Blog Entrevista Coordenador do Projeto do Cubesat AESP-14 do ITA

Olá leitor!

Dando sequencia a série de entrevistas “Personalidades do Programa Espacial Brasileiro (PEB), o Blog BRAZILIAN SPACE traz agora para você uma entrevista com outro profissional envolvido com um projeto de nanosatélite no Brasil.

Como já fizemos recentemente com os coordenadores dos projetos dos nanos e picossatélites em andamento no Brasil (ITASAT-1, NanosatC-Br1, 14-BISat, CONASAT e do Tubesat Tancredo-1)  trago agora para você leitor uma entrevista com o coordenador do projeto do Cubesat AESP-14, o Dr. Pedro Teixeira Lacava, professor e coordenador do Curso de Engenharia Aeroespacial do nosso prestigiado Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

Nesta entrevista o Dr. Pedro Lacava nos fala sobre a sua carreira e faz um relato sobre as atividades no ITA relacionadas com o projeto do Cubesat AESP-14, cubesat este que se prepara para ser lançado ao espaço em outubro deste ano. Vale a pena conferir.

O Blog BRAZILIAN SPACE aproveita para agradecer ao Dr. Pedro Lacava e ao Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) pela atenção dispensada ao nosso Blog lhe desejando desde já sucesso com a sua missão.

Vale dizer também que com essa entrevista encerramos por hora a série de entrevistas com os profissionais envolvidos com projetos de nanossatélites no Brasil, já que os outros projetos em curso, ou seja, o misterioso SERPENS de nossa Agência Espacial de Brinquedo (AEB) e o discutível MMM-1, não merecem a nossa atenção pelos motivos já abordados aqui no Blog, e um terceiro projeto de Cubesat em andamento no Brasil está em fase de concepção inicial e sua equipe ainda não esta pronta para falar sobre o assunto. Fora esses projetos, vale também citar o projeto da sonda espacial lunar do Grupo ZENITH da Universidade de São Paulo (USP), projeto este em parceria com a empresa brasileira AIRVANTIS, mas já quanto a este projeto abordaremos aqui em outra oportunidade.

Dr. Pedro Teixeira Lacava
(Coordenador do projeto e do

Curso de Eng. Aeroespacial do ITA)
BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro Lacava, para aqueles leitores que não o conhecem e ao seu trabalho, nos fale sobre o senhor, sua idade, formação, onde nasceu e desde quando está atuando como docente no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)?

DR. PEDRO TEIXEIRA LACAVA: Eu tenho quarenta e quatro anos e nasci em Ribeirão Preto no estado de São Paulo. Sou Engenheiro Mecânico formado pela UNESP de Guaratinguetá em 1992, Mestre e Ciências Espaciais pelo INPE em 1995 e Doutor em Engenharia Aeronáutica e Mecânica pelo ITA em 2000. Sou Professor do Departamento de Propulsão do ITA desde de maio de 1999. Tive passagens como Vice-presidente da Associação Aeroespacial Brasileira – AAB e como Chefe da Divisão de Engenharia Aeronáutica do ITA. Assumi a Coordenação do Curso de Engenharia Aeroespacial em dezembro de 2012 e em decorrência disso também assumi a Coordenação do Projeto AESP 14.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, como surgiu à ideia de desenvolver o nanosatélite AESP-14?

DR. PEDRO LACAVA: No ITA o desenvolvimento de cubesats com interesse acadêmico nasceu com a criação do curso de Engenharia Aeroespacial em março de 2010. O plano político pedagógico do curso estava em elaboração e incluía a realização de um projeto SISTEMA que cobria os três anos do curso e que seria realizado ao longo de seis disciplinas semestrais. No semestre 1 define-se a missão do sistema espacial. No semestre 2 define-se os requisitos do sistema a ser desenvolvido. No semestre 3 desenvolve-se o projeto detalhado do sistema. No semestre ocorre a manufatura dos subsistemas. No semestre 5 a montagem, integração e teste. No semestre 6 ocorre o lançamento e operação. Essa sequencia segue um novo paradigma de ensino de engenharia, desenvolvido no MIT e chamado de CDIO (Conceive, Design, Implement and Operate). CDIO permite que os alunos experimentem desde a concepção de um sistema até a sua operação.

