Um Espião no Cerrado Brasiliense

Olá leitor!

Para demonstrar como é grave e antigo o problema da espionagem no país, vou apresentar agora para você uma série de três artigos escritos recentemente sobre esse  assunto. O primeiro deles foi postado dia (19/07) no site da “Universidade de Brasília (UnB)”, escrito que foi pelo geólogo e professor aposentado da UnB, Alberto Veloso.

Duda Falcão

OPINIÃO

Um Espião no Cerrado Brasiliense

Alberto Veloso*
UnB Agência
19/07/2013

As recentes notícias da existência de um programa de espionagem norte-americano sobre informações brasileiras me faz antecipar a divulgação de uma curiosa história que integra um livro, que ora escrevo. Acredito ser também uma boa oportunidade para refletirmos sobre a vulnerabilidade de nossa nação ante o vertiginoso progresso da tecnologia da informação.

Eram os anos de 1980 e, dirigindo a Estação Sismológica da Universidade de Brasília, recebia diferentes visitantes, pois os terremotos atraem a curiosidade de muitas pessoas. Certa vez, apareceu um jovem diplomata estrangeiro se expressando em bom português - aqui ele será chamado de Mr. X. Fez perguntas sobre sismologia, interessou-se pelo sistema de registro e ouviu a reprodução sonora de um terremoto. Ao final, agradeceu e, como muitos, prometeu regressar. E voltou. Às vezes para dizer alô e outras para deixar revistas de seu país.

Um dia, perguntou se havíamos registrado determinada explosão nuclear e, verificando os boletins, confirmei o fato. Em Brasília, só detectávamos as mais potentes mas, indiretamente, tínhamos os dados de todas as detonações através de boletins fornecidos pelo Serviço Geológico Americano e distribuídos a vários centros de sismologia. Mr. X solicitou uma cópia daqueles dados e lhe dei, já que eram públicos e qualquer entidade que recebesse o boletim poderia utilizar e divulgar seu conteúdo. Nada havia de secreto, apenas teríamos de citar a fonte da informação. Mas confesso que fiquei intrigado com o pedido.

Naqueles anos, as principais potências nucleares procuravam negociar um tratado de limitação de testes nucleares, mas o horizonte continuava escuro e cheio de incertezas. O muro de Berlim permanecia em pé, os principais atores corriam para expandir seus arsenais e as explosões continuavam sacudindo as áreas de testes nos Estados Unidos e na União Soviética e, pouco menos, na China e França.

Passado um tempo, Mr. X regressou. Desejava informações de outros dois, ou três testes, e explicou que estava atendendo pedido de um professor-pesquisador de seu país, que tinha dificuldades de conseguir tais dados – terremotos e explosões são as principais ferramentas que ajudam a conhecer o interior da Terra. Eu já havia visitado seu país, conhecido cientistas e centros de pesquisas, observado coisas boas e ruins. Sua história soava fraca, mas poderia ser verdadeira e acabei cedendo. Quando voltou a requisitar novas informações, educadamente neguei. Para mim não estava claro suas intenções e o destino dos dados. Acrescentei que a informação que ele buscava não era de forma nenhuma secreta, mas não seria eu a fornecê-la. Suas visitas findaram, mas a história não.

Um dia, ele ligou e convidou-me para um chopinho. Conversa vai, conversa vem, depois de alguns copos, sem qualquer pudor, ele falou: Estou autorizado a lhe pagar mil e quinhentos dólares, que poderão subir para dois mil, todos os meses. Precisamos de sua cooperação. Queremos que você forneça, rotineiramente, aqueles dados sobre as explosões atômicas. Atônito, não acreditava no que ouvia. Parecia mais coisa de cinema, ou livro de ficção. Mas, não. À minha frente, abaixo do céu de Brasília, havia um espião de carne e osso, querendo me corromper. Ele não estava atrás somente de dados, deveria querer informações de equipamentos, projetos internacionais e outras coisas.

O simpático diplomata havia tirado a máscara. Minha surpresa virou indignação, mas reagi com calma. Medindo as palavras, mas em tom enérgico, lhe disse que a partir daquele momento encerrava qualquer possibilidade de futuros contatos. Levantei-me da mesa dizendo: - já que você tem tanta grana, pague a conta. Nunca mais o vi, nem nas reuniões em Genebra, quando participava da Conferência sobre Desarmamento, ou quando trabalhei para a ONU, em Viena, por sete anos.

A espionagem sempre existiu e talvez nunca acabe, pois a informação traz conhecimento e, acima de tudo, poder. Cabe aos que possuem informações sensíveis encontrar formas eficientes de salvaguardá-las. Nosso Ministro da Defesa reconheceu a imensa distância que nos separa de países que dominam sistemas de vigilância da informação. Temos de reduzir este gap e não basta só patriotismo, boa vontade, ou espada. Desenvolver e cultivar o saber em toda sua plenitude, com muito talento humano e adequados recursos financeiros é uma receita, pois hoje a guerra é cibernética.

* Geólogo e professor aposentado da UnB, trabalhou nas Nações Unidas e é autor do livro O terremoto que mexeu com o Brasil.


Fonte: Site da Universidade de Brasília (UnB)

Comentário: Para aquele leitor menos antenado com o assunto, essa modalidade de espionagem vivida pelo Prof. Alberto Veloso é chamada de “recrutamento” sendo uma das mais comuns e eficiente que existe no universo da espionagem internacional. Ela existe e é eficiente pelo fato da maioria das pessoas serem facilmente seduzidas por dinheiro, pela falta de ética e de patriotismo em todos os países do mundo e não só no Brasil. Sabendo disso, as agenciais de inteligência de todo o mundo se utilizam dessa modalidade quando enxergam essa possibilidade com muita frequência e eficiência, sendo a história da espionagem a grande prova disso. Recentemente conversando com um grande profissional do PEB, ele me disse que ele viveu uma experiência em seu local de trabalho que pode ser, a meu ver, o resultado de uma ação de recrutamento, já que envolvia a ação de profissionais militares insuspeitos, mas que felizmente por sua rápida e efetiva ação acabou não resultando em nada. Acorda Brasil. Amanhã postarei o segundo artigo dessa série.

Comentários

Postar um comentário