Satélites: Maior Aproximação e Diálogo Entre MCTIC, AEB e CCISE
Olá leitor!
Segue abaixo uma interessante entrevista com o Brigadeiro
do Ar José Vagner Vital, presidente da “Comissão de Coordenação de Implantação
de Sistemas Espaciais (CCISE)” postada que foi dia (07/03) no site “TELETIME” tendo
como destaque a maior aproximação e diálogo entre o Ministério de Ciência,
Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), a Agencia Espacial Brasileira (AEB) e a CCISE.
Duda Falcão
ENTREVISTA
Satélites: Maior Aproximação e
Diálogo Entre MCTIC, AEB e
CCISE
Por Samuel Possebon
Quinta-feira, 07 de março de 2019 , 18h53
Parte significativa do programa espacial brasileiro
destinado a aplicações de Defesa é coordenada e acompanhada pela Comissão de
Coordenação de Implantação de Sistemas Espaciais (CCISE), sob a presidência do
Brigadeiro do Ar José Vagner Vital. Em 2019, com a maior presença militar no
governo, apareceram sinais de que a área espacial poderá ganhar novo impulso.
Ações mais concretas, que dependem de orçamento e de execução de projetos,
ainda estão distantes, mas algumas coisas mudaram. Uma delas é um maior diálogo
da CCISE a Agência Espacial Brasileira e o INPE (Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais), órgãos vinculados ao Ministério de Ciência, Tecnologia,
Inovações e Comunicações (MCTIC) e que coordenavam a política aeroespacial
civil e parte dos trabalhos de pesquisas. Nesta entrevista o Brigadeiro Vital
fala sobre os projetos de Defesa, sobre a perspectiva de uso do Centro de
Alcântara e das futuras aplicações.
TELETIME – O que mudou na CCISE e nos trabalhos
referentes ao programa espacial brasileiro ligados à Defesa a partir do atual
governo?
Brig. Vital – Para a área espacial, a mudança
de governo facilitou não pelo fato de ter um ministro de origem militar no
Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), mas um
astronauta (ministro Marcos Pontes), que é alguém que conhece o setor espacial.
Para nós isso é muito significativo porque facilita o entendimento dos
problemas e onde tem que ser colocada a prioridade.
Ele não teve passagem pela CCISE?
Foi outro caminho, a CCISE existe só desde 2012. Ele é
pioneiro na área. Mas o fato de o ministério ter esta prioridade para a área
espacial, que nunca foi prioridade como agora, é positivo. A parte científica é
muito ampla, e quando não se tem conhecimento é difícil dar prioridade, daí o
nosso atraso. Outra coisa muito importante é o fato de o presidente da AEB, o
engenheiro Carlos (Augusto Teixeira de) Moura (coronel reformado da
Aeronáutica) ter larga experiência de vida na área espacial, desde o início da
carreira, com especialização na área, o que facilita a conversa com o MCTIC e
conosco na CCISE, que somos focados na área espacial.
E por que é importante dar esta prioridade, considerando
as carências do País?
A área satelital pode reduzir o custo de muitas
atividades que são feitas em terra. Depois do acidente de Brumadinho, vimos que
o recurso satelital pode ser largamente utilizado nestas situações, tanto nas
comunicações e coordenação das equipes em campo, quanto imageamento, com
utilização de satélites por vários órgãos. O que queremos é ter isso, imagens e
sistemas satelitais nossos, que permitam fazer operações integradas e ações
mais rápidas e eficientes. Manejo de águas, planejamento urbano, controle de
queimadas, barragens. Isso ainda não existe no Brasil de maneira eficiente, mas
pode ser desenvolvido.
O Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE)
será revisto? Já se sabe o que será prioridade?
