Space.com: Decisão Recente do Governo do Reino Unido de Extinguir a 'UK Space Agency (UKSA)' Não Supreendeu o Setor Espacial Britânico
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No dia 1º de setembro, o portal Space.com publicou um artigo interessante sobre a recente decisão do governo do Reino Unido de extinguir sua Agência Espacial Nacional (UK Space Agency - UKSA). A medida, embora impactante à primeira vista, não surpreendeu aqueles que acompanham de perto o setor espacial britânico.
(Crédito da imagem: TARSO SARRAF/AFP via Getty Images)
De acordo com o artigo do portal, o anúncio do governo do Reino Unido de incorporar a agência espacial nacional (UK Space Agency - UKSA) de 15 anos a um departamento governamental recém-criado pode parecer chocante para alguns, mas não foi surpresa para os insiders do setor. Ainda assim, especialistas temem que essa mudança possa prejudicar as ambições espaciais do país e enfraquecer sua posição dentro da Agência Espacial Europeia (ESA), à qual o Reino Unido destina a maior parte de seu orçamento espacial civil.
A UK Space Agency (UKSA), criada em 2010 com o objetivo de impulsionar o setor espacial e de satélites do país para uma nova era espacial, será incorporada ao Department for Science, Innovation and Technology (DSIT) até abril.
O governo anunciou a decisão em 20 de agosto, dizendo que a mudança buscava "eliminar duplicações e garantir que as decisões fossem tomadas com supervisão ministerial clara". A UKSA se tornará, efetivamente, um departamento dentro do DSIT, que já vinha financiando a agência desde 2023. A fusão é amplamente vista como parte da iniciativa do governo trabalhista de reduzir os gastos públicos e os custos da máquina pública em 15% até o fim da década.
Mas pessoas de dentro do setor, que conversaram com o site Space.com, afirmam que as dúvidas sobre a relevância da UKSA já circulavam nos bastidores do governo desde 2020.
"Foi por volta da pandemia de COVID que o [Department for Business, Energy and Industrial Strategy, ou BEIS], então responsável pela UKSA, começou a argumentar que a agência havia se isolado e não compreendia mais as necessidades espaciais dos outros departamentos do governo", disse uma fonte que trabalhou na UKSA durante sua primeira década, sob condição de anonimato.
"A agência passou a ser vista como um enfeite, uma animadora de torcida do conceito de espaço, em vez de pensar no que realmente precisamos do espaço para o meio ambiente, transporte, defesa etc."
O Reino Unido sempre teve uma abordagem diferente do espaço em comparação a seus vizinhos europeus, como Alemanha, França e Itália, explicou a fonte. Historicamente, o país direcionou a maior parte de seus recursos para a Agência Espacial Europeia (ESA), em vez de desenvolver um programa espacial nacional robusto com parcerias bilaterais independentes da ESA.
Assim, mais de 80% do orçamento da UKSA era destinado à ESA. A percepção no governo era de que a UKSA agia mais em linha com os interesses da ESA do que com as necessidades britânicas.
"O governo começou a dizer que a equipe de políticas da UKSA era muito limitada e focada demais no que a ESA queria", contou a fonte ao Space.com. "A agência não questionava os rumos que a ESA desejava tomar e se deixava levar pela visão da organização."
A ESA é uma instituição intergovernamental independente da União Europeia, da qual o Reino Unido saiu em janeiro de 2020. Com 23 países-membros atualmente, a ESA tem um status especial que a diferencia de outras agências espaciais, como a NASA.
(Crédito da imagem: UK Space Agency)
Como entidade intergovernamental, a ESA opera fora do controle direto de qualquer governo e é protegida por imunidade diplomática. A agência, que enfrenta denúncias de assédio moral e violações de leis trabalhistas, é frequentemente criticada por falta de transparência, já que não está sujeita a leis de acesso à informação. O Reino Unido, representado pela UKSA, é o quarto maior contribuinte do orçamento da ESA, atrás apenas de Alemanha, França e Itália.
O governo britânico começou a tentar exercer mais controle sobre seus investimentos espaciais após a publicação de um Space Landscape Review, encomendado em 2021. A revisão recomendava que a estratégia espacial nacional fosse retirada das mãos da UKSA e transferida para o então BEIS, reduzindo a UKSA a um órgão executor.
