Trump Entre a Paz e a Guerra, Inclusive no Espaço
Olá leitor!
Segue abaixo mais um interessante
artigo de Direito Espacial escrito pelo Sr.
José Monserrat Filho e postado
pelo companheiro André Mileski ontem (20/11) em seu no Blog Panorama Espacial.
Duda Falcão
Trump Entre a Paz e a Guerra,
Inclusive no Espaço
“O mundo está doente. E não pode ser curado com as
novas guerras dos EUA.
Os caminhos da paz – adotados não como um objetivo distante, mas como
uma necessidade prática no presente – são a única cura.” Jonatham Schell,
O Inconcluso Século XX – A Crise das Armas de Destruição em
Massa, Reino Unido: Verso, 2001, P. 105.(1)
Os caminhos da paz – adotados não como um objetivo distante, mas como
uma necessidade prática no presente – são a única cura.” Jonatham Schell,
O Inconcluso Século XX – A Crise das Armas de Destruição em
Massa, Reino Unido: Verso, 2001, P. 105.(1)
José Monserrat Filho *
O Presidente eleito dos Estados Unidos falou bem
pouco, quase nada, sobre espaço e América Latina, em sua campanha
eleitoral. (2) Outros temas relevantes tampouco lhe mereceram qualquer atenção.
Trump não apresentou um programa de propostas e ações. Preferiu dar shows de
acusações e ataques gratuitos, vulgaridades e frases de efeito para se tornar
popular o mais rapidamente possível, a qualquer preço. Só faltou repetir o que
já foi dito aqui no Brasil nos tristes idos de 1969: Às favas os escrúpulos. E
também as ideias.
Vilipendiando o México e ignorando a América Latina,
Trump, mesmo se fosse sem o querer, criou uma saia justa para a Presidente do
Conselho das Américas (EUA), Susan Segal. Falando a O Globo, a Sra. Segal
tentou pôr “panos quentes” nos destemperos de Trump e acabou provocando outro
mal estar, ao dizer que “a América Latina será importante (para o novo Presidente)
à medida que prepare sua equipe e se cerque de especialistas”. (3) Ou seja, a
América Latina precisa se qualificar para ser bem recebida na Casa Branca.
Antes disso, nem pensar.
Quanto ao espaço, Trump nomeou, há cerca de três
semanas, Robert Walker, ex-congressista, como seu conselheiro para questões
do espaço, e pediu que elaborasse um esboço de política espacial. Walker
confessou que só há bem pouco tempo a campanha descobriu que precisava de uma
política espacial. Apesar do tempo exíguo, anunciou já ter cumprido a tarefa. E
elogiou o próprio plano, capaz de "real mudança" no espaço,
atribuindo-lhe nada menos de quatro adjetivos: “visionário, perturbador,
coordenador e invulnerável (resiliente)". (4)
Walker listou ainda os nove aspectos principais de seu
plano:
1. “Compromisso com a liderança espacial global",
produzindo "tecnologia, segurança e empregos", elementos
indispensáveis aos EUA no século XXI (aos EUA e ao mundo inteiro);
2. Reativação do Conselho Nacional do Espaço, liderado
pelo vice-presidente, para supervisionar todos os esforços do governo na área
espacial, buscando eficiência e eliminando redundâncias. A última vez que o
Conselho se reuniu foi durante o Governo George Bush.
3. “Exploração humana do sistema solar até o final do
século", como “meta ampliada” para impulsionar avanços tecnológicos
visando objetivos maiores do que só levar astronautas a Marte.
4. Aumento do orçamento da NASA, para cobrir voos ao
“espaço profundo", não se limitando, como hoje, às ciências da Terra e às
pesquisas climáticas. Certas missões da NASA nessas áreas seriam repassadas à
National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA). Ocorre que Trump jamais
disse uma palavra sobre o polêmico tema do financiamento da NASA.
5. Desenvolvimento tecnológico de pequenos satélites
que podem proporcionar poder de resistência aos militares, e também desenvolver
tecnologias para serviços via satélite.
6. Buscar a liderança mundial em tecnologia de
hypersonics, inclusive para usos militares.
7. Entregar ao setor comercial o acesso e as operações em
órbitas baixas da Terra;
8. Iniciar debate sobre a inclusão de mais
"parceiros privados e públicos" nas operações e financiamentos da
Estação Espacial Internacional, inclusive prolongando sua vida útil. A decisão de
operá-la só até 2024 poderá ser mudada. Mas ainda não se resolveu até quando
ela poderá durar.
