Programa Nacional de Atividades Espaciais - PNAE


Segundo foi anunciado pela Agência Espacial Brasileira (AEB/MCT), iniciou-se em janeiro passado os trabalhos de revisão do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), documento que norteia as atividades espaciais no país.

Segundo o presidente da agencia Carlos Ganem, será feito um amplo estudo sobre as demandas e capacidade técnica do programa espacial que será usado para basear as ações que deverão contemplar o novo PNAE.

O novo PNAE deverá ser concluído em aproximadamente um ano e sua elaboração envolverá a participação da sociedade, dos setores acadêmico e industrial além de atores importantes do executivo e legislativo.

Para que o leitor tenha uma idéia como é preocupante essa notícia, a primeira edição do PNAE foi aprovada em agosto de 1996 e abrangia o período de 1996 a 2005 (não concluído). Já a segunda edição abrangia o período de 1998 a 2007 (atualizado dois anos após a primeira edição e também não concluído). Em 2005 foi lançada a terceira edição que abrangia o período de 2005 a 2014 (infelizmente também não concluído) e agora a AEB planeja uma nova edição desse documento.

Sinceramente em qualquer organização privada séria, norteada por um plano de ação de mercado bem elaborado, essa falta do foco e de comprometimento seria vista como um desastre que poderia levar à empresa a concordata.

Infelizmente estamos falando de uma organização pública que demonstra não fugir da crença reinante na sociedade (não que isso não seja possível) de que todo órgão público é ineficiente e incompetente na realização da função para qual foi criado.

Temo pelo que possa acontecer com o Programa Espacial Brasileiro nos próximos anos se essa postura continuar reinando na AEB e nos órgãos que comandam as atividades espaciais no país.

O tempo está passando e países (Paquistão, Coréia) que antes não sabia nem fazer bombinha de São João já estão a nossa frente, dobrando a cada cinco anos o tamanho de seus respectivos programas espaciais. Fora os programas espaciais de países que estão na nossa cola, como Argentina, Chile e pasmem o Peru. Dentre esses, em algumas áreas, já estão até mais desenvolvidos como é o caso da Argentina na área de satélites.

Para um país que foi um dos pioneiros das atividades espaciais no mundo no início dos anos 60, desde a implantação da extinta MECB - Missão Espacial Completa Brasileira no inicio dos anos 80 até hoje, os gols alcançados pelo programa brasileiro foram insignificantes, se compararmos com o desenvolvimento de outros países no mesmo período.

Usando a China e a Índia como exemplos (paises que tinham na época do lançamento da MECB programas espaciais com o mesmo nível de desenvolvimento do programa brasileiro) a comparação não parece justa, já que a China tornou-se a terceira nação do mundo a colocar seres humanos no espaço e a Índia recentemente colocou uma sonda ao redor da lua. Já no caso brasileiro, não conseguimos ainda nem finalizar o nosso veículo lançador de satélites, um projeto que fazia parte da extinta MECB.

Quanto ao Paquistão e a Coréia, nesse período construíram seus foguetes lançadores e se não estou enganado, já lançaram até satélites.

No entanto, apesar desse quadro desolador, ainda temos tempo de recuperamos o tempo perdido, pois não nos faltam recursos humanos para isso. O que nos falta é organização, seriedade, comprometimento com os objetivos traçados e perseverança.

Pra tanto inicialmente a AEB tem de mudar seu modelo operacional de uma simples repassadora de recursos para uma verdadeira agencia espacial gerenciadora e norteadora das atividades espaciais no país. Exemplos de modelos gerenciais bem sucedidos não faltam (NASA, ESA, NASAU, JAXA, entre outras), é só adequá-los a realidade brasileira.

No campo político, a necessidade de transformar o programa espacial num "programa de estado" é algo que já deveria ter sido feito desde a época da implantação da extinta MECB, coisa que infelizmente não foi feita, deixando o programa durante esse período a mercê da instabilidade e dos interesses políticos, que nem sempre estão em concordância com os interesses e necessidades do país.

Outra coisa imprescindível em qualquer programa espacial é que o mesmo tenha representatividade política junto aos poderes executivo, judiciário e principalmente legislativo (Ex: NASA). Uma verdadeira força tarefa espacial formada por profissionais qualificados para servirem e auxiliarem os políticos preparados e comprometidos a defender os interesses do programa em seus respectivos fóruns.

Se olharmos para história das atividades espaciais ao redor do mundo, veremos que em todos os países onde o desenvolvimento aconteceu de forma avassaladora o apoio da sociedade foi decisivo para que esse desenvolvimento acontecesse. Cientistas, astronautas, cosmonautas, taikonautas, viraram heróis nacionais o que demonstra que não podemos deixar de trazer povo brasileiro para mais perto do esforço do programa espacial, através de uma maior divulgação de quais são os objetivos do programa, como alcançar esses objetivos e porque da necessidade desses objetivos.

Uma forma de fazer isso seria a criação de uma AEB TV nos moldes da TV Câmara, TV Senado e de preferência com o sinal aberto para todo país.

Além disso, o aprimoramento e expansão de programas como AEB Escola (boa iniciativa) são imprescindíveis e uma forma de atrair o interesse e a curiosidade de nossas crianças e adolescentes (nossa divisão de base) para as atividades espaciais. São daí que poderão em longo prazo sair os recursos humanos que o programa espacial necessitará no futuro.

Outros exemplos ao redor do mundo mostram também que uma integração com universidades, centros de pesquisas públicos e privados, e a indústria local são um grande impulsionador do desenvolvimento na área espacial. Sendo assim, a ampliação dos Programas de Microgravidade e Uniespaço e a criação de novos programas financiados pela AEB e pelos fundos de pesquisas brasileiros (tipo competições motivadas por prêmios entre instituições acadêmicas publicas e privadas) estimulará a comunidade científica brasileira atingir com mais rapidez os objetivos do programa espacial brasileiro.

A infeliz verdade é que pela cultura reinante estamos muito longe de alcançarmos os objetivos traçados ainda na primeira edição do PNAE e já estamos planejando uma quarta edição desse documento. O que será do programa espacial? Só poderemos responder a essa pergunta na quinta vez que reformularem o documento, afinal, como diz o ditado popular: o futuro só a deus pertence e eu sinceramente espero que ele esteja olhando com carinho para o cambaleante Programa Espacial Brasileiro.

Duda Falcão

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