EUA Impuseram Restrições ao VLS, Revela Jayme Boscov
Olá leitor!
Segue abaixo uma interessantíssima entrevista/depoimento
com o Dr. Jayme Boscov sobre a sua trajetória profissional, o PEB, o
Projeto do VLS, entre outros assuntos. Vale a pena dar uma conferida
Duda Falcão
VIDA E
TRABALHO – DEPOIMENTO
EUA Impuseram Restrições ao VLS,
Revela Jayme Boscov
“Só nos restou recorrer a Rússia e Índia, e fomos bem
atendidos”,
relatou ao Jornal do SindCT o engenheiro brasileiro que
atuou no
programa espacial francês por 7 anos e no desenvolvimento
do
foguete SONDA 3, bem como do programa VLS
Fernanda Soares e Redação
Jornal do SindCT
Edição nº 35
Março de 2015
Boscov examina tubeira de um foguete da série SONDA.
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Entre os engenheiros que mais se destacaram na história
de realizações aeroespaciais do Brasil, Jayme Boscov é dono de uma trajetória
profissional bastante singular. Formou-se no Instituto Tecnológico da
Aeronáutica (ITA), em 1959, mas após rápida passagem por seu primeiro emprego,
numa “pequena companhia de aviação comercial no Rio de Janeiro”, ganhou uma
bolsa de estudos do governo francês. Sua chegada à França, em 1960, dava início
a uma carreira marcante, na qual não faltaram lances inusitados.
Em pleno auge da “Guerra Fria”, foi contratado por uma
empresa que participava do desenvolvimento do programa de mísseis balísticos
internacionais. Depois de sete anos ali, a amizade com um colega de trabalho
que se tornou suspeito de espionagem em favor da então URSS lhe trouxe
dissabores: exigiram que Boscov assumisse a cidadania francesa, para provar sua
fidelidade. Ele se recusou e foi transferido de setor, para a produção do
supersônico Concorde.
Em 1969 regressou ao Brasil, passando a trabalhar no
então Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA), no projeto do foguete SONDA, que
daria origem à Missão Espacial Completa Brasileira (MECB) e ao programa de
veículos lançadores de satélites (VLS), cuja direção ele viria a assumir em
1980. “Relutei em aceitar redigir este trabalho [as respostas às questões
encaminhadas pela reportagem] já que me encontro afastado de qualquer atividade
espacial desde que me aposentei e realizei um trabalho para a AEB em 1997-98,
intitulado ‘Veículos Lançadores’, em nível internacional e nacional”, explica
Boscov. “É bom lembrar, também, que exerci a gerência do VLS somente até
janeiro de 1992, quando então ela passou a ser exercida diretamente pelo
diretor do CTA e posteriormente pelo diretor do IAE”.
Jornal
do SindCT -
Tendo se formado no ITA, como foi o início da sua
carreira na França?
Boscov - Formado em 1959 em Engenharia
Aeronáutica, iniciei minha vida profissional em uma pequena companhia de
aviação comercial no Rio de Janeiro. Contemplado com uma bolsa de estudo do governo
francês, parti para a França em 28 de julho de 1960. Estagiei durante seis meses
nas Indústrias Mecânicas e Aeronáuticas. Após o término da bolsa, por motivo
alheio à minha vontade (acidente com um familiar) vi-me obrigado a permanecer
na França, quando então passei a procurar emprego. Após seis longos meses de
procura, sempre com recusa por eu ser estrangeiro, dado que todas as empresas
aeronáuticas eram ligadas a programas militares, finalmente consegui
empregar-me numa empresa que participava do nascente programa de desenvolvimento
dos mísseis balísticos intercontinentais, menina dos olhos do então presidente general
Charles De Gaulle, quando o mundo se encontrava no âmago da “Guerra Fria”.
Isto só foi possível porque a maior autoridade em termodinâmica
de reatores da França esteve no ITA para um seminário com os professores; ele
deu o aval para que eu fosse contratado, garantindo que o ITA era uma escola de
engenharia de alto nível. Mesmo assim fui confirmado como engenheiro somente
após três meses de experiência.
