Blog Realiza Nova Entrevista com o Diretor Executivo da AIRVANTIS
Olá leitor!
Dando sequência à série de entrevistas com
personalidades das atividades espaciais brasileiras, trago agora para você leitor
uma entrevista com um dos profissionais que mais respeito e admiro deste setor,
o Engenheiro Mecatrônico pela USP São Carlos e Mestre em Engenharia de Sistemas Espaciais pelo Institut
Supérieur de l'Aéronautique et de l'Espace (ISAE-Supaero) da França, o Sr. Lucas de Mendonça Fonseca, diretor executivo e cofundador da pequena empresa espacial brasileira AIRVANTIS e atualmente atuando
também como professor convidado da USP São Carlos.
Em sua segunda entrevista ao BLOG (talvez a sua última como profissional atuante no País) o Eng. Lucas Fonseca
fala de seus atuais projetos em curso (inclusive um com o Grupo de Astrobiologia Brasileiro - Astrolab, do Dr. Douglas Galante), a sua intenção de deixar o País convidado que foi pelo Governo Francês para migrar com a AIRVANTIS, e de sua decepção
com o Programa
Espacial Brasileiro.
Nessa entrevista o leitor poderá notar a
semelhança de pensamento deste engenheiro de grande experiência (trabalhou no Centro Aeroespacial Alemão – DLR em projetos de espaço profundo como a Sonda Espacial Rosetta) sobre a atual situação das atividades espaciais do Brasil com o que o BLOG vem dizendo nesses últimos
5 anos
online.
Infelizmente o Brasil pode esta perdendo mais um profissional de qualidade que há 3 anos deixou um emprego sólido e promissor no DLR alemão para junto com outros brasileiros voltarem ao Brasil e fundarem a AIRVANTIS, já que naquela
época acreditavam que podiam colaborar com o PEB e fazer a diferença, mas infelizmente não foi o que aconteceu.
Gostaríamos de agradecer ao Eng. Lucas Fonseca pela atenção dispensada ao Blog BRAZILIAN SPACE e desejar-lhe sucesso, seja qual for o caminho escolhido por ele.
Duda Falcão
Eng. Lucas Fonseca |
LUCAS FONSECA: Bom, os motivos são vários, permeando entre decisões pessoais e
profissionais. Falando apenas dos motivos profissionais, quando voltei
visualizava alguns projetos para minha vida profissional que não se cumpriram
nos quase 3 anos que estou aqui e não me parecem que vão acontecer. Fora isso,
o governo francês fez uma proposta muito interessante para migrarmos com a
AIRVANTIS para o sul do país e estivemos realmente tentados a aceitar esse
convite. No fim das contas resolvi segurar um pouco a decisão e atualmente
tenho contratos com a empresa que não me permitiriam essa
mudança em um curto prazo. Mas para o médio prazo, continua sendo meu plano.
BRAZILIAN
SPACE: Sr. Lucas,
como fica então o projeto que a AIRVANTIS estava realizando com o Grupo ZENITH
da USP visando o desenvolvimento de uma Sonda Lunar Brasileira? O Projeto foi
cancelado ou continuará mesmo sem a participação da AIRVANTIS?
LUCAS FONSECA: O projeto existe e é um
norte para a atividade do Grupo ZENITH. Obviamente temos vários degraus a serem
conquistados em um objetivo tão ousado. Entenda que o fato de envolver a lua
acaba se tornando um atrativo a mais, mas o objetivo principal da missão é
estudar os efeitos danosos da radiação espacial e por isso montamos etapas
progressivas que contemplam esse estudo. O projeto em si nunca foi uma
iniciativa da AIRVANTIS, é um projeto pessoal que tenho com alunos e atuo como
professor. A AIRVANTIS poderia participar eventualmente no desenvolvimento de
parte do projeto que demande a participação da indústria, mas isso não é
mandatório. Nunca foi minha meta ter a AIRVANTIS como protagonista do projeto,
sou motivado por outras razões.
BRAZILIAN SPACE: Sr. Lucas, em nosso ultimo contato, o senhor nos disse que estava tentando
prosseguir com passos mais viáveis em curto prazo, e para tanto estava
conversando com o Astrobiólogo Douglas Galante do Grupo de Astrobiologia
Brasileiro a possibilidade de lançar conjuntamente uma colônia de bactérias em baixa órbita e
estudar os efeitos da radiação sobre elas. Este projeto avançou?
LUCAS
FONSECA: Sim, estamos
com um grupo de trabalho que envolve o pessoal do grupo de astrobiologia, a USP
de São Carlos, o Instituto Mauá de Engenharia e a UNB. A ideia é exatamente
essa que você citou, mas no momento estamos preparando um voo com balão para
estudo de radiação em alta altitude. O maior desafio atual é garantir a
subvenção para que as etapas do projeto se tornem viáveis. A participação do
Grupo de Astrobiologia Brasileiro é fundamental, pois a atividade de pesquisa
realizada por eles é o objetivo da missão (seja balão, baixa órbita ou mesmo
lunar).
