A Importância do Uso de Foguetes de Treinamento no PEB
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo publicado na revista “Espaço Brasileiro” (Jul., Ago e Set. de 2009) destacando a importância para o PEB do desenvolvimento de foguetes de treinamento.
Duda Falcão
A Importância do
Foguete de Treinamento
Ten. Cel. Av.
Ricardo Rodrigues Rangel
Há mais de dois mil anos, o homem busca desenvolver novas habilidades para saber como lidar com situações difíceis e complexas. A tônica básica encontrada nestas filosofias, principalmente nas culturas milenares, esta focada no conhecimento completo de toda a situação, incluindo uma análise profunda das diversas possibilidades em função das variáveis encontradas no problema. Em outras palavras, é ser capaz de planejar o difícil enquanto ainda é fácil, é entender o conjunto, enquanto existem apenas alguns pedaços, é conseguir planejar caminhos considerando todas as alternativas que podem se tornar realidade.
No esporte, facilmente observamos este esforço no treinamento dos atletas que se preparam para as Olimpíadas. As características naturais e genéticas destes esportistas não são suficientes para garantir um bom resultado. Apenas os que conseguem planejar e executar um programa completo, levando em conta todos os detalhes do corpo, do esporte e da estratégia, tem condições de alcançar os lugares mais altos do pódio.
Nas atividades espaciais brasileiras, o contexto não é diferente. Há necessidade de prepararmos as equipes envolvidas nas operações de lançamento e de as mantermos em condições de alta performance para que estejam prontas e capazes de participarem, com proficiência, dos atos que estão por se descortinar nos próximos anos no cenário espacial (não podemos ficar desatentos à proximidade dos lançamentos do VLS e do Cyclone).
A forma mais eficiente encontrada para capacitarmos as equipes dos Centros de Lançamentos Brasileiros foi a criação de um projeto específico para o desenvolvimento de foguetes instrumentados de treinamento, com custos inferiores aos atuais veículos suborbitais, tendo como uma de suas premissas básicas a compatibilização dos que estão sendo produzidos com as características técnicas e meios operacionais dos centros, incluindo lançamento a partir dos lançadores de porte médio, telemetria na banda S, transponder na banda C, terminação de vôo, disponibilidade de carga útil para experimentos do interesse do Programa Nacional de Atividades Espaciais – PNAE e possibilidade de incorporação futura de GPS e slante range.
Após o levantamento das capacidades técnicas das empresas brasileiras, em especial das Indústrias Aeroespaciais do Brasil, o desenvolvimento dos foguetes de treinamento foi iniciado em dezembro de 2008 e se encontra em produção junto à empresa AVIBRÁS, com suporte financeiro do Comando da Aeronáutica (COMAER) e da Agência Espacial Brasileira (AEB), e ainda da gerência do Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI) do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA).
O projeto esta sendo desenvolvido de acordo com as normas brasileiras e internacionais de forma a viabilizar a qualificação e a certificação dos veículos, por meio do Instituto de Fomento e Coordenação Industrial (IFI), órgão de certificação reconhecido internacionalmente. Os foguetes de treinamento terão propulsores sólidos e cargas úteis instrumentadas, sendo de três tipos distintos:
- Foguete de Treinamento Básico (FTB) - Foguete para treinamento operacional do Centro de Lançamento, de forma isolada, sem participação da estação remota para monitoramento redundante do veículo, instrumentado com telemetria na banda S e apogeu superior a 30 km.
- Foguete de Treinamento Intermediário (FTI) - Foguete para treinamento operacional do Centro de Lançamento, de forma isolada, sem participação da estação remota para monitoramento redundante do veículo, instrumentado com telemetria na banda S, transponder na banda C, terminação de vôo, e apogeu superior a 60 km.
- Foguete de Treinamento Avançado (FTA) - Foguete para treinamento operacional dos dois Centros de Lançamento, de forma conjunta, sendo um responsável pelo lançamento e o outro pelo monitoramento remoto do veículo e da carga útil (Estação Aval), instrumentado com telemetria na banda S, transponder na banda C, terminação de vôo, e apogeu superior a 160 km.
