Indianos na História do INPE
Olá leitor!
Segue abaixo um interessante artigo da Edição de Nº 33
(Dezembro) do Jornal do SincdCT tendo como destaque a participação de Indianos
na história do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Duda Falcão
VIDA E TRABALHO 2
Indianos na História do INPE
Contribuição Asiática
Shirley Marciano
Jornal do SindCT
Edição nº 33
Dezembro de 2014
Os primeiros pesquisadores
vindos da Índia começaram a chegar a São José dos Campos, para trabalhar no
INPE, na década de 1970. Adaptaram-se à cidade e ao trabalho e alguns de seus
descendentes tornaram-se também funcionários do instituto.
Na década de
1960, devido à dificuldade de encontrar mão de obra especializada no Brasil, o
primeiro diretor do recém fundado Instituto Nacional de Pesquisas Especiais
(INPE), Fernando de Mendonça, trouxe para o Brasil vinte e seis pesquisadores
da Índia que faziam parte de um programa que formava doutores nos EUA e também
na Inglaterra. A ideia inicial era uma permanência de apenas dois anos e, caso
houvesse interesse das partes, ficariam no país por igual período. No entanto,
acabaram se fixando em São José dos Campos.
Um desses pesquisadores
é Rajaram Purushottam Kane, atualmente com 88 anos. O geofísico, que viveu nas
cidades indianas de Gwalior e Ahmedabad, chegou ao Brasil em 1978, depois de
trabalhar 30 anos na Índia. Ele explica que Mendonça conhecia o fundador do
Programa Espacial Indiano, Vikram Sarabhai: por essa razão, houve facilidade de
organizar esse intercâmbio. Kane assinala que já completou 35 anos de
permanência no Brasil. Cinco anos depois de Kane, desembarcaria em São José dos
Campos, procedente de Kérala, também para atuar no INPE, Polinaya
Muralikrishna.
“Eu cheguei ao
Brasil no dia 23 de janeiro de 1983, com minha esposa e uma das duas filhas,
que tinha quase dois anos. A outra filha mais velha, então com três anos,
estudava na Índia e ficou com meus sogros. Depois ela também veio para o
Brasil”, conta Polinaya, que veio trabalhar na área de desenvolvimento de
experimentos embarcados a bordo de foguetes de sondagem, com um contrato
temporário de dois anos. Antes de vir para o Brasil, Polinaya acreditava que aqui
havia somente “florestas e futebol”, mas, ao chegar, teve outras impressões.
“Quando saí do
aeroporto de Congonhas para São José dos Campos, no carro oficial do INPE, já
comecei a descobrir que eu estava errado. Vi que as estradas eram limpas, que
no trânsito os carros eram novos e luxuosos e que parecia haver um padrão de
vida melhor”. Kane, Polinaya e outros abriram um canal permanente para a
imigração de pesquisadores aeroespaciais indianos. A jovem pós-doutora Rashmi
Rawat, que pisou em solos brasileiros em abril de 2013, diz que está gostando
do país. O que lhe chamou a atenção foi a forma educada, gentil e prestativa
das pessoas. Ficou positivamente surpresa com a limpeza e também com a forma
como são tratados os resíduos.
Violência Menor
Colonizada pela
Inglaterra no início do século 18, palco de imensos conflitos étnicos e
assassinatos políticos no século 20, hoje a Índia é um país com índices de
violência relativamente baixos. Uma possível explicação para esse fato é a
filosofia que conduziu a luta pela independência nacional contra os
colonizadores britânicos, marcada pela resistência não violenta protagonizada
por Mahatma Ghandi, idealizador e fundador do moderno Estado indiano e o maior
defensor do princípio de não-agressão.
“Não vou dizer
que não tenha violência na Índia, mas, sem dúvida, que é bem menor do que em
muitos países. Isto se explica pelo fato de haver um esgotamento dos conflitos
pelo diálogo, sem o uso da força”, ressalta Kane, cuja idade avançada não o
impede de continuar trabalhando. Atualmente atua na área meteorológica,
utilizando dados da NASA (agência espacial dos EUA).
Os avanços
democráticos na Índia teriam começado, contraditoriamente, em 1930, com uma
reforma legislativa imposta pelos colonizadores britânicos. Na década seguinte,
houve turbulências relacionadas à participação indiana na 2ª Guerra Mundial, à
intensificação da luta pela independência e a uma forte onda de nacionalismo
muçulmano.
A conquista da
independência cobrou um alto preço político, resultando na divisão do antigo
país em dois Estados: Índia, predominantemente hindu, e Paquistão, de maioria
islâmica. Ambos tornaram-se potências nucleares, que se hostilizam mutuamente.
“O conflito da Índia com o Paquistão é algo parecido com um câncer e não tem
uma solução definitiva”, comenta Polinaya.
“Na Índia tem um
número muito grande de muçulmanos, o que levanta muitas questões sentimentais
no dia a dia, mas a amizade não sofre barreira por motivos religiosos.
Portanto, a convivência entre hindus e muçulmanos na Índia não está ameaçada”,
sustenta o pesquisador. Kane, por sua vez, faz referência à ativa presença de
grupos islâmicos no Paquistão: “A Índia é muito maior do que o Paquistão. Eles
estão preocupados com a gente, mas nós não estamos preocupados com eles, exceto
quando eles enviam terroristas para prejudicar os indianos. O Paquistão tem uma
grande rede de terroristas, enquanto a Índia não tem nenhum.
