O “Estabaco” Olímpico de Dona Luiza e o Programa Espacial Brasileiro
Olá leitor!
Segue abaixo um interessante artigo publicado no site
revista “Época” dia (21/07) abordando o descaso para com o Programa Espacial
Brasileiro e o lançamento de um Livro sobre este tema.
Duda Falcão
RICARDO NEVES
O “Estabaco” Olímpico de Dona Luiza
e o Programa Espacial
Brasileiro
Vamos descobrindo que as coisas podem dar mais errado do
que imaginávamos.
Será que precisamos de um tombo para acordar do pesadelo?
RICARDO NEVES
21/07/2016 - 18h32
Atualizado 22/07/2016 13h42
No dia 2 de outubro de 2009 nós, brasileiros, recebemos
eufóricos a notícia da escolha do Rio de Janeiro para sediar os Jogos Olímpicos
de 2016. A festa da delegação brasileira presente à reunião do Comitê Olímpico
reunida em Copenhagen, transmitida ao vivo, logo se transformou em um carnaval
pelo país afora. Entre 2009 e 2010 aqui no Brasil vivíamos outra
realidade, diferente do resto do mundo, especialmente dos Estados Unidos e da
União Europeia – atônitos e tateando no escuro na busca de remédios para a
crise iniciada em meados de 2008 e que se configurou como a maior e mais
complexa das crises econômicas mundiais desde 1930.
Nossas cabeças de brasileiros estavam tranquilas e
serenas. Assegurados pelo presidente Lula, estribado em uma aprovação de
quase 80%, que lhe conferia uma enorme credibilidade, contemplávamos confiantes
o futuro, certos de que a crise por aqui não seria mais que uma “marolinha”.
Empreiteiros felizes com a caderneta lotada de encomendas
para Copa e Olimpíada pelos governos federal, estaduais e municipais: estádios
novinhos e um sem-número de obras, principalmente para mobilidade, em 12
cidades; banqueiros vivendo felizes o mundo do juro lá em cima e o crédito
fácil e subsidiado; pelo menos um quarto dos brasileiros recebendo algum um
tipo de bolsa ou subsídio público; o varejo bombando como “nunca na história
deste país” vendendo TVs de tela plana e smartphones aos milhões. Junte-se a
tudo aquele sentimento oficial e público de termos tirado o bilhete premiado
simbolizado pela descoberta de petróleo no pré-sal. O Brasil só podia ser
feliz. Tínhamos a melhor das perspectivas de aparecer bem na foto como
anfitriões dos mais inesquecíveis megaeventos planetários representados pela
Copa 2014 e pela Olimpíada 2016.
Não tinha chance de dar errado. Mas vamos descobrindo que
as coisas podem dar mais errado do que poderíamos imaginar. Agora, não
deixa de ser emblemático o “estabaco” que dona Luiza Trajano, a empresária
ícone do otimismo que vivemos até recentemente, sofreu ao se voluntariar para
carregar a tocha olímpica.
Nós, brasileiros, precisamos ir mais fundo em nossa
autoanálise e reconhecer como perdemos completamente os rumos como nação. Nossa
incapacidade completa de formular quaisquer ideias ou visões verdadeiramente
estratégicas. Incapacidade que segue nos aprisionando na maldição de ser para
sempre o “país do futuro”.
Fico perplexo ao perceber tantas chances que
desperdiçamos, tantas coisas que fomos capazes de jogar pela janela.
Deparei recentemente com um livro que realiza um histórico do Programa Espacial
Brasileiro. Trata-se de livro publicado por uma pesquisadora brasileira
estranhamente lançado por uma editora em Portugal. Compreensível? Talvez pelo
fato de em nosso país as editoras se interessarem mais pela demanda por livros
de colorir para adultos e de autoajuda escritos por padres pops.
Não sou daqueles que dizem tolamente que “o Brasil
precisa é de saneamento básico e não de foguetes”. Pelo contrário. Entendo que
um país que investe ampla e seriamente em ciência e desenvolvimento tecnológico
é uma nação capaz de reter um amplo leque de cérebros, criando reserva de
inteligência que pode ser mobilizada e dedicada a solucionar os mais variados
tipos de problemas.
Tecnologista sênior do Museu de Astronomia e Ciências
Afins, no Rio de Janeiro, Ana Lucia Villas-Boas, socióloga e ph.D. em ciências
sociais, pela agonizante Universidade Estadual do Rio de Janeiro – agonizante
porque o estado do Rio de Janeiro se encontra falido e a referida universidade
corre o risco de ser simplesmente extinta –, faz em seu livro, intitulado Programa
Espacial Brasileiro: militares, cientistas e a questão da soberania
nacional, mais propriamente uma autópsia do que uma análise atual do que é
nosso programa espacial.
(Foto: Divulgação)
Livro Programa Espacial Brasileiro
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Um país com nossas características geopolíticas não
poderia jamais abrir mão de ter uma política de Estado e de investir seriamente
em um programa aeroespacial. Longe de ser traduzido em “lançar foguetes”, um
programa aeroespacial é uma iniciativa transversal que acaba tendo aplicabilidade,
impacto e repercussão nos mais diversos segmentos da sociedade e do mercado,
não apenas na questão militar.
A análise de Villas-Boas, compreendendo desde os tempos
que se seguiram ao final da Segunda Guerra Mundial, demonstra que a nação
brasileira já teve líderes, tantos civis quanto militares, muito mais
qualificados do ponto de vista de formular visão estratégica.
O que restava do Programa Espacial Brasileiro até a
virada de século foi virtualmente liquidado após a tragédia da explosão da base
de Alcântara, em 22 de agosto de 2003, quando morreram 21 engenheiros e
técnicos. De lá para cá, tanto a administração de Lula quanto a de Dilma jamais
foram capazes de ter um mínimo de compreensão ou sensibilidade para o caráter
estratégico de um programa aeroespacial.
Os números falam por si. Hoje, em um país de dimensões
continentais e mais de 200 milhões de habitantes, restam pouco mais de 1.000
profissionais envolvidos com as atividades de nosso setor espacial. Para
ser mais exato, na verdade, em 2013 eram contabilizados 822 civis, 176
militares e 107 colaboradores externos. O que seguramente torna a comunidade
brasileira de profissionais do setor aeroespacial radicada no exterior maior do
que a que vive aqui.
Talvez o que nós, brasileiros, estejamos mesmo
necessitados é de um “estabaco” como o de dona Luiza para acordar de vez deste
sonho errado, deste torpor que virou pesadelo. Nosso futuro acabou. É tempo de uma
nova geração de líderes políticos, empresariais e cívicos.
Fonte: Site da Revista Época – 21/07/2016
Comentário: Pois é, quem sabe esse artigo ajuda na reflexão
daqueles que realmente se importam com os rumos de nossa Sociedade, mas ainda
estão dormindo em berço esplêndido.
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