Fica, então, combinado: os negócios mais lucrativos vão
para as empresas privadas ou, na melhor das hipóteses, para as parcerias
público-privadas; e os grandes investimentos, pelo menos no início, correrão
por conta dos recursos públicos. Correr riscos não é próprio das empresas
privadas.
Por outro lado, para Walker, não se exclui a
possibilidade de a China ser convidada para membro da estação. Isso jamais
foi cogitado antes. Seria uma inequívoca demonstração de convivência pacífica
entre EUA e China. A China já lançou em 2011 sua própria estação Tiangong-1,
que deve cair na Terra em 2017. A estação Tiangong-2 subiu em 15 de setembro
último e, em menos de um mês, já recebia dois Taikonautas chineses, que para lá
voaram a bordo da espaçonave Shenzhou-11. Beijing já anunciou que a Tiangong-2
estárá aberta à cooperação com qualquer país do mundo – uma indireta ao
procedimento seletivo dos EUA.
9. Todas as agências federais dos EUA deveriam elaborar
planos sobre como usufruir dos "bens e desenvolvimentos espaciais"
para a realização de suas funções específicas.
Mas sobre como o novo governo vai financiar a NASA, o
plano de Walker silencia.
Contudo, ele reconhece: "Não é provável que
alcancemos grandes novas cifras para o programa espacial no futuro, mesmo se
conseguirmos o orçamento já fixado", disse Walker. E fez um apelo para que
se "empacotem os recursos de toda a comunidade espacial", a fim de
executar essas políticas. Não esclareceu, no entanto, como isso poderia ser
feito.
Ele propôs a Trump que atribuísse uma função mais
relevante à Lua nos planos da NASA. Atualmente, porém, o retorno de astronautas
à superfície lunar não consta do programa de atividades da agência espacial dos
EUA. Lá, hoje, só se pensa em Marte.
Apesar disso, Walker defende a Lua como escala básica
para a exploração do espaço profundo. “Quando participei da Comissão
Aldridge, fiquei convencido de que era essencial ter a Lua como parte de nossas
missões a Marte e além", disse ele. A comissão foi criada em 2004 para
estudar a implementação do programa Visão do Presidente George W. Bush para a
Exploração Espacial. "Não posso falar em nome da campanha ou da equipe da
transição, mas, pessoalmente, penso que ir à lua é vital para o programa de
presença prolongada no espaço." Mas, convenhamos, ir a Marte dá muito mais
Ibope, é mais espetacular e emocionante...
Trump priorizará a Defesa com especial impulso às
ações militares no espaço, basta para isso que o Congresso o apoie,
escreveu, em 11 de novembro, outro articulista do SpaceNews, Phillip Swarts. O
jornalista foi taxativo: “A Defesa dos EUA vê na inesperada vitória de Trump a
chance de ganhos sólidos. Wall Street presume que o presidente eleito cumprirá
sua promessa de campanha de aumentar o orçamento da Defesa”. (5) Parte do
aumento irá para programas espaciais militares, afirma Swards, baseado na
opinião de “analistas”. Trump estaria muito preocupado com os planos espaciais
militares da China e da Rússia. Walker e Peter Navarro, professor da
Universidade da Califórnia-Irvine, são citados por Swarts como tendo dito
que Trump prometeu aumentar os gastos com projetos militares no espaço, a fim
de “reduzir nossas vulnerabilidades atuais e garantir que nossos comandos
militares tenham as ferramentas espaciais de que precisam”.
Para Trump, cortar os recursos militares estimula os
adversários dos EUA a mais agressões. Em setembro passado, discursando na
Filadélfia, o agora Presidente eleito acusou o Presidente Obama de
"supervisionar cortes profundos em nossas Forças Armadas, que serviram
apenas para convidar a mais agressão" dos “adversários” dos EUA. Mas não
se diz que agressões são essas. A julgar por tudo o que Trump e seus partidários
mais próximos pregaram durante a campanha sobre esse assunto, não parece haver
dúvidas de que a nova administração americana apostará todas as fichas
possíveis na missão de tornar as Forças Armadas dos EUA ainda mais poderosas do
que já são há muito tempo – com ênfase especial no poderio espacial. Isso
seguramente incrementará a corrida armamentista nesta II Guerra Fria, ora
avançando no espaço.
