Sinais de Guerra Fria no Ar
Olá leitor!
Segue abaixo mais um artigo do Sr. José Monserrat Filho
postada hoje (14/10) no site da Agência Espacial Brasileira (AEB) dando
destaque ao impedimento da participação da China na Conferência Científica Kepler,
que será realizada no Centro de Pesquisa Ames da NASA.
Duda Falcão
Sinais de Guerra Fria no Ar
José Monserrat Filho*
A 2ª Conferência Científica de Kepler será realizada no
Centro de Pesquisa Ames da NASA, na Califórnia, EUA, de 4 a 8 de novembro
próximo.
Vai discutir temas atuais da astronomia: estatísticas dos
exoplanetas; planetas análogos à Terra, planetas ligados a sistemas estelares
múltiplos; zonas habitáveis; caracterização de trânsitos planetários; atividade
estelar, rotação, idades e metalicidade; estrelas binárias eclipsantes e binárias
em interação; futuros telescópios e instrumentação para pesquisas de
exoplanetas; sismologia estelar; astrofísica galáctica e extra galáctica. Para
saber mais, visite o site <http://nexsci.caltech.edu/conferences/KeplerII/>.
O Centro Ames, sediado na Califórnia, foi fundado em 1939
como centro de pesquisas aeronáuticas, certamente devido à importância que a
aviação começava a ter na época e à II Guerra Mundial que logo eclodiria. Após
a criação da NASA em 1958, passou a pesquisar novas tecnologias destinadas a
viabilizar suas missões. Essas tecnologias incluiam biologia espacial,
nanotecnologia, biotecnologia, sistemas de proteção a calor para naves
espaciais, tecnologia da informação e astrobiologia – áreas essenciais à
corrida espacial que se iniciava.
De lá para cá, a astronomia, com base na cooperação e no
trabalho conjunto de equipes internacionais, deu um salto sem precedentes.
Hoje, astrônomos de inúmeros países exploram juntos o espaço profundo, com
descobertas cada vez mais fantásticas. As Conferências Kepler se inserem nesse
novo tempo de conquistas e avanços impressionantes.
Isso significa que todos os astrônomos do mundo têm
acesso à 2ª Conferência Kepler, certo? Lamentavelmente, não. Os chineses não
poderão participar do evento.
Segundo a France Press, a decisão teria sido tomada com
base na lei federal dos EUA, sancionada em 2011, que não permite o emprego de
recursos financeiros da NASA em ações bilaterais com a China ou empresas
chinesas, ou para receber visitantes chineses em instalações pertencentes ou
utilizadas pela NASA.
Na Câmara de Representantes, o congressista Frank Wolf,
presidente do Subcomitê do Comércio, Justiça, Ciência e suas agências, tentou
melhorar a situação. Explicou que a restrição criada pela lei de 2011 é
bilateral e não multilateral. Ou seja, não veda a participação individual de
cidadãos chineses, a menos que representem o seu governo – o que não é o caso.
Ocorre que o administrador da NASA, Charles Bolden,
declarou ao depor na mencionada subcomissão, em 20 de março passado, que adotou
uma moratória no financiamento a qualquer acesso a instalações da NASA de
indivíduos de um grupo especial de países, nomeadamente China, Birmânia,
Eritreia, Irã, Coreia do Norte, Arábia Saudita, Sudão e Usbequistão. A China
foi igualada à Coreia do Norte, à Eritreia e ao Sudão. Por que um gesto tão
exagerado e inamistoso?
Mas a porta-voz da Chancelaria chinesa não emitiu nenhum
protesto.
Apenas definiu o veto aos chineses como “ação
discriminatória” que “tem encontrado oposição nos EUA”. E acrescentou,
diplomaticamente: “Pensamos que eventos acadêmicos não deveriam ser politizados”.
Nos EUA, de fato, houve reações duras. Alan Boss, do
Instituto Carnegie para a Ciência, com sede em Washington, e co-presidente da
2ª Conferência Kepler, afirmou em nota: “Nós consideramos deploráveis as
consequências dessa lei e nos opomos fortemente à proibição contra nossos
colegas chineses, ou de qualquer outro país. Estamos buscando outras opções,
que permitam a participação de todos os cientistas interessados, pessoal ou
remotamente.”
A revista inglesa “The Economist”, de 12 de outubro,
relata:
“Indignados, muitos astrônomos americanos proeminentes –
inclusive Geoff Marcy, da Universidade da Califórnia, Berkeley, EUA, um dos
pioneiros da pesquisa sobre exoplanetas, e Debra Fisher, da Universidade de
Yale, EUA, que ajudou a descobrir o primeiro sistema com mais de um planeta,
fora do sistema solar – anunciaram que vão boicotar a conferência, em sinal de
protesto”.
“The Economist” disse ainda que, se o veto aos chineses
se deve ao medo de espionagem, “é difícil imaginar quais segredos os supostos
espiões seriam capazes de roubar em uma conferência dedicada a planetas
alienígenas. Serão discutidos dados coletados pelo telescópio espacial Kepler,
da NASA, já disponíveis gratuitamente para quem quiser, chinês ou seja lá quem
for”.
Como resolver, com tranquilidade, essa crise difícil de
explicar?
Chris Lintott, astrônomo da Universidade de Oxford, EUA,
sugere transferir a conferência para um local neutro, fora da NASA. Mas,
faltando tão pouco tempo para o evento, a mudança parece inviável.
Pena, pois, como prevê “The Economist”, “se os chineses
estiverem ausentes e se, de fato, alguns dos luminares da área ficarem de fora,
o clima será pesado”. Tipo clima de guerra fria.
Numa época de tantos e tão graves desafios globais,
inclusive para assegurar a sustentabilidade a longo prazo das atividades
espaciais indispensáveis à evolução humana, essa atmosfera não pode, em sã
consciência, interessar nem a americanos, nem a chineses, cujas
responsabilidades, hoje, vão além das de muitos outros povos.
Aliás, ela não pode interessar a ninguém.
* Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da
Agência Espacial Brasileira (AEB), Vice-Presidente da Associação Brasileira de
Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor Honorário do Instituto
Internacional de Direito Espacial e Membro pleno da Academia Internacional de
Aeronáutica.
Fonte: Agência Espacial Brasileira
(AEB)
Os chineses sao espioes, os brasileiros os ingenuos !
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