Meteoritos: Por Que o Brasil Precisa de Uma Lei?
Olá leitor!
Segue abaixo outro artigo
escrito pelo Sr. José Monserrat
Filho e postado pelo companheiro André Mileski ontem (20/09) em seu no Blog Panorama Espacial.
Duda Falcão
Meteoritos: Por Que o Brasil
Precisa de Uma Lei?
José Monserrat Filho*
O que é um meteorito?
É um meteoroide – bloco de fragmentos de asteroides, cometas ou restos de
planetas desintegrados – quando alcança a face da Terra. Meteorito é um “objeto
sólido que se desloca no espaço interplanetário e atinge a Terra sem estar completamente
vaporizado” (Enciclopédia e Dicionário Koogan-Houaiss, Edições Delta, 1998).
Os meteoroides mais
densos ou maiores logram, às vezes, cruzar a atmosfera terrestre e,
despedaçados, atingir a superfície do nosso planeta. A queda dos meteoroides na
Terra produz o fenômeno luminoso chamado de meteoro, como explica o astrônomo
Ronaldo Rogério de Freitas Mourão (Dicionário Enciclopédico de Astronomia e
Astronáutica, Nova Fronteira, 1995).
Os meteoroides viram
meteoritos, popularmente apelidados de “estrelas cadentes”, mesmo que não
tenham nada a ver com as estrelas. A grande maioria dos meteoritos é destruída
pelo atrito com a atmosfera antes de chocar-se com a Terra.
De onde eles provêm?
De cometas, da Lua, de Marte, de asteroides e de outros corpos celestes.
Resumindo, para melhor entender os termos: Meteoroide é o corpo em voo no
espaço; meteoro é o meteoroide que penetra a atmosfera da Terra; e meteorito é
o meteoro não destruído que colide com a Terra. Isso ocorre quando esse corpo
não se desintegra totalmente graças a seu tamanho e sua composição química.
A União Astronômica
Internacional define o meteoroide como “um corpo sólido que se desloca no
espaço interplanetário, de tamanho consideravelmente menor do que um asteroide
e significativamente maior do que um átomo”.
Há quatro categorias
principais de meteoritos, segundo sua estrutura e composição: condritos (mais
comuns), acondritos, ferrosos e ferrosos-rochosos.
Os meteoros voam à
velocidade média de 40.000 Km/h e são muito perigosos caso não se queimem
totalmente ao entrar na atmosfera terrestre. No choque com a Terra podem abrir
enormes crateras e causar danos consideráveis, como aconteceu numa região da
Sibéria, na Rússia, em fevereiro de 2013. Vale ver o vídeo no site https://www.youtube.com/watch?v=lacHpTu_ej4.
A Organização
Internacional de Meteoros, fundada em 1988, é uma associação de astrônomos
amadores que se dedica incentivar e coordenar atividades de observação de
chuvas de meteoros em todo o mundo. Ela se reúne todos os anos e publica
bimestralmente sua revista especializada.
Como os meteoritos são
regulamentados? Há países com leis especiais sobre eles. Não é o caso do
Brasil. Essa lacuna jurídica cria riscos para a população. Fomenta o comércio
desordenado e clandestino. E não estimula a descoberta, o estudo e o interesse
científico pelos meteoritos e sua destinação para fins culturais.
Os meteoritos são
“mensageiros” do espaço interplanetário e podem trazer dados sobre o universo.
Objetos extraterrestres, têm inestimável valor científico, cultural e também
comercial. São procurados e disputados por pesquisadores, proprietários de
terras e mercadores de objetos naturais rentáveis.
Quem pode ser dono dos
meteoritos? Não há legislação internacional a respeito, mas deveria haver. A questão
é global. Interessa a todos os países. Infelizmente, hoje, cada país resolve a
questão a seu modo. Nos EUA, os meteoritos pertencem ao dono da área onde
caíram. Na Argentina, pertencem ao Estado. No Brasil, não há lei específica,
nem doutrina sobre a matéria.
Em 2011, um meteorito
caído no Município de VarreSai, no Estado do Rio de Janeiro, desencadeou
“verdadeira caça ao tesouro”. Até cidadãos de outros países entraram na
corrida. O caso acabou na Justiça. O estrangeiro que se apossou do objeto e nada
revelou às autoridades foi condenado por contrabando. Quem conta esse caso real
é Mariani Policarpo Neves, em “O direito de propriedade sobre os meteoritos no
ordenamento jurídico brasileiro”, trabalho de conclusão do curso de
Pós-Graduação na Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, em 2014.
