O Futuro do ITA em Construção

Olá leitor!

Segue abaixo uma interessante entrevista com o novo reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Prof. Anderson Ribeiro Correia, publicada na revista AEROVISÃO e postada dia (26/05) no site da Força Aérea Brasileira (FAB), tendo como destaque o futuro desta instituição militar de ensino.

Duda Falcão

AEROVISÃO

O Futuro do ITA em Construção

Acompanhe entrevista exclusiva com o reitor de uma das mais
prestigiadas instituições de ensino do País

Por Ten Jussara Peccini
Agência Força Aérea
26/05/2016 - 08:00h


Para os próximos quatro anos, o novo reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), professor Anderson Ribeiro Correia, tem pela frente o desafio de renovar o quadro de professores, modernizar o ensino de engenharia e fortalecer as parcerias internacionais com objetivo de formar “engenheiros de concepção” – profissionais responsáveis por gerar novas ideias e inovações, de perfil empreendedor.

Engenheiro civil formado pela Unicamp, professor do ITA há mais de uma década, aos 41 anos foi o mais novo entre os 11 candidatos no processo de seleção para a escolha do novo gestor. Tomou Casimiro Montenegro, fundador do ITA aos 39 anos, e Ozires Silva, fundador da Embraer aos 38 anos, como suas referências e acredita que sua experiência na área de logística lhe deu uma visão global, útil ao cargo.

Um dos principais desafios será o de dar continuidade ao projeto de expansão - que inclui obras como o novo prédio de Ciências Fundamentais, no valor de R$ 50 milhões - mas que, segundo ele, não se esgota no aspecto físico. “Vamos olhar para frente respeitando o passado”. 

Aerovisão - Como está o projeto de expansão?

Anderson Correia - O projeto de expansão vai continuar. Algumas obras terão atraso por causa da conjuntura econômica nacional, que transcende a atuação do ITA. Apesar disso, a principal obra – o prédio novo de Ciências Fundamentais (foto) - está em andamento e a velocidade tem sido acima dos padrões. Se houver continuidade dos aportes do Ministério da Educação, que estão sendo honrados, a gente consegue terminar em outubro deste ano, mobiliar e, em 2017, os alunos já devem usar as novas instalações.

Aerovisão - Já será possível ampliar o número de vagas ofertadas pelo vestibular?

Anderson Correia - Ainda não, porque precisamos trabalhar a questão de alojamentos. A gente não consegue ampliar o ITA sem a conclusão dessas obras. São três pilares: espaço físico para os professores, alojamento e contratação de professores. Com isso a gente consegue ampliar até chegar às 240 vagas para o vestibular, que é nossa meta até 2020. 

O modelo do ITA é pautado pelo ensino integral. É como na AFA [Academia da Força Aérea], na EPCAR [Escola Preparatória de Cadetes do Ar], nas principais escolas militares, inclusive fora do Brasil também. É internato. É opcional, mas 99% dos alunos escolhem esse modelo. Mesmo quem mora em São José dos Campos (SP) fica aqui no alojamento, pois é um modelo que envolve as turmas. Tem várias atividades em paralelo, eles se apoiam, transmitem informações.

Nosso projeto de expansão é a maior obra do ITA e uma das maiores do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial [unidade da FAB onde está sediado o campus do Instituto] realizada nos últimos 20 anos. É uma obra bem significativa. Apenas no prédio de Ciências Fundamentais são 15.873 metros quadrados de área construída, no valor total de R$ 50 milhões. O Ministério da Educação disponibilizou boa parte dos recursos. Já foi aprovado o valor de R$ 14 milhões na Lei Orçamentária deste ano [valor de uma das parcelas] e estamos bem confiantes que a gente vai conseguir finalizar essa obra.


Aerovisão - Quais os desafios para os próximos quatro anos à frente da reitoria de uma instituição que tem 65 anos e uma tradição consolidada?

Anderson Correia - O desafio é olhar para frente, respeitando o passado. É uma escola que precisa de renovação. Pelo menos metade dos professores deve se aposentar nos próximos cinco anos. Estamos bem preocupados com a realização de concursos públicos, já que passamos por um período em que o governo está com dificuldades. E também leva tempo para efetuar uma contratação: um processo seletivo demora de um a dois anos, desde o processo de aprovação no Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão até conseguir colocar o professor em sala de aula. Estou bem preocupado com essa questão, que é central. É tão importante quanto as obras. Não se pode inaugurar uma obra desse porte e não ter número suficiente de professores.

Então, vamos priorizar nossa atuação junto ao governo federal para conseguir concursos para professores e técnicos do ITA. Sem isso, a gente não consegue renovar. Vai perdendo gente, vai ficando sem estrutura. Esse é o principal desafio que teremos. 

Aerovisão - E tem outros desafios?

