Para Que Serve a Força Espacial dos EUA?
Olá leitor!
Segue abaixo um interessante artigo da área de Direito
Espacial escrito pelo Dr. José Monserrat Filho e postado que foi dia (26/09) no site
do “Jornal da Ciência” da SBPC.
Duda Falcão
JC Notícias
Para Que Serve a Força Espacial dos EUA?
‘Facões de dois dólares matam um milhão de pessoas, enquanto
sistemas de vigilância
por satélites, de bilhões de dólares, apenas assistem à
matança lá de cima.’
Joshua Cooper Ramo (1)
Por José Monserrat Filho*
Jornal da Ciência
Edição: 5995 de 26 de setembro de 2018
A primeira resposta também pode ser uma boa pergunta:
Serve para a paz ou para a guerra? O presidente Donald Trump, ao ordenar, neste
ano, a criação da Força Espacial, já adiantou que ela será o 6º ramo das Forças
Armadas. Assim, a Força Espacial não viria só inaugurar novo setor nas Forças
Armadas do país, mas também, e, sobretudo, reforçá-las na área espacial, já
considerada, há cerca de 30 anos, a mais moderna e estratégica do ponto de
vista militar.
O crescimento dos gastos militares globais de hoje não
tem similar na história. Esses gastos nos últimos cinco anos atingiram a cifra
de 1,67 trilhões dólares, segundo a revista inglesa especializada Jane.
Só o gasto militar americano saltou de 636 bilhões para 696 bilhões de dólares,
de 2017 para 2018. São 60 bilhões de dólares a mais, de um ano para o outro. Os
EUA acusam a Rússia e a China de pretenderem suplantar a liderança espacial
americana. Isso é inadmissível para Washington. Pode um país ambicionar ser
proprietário exclusivo da liderança espacial mundial?
Curioso: China e Rússia têm orçamentos militares bem
menores do que o dos EUA. Em 2018, a China deve gastar 173,47 bilhões de
dólares, com o aumento de 8,25% em relação a 2017. Os gastos militares russos
são ainda menores, se comparados com os dos EUA: 66,3 bilhões de dólares. São
dados do prestigioso Instituto Internacional de Investigação sobre a Paz
(SIPRI), da Suécia.
Sucede que a Força Espacial ainda nem foi criada e já
entrou em conflito com a Força Aérea dos EUA. Motivo da briga? Dinheiro, claro.
Se aprovada pelo Congresso Nacional, a Força Espacial terá 13 mil funcionários
e custará nada menos que US$ 13 bilhões só nos primeiros cinco anos. Dividindo
US$ 13 bilhões por 13 mil funcionários, dá um gasto de US$ 1 bilhão por mil
funcionários. Cada funcionário, portanto, representará a despesa de US$ 1
milhão. Um dinheirão.
A Secretária da Força Aérea, Heather Wilson, registrou
num memorando de 14/09/2018 que a competição estratégica com Rússia e China é a
‘prioridade máxima’ dos militares [e] ‘em nenhum lugar isso é mais evidente do
que no espaço.’ O Presidente Trump tem dito e repetido que o Espaço Exterior é
teatro de guerra, tanto quanto a Terra, o Mar e o Espaço Aéreo. Nenhum outro
líder mundial disse isso antes.
Heather Wilson reconheceu ter pressa ante o que chama de
‘as tentativas dos concorrentes de erodir’ as vantagens militares dos EUA no
espaço. De certo, por isso, a inauguração da sede da Força Espacial está
prevista já para 2020, e a transferência de todos os programas para a nova
instituição, por meio de propostas de lei e financiamento do Congresso, logo
para o ano seguinte, em 2021. Ela aproveitou certas ideias do Subsecretário de
Defesa Patrick Shanahan para o projeto inicial da Força Espacial, como criar
uma Agência de Desenvolvimento Espacial para supervisionar a
compra de satélites e elevar o Escritório de Defesa a um nível ainda mais alto.
Tudo pela Força.
O que seria erodir as vantagens militares dos EUA no
espaço? Uma grande potência precisa necessariamente manter suas vantagens
militares no espaço? Para assegurar a vitória da paz ou da guerra? A Secretária
da Força Aérea assegura que ‘criar um Secretário Assistente de Defesa para o
Espaço ou nova burocracia de defesa, ou ainda levar adiante programas espaciais
temporários, não estão entre as intenções do Presidente’. Trump não quer mais
que tranquilizar os demais países…
Fala-se que o Departamento de Defesa dos EUA (Pentágono) incluirá
a lei que cria a Força Espacial, requerida por Trump, na proposta de orçamento
para o ano fiscal de 2020. Se a meta é manter o predomínio americano no espaço,
por que não dispor da Força Espacial o quanto antes? O vice-presidente Mike
Pence está na batalha pela rápida implementação da nova Força. Acaso há
resistências ao projeto?