Ainda não discutimos especificamente o PESE. Mas uma
coisa positiva é que desde o ano passado estamos trabalhando com diversas áreas
do governo no Comitê para o Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro,
com vários ministérios reunidos em grupos temáticos e técnicos. O que estava
definido no planejamento está sendo mantido. O que estava no PESE continua como
está, mas agora aumentou muito a cooperação com a AEB e com o MCTIC, por conta
do alinhamento de visões. Estamos trabalhando para ampliar a sinergia dos
projetos existentes.Os projetos do INPE, por exemplo, estão sendo concatenados
com os projetos do PESE. Os projetos da AEB estão sendo concatenados com os
projetos do Centro de Lançamento de Alcântara. Tudo está sendo integrado para
termos um programa espacial brasileiro forte.
A divisão entre a área civil e militar continua? A
tendência é que se fortaleça agora mais o segmento espacial militar ou civil?
A tendência é que a área satelital seja fortalecida para
prestar serviços para a sociedade como um todo, independentemente de ser civil
ou militar. E além dos serviços, esperamos que isso puxe a nossa indústria e a
parte científica.
O Brasil terá uma indústria espacial que atenda toda a
demanda de serviços e aplicações?
Ela já é forte, mas está fora do mercado global. Se nós
aumentarmos a quantidade de serviços para a sociedade, a indústria estará
focada nestes serviços, que têm escala global. E ela irá se fortalecer e
participar do mercado global. Ser protagonista é um pouco mais distante, mas
pelo menos participar de maneira mais efetiva.
As mudanças no controle da Embraer comprometem a parte
de desenvolvimento tecnológico na área de satélites de comunicação?
Nessa parte de desenvolvimento e integração de satélites
não muda nada porque a Visiona está na Embraer Defesa (que não foi adquirida
pela Boeing). Mas agora a coisa de ampliou, não é só uma empresa que fará esse
trabalho. Teremos condições de ter outros parceiros interessados, como as
federações de indústria, o laboratório do Senai de Santa Catarina, num projeto
que a Visiona está envolvida, o trabalho da UniAmérica de Foz do Iguaçu, e
mesmo Alcântara, que virará um polo de tecnologia assim que a base entrar no
mapa global de sítios de lançamento. Existem visões alinhadas, todo mundo
entende as prioridades, e isso facilita muito a integração.
Qual a prioridade número um na área espacial hoje para
o Brasil?
Temos duas prioridades número um. Alcântara é uma delas,
pois está muito perto de ser viável comercialmente. Depende apenas do TSA
(Acordo de Salvaguardas Tecnológicas), que precisa ser assinado. Ela passará a
ser realmente comercial, pois até lá ninguém pode lançar satélites comerciais
que tenham tecnologia norte-americana, e praticamente todos os satélites têm alguma
tecnologia americana. A partir do momento em que o acordo for assinado, e isso
está muito perto, e for ao Congresso, italianos, franceses e os próprios
americanos poderão lançar seus satélites do Brasil, dos nossos lançadores ou
outros.
E que contrapartida que o Brasil tem que dar?
É apenas um acordo de salvaguarda. Para que o
norte-americano aceite colocar uma tecnologia sensível em outro país, ele
precisa de garantias de que essa tecnologia será protegida, não será usada de
maneira errada, enviada para países para os quais eles não exportam. É uma
salvaguarda para que eles possam trazer a tecnologia e em contrapartida eles
nos pagam pelos serviços de lançamento. Com isso a gente consegue ter um centro
sustentável, sem a necessidade de investimentos do governo.
Mas ainda assim seriam necessários investimentos em
Alcântara?
Não falta nada, é só uma questão de adaptar a base para
cada lançador e para o business plan de quem for utilizar. Na verdade, o que
precisamos é tornar possível comercialmente os lançamentos. A partir daí, a
empresa vai fazer o planejamento e os investimentos dela, negociando conosco o
que for necessário. Para operar em dois ou três anos, mas teria empresa que
poderiam operar imediatamente.
E existe demanda para Alcântara?
Existe interesse. Empresas de lançadores pequenos como a
Vector Space já demonstraram interesse firme assim que assinarmos o TSA. A
Virgin Orbit está avaliando e assim que fizerem o primeiro lançamento deles em
março, deve haver uma visita técnica a Alcântara para avaliar o potencial, pois
eles lançam a partir de uma pista e de um Boeing 747. Há interesse, inclusive
da Força Aérea dos EUA, que precisa de um sítio e tem considerado Alcântara. Se
bem que para eles não há tanto problema porque para lançamentos não comerciais
não precisa de salvaguardas. Mas nosso interesse não é só que eles venham, é
que qualquer civil possa lançar, dentro das regras acordadas.