Trump poderá alegar que, com tal propósito, os EUA
garantem sua liderança espacial global, que já detêm desde a missão Apollo,
graças à qual astronautas americanos foram os primeiros a pisar na Lua –
projeto carríssimo, cujos objetivos científicos – tão alardeados na época –,
hoje parecem pouco convincentes, para não dizer obscuros. (6) Hoje, porém, os EUA
já não estão em condições de garantir a atual meta ampliada de “exploração
humana do sistema solar até o fim do século", para impulsionar
desenvolvimentos tecnológicos com objetivos ainda maiores do que simplesmente
levar astronautas a Marte. Quem colocaria a mão no fogo assegurando que os EUA
podem dispor hoje da fortuna quase ilimitada gasta nos anos 60 com o projeto
Apollo (1961-1972) e a Guerra do Vietnã (1965-1973), ao mesmo tempo? A era da
fartura acabou. Impossível voltar atrás.
Não, definitivamente não serão ações bélicas que
poderão garantir a liderança espacial dos EUA no mundo atual. Disso já se
pode ter alto grau de certeza. Se Trump e sua equipe, de fato, pensarem e
agirem assim, estarão tragicamente equivocados. E se insistirem nesse erro crasso,
o máximo que conseguirão é entrar para a história como os principais
responsáveis por um desastre de proporções e consequências inestimáveis para
muitas gerações à frente e todo o nosso planeta – paradoxalmente, o único
conhecido até agora como dotado de vida inteligente.
Mas Trump também questionou durante a campanha o papel
dos EUA como “polícia do mundo”. Se isso for verdade, temos aí um sinal
imperdível de sensatez, que urge aproveitar ao máximo para evitar o pior. Tanto
a Rússia quanto a China fizeram questão de dizer a Trump, em mensagens
urgentes, que desejam manter com o novo governo americano relações bilaterais
sadias e de crescimento estável, em benefício de seus povos e do mundo inteiro.
O Presidente russo, Vladimir Putin, felicitou Trump pela
eleição e se disse decidido a tirar as relações Rússia-EUA do estado crítico em
que se encontram. O Presidente chinês, Xi Jinping, escreveu a Trump: “Dou
grande importância às relações sino-americanas e estou ansioso para trabalhar
com você, sem conflito e sem confrontação, com base baseado nos princípios do
respeito mútuo e da cooperação”.
Trump não rasga dinheiro. Logo, não perdeu sua
sanidade mental. E, como Presidente dos EUA a partir de janeiro próximo,
terá de optar entre duas alternativas: a que leva ao fortalecimento da paz
global e a que nos condena ao abismo da guerra de extermínio. De sua escolha
dependemos, em larga escala, todos nós, os mais de 7,2 bilhões de habitantes da
Terra, e a própria Terra. Não votamos em Trump, mas é ele quem vai decidir por
nós se, no fim dos quatro anos de seu mandato, estaremos ainda vivos ou todos
mortos.
* Vice-Presidente da Associação Brasileira de Direito
Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor Honorário do Instituto Internacional de
Direito Espacial, Membro Pleno da Academia Internacional de Astronáutica (IAA)
e ex-Chefe da Assessoria Internacional do Ministério de Ciência, Tecnologia e
Inovação (MCTI) e da Agência Espacial Brasileira (AEB). E-mail: jose.monserrat.filho@gmail.com.
Referências
1) Jonathan Schell (1943-2014), professor da Escola de
Direito das Universidade de Yale, EUA. Autor de inúmeros livros sobre o perigo
da guerra nuclear, publicados em vários idiomas.
2)
What a Trump administration means for space, by Jeff Foust, SpaceNews, November
9, 2016. Ver em http://spacenews.com/what-a-trump-administration-means-for-space/.
3) O
Globo, Economia, 14/11/2016, p. 18.
4)
Ver também em .
6)
DeGroot, Gerard, Dark Side of the Moon – The Magnificent Madness of the
American Lunar Quest,Great Britain, Vintage Books, 2008. Já no prefácio
o autor afirma: “A missão da Lua foi vendida como uma corrida que os EUA não
poderam se dar ao luxo de perder – uma luta pela sobrevivência. Argumentou-se
que desembarcar na Lua traria enorme benefício para toda a humanidade. Seria
bom para a economia, para a política e para a alma. Alguns chegaram a sustentar
que a missão acabaria até mesmo com as guerras.”
Fonte: Blog Panorama Espacial - http://panoramaespacial.blogspot.com.br/
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