Nós somos
basicamente pacíficos, assim como o Brasil”. Sob um regime parlamentarista, a
Índia é o segundo país mais populoso do mundo e possui nada menos do que 22
idiomas oficiais. A língua escrita oficial é o hindi, mas é permitido também o
uso do inglês. “Quando cheguei ao Brasil, em 1971, tinha apenas 13 anos, e a
questão da língua foi um grande desafio.
Eu estudei o
equivalente ao ensino médio na escola Sinésio Martins, em São José, e tive
muita dificuldade no começo. Mas como meu pai participava de clubes sociais,
tive a oportunidade de interagir mais com os brasileiros, o que fez com que eu
aprendesse mais rapidamente o idioma”, lembra N. L. Vijay Kumar, que atualmente
trabalha no Laboratório Associado de Computação e Matemática do INPE. Apesar de
ser atualmente a terceira economia do mundo, situando-se atrás apenas dos EUA e
China, o país possui gravíssimos problemas sociais, especialmente a pobreza, o
analfabetismo e a inexistência de saneamento básico.
Religiosidade
Estima-se que o
povo indiano tenha surgido entre 1500 e 2000 AC. Possui uma cultura muito
diversificada, em especial, por sua origem multiétnica. As religiões foram e
são até os dias de hoje componente importante da cultura nacional. O hinduísmo,
o budismo, o jainismo e o sikhismo tiveram origem na própria Índia, enquanto
que o zoroastrismo, o judaísmo, o cristianismo e o islamismo chegaram no
primeiro milênio DC e moldaram a diversidade cultural da região. “Não sinto
falta de nada aqui no Brasil, pois até mesmo na religião encontrei o meu espaço
nos templos Hare Krishna”, conta Kane.
Outro fator
religioso que influenciou muito a sociedade indiana foi o sistema de castas.
Apesar de oficialmente abolido em 1950, ainda está nas raízes culturais da
população. Esse sistema assenta- -se nos princípios religiosos do vedismo,
escritura sagrada do hinduísmo, segundo a qual a natureza de cada ser humano é
pré- -determinada por deuses: quando a pessoa nascia, ela já era fixada numa
hierarquia, que incluía Brâmanes (sacerdotes), Guerreiros, Mercadores, Sudras
(escravos). Além desta hierarquia, existiam os Dalits ou párias (“intocáveis”),
considerados impuros.
“O sistema de
castas ainda existe na cultura indiana, mas ao longo do tempo mudou bastante.
As pessoas, especialmente os jovens das áreas metropolitanas, não dão muita
importância para o sistema. Os casamentos entre as castas antigamente não eram
permitidos, mas estão ficando cada vez mais frequentes e acontecem até entre as
religiões.
Eu, como a
maioria dos indianos que vivem em São José dos Campos, fazía parte de uma casta
considerada a mais superior, chamada Brâmanes”, conta Polinaya. “As castas
existem na Índia, mas fora não damos nenhuma importância, tanto que nos
reunimos, comemos e confraternizamos juntos”, acrescenta Kane.
Culinária
Como não podia
ser diferente, num país de grande extensão territorial e diversidade étnica, a
culinária é riquíssima, principalmente no modo como os alimentos são
preparados, com destaque para a variedade de temperos, ervas e outros vegetais,
além de frutas. Cada família indiana possui extenso sortimento de pratos e
técnicas. Os pratos variam de região para região, refletindo a variedade
demográfica e a diversidade étnica do subcontinente.
“Eu sinto falta
é da variedade de sabores dos alimentos, desde a comida indiana até o chá.
Acredito que em São José dos Campos possa ter alguma mercearia para comprar
esses alimentos”, diz a recém chegada Rashmi, que ainda não teve tempo para
conhecer bem a cidade. Kane garante que a adaptação alimentar não foi um grande
obstáculo: ele diz que o arroz é o mesmo, então era só juntar as verduras e os
vegetais para ficar tudo certo, já que é vegetariano.
Vijay é outro
que se adaptou com facilidade à comida brasileira, pois já havia morado na
Arábia Saudita, e também por ainda ser jovem quando chegou aqui. Mesmo com
todas as diferenças culturais e sociais foi possível a esses engenheiros, que
trouxeram suas experiências para ajudar a fazer avançar a tecnologia espacial
do Brasil, permanecer e conviver com o modo brasileiro de ser. “Nós, como seres
humanos, temos que fazer escolhas na vida e não dá para ficar apenas com o que
é bom. Na minha opinião, quem fica feliz com o que ele tem é uma pessoa feliz;
e quem fica pensando nas coisas que ele não tem é uma pessoa triste. Sou uma
pessoa feliz com as escolhas que eu e a minha família fizemos na vida, e o
Brasil é hoje nosso lar”, finaliza Polinaya.
Fonte: Jornal do SindCT - Edição 33ª - Dezembro de 2014
Comentário: Pois é leitor, tínhamos conhecimento da
contribuição indiana com a história do INPE, mas não tínhamos ideia de quanto
extensa e valiosa ela foi. Ao Blog BRAZILIAN SPACE só nos resta agradecer aos
indianos pela ajuda e lamentar muito, muito mesmo, que esta consciência indiana
da importância das tecnologias espaciais ainda não tenha obtido (apesar dos 53
anos de atividades espaciais do Brasil) a devida importância em nossa sociedade e de nossa irresponsável Classe Política.
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