Estudo de Neutrinos Viabiliza Explicação Sobre a Origem do Universo Material
Olá leitor!
Segue abaixo um artigo postado ontem (17/11) no site da
Agência FAPESP, destacando que um estudo internacional de neutrinos com
participação brasileira viabiliza explicação sobre a origem do Universo Material.
Duda Falcão
Notícias
Estudo de Neutrinos Viabiliza Explicação
Sobre a Origem
do Universo Material
José Tadeu Arantes
Agência FAPESP
17 de novembro de 2016
(foto do detector interno do Double Chooz / CEA-Saclay /
IRFU-SIS)
Um experimento
destinado a medir as “oscilações dos neutrinos” forneceu conhecimentos cruciais
para a compreensão do fenômeno que possibilitou a constituição do universo
material. Tal fenômeno, denominado “violação da simetria de carga-paridade dos
léptons”, produziu, logo depois do Big Bang, um pequeno excedente de matéria em
relação à antimatéria. É esse excedente que compõe, atualmente, o universo
conhecido.
O experimento,
chamado Double-Chooz, ainda está sendo conduzido, na França, por uma
colaboração internacional com participação brasileira. O físico italiano
radicado no Brasil Pietro Chimenti participou da colaboração com o projeto
“Análise bayesiana de θ13 no experimento Double-Chooz”, apoiado pela FAPESP.
“Foram
investidos por volta de 40 milhões de euros no Double-Chooz. Quem gasta um
valor desses para obter uma medida quer ter certeza de que essa medida seja
muito bem realizada. Para isso, é necessário fazer e refazer os cálculos,
empregando métodos diferentes, com o objetivo de descartar qualquer possível
fonte de erro. Minha análise, utilizando o método bayesiano, confirmou os dados
que haviam sido obtidos com técnicas mais convencionais. E isso foi muito bom”,
disse Chimenti à Agência FAPESP. O pesquisador, que atuou na
Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Paulo, é, atualmente,
professor-adjunto na Universidade Estadual de Londrina (UEL), no Paraná.
Existem três
tipos ou “sabores” (“flavors”) de neutrinos: o neutrino do elétron, o
neutrino do múon e o neutrino do tau. A “oscilação dos neutrinos” é o nome
genérico que se dá para a transformação de um tipo em outro. “Trata-se de um
fenômeno probabilístico, que ocorre durante a propagação dos neutrinos pelo
espaço”, informou Chimenti.
O experimento
Double-Chooz consiste na medição do fluxo de neutrinos produzido, em uma
determinada direção e sentido, pela central nuclear de Chooz, localizada no departamento
de Ardennes, próximo à fronteira da França com a Bélgica. O fluxo é medido por
meio de dois detectores idênticos, situados respectivamente a 400 metros e a
1.050 metros do reator. A diferença na quantidade detectada permite calcular a
transformação de um tipo de neutrino em outro e o ângulo de mistura entre os
tipos.
A medição
precisa desse ângulo de mistura, identificado pela sigla θ13 (lê-se “teta um
três”), foi o objetivo principal do experimento Double-Chooz – não apenas pelo
que podia informar acerca da natureza intrínseca dos neutrinos como,
principalmente, por sua conexão com a violação da simetria de carga-paridade
nos léptons, que produziu o excedente de matéria que constituiu o universo.
“Se θ13 fosse
nulo, não seria possível medir, nas oscilações, a assimetria de carga-paridade.
Porém, Double-Chooz forneceu um valor diferente de zero. E isso possibilita que
experimentos futuros obtenham medidas da violação de simetria. Esses
experimentos de nova geração são necessários porque, mesmo com θ13 diferente de
zero, a assimetria pode ser nula”, argumentou Chimenti. Sua confirmação das
medidas convencionais pelo método bayesiano foi muito bem recebida pelos pares.
“A análise
bayesiana é um método estatístico que foi pouco usado na física de altas
energias porque necessita de uma capacidade de cálculo que, até 20 anos atrás,
não era comum. Agora, computadores muito poderosos, operando a baixo custo,
possibilitaram que essa técnica viesse a ser utilizada mais frequentemente. Os
resultados que alcancei são perfeitamente compatíveis com aqueles que a
colaboração já havia obtido por meio de outras técnicas. Para usar uma
analogia, nós dissemos a mesma coisa usando palavras diferentes”, explicou o
pesquisador.
Quando fala em
“experimentos de nova geração”, Chimenti refere-se especificamente ao
megaprojeto internacional Dune (Deep Underground Neutrino Experiment), cuja primeira
fase de operação deverá ter início em 2018, e a segunda, em 2021. O aparato
experimental do Dune consistirá, principalmente, em dois detectores instalados
no percurso do mais intenso feixe de neutrinos produzido na Terra. O primeiro
detector registrará o fluxo próximo de sua fonte, no Fermilab (Fermi National
Accelerator Laboratory), em Illinois, Estados Unidos. O segundo detector, de
porte muito maior, fará a detecção a 1300 quilômetros da fonte e a mais de um
quilômetro abaixo do solo, no Sanford Underground Research Laboratory, em South
Dakota, EUA.