Um relatório subsequente do National Audit Office, publicado em 2024, identificou ineficiências no novo modelo e falhas persistentes da UKSA, incluindo monitoramento e avaliação inadequados do progresso dos projetos. Também constatou que a UKSA não conseguiu garantir um retorno completo sobre os investimentos feitos na ESA. A decisão de absorver completamente a agência pelo DSIT é vista como consequência direta desse relatório, e já vinha sendo precedida por transferências de funcionários-chave da UKSA para o departamento espacial do DSIT.
"Era um movimento esperado", disse outra fonte que também trabalhou na UKSA, sob anonimato. "Já sabíamos que isso aconteceria há algum tempo."
As fontes disseram que faz sentido reunir os vários órgãos do governo responsáveis pela agenda espacial. A mudança ocorre num momento em que o Reino Unido, assim como outros países europeus, se mostra cada vez mais consciente da necessidade de desenvolver capacidades espaciais voltadas à defesa. No entanto, a UKSA sempre foi responsável apenas pelas aplicações civis e pela exploração científica.
"Atualmente, no Reino Unido, tudo é muito fragmentado", disse uma das fontes. "É preciso falar com muitas pessoas e diferentes áreas do governo."
"Não acho que seja algo ruim, já que o DSIT é o departamento que já financia a agência espacial", completou outra fonte. "A agência manterá sua marca, mas passará a se reportar diretamente ao chefe do DSIT, sem pedir recursos diretamente ao governo."
Alguns, no entanto, questionam a decisão — especialmente por ter sido anunciada três meses antes da próxima reunião do Conselho Ministerial da ESA, que definirá o financiamento da agência para os próximos três anos. O risco de enfraquecer a posição britânica dentro da ESA foi apontado por várias fontes como o principal argumento contra a fusão com o DSIT.
"É difícil imaginar como isso funcionará na prática e como nossos parceiros internacionais saberão como se relacionar com o Reino Unido", disse uma das fontes. "Ainda não se sabe se isso será uma boa solução. Acho que, nos próximos 12 meses, tudo vai desacelerar, e as prioridades ficarão menos claras com tantas mudanças internas no governo."
(Crédito da imagem: UK Space Agency)
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| O astronauta britânico Tim Peake foi o primeiro tripulante britânico da Estação Espacial Internacional, em 2015. Ele representou as agências espaciais britânica e europeia. |
Outras fontes ligadas ao setor espacial britânico, mas sem conhecimento interno da UKSA, também criticaram a decisão. Argumentam que todas as nações com ambições espaciais sérias mantêm agências espaciais dedicadas. França e Alemanha, os dois maiores contribuintes da ESA, possuem suas próprias agências — CNES e DLR, respectivamente — que coordenam programas espaciais complexos e lideram projetos como a família de foguetes europeus Ariane.
"Quando a UKSA foi criada, em 2010, todos ficaram empolgados com o fato de o Reino Unido finalmente ter uma agência executiva com poder para moldar a política e a estratégia espacial do país", disse uma fonte ao Space.com.
"Na França e na Alemanha, o CNES e o DLR impulsionaram o crescimento de indústrias espaciais fortes, principalmente por meio de projetos da ESA, e o Reino Unido queria seguir esse caminho. O que mudou agora?"
Outra fonte acrescentou: "Uma agência espacial executiva independente era considerada parte fundamental do compromisso mais ambicioso do Reino Unido com o espaço [antes de 2010]."
Antes da UKSA, o programa espacial britânico era coordenado pelo British National Space Centre (BNSC), que reunia especialistas de diversos departamentos governamentais. Porém, como o BNSC não tinha orçamento próprio, suas negociações com a ESA eram limitadas e seu poder de fomentar a indústria nacional era restrito. Alguns veem a incorporação da UKSA ao DSIT como um retorno ao modelo do BNSC — e temem o ressurgimento dos mesmos problemas.
A Estratégia Espacial Nacional do Reino Unido, publicada em 2021 pelo governo conservador de Boris Johnson, traçava metas ambiciosas para o setor espacial do país. Entre elas, tornar-se o principal provedor europeu de serviços de lançamento de satélites e um fabricante líder de pequenos satélites.
Nos 15 anos de existência da UKSA, a indústria espacial britânica cresceu significativamente. Segundo o relatório "Size and Health of the UK Space Industry", publicado em 2025, o setor cresceu mais de 3,3% ao ano desde 2010, empregando atualmente mais de 55.500 pessoas diretamente e gerando 81.000 empregos indiretos.
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