A turma que se formou em 2012 no ITA desenvolveu um CANSAT, uma estação terrena e um pequeno foguete balístico. A turma que se formou em 2013 desenvolveu uma nova versão do trabalho da turma 2012. A turma 2014 desenvolve o Cubesat AESP14. Esses projetos tiveram apoio e coordenação do Dr. Geilson Loureiro, Pesquisador do INPE e Professor Colaborador dos cursos de Eng. Aeroespacial e Eng. Aeronáutica. A proximidade, não somente física, mas principalmente profissional e histórica, entre o ITA e o INPE foi fundamental para realização desses projetos e para a aproximação dos alunos às atividades práticas do setor espacial.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro quais são os objetivos do desenvolvimento desse nanosatélite?

DR. PEDRO LACAVA: Conforme comentado os objetivos são acadêmicos, ou seja, que os alunos coloquem em prática os conhecimentos adquiridos no curso através de um projeto que é executado gradativamente ao longo do curso.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, quantos pesquisadores (alunos e professores) estão envolvidos nesse projeto?

DR. PEDRO LACAVA: São quatro alunos de graduação do curso de Engenharia Aeroespacial, três alunos de mestrado, um aluno de doutorado, um pós-doutor, dois professores, dois radio amadores e o coordenador.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro existe alguma outra instituição envolvida no desenvolvimento do projeto além do ITA?

DR. PEDRO LACAVA: Contamos com apoio do INPE, não apenas para o projeto, mas também para participação de seus pesquisadores como professores colaboradores. Também contamos com as instituições de fomentos, como AEB através da LSI-Tec e CNPq.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, qual será as dimensões deste nanosatélite e suas cargas úteis?

DR. PEDRO LACAVA: Cubesat 1U, o experimento foi desenvolvido em conjunto com o CRAM (Clube de Radio-amadores de AMericanas) este experimento consiste em 100 sequencias (strings MD5) armazenadas no AESP-14. As sequencias serão usadas para abrir uma imagem no software do solo (álbum de figurinhas). Elas serão transmitidas aleatoriamente para o solo. No solo, as estações que receberem as sequencias poderão abrir as imagens e "colecionar" as figurinhas. As imagens serão escolhidas de forma que sejam relevantes para as áreas STEM.


Modelo de vôo do Cubesat AESP-14 em testes no LIT.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, quando e como o nanosatélite AESP-14 deverá ser lançado ao espaço?

DR PEDRO LACAVA: A previsão é lançar a partir da Estação Espacial Internacional, sendo agenciado pela JAMSS e AEB. A JAXA através da JAMSS comercializa o lançamento de Cubesats através do JEM Small Satellite Orbital Deployer – J-SSOD. A campanha de lançamento é dividida em dois marcos importantes. No primeiro marco o cubesat é enviado para a estação espacial através de um cargueiro (a previsão é outubro deste ano). Ao chegar na estação espacial, o cubesat fica cerca de 2 meses até ser lançado através do braço robô japonês.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, porque o nanosatélite foi nomeado de AESP-14 e não um nome em homenagem a uma personalidade da história do ITA, como por exemplo, o Marechal Montenegro?

DR. PEDRO LACAVA: O nome do nanosatélite recebeu este nome por ser o nome da turma de engenharia aeroespacial do ITA que se formará em 2014. A idéia foi dar uma conexão forte entre o projeto e a turma que estava participando do projeto.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, existe a pretensão de se dar continuidade no projeto após o lançamento do AESP-14, ou seja, haverá um AESP-14 - 2?

DR. PEDRO LACAVA: Como do ponto de vista acadêmico, focado na formação de recursos humanos para o setor espacial, o projeto vem gerando bons frutos e a ideia seria sim de continuar. Estamos estudando um novo projeto chamado de AESP 16. Contudo, esse tipo de iniciativa, onde o aprendizado está baseado em atividades “hands on”, tão comum em instituições americanas por exemplo, torna-se bastante complicado aqui no Brasil, especialmente em instituições públicas como o ITA. Mesmo uma iniciativa como o AESP 14 ser totalmente possível de ser encampada por recursos institucionais, no que se refere aos valores necessários para execução, na prática a burocracia para o uso dos recursos públicos inviabiliza.