Os veículos estão sendo projetados para permitirem o lançamento em condições inóspitas, tais como alta salinidade, vento de superfície e balísticos de até 10 m/s e chuva moderada de até 10 mm/h.
Em termos de ensaios, os veículos, desde o básico até o avançado, disponibilizarão de 5 kg a 30 kg de carga útil, com rede elétrica e transmissão por telemetria para os equipamentos de solo, para experimentos de interesse do meio acadêmico e científico.
A fabricação dos foguetes FTB e FTI já se encontra em andamento, com os primeiros lançamentos previstos para agosto de 2009 e abril de 2010, respectivamente. O desenvolvimento dos foguetes FTA acontecerá a partir de janeiro de 2012, com o lançamento previsto para 2013.
A partir das primeiras campanhas de lançamento, cada Centro receberá anualmente cinco FTB e dois FTI, totalizando sete foguetes instrumentados, que permitirão às equipes o treinamento dos procedimentos de montagem, integração, preparação, coordenação, segurança operacional, lançamento e rastreio, incluindo radares e telemetria.
Os treinamentos regulares facultarão aos Centros manterem a operacionalidade para lançamentos suborbitais e orbitais de interesse nacional, com níveis mais altos de segurança e de eficiência, além de viabilizarem avaliações constantes dos meios técnicos, identificação de novos procedimentos e atualização dos equipamentos.
Certamente, novas pesquisas surgirão nas áreas de motores, eletrônica, computação aplicada, radares, telemetria, dinâmica, segurança de vôo e outras de interesse da sociedade. É importante lembrar que cada pequena experiência faz parte de uma caminhada maior que possibilita tornar realidade diversas facilidades que temos hoje em dia, tais como TV por satélite, telefones celulares, posicionamento por GPS e avanços nas áreas de medicina e biologia.
Não há duvidas de que o Programa Espacial Nacional depende de vários fatores, dentre eles a política, a economia, a ciência, a tecnologia e a indústria. Entretanto, apenas o estudo completo de todas as variáveis proporcionará reais condições ao Brasil de alcançar o domínio do espaço.
Ten. Cel. Av. D. Sc. Ricardo Rodrigues Rangel
O Ten. Cel. Rangel é Doutor pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e atualmente exerce o cargo de Chefe da Divisão de Operações do CLBI.
Fonte: Revista Espaço Brasileiro - núm 06 - Ano 2 - Jul., Ago. e Set. de 2009 - Pag. 18
Comentário: Nada como um especialista da área para lhe explicar melhor algo que lhe parece não tão convincente. Como o leitor sabe, sempre demonstrei em meus comentários a minha insatisfação e não compreensão da necessidade de se realizar tantas operações de lançamentos com foguetes de treinamento como o Improved Orion americano e os recém lançados FTB. Principalmente por causa da tão conhecida dificuldade de recursos do PEB e pelo fato de achar que as equipes tanto do CLA quanto do CLBI já estarem suficientemente treinadas devido à notória experiência de ambas. No entanto, após ler atentamente esse artigo escrito pelo Tenente Coronel Aviador Ricardo Rangel, sou obrigado a me render as suas colocações e até parabenizar a Aeronáutica e a AEB pela visão estratégica e inteligente neste episódio. Já que as colocações feitas pelo Ten. Cel. Av. Rangel em seu artigo são convincentes em todos os pontos, principalmente no que diz respeito ao uso desses foguetes para experiências científicas e tecnológicas de interesse da comunidade científica brasileira. Criando assim outras plataformas de acesso a altas camadas da atmosfera e do espaço de forma mais barata e num período bem menor de preparação que os foguetes de sondagens atualmente em uso. Ou seja, além do treinamento das equipes e testes dos equipamentos dos Centros, estarão sendo realizados experimentos científicos e tecnológicos de interesse da sociedade brasileira justificando assim a meu ver o seu investimento.
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