E como operacionalizar essa exploração?
A gente pensa em ter uma operadora do espaçoporto, que
seria a Alada, uma empresa pública. É como se fosse uma Infraero do espaço. Até
o momento não houve interesses de empresas privadas em assumir o risco tão alto
de um negócio bilionário, com tantas dificuldades e incertezas. A Alada é um
modelo viável, como foi a Infraero no passado, de permitir que outras empresas
tenham facilidade de alugar o seu espaço e fazer o lançamento, com facilidade
de contato com o Centro de Lançamento de Alcântara, que é uma unidade militar e
faz os rastreios. Os serviços serão feitos por meio da estatal Alada, que será
uma empresa não dependente. Seria um grande facilitador para o diálogo entre os
clientes privados e a unidade militar, mas será uma empresa enxuta, pois já
temos o Centro de Lançamento, com 900 pessoas já trabalhando, uma infraestrutura
de rastreio muito avançada, pela qual a gente atende várias demandas. Essa
estrutura poderá prestar serviços para lançamentos civis.
Mas os militares precisam estar envolvidos nesse
projeto?
Entendemos que um centro de lançamento de foguetes não
pode estar na mão de civis. É um centro de interesse nacional. Mas podemos
manter a segurança, que é nossa responsabilidade, e a Alada facilitaria o
acesso civil, para que as empresas não precisem se preocupar de interfacear com
os militares. E a Alada ainda poderia sair para o mercado global buscando esses
clientes para lançamento. Quando isso começar, o turismo de lançamento vai se
desenvolver, a cadeia de suprimentos, escolas de tecnologia, toda a região vai
se beneficiar, e São Luís está muito próxima…
Qual é o nicho de mercado para Alcântara? Em que tipo
de lançamentos vocês pensam em posicionar o centro?
Será possível lançar até um Falcon Heavy (maior foguete
da SpaceX) depois que estiverem consolidados os 12 mil hectares das comunidades
(existem comunidades quilombolas no perímetro necessário para a expansão da
base para lançamentos maiores). Estamos em fase de realocação das pessoas, o
que deve ser feito com cuidado e respeito, mas vai acontecer. Mas independente
disso, Alcântara tem um grande potencial para atender ao nicho de lançadores
pequenos, e pode ir a qualquer tamanho, pois tem uma posição melhor do que
Guiana, por exemplo. Mas vemos um mercado disponível para esses lançadores
pequenos e de pequena inclinação. Além disso, dentro do próprio centro tem um
aeroporto que pode receber um 747, e que desde o final do ano passado passou a
ser um aeroporto civil e militar. Seria um aeroporto inclusive para os
lançamentos como os da Virgin, mas isso dependeria da avaliação técnica e
operacional deles.
E qual é a outra prioridade do projeto espacial
brasileiro?
Também é prioridade número um: o Carponis, que é o
primeiro satélite de sensoriamento submétrico de alta resolução brasileiro. É
um satélite importante para a Defesa quanto para aplicações de agricultura,
meio-ambiente, planejamento urbano… Encerramos agora a fase de definições de
engenharia de sistemas e o próximo passo é o pedido de ofertas (RFP). Temos uma
parceria com a Embrapa sendo finalizada, e isso aumenta a prioridade no governo
para garantir os recursos e lançar ainda no primeiro trimestre o pedido de
ofertas, para termos um contrato de construção ainda este ano e lançamento até
2021/2022.
Ele será usado para outras aplicações de imageamento
além do uso governamental? Há muita demanda civil por esse tipo de
levantamento.