Sem definição legal
própria, o direito de propriedade sobre os meteoritos produz controvérsias no
Brasil. Pode gerar decisões judiciais diversas, arbitrárias e até
contraditórias. Tal insegurança jurídica precisa ser sanada. Há muitas
perguntas a responder: Que valores e interesses uma lei brasileira sobre
meteoritos deve resguardar? Que direitos e obrigações corresponderiam a esses
valores e interesses? Cabe atribuir prerrogativas e deveres a quem descobriu ou
encontrou um meteorito? Qual o interesse da União nos meteoritos, tomando por
base a soberania territorial e o interesse público? Quais são os interesses
internacionais envolvidos no caso?
O que diz nossa
Constituição? Pelo Art. 20, IX, os recursos minerais são bens da União. Mas,
para os pesquisadores brasileiros, os meteoritos não se ajustam a essa norma,
já que sua exploração não é economicamente viável. Chamam-se recursos minerais
as jazidas de minério formadas na crosta terrestre cuja extração é ou pode ser
técnica e economicamente rentável. Os meteoritos não se formam na crosta
terrestre. Eles vêm do espaço. Logo, não são recursos minerais. Daí a confusão
em torno do direito de propriedade sobre os meteoritos no nosso sistema
jurídico. Várias situações podem ser imaginadas ao se tentar definir o dono de
um meteorito.
Qual é a solução? A
questão só será resolvida com a definição da natureza jurídica dos meteoritos.
Se forem considerados bens públicos, passam a ser propriedade da União. Seria a
melhor solução. Evitaria o recurso do usucapião (apropriação pelo uso) por
parte de quem quer que seja. E prevaleceria o princípio do interesse público
cultural e científico, evidente no caso.
Se os meteoritos forem
definidos como “bens móveis particulares”, o direito de propriedade sobre eles
é regido pelo Código Civil de 2002 (Capítulo III do Título III do Livro III).
Indo por aí, caberia definir o meteorito como res nullius, isto é, coisa de
ninguém, ou, mais precisamente, coisa que nunca pertenceu a alguém e, portanto,
pode ser apropriada por quem a encontrar primeiro.
Definido como bem
móvel, o meteorito poderia ser apropriado por uma dos modos de aquisição de
propriedade previstos pelo Código Civil, entre as quais estão a ocupação, a
tradição, o usucapião e a sucessão testamentária. A ocupação, regulada em seu
Artigo 1.263, é vista como o principal meio de apropriar-se de um meteorito.
Mas, na prática, isso leva a grandes litígios. Quem se apossa de uma coisa sem
dono busca, claro, tornar-se seu proprietário. Mas isso pode ser legalmente
questionado no caso de um meteorito, que tem valor cultural e não tem lei a
respeito. Ainda mais se, para apossar-se de um meteorito, alguém invadir o
imóvel onde o objeto se encontra.
Quais as conclusões?
Os meteoritos fornecem valiosos dados sobre a origem e evolução do Sistema
Solar. Isso é de suma relevância para as pesquisas sobre a origem do universo.
Por isso, ver os meteoritos como meros bens particulares afronta as normas e
princípios constitucionais em vigor, destinados a preservar o patrimônio
público. O interesse público – nacional e internacional – deve ser a base da
decisão de construir o direito de propriedade sobre os meteoritos no Brasil.
Há também que levar
conta casos como o da Argentina. Lá, os meteoritos são propriedade do Estado, o
que é positivo. Mas esse fato tem causado grandes prejuízos ao país. O comércio
ilegal de meteoritos atinge níveis altíssimos. Essa e outras lições similares
são importantes ao se pensar numa lei brasileira sobre o assunto. Os meteoritos
devem pertencer ao poder público, pois o interesse particular não pode se
sobrepor ao interesse público, que, no caso, é preferencial e prioritário.
Porém, simultaneamente, o Estado deve promover de modo sistemático um programa
que incentive as pessoas tanto a descobrirem quanto a encaminharem os
meteoritos, de acordo com a lei a ser criada. Segundo nossa Constituição,
compete à União regulamentar os meteoritos, por interpretação extensiva do Art.
20, IX, e por sua competência privativa para legislar sobre o direito espacial
(Art. 22, I).
É imperioso e justo,
portanto, conciliar o interesse público com o fomento à descoberta de novos
meteoritos, por meio de prêmios ou recompensas, sob um sistema eficaz que
desestimule o contrabando desses corpos que caem do céu.
* Vice-Presidente da
Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor
Honorário do Instituto Internacional de Direito Espacial, Membro Pleno da
Academia Internacional de Astronáutica (IAA) e Chefe da Assessoria de Cooperação
Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB). Esse artigo expressa
exclusivamente a opinião do autor.
Fonte: Blog Panorama Espacial - http://panoramaespacial.blogspot.com.br/
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