Dr. Mangalathayil Ali Abdu, Autoridade Internacional em Geofísica Espacial do INPE

Olá leitor!

Segue abaixo uma curiosa entrevista com o pesquisador indiano do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Dr. Mangalathayil Ali Abdu, autoridade internacional em Geofísica Espacialpublicada na edição de julho e Agosto do “Jornal do SindCT”.

Duda Falcão

ENTREVISTA

Mangalathayil Ali Abdu, Autoridade
Internacional em Geofísica Espacial

Antonio Biondi 
Jornal do SindCT
Edição nº 39
Julho e Agosto de 2015


Indiano graduado em Física na Universidade Kerala, pós-doutorado no Canadá, Abdu é um dos pioneiros do INPE, onde chegou em 1973. Ele tornou-se um dos maiores especialistas mundiais em ionosfera.

Quando chegou para lecionar no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em 1973, Mangalathayil Ali Abdu foi saudado por Fernando de Mendonça, diretor pioneiro do instituto, com um “Welcome home!”, ou, em português, “Bem-vindo à sua casa!”. Naquele momento o cientista indiano, radicado havia dois anos em São Paulo, não poderia imaginar que passaria as quatro décadas seguintes na instituição, onde viria a orientar 25 mestrandos e doutorandos no curso de Geofísica Espacial.

Ele também chefiou a divisão de Aeronomia entre 1992 e 1996 e coordenou a linha de pesquisas ionosféricas de 1978 a 2008. Hoje, Abdu é pesquisador sênior do INPE e pesquisador de nível 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Físico graduado pelo Maharajas College (1959), da Universidade Kerala (onde, em seguida, cursou mestrado em Física), ele se doutorou em Física da Ionosfera no Physical Research Laboratory, da Gujarat University (1967), em Ahmedabad, ainda em seu país natal. O pós-doutorado levou-o à Western Ontario University, no Canadá.

No ano da conclusão, mudou-se para o Brasil. Como consultor, o físico colaborou com instituições como a NASA, a National Science Foundation (NSF), o CNPq e a Fapesp. Publicou cerca de 270 artigos em periódicos científicos de alto nível, um livro e diversos capítulos de livros. Foi premiado com a medalha Vikram Sarabhai, concedida a cientistas que se destacaram na promoção de pesquisas espaciais em países em desenvolvimento.

Teve destacada atuação na International Association of Geomagnetism and Aeronomy (IAGA), da qual integrou o comitê executivo entre 2003 e 2011 e o Comitê Científico de Física Solar-Terrestre (Scostep) de 1987 a 1995. Atuou, ainda, como chairman da comissão interdivisional para promoção de pesquisas nos países em desenvolvimento, a ICDC, no período 1987-1991, quando foi responsável pelo estabelecimento de vários observatórios ionosféricos no Brasil. Na mesma data em que recebeu a equipe de reportagem do Jornal do SindCT, o professor se preparava para uma reunião em que seriam estudadas possíveis aplicações para um novo satélite a ser desenvolvido com a NASA, para acompanhamento das atividades da ionosfera.

“Uma vez que existe uma grande quantidade de artefatos desse tipo, precisamos de justificativas fortes e novas aplicações interessantes para o desenvolvimento de mais esse”, explicou. Na entrevista a seguir, Mangalathayil Ali Abdu conta sua trajetória e a relação de mais de quatro décadas com o Brasil e o INPE.

Quando o sr. chega ao Brasil, e posteriormente, ao INPE?

Fiz o pós-doutorado no Canadá entre 1968 e 1971, e de lá vim para o Brasil. Inicialmente, como professor da Universidade Mackenzie. Em 1973, ingresso no INPE.

O professor Mendonça [Fernando de Mendonça, um dos fundadores do INPE — e seu primeiro diretor], quando me encontrou, disse “bem-vindo à sua casa”. Não imaginava que ficaria todo esse tempo.

Como o sr. decidiu vir para o Brasil?

Quando eu estava no Canadá, conhecia muitos colegas que estavam no Brasil, e me convidaram para vir. Acabei ficando. O clima é muito bom, a sociedade amigável, e existia liberdade para pesquisar nessa área.

Na época, havia alguma dificuldade para receber recursos para pesquisa, mas hoje isso está muito melhor. Meus filhos cresceram no Brasil e estudaram aqui. E depois se mudaram justamente para o Canadá.

Em termos de idioma, como foi a adaptação?

Na Índia, cada Estado possui uma língua, e falamos o inglês ou o português também.

No meu Estado na Índia, fala-se o Malayalam. No INPE, além de mim existe mais um pesquisador com quem posso falar utilizando o Malayalam.

Mantém vínculos de pesquisa com a Índia hoje?

Visito a Índia a cada um ou dois anos. Tenho colaboração com várias instituições locais. Índia e Brasil começaram as pesquisas no espaço quase ao mesmo tempo. Mas, na parte da tecnologia, a Índia tem avançado mais.

Os dois países possuem grandes dimensões e importância mundial, mas a Índia possui mais conflitos com os países vizinhos, e isso interfere nesse ponto do desenvolvimento tecnológico e espacial.

O sr. poderia nos explicar didaticamente o que é a ionosfera, o seu tema por excelência?

A ionosfera é uma região da atmosfera terrestre que é ionizada [e que se encontra entre aproximadamente 60 km e 1.000 km de altitude].

Nela, existem cargas elétricas (íons e elétrons), que se encontram em um estado de plasma ionosférico. Ela interfere sobretudo nas questões da comunicação, na propagação das ondas relativas a esse setor, que podem, por exemplo, bater na ionosfera e voltar, ou atravessá-la.