Anderson Correia -Tem. Até o professor Pacheco [Carlos Américo Pacheco, ex-reitor do ITA] sempre mencionava que a ‘expansão não é somente física’. Muitos focam a expansão e a identificam como sinônimo de obras, pessoal, novos alunos entrando. Isso é somente metade da história. A outra metade é como você vai adaptar o currículo de um curso que tem 65 anos, pensando nos próximos 30 anos.

Aerovisão - É a renovação do ensino de engenharia...

Anderson Correia - É a renovação e não é só o ITA que está passando por isso: o mundo vem lidando com esse desafio, catalisado pela revolução da tecnologia e pela renovação do conhecimento. O professor Sakane [Fernando Toshinori Sakane, assessor especial do reitor] mencionou, na aula magna de início do ano letivo de 2016, que a tendência é de que o conhecimento seja duplicando a cada 13 horas no futuro. Então, o aluno entra aqui e, em cinco anos, o conhecimento se transforma. O que temos que fazer não é passar conhecimento aos alunos, mas prover a eles a capacidade de pesquisar, de trabalhar em equipe, de resolver problemas.

O professor não pode ficar só no quadro negro passando o conteúdo; aluno não quer mais isso. A geração de adolescentes que estamos recebendo é muito dinâmica. Há disponibilidade de informação no celular, tem o Google, trabalha-se com quatro ou cinco ferramentas ao mesmo tempo. Não tem como usarmos os mesmos métodos de ensino da década de 1950. Hoje, o professor tem que ser um facilitador. Tem que promover o ensino, mostrar as ferramentas aos alunos e praticá-las em sala de aula. Nós buscamos, cada vez mais, que a aprendizagem esteja voltada aos problemas práticos que a indústria e o Comando da Aeronáutica têm. Queremos trazer esses desafios para a sala de aula, a fim de serem resolvidos e equacionados com apoio do professor. 

Aerovisão - Há preocupação do ITA em conseguir se transformar e manter a excelência?

Anderson Correia - Uma vantagem do ITA, em comparação com outras escolas de engenharia, é sua vinculação ao Comando da Aeronáutica, o que o torna mais autônomo para propor mudanças. Outra questão é que o ITA foi criado com uma estrutura de renovação curricular anual, portanto, é mais flexível que outras instituições onde se muda o currículo a cada cinco, dez anos. O risco que identifico é que, como a competitividade para ingresso no ITA é muito alta [no vestibular de 2016, foram 90 candidatos por vaga], a gente já recebe os melhores alunos. Muitas vezes, a avaliação feita pelos órgãos competentes considera o quanto o aluno evoluiu dentro da escola. O ITA tem essa particularidade: já recebe os melhores. Evoluir ainda mais é o desafio. Por isso a importância de trabalhar com ferramentas que explorem o potencial do aluno em um ensino mais prático e orientado.

Aerovisão - Com todas essas mudanças, o que se espera do perfil do egresso do ITA? 

Anderson Correia - Existem engenheiros de operação, de manutenção, de produção, de projeto e de concepção, que equivalem a diferentes níveis de formação. O nível do ITA é o 5, conhecido como engenheiro de concepção. É aquele que vai pensar no processo, pensar no novo projeto, pensar em uma nova ideia. Um engenheiro muito mais criativo, inovador e empreendedor, seja em uma empresa, seja dentro do Comando da Aeronáutica ou mesmo criando o próprio negócio. São eles que vão desenvolver a tecnologia necessária para os próximos anos. 

Aerovisão - Sabe-se que muitas grandes inovações, como a internet e o uso de ressonância, surgiram de projetos militares. Como o senhor avalia o diálogo do ITA com o Comando da Aeronáutica?

Anderson Correia - O diálogo com o Comando da Aeronáutica vem sendo pautado pela dualidade. Ou seja, é evidente que nosso foco está no setor aeroespacial e nos projetos estratégicos da Força Aérea Brasileira. Mas, muitas vezes, perseguindo um projeto desses, conseguimos transbordamento de tecnologia para outros setores que também interessam à indústria nacional. Estamos focando em um projeto aeroespacial e surge o interesse da Petrobras, por exemplo, na exploração do pré-sal. Ou, então, estamos buscando uma solução na área de materiais e elas acabam transbordando para a bioengenharia. Uma tecnologia de manufatura avançada de asa aeronáutica pode ser aproveitada para reservatórios de alta complexidade. O diálogo com o Comando da Aeronáutica deve priorizar o setor aeroespacial, mas sem deixar de atender a outros setores que também são relevantes para o País.


Aerovisão - Seguindo este raciocínio, estão previstas novas linhas de pesquisa e laboratórios? 

Anderson Correia - Dois laboratórios estão em maturação e outros dois em gestação. Um deles é o de novos conceitos aeronáuticos, muito importante porque foca na concepção de soluções para as próximas décadas, como formas mais eficientes de arrasto, aerodinâmica, redução de ruído e de consumo de combustível – assuntos que interessam à FAB, à Embraer e também à Saab.