Já com sete anos participando do programa espacial, por
suspeita de envolvimento em espionagem em prol da Rússia de um colega de trabalho
com quem mantinha relação de amizade, fui intimado a assumir a nacionalidade francesa,
o que naquele tempo significava renegar a minha própria nacionalidade, para
permanecer neste trabalho. Recusei-me e fui transferido para o programa de
desenvolvimento do avião supersônico Concorde, onde permaneci até meu regresso
ao Brasil em 1º de julho de 1969.
Jornal do SindCT - Como foi o convite para voltar
ao Brasil para trabalhar no CTA?
Boscov - Tudo começou com um primeiro
contato com o já falecido colega de turma Claudio Uzeda, que trabalhou na mesma
empresa na França, mas na área de desenvolvimento de reatores de aviões. Ele já
havia retornado ao Brasil e estava empregado no CTA. Ele me informou que havia
uma nascente atividade espacial com o desenvolvimento do foguete de sondagem
mono-estágio SONDA 2. Em dezembro 1967, vim ao Brasil e mantive contato com o
INPE e o CTA, onde fiquei sabendo que o passo seguinte era o desenvolvimento do
foguete bi-estágio SONDA-3, que se coadunava com minha experiência profissional
adquirida na França.
Voltei para a França e, paralelamente ao meu trabalho no
desenvolvimento do Concorde, elaborei um diagrama PERT com todos os eventos e
suas dependências para o desenvolvimento do SONDA 3, atendendo às performances
esperadas do futuro foguete de sondagem.
Apresentei o diagrama PERT ao adido da Aeronáutica em Paris
em 1968. Finalmente, aceite o programa para o desenvolvimento do SONDA 3 de
acordo com o diagrama PERT, entreguei-o para uma comitiva da Aeronáutica que se
encontrava em Paris. Isto feito, entrei em contato com entidades espaciais da
França para que dois especialistas viessem para o CTA para participar dos
estudos preliminares do SONDA 3.
Retornei ao Brasil em 1º de julho de 1969, integrando-me ao
restrito grupo de não mais que 25 pesquisadores de uma das seções do Instituto
de Pesquisas e Desenvolvimento (IPD) do CTA, seção esta que posteriormente se
transformou no Instituto de Atividades Espaciais (IAE).
Jornal do SindCT - Quais foram os planos iniciais
no Brasil?
Boscov - Durante todo o mês de agosto
de 1969, realização dos estudos preliminares do foguete SONDA3 com a
participação dos especialistas franceses. Foram analisadas todas as áreas concernentes
ao projeto: Estruturas, Aerodinâmica, Propulsão, Rede Elétrica, Trajetografia e
Sistema de Segurança, finalizando com um documento englobando todos os estudos.
A partir daí, controle rigoroso das atividades técnicas e de gerenciamento, sem
dar espaço para “jeitinhos” e “gambiarras” tão difundidos em nossa cultura.
Jornal do SindCT - Qual era a motivação das pessoas
na área espacial?
Boscov - Entusiasmo! Dedicação!
Inovação! Mentes abertas para uma nova atividade profissional fora das áreas
convencionais. Pioneirismo! Eram apenas 25 pesquisadores para tratar de todas
as áreas aqui mencionadas. A partir daí, contratações de engenheiros e
técnicos, já que havia um programa com continuidade.
Jornal do SindCT - Como foi a dinâmica de trabalho
no CTA naquela época?
Boscov - Não gostaria de citar nomes,
seriam muitos e muitos! Mas não posso deixar de citar aquele que foi o grande
incentivador para a sedimentação das pesquisas e realizações no campo espacial
no CTA: o saudoso tenente-brigadeiro do ar Paulo Victor da Silva. Eu
particularmente tive uma rica experiência de trabalho com ele, desde que assumi
meu posto de coordenador dos projetos de desenvolvimento de veículos
lançadores, a partir de agosto de 1969. Ele não fazia nenhuma diferenciação entre
militares e civis. O que contava para ele eram a competência e
responsabilidade nas ações de trabalho.