O sr. possui estudos importantes sobre a região do Equador. O que essa região possui de especial para o tema?

Na região equatorial a atividade da ionosfera é mais intensa. Essa movimentação da ionosfera dificulta a transmissão dos sinais, interfere nas ondas de comunicação, de GPS [Global Positioning System], por exemplo.

E isso interfere em várias atividades, especialmente de navegação de todos os tipos: navios, aviões, automóveis etc. Quando o Sol fica ativo, ele manda massa, energia para a ionosfera. E isso causa impacto nas comunicações em toda a Terra, normalmente com maior efeito sobre a região equatorial.

É uma área de estudos que possui, portanto, diversas aplicações e interesses. Vários grupos possuem interesse em estudar a ionosfera. Inclusive para se buscar previsibilidade dos fenômenos verificados nela e seus impactos. As principais aplicações se referem à navegação e comunicação. O SGDC brasileiro [Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas, em desenvolvimento pela Embraer e Telebras, por meio da Visiona], por exemplo, ficará estacionado sobre a linha do Equador, exatamente.

E irá girar à mesma velocidade que a Terra, a fim de manter-se sobre o mesmo ponto de referência. O monitoramento da ionosfera é muito importante e possui muito mais aplicações no campo físico. Traz elementos fundamentais para o estudo do clima, do tempo na Terra, e de sua previsibilidade.

Os fenômenos do Sol e sua incidência sobre a ionosfera mudam tudo na Terra. Os raios do Sol penetram mais facilmente nos polos da Terra, e mais intensamente no Equador. E ambos os processos se inter-relacionam. A comunidade científica tem muito interesse em conhecer melhor esses processos, do ponto de vista físico, eletrodinâmico etc.

Em que áreas o INPE foca seus estudos sobre a ionosfera?

O INPE estuda principalmente os aspectos físicos. Usa esse conhecimento para desenvolver previsões. Existem modelos baseados em supercomputadores, nos EUA por exemplo, que buscam consolidar o maior número possível de informações para desenvolver essa previsibilidade. No Brasil, são modelos mais empíricos, físicos.

Os modelos buscam contemplar todos os conhecimentos que possuímos sobre a ionosfera, atmosfera, atividade do Sol, etc. No caso do Brasil, são abordados inúmeros aspectos, cada um deles, ou um conjunto deles é estudado de forma específica, e depois se busca reunir todos os elementos em um grande conjunto.

Podemos dizer que o Brasil se encontra em uma posição intermediária no mundo nessa questão dos modelos. Os fenômenos envolvendo a ionosfera variam conforme a latitude na Terra e em cada país.

No Rio Grande do Sul eles vão se manifestar de uma forma, em Fortaleza de outra, por exemplo. Assim, o Brasil precisa de uma rede que integre todas essas pesquisas, e o país está avançando nesse sentido. Atualmente, o Brasil conta, por meio do INPE e instituições parceiras, com uma rede de sondagem da ionosfera que possui pontos em Fortaleza (CE), São Luís do Maranhão (MA), Cachoeira Paulista (SP), Boa Vista (RR) e Campo Grande (MS). Ainda serão instalados pontos da rede em Alta Floresta (MT) e no Rio Grande do Sul.

A rede é baseada em sondas que emitem sinais para a ionosfera, que rebate os sinais. O funcionamento é semelhante ao de um radar.

Em 2008, o sr. recebeu do Committee on Space Research a medalha Vikram Sarabhai. Do ponto de vista acadêmico, o Brasil possui bons indicadores nessa área de pesquisa?

O Brasil possui uma boa quantidade de citações nessa área. O livro que publiquei sobre o tema, por exemplo, foi muito baixado nos últimos quatro anos, com mais de 25 mil downloads dos artigos. O país possui publicações de relevância na área. E a relação entre publicações e citações do país é bastante positiva nessa área.

Como avalia a situação atual da pesquisa e do desenvolvimento em ciência e tecnologia no Brasil, sobretudo a aeroespacial, e especialmente a geofísica espacial?

O país tem realizado importantes avanços nas últimas décadas nessas temáticas. O Brasil reencontrou a importância de investir nessa área de ciência e tecnologia, com maior destinação de recursos, intercâmbio com outros países, inserção na comunidade científica internacional, etc. Se considerarmos os aspectos da ciência, tecnologia e aplicação, podemos afirmar que o Brasil vem tendo crescimento especialmente em ciência e aplicação, com a chegada de massa crítica, que agora precisa ser transformada em mais voz. Isso já está acontecendo, tanto junto ao governo quanto frente à sociedade, mas é preciso ampliar isso.

Na parte da tecnologia, entendo que o país ainda enfrenta mais dificuldades para desenvolver-se. O sr. está satisfeito hoje com suas atividades no INPE e com o reconhecimento que recebe na comunidade do instituto e de pesquisas do país em geral?

Contamos com recursos, bom clima, colaboração de outros pesquisadores, equipe muito boa, integração... O ambiente para pesquisa no INPE é muito bom.


Fonte: Jornal do SindCT - Edição 39ª - Julho e Agosto de 2015

Comentário: Extremamente curiosa essa entrevista do Dr. Mangalathayil Ali Abdu, já que na parte final de sua entrevista o pesquisador indiano do INPE deixa entender que para ele tá tudo indo satisfatoriamente bem com o PEB e com a ciência brasileira, quando na realidade é um tremendo caos. Essa postura do pesquisador indiano me faz levantar algumas questões, enfim...

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