Aí dependemos das instituições públicas de fomento a esse tipo de iniciativa e ficamos no aguardo de oportunidades. Na prática, isso gera interrupções entre a continuidade dos projetos e na transferência do conhecimento entre uma equipe e outra.

Equipe do Cubesat AESP-14 no LIT.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro com o desenvolvimento da tecnologia de nanossatélites no ITA, existe a pretensão de se explorar esse conhecimento no desenvolvimento de projetos mais significativos, como por exemplo, uma missão em Órbita Lunar?

DR. PEDRO LACAVA: O ITA é uma instituição de ensino e pesquisa e existem outras iniciativas na área de desenvolvimento de satélites, como, por exemplo, o ITASAT, que do ponto de vista de missão e carga útil passam a ser mais ousadas. Contudo, o grupo que desenvolve o AESP 14 e possíveis continuidades deste busca trabalhar com projetos atrelados ao curso de Engenharia Aeroespacial, ou seja, com objetivo acadêmico e que seja exequível em termos de recursos envolvidos e tempo de execução.

BRAZILIAN SPACE: Dr. Pedro, como o senhor avaliaria o estágio de desenvolvimento atual do Programa Espacial Brasileiro?

DR. PEDRO LACAVA: Eu como Professor e Coordenador do Curso de Engenharia Aeroespacial olho com muita preocupação para o Programa Espacial Brasileiro, pois é difícil enxergar o seu futuro, ainda é muito baseado no entusiasmo de pesquisadores e instituições que não querem que a “peteca” caia. A minha sensação é que se o governo e a sociedade não tiverem um entendimento claro que Programa Espacial Brasileiro é algo relevante para o Brasil, vamos continuar seguindo a passos curtos movido apenas pelo entusiasmo de alguns, enquanto ele existir. O problema é como passar esse entusiasmo para os jovens que estão se formando, tomo como exemplo o nosso curso de Engenharia Aeroespacial, em 2012 dez alunos iniciaram o curso no fundamental, em 2014 oito alunos deveriam iniciar o ciclo profissional (terceiro ano do ITA), mas quatro migraram para outros cursos por principalmente não enxergarem perspectiva na área espacial. Infelizmente vejo relatos similares de coordenadores de curso de Engenharia Aeroespacial de outras escolas.

BRAZILIAN SPACE: Finalizando Dr. Pedro, o senhor teria algo a mais a dizer para os nossos leitores?

DR. PEDRO LACAVA: Por fim, acho que iniciativas como o AESP 14  e outras que estimulamos nossos alunos participarem, como as competições Aerodesign e Rocketdesign são fundamentais para que eles exercitem engenharia ao longo do curso; pois além de serem atividades estimulantes, mostram as razões dos conceitos passados em aulas teóricas e colocam os alunos frente a desafios de projeto, integração de sistemas, confiabilidade de sistemas e gestão de projeto e equipe. O que precisamos são mais meios para executar projetos como estes.

Comentários

  1. Interessante essa visão de que um dia esse ou qualquer outro governo semelhante vai se conscientizar de que o PEB é importante para o país, e mais ainda que parte considerável da nossa sociedade vai algum dia, sequer saber do que se trata...

    Nota-se que é uma pessoa de fé.

    Eu como sou cético, porém como todo brasileiro, não desisto, continuo esperando que o pessoal de DENTRO do PEB e das instituições que orbitam ao seu redor, um dia tomem uma atitude realmente efetiva para OBRIGAR esses "desgovernos" a colocar um mínimo de ordem nas coisas.

    Continuar contando que um dia vai descer uma bênção dos céus e conscientizar a todos sobre a importância do programa espacial, pra mim, é eufemismo para outra coisa...

    Bom meu desabafo já está ficando grande. Eu continuo insistindo. Se querem mudanças, essas mudanças precisam ser forçadas e exigidas. Se não for assim, é melhor mesmo deixar do jeito que está e esperar a aposentadoria.

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