Foi uma época de realizações com apoio irrestrito às
inovações. Foi uma época áurea! É bom lembrar também do desenvolvimento do
avião Bandeirante, que deu origem à Embraer. A dinâmica era de muito trabalho,
dedicação, esforço, entendimento e companheirismo de todos, civis e militares,
era a mola mestre de todas as atividades.
Jornal do SindCT – Como foi concebida a MECB?
Boscov - Foi consequente dos resultados
do desenvolvimento dos foguetes SONDA: S2, S3, S4, demonstrativos de competência
e savoir--faire,
permitindo
assim objetivar o desenvolvimento ambicioso de um Veículo Lançador de Satélites
(VLS), bem mais complexo. A MECB era um programa de governo gerenciado pela
Comissão Brasileira de Atividades Espaciais (COBAE) ligada ao Estado Maior das Forças
Armadas (EMFA). Tinha como objetivo assegurar os recursos financeiros para o
desenvolvimento dos três segmentos: o VLS e o Campo de Lançamentos de
Alcântara, pelo CTA; e o Satélite de Coleta de Dados, pelo INPE, do Ministério
da Ciência e Tecnologia.
“Em meados de 1994, a Direção
do CTA convocou uma reunião com
todos os dirigentes do IAE, quando
fomos informados que toda a força de
trabalho (drive force) do CTA era para
atender como primeira prioridade às
necessidades da Força Aérea Brasileira.
Prioridade esta que não era o VLS”
Jornal do SindCT – Por que não prosseguimos no mesmo
ritmo?
Boscov - Esta questão é bastante
delicada, envolve a mudança do regime de exceção para o regime democrático. A
partir de 1985, o programa espacial, que era estratégico, foi caminhando para
uma perigosa situação de anacronismo Deixou de ser prioritário no próprio CTA.
Em meados de 1994, a Direção do CTA convocou uma reunião com todos os dirigentes
do IAE, quando então fomos informados que toda a força de trabalho (drive force) do CTA era para atender como primeira
prioridade às necessidades da Força Aérea Brasileira (FAB). Prioridade esta que não era o VLS, deixou também de ser de cunho
governamental.
Independentemente de qualquer conotação ideológica, deve-se
reconhecer que durante o regime de exceção havia uma política espacial ao nível
de Presidência, sem restrições financeiras. O programa de desenvolvimento do
VLS já era de cunho internacional com intercâmbio com vários países
(principalmente França, Alemanha, Estados Unidos) objetivando a formação de pessoal,
aquisição de componentes, desenvolvimento de alguns subsistemas do VLS. Chegou
a ficar nos holofotes do Departamento de Estado dos EUA, que impuseram restrições
a qualquer fornecimento de materiais e serviços que pudessem ajudar o
desenvolvimento do VLS; tanto nos EUA como na França, Alemanha e Inglaterra. Só
nos restou recorrer à Rússia e Índia, e fomos bem atendidos.
Infelizmente, diletantismo e anacronismo perduram até hoje
no segmento VLS sob a responsabilidade da Agência Espacial Brasileira (AEB).
Boscov e equipe no lançamento do SONDA 4,
em novembro de
1985.
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Fonte: Jornal do SindCT -
Edição 35ª - Março de 2015
Comentário: Entrevista depoimento importantíssima para esclarecer para Sociedade Brasileira ainda mais as coisas. Será que precisa acrescentar mais alguma
coisa Sr. Braga Coelho?
Uma aula de historia tremenda; e o titulo que o sindCT coloco eh uma pequena piada. Tanta coisa que podia exaltar, como a falta de visao dos governos, ou o fato do PEB nao ser programa de estado. Mas o que o jornal decidiu enfatizar foi o boicote dos EUA, quando na verdade os grandes boicatadores sao brasileiros. Sabemos que houve boicote estrangeiro e que isso atrapalha muito, mas tem que deixar de ser a vitima e colocar a culpa nos EUA o tempo todo.
ResponderExcluirAbs
Eduardo
DE pleno acordo Eduardo.