Esse pode ser o X do problema. No mesmo
memorando de 14/09/2018, a Secretária da Força Aérea dos EUA rejeitou várias
propostas para a Força Espacial de Trump. Suas declarações foram feitas em
resposta a uma diretriz do vice-secretário de Defesa Patrick Shanahan,
formulada em 10 de setembro, que convocava o subsecretário de Defesa para
Pesquisa e Engenharia, Michael Griffin, a desenvolver uma ideia melhor para
criar a Força Espacial.
Heather Wilson, em texto de 16 páginas, criticou
duramente o plano de forças, programas e agências espaciais militares para
fundar a nova Força Espacial, a ser apresentada ao Congresso. ‘Não há
necessidade de estabelecer um Subsecretário de Defesa para o Espaço, nem há
nenhum benefício em criar uma agência de aditivos e programas como organização
temporária’, argumentou ela antes de apresentar sua própria proposta de criação
de um Departamento Espacial dentro de um escritório da Força Aérea já existente.
A Secretária da Força Aérea comentou ainda que sua
proposta ‘estabelece uma missão clara, diretamente relacionada ao problema
estratégico que estamos tentando resolver. Preserva laços estreitos com o
combatente, assegura autoridades fortes e evita atrasos desnecessários e
interrupções nos programas em andamento’. Em vez de criar uma agência
inteiramente nova, Heather Wilson sugere que o já criado Escritório de
Capacitação Rápida Espacial da Força Aérea (AFSRC) seja o único a
fazer a transição para a Agência de Desenvolvimento Espacial, empresa de compra
de satélites impulsionada por Shanahan. ‘Este escritório já existe e tem
pessoal e conhecimento para desenvolver e pôr em ação as capacidades de combate
necessárias ao Comando Espacial dos EUA’, sustentou ela. E mais: ‘a Força
Espacial não pode ser completamente solitária; deve ser capaz de desenvolver
laços profundos com a comunidade de inteligência e levar o chefe do Escritório
Nacional de Reconhecimento a ocupar também o primeiro lugar no AFSRC’.
Heather Wilson acrescenta: ‘Essa proposta deve conter
todos os elementos necessários para que as atividades espaciais sejam bem
sucedidas num único departamento’. ‘Deve manter uma conexão próxima entre a
aquisição e o combatente e deve aprofundar a conexão já próxima entre o espaço
militar e os elementos espaciais da comunidade de inteligência.’ Mas ela
concorda que a nova força exigiria 13 mil novos servidores. Com a proposta de
orçamento para o ano fiscal 2020 do Pentágono esperada para incluir planos para
a Força Espacial, a Secretária indica no memorando que o projeto da Força
Espacial poderia entrar em serviço no ano fiscal de 2021, assim que seja dada a
luz verde.
Em vez de criar uma agência totalmente nova, Heather
Wilson sugere que o já estabelecido Escritório de Capacitação Rápida
Espacial da Força Aérea (AFSRC) seja o único a fazer a transição para
a Agência de Desenvolvimento Espacial, empresa de compra de
satélites impulsionada por Shanahan. Para ela, ‘este escritório já existe e tem
pessoal e conhecimento para desenvolver e pôr em campo as capacidades de
combate necessárias ao Comando Espacial dos EUA’. E a Força também não pode ser
completamente solitária; deve ser capaz de desenvolver laços mais profundos com
a comunidade de inteligência, nota Heather Wilson, pedindo que o chefe do
Escritório Nacional de Reconhecimento também ocupe o mesmo posto no AFSRC.
Em nenhum momento, a Secretária fala em paz. Ela se
mantém na senda da guerra. Quer apenas que a Força Aérea continue no comando do
negócio.
Referência
(1) Ramo, Joshua Cooper, A Era do Inconcebível –
Por que a atual desordem no mundo não deixa de nos surpreender e o que podemos
fazer, São Paulo: Companhia Das Letras, 2009, p. 103.
*vice-presidente da Associação Brasileira de Direito
Aeronáutico e Espacial, escreve para o Jornal da Ciência
Fonte: Jornal da Ciência de 26/09/2018
Comentário: Pois é leitor, tá ai a visão do maior
especialista brasileiro em Direito Espacial sobre esta questão e gostaríamos de
agradecer a nossa leitora Mariana Amorim Fraga por ter nos enviado este artigo.
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