Interessante citar aqui que a UNB já teve um avanço significativo
com balões, e a Mauá vem desenvolvendo sistemas embarcados com muita excelência
e rapidez. Estou muito positivo em relação a esse grupo que conseguimos montar.
BRAZILIAN SPACE: Sr. Lucas, e quanto ao projeto
de um sistema de CubeSats que a AIRVANTIS estava desenvolvendo em
conjunto com o curso de Engenharia Mecatrônica da USP São Carlos, ele continua?
LUCAS FONSECA: Tenho que manter sempre em mente
que a AIRVANTIS é uma empresa e precisa ser rentável. Por ser uma empresa de
Pesquisa & Desenvolvimento voltada para atividades aeroespaciais,
desenvolver CubeSats estaria totalmente de acordo com nossa missão, mas não se
mostrou uma atividade rentável ainda. O que mantenho com os alunos de São
Carlos são atividades puramente educacionais e dentro desse cenário estamos
estudando conceitos e desenvolvendo subsistemas relacionados com micro
satélites. Faço questão que os alunos participem de todos os passos do projeto
que estamos propondo e desenvolvam, inclusive, conceitos muito básicos ligados
ao tema.
Por ser uma
atividade que envolve muita complexidade, os alunos acabam vivenciando modelos
organizacionais muito parecidos com os que vão encontrar no mercado de
trabalho. Desenvolver um projeto espacial não se resume em sentar numa bancada
e soldar peças, existem ações estruturadas que minimizam os riscos e definem
exatamente onde queremos chegar e com que meios faremos isso. Os desafios são
interdisciplinares e por isso de extrema valia para a formação desses jovens.
Falando como
fundador da AIRVANTIS, o único objetivo desta atividade é manter o interesse no
tema pelos jovens, incentivar a formação profissional, e assim criar uma
possível fonte de mão-de-obra para o futuro.
BRAZILIAN
SPACE: Sr. Lucas como a direção da USP se posiciona em relação às atividades espaciais de
parceria com a AIRVANTIS? Ela de alguma
forma tem apoiado essas iniciativas?
LUCAS FONSECA: Somos um grupo oficializado pela comissão de organização dos
cursos da USP, então temos o apoio institucional, mesmo que de maneira simbólica.
Por conta do tamanho da USP e das dificuldades que vivemos dentro da
universidade, é muito difícil querer consolidar esse apoio como um agente
financeiro permanente. Nosso contato é mais departamental, contando com a ajuda
de professores que nos liberam espaço e ferramentas para desenvolvermos nossas
atividades. Quanto à isso, não posso reclamar.
BRAZILIAN SPACE: Sr. Lucas
e quanto a Agência Espacial Brasileira (AEB), como a agência tem se posicionado
perante aos projetos dessa parceria USP/AIRVANTIS?
LUCAS FONSECA: Eles sabem que existe, mas é isso. Aplicamos o projeto para o
Uni-Espaço, mas não fomos selecionados.
BRAZILIAN
SPACE: BRAZILIAN SPACE: Sr. Lucas a
AIRVANTIS ainda acredita na possibilidade de parceria com outras empresas brasileiras
para realizar projetos espaciais conjuntos, como por exemplo, o de
motores-foguetes líquidos e até mesmo de um veículo lançador de satélites?
LUCAS FONSECA: A minha resposta seria sim e não.
Mas essa é uma pergunta que demanda uma resposta mais elaborada, pois
precisamos refletir quais são as necessidades de um país em ter um programa
espacial.
Basicamente,
quando um país se propõe a iniciar um programa espacial, ao menos um dos
seguintes pontos são levados em conta, sendo eles: soberania nacional,
propaganda de estado, desenvolvimento científico/tecnológico, atividades de
defesa e para fins comerciais.
Olhando pelo
prisma empresarial, com exceção dos fins puramente comerciais, todas as outras
atividades dependem de uma agenda positiva do governo. Mesmo para quem almeja
apenas atividades comerciais, o governo continua sendo órgão regulador e muito
possivelmente o maior agente contratante dessas atividades.
Como
atividade comercial, apenas recentemente alguns países vem conseguindo
implementar o conceito de NewSpace e com isso provando que a atividade
comercial espacial pode ser desenvolvida de maneira sustentável e com
crescimento orgânico. Mas isto está muito longe de acontecer no Brasil, diria
que no mínimo 10 anos de atraso para iniciar esse tipo de conversa por aqui.
Fora isso,
todos os grandes players tradicionais que existem no mercado mundial foram
fomentados pelos países de origem na tentativa de suprir os pontos que
mencionei como motivadores. Então quando penso na possibilidade de desenvolver
algo com outros parceiros comerciais, primeira coisa que considero é a
participação do governo na empreitada.