ExcluirColocar culpa nos EUA e dizer que conseguiram algo com a China e Russia é um atestado de burrice ou se fazer de vítima. Ou ambos.
Com todo o respeito ao trabalho do Eng. Boscov e a sua contribuição ao PEB.Parece que de alguma maneira ele quer se eximir dos problemas relacionados ao VLS ("só exerci a gerência do VLS até 1992").Mas eu ainda tenho dúvidas, se a sua solução em "cacho" do VLS; (muito complexa e inédita no mundo) não foi a origem, de todos os problemas relacionados ao lançamento do VLS.
ResponderExcluirAgeu
Ageu
ExcluirA configuração em tandem existe em outros foguetes sim. veja a imagem do delta http://s.glbimg.com/jo/g1/f/original/2011/09/09/ll585239main_grail_onpad201.jpg
era a solução possível há 30 anos atrás.
Concordo que Boscov foi "bonzinho" ao avaliar o problema, mas usou uma palavra que se torna politicamente correta porque quase ninguém entende o seu sentido: diletantismo.
Diletantismo é, trocado em miúdos, um hobby. Não há seriedade nem objetividade na condução do projeto. A decisão da época (que Boscov não menciona) é que nenhum grande projeto dentro da Aeronáutica poderia ser liderado por um civil. Daí ele próprio ter sido afastado.
Que justificativa / desculpa o DCTA tem para não refazer a metade de um VLS (o VSISNAV não é o VLS completo) em 12 anos ? só mentiras...
http://www.jusbrasil.com.br/diarios/89081163/dou-secao-3-02-04-2015-pg-16
ResponderExcluirPREGÃO Nº 18/2015 - UASG 120013
Nº Processo: 67710006503201467 . Objeto: Pregão Eletrônico -Aquisição de peças sobressalentes para o sistema plataforma VLS-1. Total de Itens Licitados: 00020. Edital: 02/04/2015 de 08h00 às 12h00. Endereço: Av. Dos Libaneses,nr 29-tirirical Tirirical - SÃO LUIS - MA. Entrega das Propostas: a partir de 02/04/2015 às 08h00 no site www.comprasnet.gov.br.. Abertura das Propostas: 15/04/2015 às 10h00 site www.comprasnet.gov.br.
(SIDEC - 01/04/2015) 120013-00001-2014NE800035
COMPRASNET PE 18-2015 PDF:
https://mega.co.nz/#!7xAHiTQa!UKWzZpRVV2BlYXluz3QM7d9Xn9QLsybBjb7268TJEW0
Como tem gente que ainda acusa os EUA sabendo que o nosso governos, juntamente com seus comparsas do leste europeu, foram quem solaparam nosso programa espacial? Esse tipo de titulo e acusacao tosca eh fruto de quem fala a linguagem que o governo quer ouvir. Os EUA nao sao santos, mas nao sancionaram a Coreia do Sul, a India, e outros por quererem avancar no seu programa espacial. O maior inimigo do Brasil atualmente eh parceiro do socialismo, e qualquer sensacionalismo que se sobreponha a isso eh pura distracao.
ResponderExcluirIsrael.
ResponderExcluirOs EUA não proibiram a Coréia do sul, porque ela é um contraponto a Coréia do norte, assim como a Índia é um contraponto à China. "Deram" foguetes para israel, porque ele é o posto avançado dos EUA no oriente médio. É simples de entender. Um Brasil dotado de foguetes, talvez eles vejam como uma ameaça estratégica e comercialmente um concorrente a mais.
No entanto, nós devemos exercer nosso direito soberano, de acesso ao espaço.
Ageu
Pessoal, precisamos hoje no pais inaugurar mentes de vanguarda.Paralelamente à qualqur=er transferencia de tecnologia devemos ter um órgão de mentes brilhantes que não aceitem cópias. Criem pelo seu próprio amor ao Pais e pelo seu conhecimento nativo e adquirido.Sim intercambios podem ser aceitos, mas o projeto original tem que ser nosso. Diremos ao mundo que podemos criar tecnologia, realizar e exportar.. Escolas impares que formem genios brasileiros.
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