O Brasil está
participando do Dune, com pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas,
Universidade Federal do ABC, Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas,
Universidade Federal de Goiás, Universidade Federal de Alfenas em Poços de
Caldas e Universidade Estadual de Feira de Santana. E a participação já conta
com auxílio da FAPESP por meio do projeto temático “Desafios para o Século XXI em Física e Astrofísica de
Neutrinos”, coordenado por Orlando Luís Goulart Peres, e do apoio a
jovens pesquisadores para o “Programa de argônio líquido na Unicamp”, conduzido
por Ettore Segreto.
Propriedades Singulares
Os neutrinos
são, depois dos fótons, a segunda partícula mais abundante do universo. E, pelo
fato de não serem suscetíveis à interação eletromagnética nem à interação
nuclear forte, são capazes de atravessar a matéria comum, mesmo os corpos
compactos, sem que seu movimento seja barrado ou desviado. Essas propriedades
singulares lhes conferem um papel único na física. Até o final da década de
1990, acreditava-se que não tivessem massa. Porém, experimentos realizados nos
laboratórios Super-Kamiokande, no Japão, e Sudbury Neutrino Observatory (SNO),
no Canadá, mostraram que, embora muito pequena, a massa do neutrino não é nula.
Essa descoberta motivou a outorga do Prêmio Nobel de Física de 2015 ao japonês
Takaaki Kajita e ao canadense Arthur McDonald (Leia mais sobre o assunto em agencia.fapesp.br/22019/).
No chamado
Modelo Padrão da Física de Partículas, o neutrino faz parte da família dos
léptons. Para cada lépton eletricamente carregado (o elétron, o múon e o tau),
existe um tipo de neutrino correspondente. O que os experimentos do
Super-Kamiokande e do SNO fizeram foi comprovar que um tipo de neutrino se
transforma em outro. Essa transformação só é possível pelo fato de o neutrino
ter massa.
A demonstração
da massa da partícula e a outorga do Nobel a Kajita e McDonald transformaram o
estudo dos neutrinos em um dos campos mais promissores da física atual.
Nosso planeta é atravessado regularmente por trilhões de neutrinos: neutrinos que foram produzidos nos primeiros tempos do universo; neutrinos provenientes de fontes extragalácticas; neutrinos gerados no interior das estrelas da Via Láctea; neutrinos originados no Sol; neutrinos resultantes do choque de raios cósmicos com a atmosfera terrestre. Além destes, existem também os neutrinos produzidos na própria superfície da Terra pelo processo nuclear conhecido como decaimento beta, muito frequente nas usinas nucleares. São estes que foram e ainda estão sendo medidos pelo experimento Double-Chooz.
Nosso planeta é atravessado regularmente por trilhões de neutrinos: neutrinos que foram produzidos nos primeiros tempos do universo; neutrinos provenientes de fontes extragalácticas; neutrinos gerados no interior das estrelas da Via Láctea; neutrinos originados no Sol; neutrinos resultantes do choque de raios cósmicos com a atmosfera terrestre. Além destes, existem também os neutrinos produzidos na própria superfície da Terra pelo processo nuclear conhecido como decaimento beta, muito frequente nas usinas nucleares. São estes que foram e ainda estão sendo medidos pelo experimento Double-Chooz.
O decaimento
beta é o processo por meio do qual um núcleo instável se transforma em outro ao
emitir uma partícula beta (um elétron ou um pósitron). No decaimento beta
menos, um nêutron se transforma em um próton, ao emitir um elétron e um
antineutrino. No decaimento beta mais, um próton se transforma em um nêutron,
ao emitir um pósitron e um neutrino do elétron. Além desses dois tipos de
decaimento, a transformação pode ocorrer também por meio da captura eletrônica.
Nesta, um próton se transforma em um nêutron, ao capturar um elétron e um
neutrino do elétron.
“Devido à
grande potência da central, o fenômeno é bastante expressivo em Chooz. E o
experimento Double-Chooz foi montado para medir a transformação de neutrinos do
elétron em outros neutrinos ao se afastarem da fonte que os gerou. O
experimento deverá se prolongar por ainda mais um ano. Mas já proporcionou
medidas muito importantes do ângulo de mistura θ13. E isso suscita muita
expectativa em relação ao estudo da assimetria entre matéria e antimatéria. A
violação da simetria de carga-paridade explicaria por que observamos matéria e
não antimatéria no universo”, finalizou Chimenti.
Fonte: Site da Agência FAPESP
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