Outro laboratório muito importante é o de tráfego aéreo. Queremos identificar formas mais eficientes de fazer a gestão dos fluxos, sejam eles civis ou militares. O desafio é entender como colocar mais aeronaves no espaço aéreo, com separações menores entre elas, com a mesma segurança ou até superior, e como evitar atrasos.

Também queremos construir um laboratório de logística, muito caro à FAB. Ali podem ser pensadas soluções para que a Força Aérea seja cada vez mais operacional, gaste menos com manutenção, organize melhor questões relativas à estocagem e à aquisição de componentes. Esses desafios estão alinhados às diretrizes do Comando da Aeronáutica, recentemente divulgadas no Força Aérea 100. 

O quarto laboratório é o de bioengenharia. Os alunos chegam muito jovens ao ITA, alguns com 16 anos, e querem mudar o mundo. Um desses projetos usa tecnologias de controle de tráfego aéreo para construir fixadores externos ao corpo humano que são eletromecanicamente controlados. Tem outro aluno que fez uma cadeira de rodas que sobe escadas sozinha. A engenharia está se aproximando cada vez mais da medicina (saiba mais sobre o laboratório de bioengenharia na página 24). 

Aerovisão - Em relação às parcerias internacionais, como serão daqui para frente? 

Anderson Correia - A meta é continuar as parcerias, mas torná-las mais relevantes para o ITA.

O que eu digo com mais relevantes é que essas parceiras proporcionem dupla titulação e não apenas intercâmbios. Assim, nosso ensino ganha, cada vez mais, um caráter internacionalizado. Quando há a dupla titulação, estamos dizendo que o nível do ITA está no mesmo patamar lá de fora e ambas as instituições saem ganhando nessa troca de aprendizado, além de, claro, o próprio aluno. Isso nos ajuda a manter o padrão internacional, em se tratando de qualidade e atualidade do ensino. Internacionalizar o ITA mantendo sua identidade, mas tendo um padrão internacional de fato, é um objetivo para os próximos anos.

Junto com essas parcerias, estamos trabalhando na vinda de docentes por meio de programas de compensação tecnológica, inclusive ligados à COPAC [Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate]. Ou seja, traremos professores de renome internacional, provenientes de todas as partes do mundo, para atuar dentro do ITA com financiamento dessas empresas. Anualmente, de cinco a dez professores de outras nacionalidades deverão atuar nos nossos cursos de graduação e pós-graduação. Não basta ter os melhores alunos. Tem que ter também os melhores professores.

Aerovisão - O aluno sai do ITA com alto nível de conhecimento e preparado para pensar o futuro. O que se espera dele em termos de contribuição para o desenvolvimento do Brasil?

Anderson Correia - Qualquer país desenvolvido precisa ter capacidade de criar sua própria tecnologia. Quando se compara o quilo do satélite com o quilo do café, isso fica muito claro. Os países que vendem e produzem satélite, aviões, foguetes, por exemplo, têm muito mais valor agregado. Os salários são maiores. Esses profissionais estão fazendo a economia girar, aumentando as transações de exportações, valorizando o conhecimento. Temos alunos que atuam, além da indústria, em setores do governo e da sociedade. O presidente da FAPESP [Fundação de Amparo a Pesquisa de São Paulo], Carlos Brito, que também esteve à frente da reitoria da Unicamp, foi aluno do ITA. O presidente da CAPES [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior] também é ex-aluno do ITA. O início da Unicamp, por exemplo, foi dependente de professores do ITA. 

Aerovisão - É difícil mensurar o valor do impacto do ITA?

Anderson Correia - Um dos nossos ex-alunos, uma vez, fez um cálculo para medi-lo. A conta foi simples: as receitas da Embraer comparadas ao orçamento do ITA. O orçamento de um ano da Embraer equivale a 900 anos do ITA. Outro iteano fez um estudo sobre o valor da marca do ITA e chegou a uma estimativa de 1 bilhão de dólares. Isso é para tentar quantificar o valor da marca da instituição. Apesar de sermos pequenos e trabalharmos com algumas dificuldades, como a falta de professores e necessidades de infraestrutura, a relevância que o Instituto tem é muito grande. O nome do ITA é reconhecido em qualquer nível social nacional e internacional, seja pelo trabalho da FAB, da Embraer, dos ex-alunos, do vestibular, pela tecnologia ou pelos impactos na sociedade.

ITA EM NÚMEROS

Fundação: 16/01/1950

Graduação: Cursos de engenharia: 6 (Aeronáutica, Eletrônica, Mecânica-Aeronáutica, Civil-Aeronáutica, Computação e Aeroespacial)

Alunos 2016: 790

Formados até 2015: 5.967

Pós-graduação:

Alunos em 2016 (doutorado, mestrado e mestrado profissional): 889

Formados em 2015 (doutorado, mestrado e mestrado profissional): 290



Fonte: Site da Força Aérea Brasileira (FAB) - http://www.fab.mil.br

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