Ele consegue fazer 35 mil km por dia de imageamento,
então o potencial é bem grande. Ele cobre o país todo, com resolução
submétrica. Será um satélite estatal, como é o modelo na Europa, em que as
empresas privadas prestam serviço por meio de parcerias. Aqui estamos
preocupados inicialmente em resolver as demandas governamentais de aplicações
civis e militares, mas não está fechado a possibilidade de exploração por
empresas privadas. Mas não estamos trabalhando com isso agora. A nossa
preocupação é a Defesa, agricultura e meio-ambiente. Se houver demanda privada,
vamos procurar as maneiras de negociar. Mas não é o foco o uso comercial.
Sobre o SGDC já está há mais ou menos um ano em
operação. Qual o resultado para a área militar do uso do satélite?
Foi extremamente satisfatório. Aprendemos muito nesse
período desde 2017. Uma coisa é contratar um canal de comunicação, outra é
operar este canal do jeito que você acha que deve ser feito, descobrir
potencialidades que eram desconhecidas… Éramos excelentes usuários e estamos
nos tornando experts em operação. O efeito disso é potencializar aplicações,
serviços, otimização de uso dos links, novas capacidades de comunicação, e até
mesmo o emprego de outras bandas, como a banda Ka militar, que está prevista
para o novo SGDC.
Isso para o SGDC 2, não é? Em que fase isso está?
Está ainda na fase de definição. Ele está perto de
completar essa fase e acreditamos que assim que o SGDC 1 estiver plenamente
comercializado as fases do SGDC 2 devem avançar mais rápido. É preciso primeiro
completar a exploração civil, apesar de que estes satélites são altamente
rentáveis. Tudo correndo bem teremos ele em 2022, e agora fica mais simples
porque já temos o centro de controle planejado, as pessoas treinadas. Em 30
meses é possível construir esse satélite.
Há segurança de que o SGDC seguirá sendo um ativo
estatal?
Sim, até porque o decreto prevê a operação pela Telebras
e pela Defesa. Então temos plenas condições de operar, e quanto a isso não
existe risco de perda desse ativo. O nosso planejamento expresso no PESE
(Programa Estratégico de Sistemas Espaciais), e o próprio PNAE (Programa
Nacional de Atividades Espaciais) preveem satélites geoestacionários. O centro
já existe e está operando, então não existe risco.
E depois dos dois projetos prioritários, qual seria o
próximo projeto?
Queremos atingir a conclusão do lançador Áquila 2 em
2026, que é um foguete para lançar 500 kg a 720 km em órbita polar. Para chegar
lá, temos um caminho. O primeiro passo foi o teste estrutural do motor S50 em
2018 e este anos teremos um teste de voo com o veículo VS50, que é a base para
o Veículo Lançador de Microssatélites, o VLM. E o VLM é a base para a família
Áquila. Já estamos também trabalhando com a AEB e com o INPE para projetos de
satélites radar, onde a Defesa tem o objetivo do Lessônia e talvez com
esta maior sinergia possa ser antecipado em dois ou três anos. Esse é o efeito
do alinhamento de visões entre Defesa/CCISE, AEB, INPE, MCTIC: alinhar recursos
e capital humano, e envolver a indústria espacial brasileira desde o começo nos
projetos.
E o dinheiro? De onde vem o financiamento para o
projeto espacial?
Estamos buscando parceria com o pessoal do Meio Ambiente
para que as aplicações destinadas a este uso atendidas pelo Carponis possam
ajudar a financiar o projeto. Tem o orçamento da AEB, mas seria necessário ver
o que haveria de recursos disponíveis, já que seriam projetos conjuntos, e
também nas propostas para o Plano Plurianual 2020/23 incluiremos estes projetos
mobilizadores. Não existe sinalização de ampliação do orçamento militar, por
enquanto, mas acreditamos que, apresentando as propostas, teremos a
priorização.
Fonte: Site TELETIME - http://www.teletime.com.br/
Comentário: Boa e esclarecedora entrevista do Brig. Vidal, ficaremos na torcida para que tudo aqui levantado pelo mesmo venha a se cumprir e que ações nefastas anteriores não voltem a se repetir e o Programa Espacial Brasileiro realmente tome o caminho do desenvolvimento como todos nós desejamos. Aproveitamos para agradecer ao nosso leitor 'João Lanari Bo' pelo envio dessa entrevista.
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