteis. Também o
satélite de coleta de dados SCD-Hidro, a ser encomendado pela Agência Nacional
de Águas (ANA), já se encontra em estudos dentro da Visiona.
Aliás, para a
aquisição deste satélite, a AEB elaborou um engenhoso, embora perverso, sistema
de contratação. A ANA deverá contratar a fabricação do satélite junto à AEB;
esta, por sua vez, irá contratar o INPE, mas não para especificar, projetar ou
fabricar o satélite. Caberá ao INPE tão somente contratar o satélite junto a
uma fundação privada dita “de apoio” ao instituto: a Fundação de Ciência,
Aplicações e Tecnologia Espaciais (FUNCATE).
Por fim, caberá
à FUNCATE contratar a Visiona, esta sim responsável pela contratação integral
de todos os equipamentos e serviços relacionados ao projeto. Ou seja: o INPE
será utilizado como “barriga de aluguel” da transação, num esquema de
contratação de duvidosa legalidade.
Até mesmo o
desenvolvimento de um subsistema de controle de posicionamento no espaço
(atitude) e de órbita de satélites (AOCS, na sigla em inglês), tecnologia que o
país ainda não domina, está na mira dos projetos a serem tocados pela Visiona.
“Nós estamos analisando a possibilidade de começar o desenvolvimento deste
software, que é um sistema altamente preciso”, comentou Bonini.
Ou seja, a
empresa sinalizou que pretende atuar também na área de pesquisa e
desenvolvimento (P&D). Tal declaração chamou atenção de muitos por ser
contraditória com o modelo de gestão adotado pela AEB, no qual, por um lado,
caberia à Visiona e demais empresas privadas do setor espacial a fabricação de
satélites tidos como “operacionais”, cuja missão é prestar serviços regulares a
empresas e órgãos públicos; por outro lado, caberia aos órgãos públicos (como
INPE e DCTA) atuar em atividades de P&D de ponta, bem como no projeto de
satélites científicos, buscando alcançar o limiar do conhecimento no
desenvolvimento de equipamentos e processos de uso restrito, cuja obtenção da
tecnologia no mercado externo seria difícil ou mesmo impossível.
Ao anunciar que
pretende atuar no desenvolvimento do AOCS, a Visiona insinua que pretende
concorrer inclusive com os esforços do INPE e DCTA, responsáveis por projeto
semelhante que já consumiu R$ 40 milhões em investimentos do governo federal
nos últimos cinco anos.
Caso esta
informação se confirme e a AEB venha a contratar o desenvolvimento do AOCS
junto à Visiona, estará configurada a chamada “duplicação dos esforços para se
atingir os mesmos fins”, prática vedada na Administração Pública. “E aqui
estamos analisando, dentro dos programas existentes, [atender] tanto ao PNAE
[civil], quanto ao PESE [militar]”, conclui o incansável Bonini, da Visiona.
Crítica ao Modelo
Coube ao SindCT
lembrar aos senadores que uma empresa “integradora” como a Visiona pouco ou
nada contribuirá para o desenvolvimento das atividades espaciais no país ao
adquirir 100% do satélite SGDC no estrangeiro. Lembrou-se que a AEB não tem
cumprido seu papel: o histórico de realizações do PNAE ao longo de seis décadas
limita-se a poucos satélites (os mais complexos em colaboração com outro país)
e nenhum lançador, a ponto de ainda hoje não se ter concluído o que o país se
dispôs a fazer à época da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB).
Lembrou-se o
despropósito de se criar a empresa binacional Alcantara Cyclone Space (ACS),
que desde 2007 já consumiu quase meio bilhão de reais dos cofres públicos, sem
a menor expectativa de que o foguete ucraniano venha a operar a partir de solo
brasileiro tão cedo, e o que é pior: desviando recursos do desenvolvimento do
foguete nacional VLS, que vem “vegetando” com um orçamento de menos de R$ 20
milhões por ano. Por fim, lembrou-se que o domínio da tecnologia de satélites
mais complexos e de acesso ao espaço não virá por nenhum programa de
“transferência de tecnologia” com outros países, senão por esforço e
investimento do próprio país. A íntegra da audiência pública no Senado está
disponível em www.sindct.org.br.
* Gino Genaro é tecnologista da área de
controle térmico de satélites do INPE e secretário de Comunicação do SindCT.
Fonte: Jornal do SindCT - Edição 33ª - Dezembro de 2014
Comentário: Em resumo, como já havia dito em outros comentários
sobre estas tais audiências públicas, ou seja, este foi mais um exemplo de algo
que desde o início da década de 90 não acrescenta absolutamente nada ao
Programa Espacial Brasileiro. Uma tremenda perda de tempo que pode, por
exemplo, explicar desta vez a não presença de um representante do DCTA no evento. Na
verdade leitor o único Senador presente foi o tal Aníbal Diniz (PT-AC) que resolveu protagonizar mais esta palhaçada,
sabe-se lá qual o real motivo. Mas enfim, está ai a visão sindicalista do que
ocorreu em mais esta palhaçada sobre o PEB realizada em novembro na CCT do Senado Federal.
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