O que existe
de oportunidade atualmente para as empresas é orbitar em torno de todas as atividades que o governo
brasileiro já desenvolve com sua agência e institutos e dançar conforme a
vontade política, o que não é sustentável.
Acho que a
possibilidade de se construir um lançador nacional através da iniciativa
privada é válida, mas depende de uma quebra de paradigma muito grande. Quebra
essa que incluiu, entre outras coisas, total reeducação dos investidores que
atuam no Brasil, pois o cenário existente não possibilita nenhum tipo de
aproximação de capital privado.
BRAZILIAN
SPACE: Sr. Lucas, o senhor ainda continua com algum
interesse de atuar na área educacional, mesmo que isto seja realizado fora do
Brasil?
LUCAS FONSECA: Sim, e como visto nas minhas
respostas anteriores, mantenho esse tipo de atividade desde o momento que
retornei ao país. Valorizo o fato de eu ter tido a chance de estudar numa
escola pública no Brasil e posteriormente na França. Me sinto em débito com a
sociedade e realmente gosto de ensinar o pouco que eu sei. Enquanto tiver
oportunidade, irei manter sim minhas atividades educacionais, seja aqui ou no exterior.
BRAZILIAN
SPACE: Sr. Lucas,
após a sua passagem pelo Brasil qual é a sua atual opinião sobre a Gestão e
Política do governo em relação ao Programa Espacial do país?
LUCAS FONSECA: Inexistente, considerando um
ponto de vista macro, não existe interesse do Brasil em fomentar a atividade
espacial. Se lá atrás começamos o programa espacial baseado no militarismo
instaurado no país, que buscava claramente soberania e defesa nacional, hoje em
dia temos um pequeno apelo apenas dentro da propaganda de estado. O MCTI como
um todo e qualquer ramificação abaixo que mexa com tecnologia não possui força
política suficiente para fomentar essa atividade no Brasil, precisaria existir
um motivador maior vindo da Presidência da República.
Minha
sensação é que o governo empurra com a barriga o assunto e não tem a mínima
vontade de mexer no status-quo dessa realidade. Na minha opinião pessoal, como
cidadão brasileiro, penso que ou levamos a sério ou que se encerre por aqui e
compremos tudo de fora. Se considerarmos tudo que foi investido desde a década
de 60, temos pouquíssimos resultados. Infelizmente a inconstância de
investimento e a pulverização em diversas frente, tornou o sucesso do programa algo
intangível. Gosto de citar como exemplo o programa espacial coreano, que já
colocou seu lançador em órbita com apenas uma fração de investimento que o
Brasil vem investindo na área desde o início do nosso PEB.
Cito ainda um
problema muito sério que acomete a AEB desde sua fundação que é a falta de
servidores permanentes em seu quadro. Muito do que se é questionado aqui no
blog em relação a continuidade das ações da AEB, acontece pela rotatividade dos
servidores que vem cedidos de outros órgãos governamentais e inevitavelmente
retornam ao seu posto de origem ou são realocados para outras funções. A
publicação do edital de contratação de servidores lançado este ano pode ser o
início de uma importante transformação para a agência.
BRAZILIAN
SPACE: Finalizando
Sr. Lucas, o senhor teria algo mais que gostaria de acrescentar para os nossos
leitores?
LUCAS FONSECA: Essas próximas semanas serão de especial importância em minha
carreira. A missão Rosetta, qual eu trabalhei durante minha estadia na Europa,
tentará realizar o pouso de seu módulo Philae no cometa 67P. Durante o tempo
que trabalhei nesta missão, desenvolvi modelos para predição exatamente do
momento do pouso, então estou extremamente ansioso com o resultado que iremos
obter.
Sei que
todos que são entusiastas estão acompanhando a missão Rosetta, e de fato é um
feito extraordinário para a história da exploração espacial. Me sinto honrado
de ter feito parte do time que trabalha na missão e independente de ser uma
iniciativa europeia, podemos dizer que um brasileiro ajudou no projeto.
Como sempre,
deixo aberto meu contato para qualquer pessoa que queira conversar sobre assuntos
espaciais. lucas.fonseca@airvantis,com.br
Aqui mesmo estou vendo entre os colegas de trabalho a cada dia uma maior motivação para deixar o Brasil.
ResponderExcluirA farra que fizeram com a economia do país nessas últimas décadas, uma hora vai estourar os mercados. São como dizem os que entendem do assunto, "favas contadas". O dólar vai subir, a inflação e o desemprego vão aumentar. O aumento da energia elétrica já é o primeiro sinal, e assim vamos indo.
Tá MUITO difícil pensar em continuar insistindo nessa fórmula que sabidamente não dá certo e não tem a menor perspectiva de usar a inteligência, pois esse é um artigo raro nesse "governo".
Já se está vivendo aquela sensação de "o último a sair, apaga a luz".
É triste, é lamentável é uma VER-GO-NHA.